A alienação parental face a responsabilidade civil


Porbarbara_montibeller- Postado em 20 junho 2012

Autores: 
FERREIRA, Victor Lucian Dantas

RESUMO

O objetivo deste trabalho foianalisar sob as vias legais como o genitor detentor da guarda filial pode responder legalmente pela conduta que incide na Alienação Parental. Para tanto, a metodologia utilizada fundou-se na pesquisa bibliográfica, com base na revisão da literatura e na legislação vigente relacionada ao assunto. Com esse aspecto, foi possível concluir que as normas e as leis devem adequar-se tomando por base as várias tipologias e caracterizações das necessidades a serem supridas para que possa oportunizar a todos a preservação de seus direitos, visando, assim o equilíbrio. Dessa forma, observou-se que o genitor alienador é passível de multa, porquanto ocorrer a Alienação Parental, porém, nos casos de sinais da Síndrome da Alienação Parental, também é passível da responsabilização civil.

Palavras-chave: Síndrome da Alienação Parental, Direito de Família, Responsabilidade Civil, Dano Moral.

ABSTRACT

The aim of this study was under the legal parent as the keeper of the prison branch can legally answer for conduct that focuses on Parental Alienation. For this purpose, the methodology used was based on the literature, based on literature review and the legislation on the subject. With this aspect, it was concluded that the standards and laws must conform to building on the various types of characterizations and needs to be met that can create opportunities for everyone to preserve their rights in order, so the balance. Thus, it was observed that the alienating parent is punishable by a fine because parental alienation occurs, however, in cases of signs of Parental Alienation Syndrome, is also punishable by the civil liability.
Keywords: Parental Alienation Syndrome, Family Law, Liability, Moral damage.


1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A ruptura do elo conjugal vem sendo cada vez mais comum no Brasil, tanto que dados apresentados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística[1](IBGE)mostraram que o número de divórciosno Brasil em 2010 atingiu o maior número da história da Estatística de Registro Civil, iniciada em 1984. Porém, junto com essa crescente condição gerou-se ainda, um cenário impactante na vida daqueles diretamente envolvidos, dentre os quais, o mais atingido é o filho ou os filhos.

Isso ocorre porque no ato da separação as crianças e/ou os adolescentes acabam sendo tratados como bens que não podem ser divididos, por assim dizer, devem ser compartilhados e/ou guardados por uma das partes, cabendo à outra assumir sua responsabilidade precípua do genitor dando àquele todas as condições de vida digna. 

Mas, apesar do dever da família, por vezes, as crianças e adolescentes envolvidos acabam sendo a maior vítima da separação, tornando-se alvo, em muitos casos, dos conflitos entre os ex-cônjuges, incorrendo em consequência na incidência da alienação parental. É quando um dos pais, normalmente o que detém a guarda do(s) filho(s), inicia um processo de denegrir a imagem do outro junto aos filhos, provocando assim o afastamento desses últimos com os pais que exercem o compartilhamento, em razão da responsabilização civil, que o obriga a participar da criação e desenvolvimento do filho, no sentido de que este possa ter uma vida digna.

Entretanto, em muitos casos, isso deixa de ser apenas um problema judicial, e passa a ser um problema de maior envergadura, pois acaba por abarcar outras condições psicossociais em todos os envolvidos. Como, por exemplo, no acarretamento de uma possível síndrome psicológica, denominada por Richard Gardner como “Síndrome da Alienação Parental” que ocorre segundo Gonçalves (2011, p. 305) quando “a mãe ou o pai de uma criança a induzia a romper laços afetivos com o outro cônjuge” e segundo Fiorelli; Mangini (2010, p. 309) acarretam em serias conseqüências para a criança ou o adolescente, ou ainda para o genitor alienado como: “depressão, incapacidade de socialização; transtornos de identidade e de imagem, desespero, tendência ao isolamento, comportamento hostil, à dependência química, ao alcoolismo e até ao suicídio”.

Assim, vê-se então, segundo a justiça, um ilícito civil praticado, tanto em detrimento do menor, como do genitor alienado. Mas o que se pergunta é como ogenitor alienador pode responder pelos danos face aos seus atos?

Este questionamento, portanto, foi que norteou o desenvolvimento da pesquisa, que passa a ter por objetivo geral a ação de analisar sob as vias legais, como o genitor alienador pode responder legalmente pela conduta, que incide na alienação parental.

2 A família

Com a evolução que o homem vem passando ao longo da história, incluindo-se a família, várias transformações vão sendo identificadas. Porém, no âmbito da família, ainda assim, não há na legislação pátria uma definição específica que dê à família um significado específico, podendo, portanto, possuir vários significados, levando-se em conta as diversas áreas do saber como: Sociologia, Antropologia ou Direito. Tomando por base o Direito, Lobô (2009, p. 2) assevera que:

[...] a família é feita de duas estruturas associadas: os vínculos e os grupos. Há três sortes de vínculos, que podem coexistir ou existir separadamente: vínculos de sangue, vínculos de direito e vínculos de afetividade. A partir dos vínculos de família é que se compõem os diversos grupos que a integram: grupo conjugal, grupo parental (pais e filhos), grupos secundários (outros parentes e afins).

 Conforme se pode observar, no âmbito do Direito, a formação da família pode incorporar-se numa organização social instituída tanto com base nos laços sanguíneos, quanto jurídicos ou afetivos.

Segundo Dias (2009), com o advento da Constituição Federal de 1988 (CRFB/88), foi dada uma atenção especial ao Direito de Família, contrapondo-se ao caráter patriarcal e autoritário do Código Civil de 1916, dessa vez, fundamentado o ordenamento nos princípios da igualdade, solidariedade e de respeito à dignidade da pessoa humana.

Embora se tenha estendido sobre os aspectos relacionados ao casamento, não se pode deixar à margem do contexto a legalidade da união estável. Especialmente, por ser um instituto fundamentado pelo art. 226, § 3º da CRFB/88 que dita:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

[...]

§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. 

§ 4° Entende-se, também, como entidade familiar qualquer um dos pais e seus descendentes.

Nota-se, que a dinâmica da evolução tem feito com que a legislação se adeque e se atualize, não fechando os olhos para a realidade da vida moderna.

Para Diniz (2011), a CFRB/88 marca história no ordenamento jurídico brasileiro ao ultrapassar o paradigma de família matrimonial, estendendo o conceito de família nos casos de união estável, assim como de comunidade monoparental, desta forma, dá-se maior importância à proteção da família, independentemente de quem sejam seus integrantes.

Em uma concepção moderna, Lobô (2009, p. 1) compartilha com a idéia de que “família está matrizada em paradigma que explica sua função atual: a afetividade. Assim, enquanto houver affectio haverá família, unida por laços de liberdade e responsabilidade, e desde que consolidada na simetria, na colaboração, na comunhão de vida”.

Farias; Rosenvald (2008, p. 2) destacam o quanto é fundamental a figura da família na vida do homem “terreno fecundo para os fenômenos culturais, tais como as escolhas profissionais e afetivas, além da vivência dos problemas e sucessos”.

Entende-se que a família é essencial ao desenvolvimento sadio dos indivíduos que dela fazem parte, pois nela conseguirão satisfazer suas vontades e aprenderão a lidar com as múltiplas relações do dia a dia.

Entretanto, baseando-se, inicialmente, no vínculo afetivo entre casais, Figueiredo e Alexandridis (2011, p. 37) ressalvam:

A família independente da forma de sua constituição, quer seja pela vontade, quer seja pela morte, será dissolvida, regulando então o legislador, tanto no direito de família como no das sucessões, os reflexos dessa dissolução, sobre o aspecto patrimonial (regime de bens), bem como sobre o efeito pessoal, notadamente quanto à pessoa dos filhos.

Nenhuma entidade, incluindo-se a familiar nasce com a intenção de ser dissolvida, ao contrário, tende sempre e naturalmente à permanência. Porém, mais relevante do que manter a família é respeitar as liberdades e garantias individuais. Nesse aspecto e, segundo ensinamento de Gonçalves (2011, p. 201):

As causas terminativas da sociedade conjugal estão especificadas no art. 1.571 do Código Civil: morte de um dos cônjuges, nulidade ou anulação do casamento, separação judicial e divórcio. Acrescenta o § 1º do dispositivo em apreço que tem aplicação, ainda, a presunção estabelecida no aludido Código quanto ao ausente.

Entretanto, assim no casamento como na união estável, a família não consiste apenas dos cônjuges, mas também de filhos que podem ter nascido no percurso do casamento, fora dele, ou ainda, por adoção.

 Para Figueiredo e Alexandridis (2011, p. 37):

A criança e o adolescente, ainda em formação, tem como parâmetro a familia que acabara por se dissolver, tendo que se buscar nesse difícil momento, independentemente dos motivos que acarretaram a dissolução do casamento ou dá união estável, a fixação da guarda com base no melhor interesse desse menor.

A essa afirmação, significa dizer que, mesmo depois da dissolução dos vínculos afetivos entre os casais, a unidade familiar persiste, sendo, portanto, um elo que se perpetua, especialmente, em relação à guarda e seu compartilhamento em relação aos filhos, no sentido de promover o desenvolvimento, uma vida digna e a cidadania dos menores.

3 A guarda dos filhos

Levando-se em conta a dissolução do vínculo afetivo entre um casal, não se abstrai da responsabilidade de ambos os cônjuges, o dever com o desenvolvimento físico e psicológico do filho nem a paternidade jurídica, haja vista que o poder familiar transcende os limites da dissolução conjugal, para se estabelecer no vínculo afetivo filial.

Salienta Lobô (2009, p.168) “A separação dos cônjuges (separação de corpos, separação judicial ou divórcio) não pode significar separação de pais e filhos. Em outras palavras, separam-se os pais, mas não estes em relação a seus filhos menores de 18 anos”.

Figueiredo e Alexandridis (2011) entendem que ao haver a dissolução do casal, é preciso que ambos, que anteriormente possuíam a guarda do menor, estabeleçam uma nova forma de guarda, independemente de ser unilateral ou compartilhada, prevalecerá o melhor interesse da criança, de maneira que esta possa se desenvolver resguardados seus direitos fundamentais, humanos e de personalidade.

O Código Civil de 2002 estabelece o conceito de guarda unilateral ou compartilhada:

Art. 1.583 [...]

§ 1° Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, §5°) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.

Há algum tempo, a simples guarda do filho impunha, a partir do termo “guarda”, uma noção de vigilância, repercutindo para o filho uma noção de objeto, o que concebia inadequação, principalmente, por não afeiçoar a uma perspectiva bilateral e dialética ou de participação na educação e na formação da personalidade do filho (DIAS, 2009).

Cabe ressaltar ainda que quando se tratar de guarda unilateral, o juiz concederá ao genitor que propiciar melhor condição de exercê-la conforme os requisitos do art. 1.583, § 2°, incisos respectivos do CC/02 “I - afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar; II- saúde e segurança; III – educação”.

A dissolução reproduz entre os pais, de um lado a guarda do filho, de outro é cabido o direito da visita e de estar com ele, conforme estabelece o art. 1.589 do CC/02.

Entretanto, é preciso lembrar que o pai ou a mãe que não detém a guarda dos filhos não possui apenas direito, tem também obrigação de “supervisionar os interesses dos filhos”, diante do disposto no art. 1.583, § 3° do CC/02.

Isso porque nem sempre o que aparenta ser realmente é, ou seja, apesar de o juiz conceder a guarda a um dos genitores, pensando ser ele o melhor a exercer a guarda unilateral e propiciar o melhor desenvolvimento da criança, muitas vezes pode não ser e por essa razão, ressalta Figueiredo e Alexandridis (2011, p. 41-42):

Independente do tipo de guarda concedida – se unilateral ou compartilhada –, bem como qual os genitores a exerce, a decisão com relação a fixação da guarda não opera coisa julgada material, mas, apenas, formal, fato que possibilita  a sua alteração a qualquer tempo após a sua fixação, bem como do regime de visitas fixado.

Percebe-se então que nas situações em que há separação do casal, em que o genitor detentor da guarda unilateral do filho fica com mágoa do outro e utiliza o filho como uma arma para atingir o outro genitor, seja difamando-o e/ou tentando separá-lo do filho, é que começam a aparecer os primeiros sintomas da Alienação Parental.

Nesses casos, o melhor interesse do menor deve prevalecer, pois o filho está em desenvolvimento de sua personalidade, sendo esta determinante para o seu futuro convívio em sociedade, assim, em alguns casos é essencial à alteração da guarda unilateral, para se afastar maiores prejuízos tanto para o menor, quanto para o genitor alienado. 

4 Alienação parental

Ao se deparar com dissolução de uma família, ressaltamFigueiredo eAlexandridis (2011, p. 43) que “a relação afetiva entre pais e filhos deve ser preservada [...] tendo como principais alicerces os laços de afetividade, de respeito, de considerações mútuas”.

Porém, conforme pondera Dias (2009, p. 418):

Muita vezes, quando da ruptura da vida conjugal, um dos cônjuges não consegue elaborar adequadamente o luto da separação e o sentimento de rejeição, de traição, faz surgir um desejo de vingança: desencadeia um processo de destruição, de desmoralização, de descrédito do ex-parceiro. Nada mais do que uma “lavagem cerebral” feita pelo genitor alienador no filho, de modo a denegrir a imagem do outro genitor, narrando maliciosamente fatos que não ocorreram ou que não aconteceram conforme descrição dada pelo alienador.

Levando-se em consideração o exposto, não é difícil entender que nas separações conjugais, decorrem conflitos que colocam pais e mães em situações adversárias em razão também da guarda de filhos, o que para um ou para outro pode configurar a Alienação Parental e, que, conforme destaca o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul[2], reside no:

Processo para programar uma criança para que odeie o genitor, sem qualquer justificativa. Trata-se de verdadeira campanha de desmoralização. O filho é utilizado como instrumento da agressividade direcionado ao genitor. Assim, são geradas uma série de situações que leva o filho a rejeitar o pai. Este processo recebe também o nome de “implantação de falsas memórias”. A criança é levada a repetir o que lhe é dito de forma repetida. O distanciamento gera contradição de sentimentos e a destruição do vínculo entre ambos. Restando órfão do genitor alienado, acaba o filho identificando-se com o genitor patológico, passando a aceitar como verdadeiro tudo que lhe é informado.

Figueiredo eAlexandridis (2011, p. 43-44) compartilham da mesma ideia, ao afirmarem os efeitos de uma dissolução conjugal mal resolvida:

Muitas vezes, um dos genitores implanta na pessoa do filho falsas idéias e memórias com relação ao outro, gerando, assim, uma busca em afastá-lo do convívio social, como forma de puni-lo, de se vingar, ou mesmo com o intuito falso de supostamente proteger o filho menor como se o mal causado ao genitor fosse se repetir ao filho menor.

Os fatos acima narrados adéquam-se ao que os brasileiros chamam de “Alienação Parental”. Esta se deu origem a partir da “Síndrome da Alienação Parental”, expressão criada pelo psiquiatra e psicanalista Richard Gardner [3](2002), que assim a define:

[...] é um distúrbio da infância que aparece quase que exclusivamente no contexto de disputa de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. Resulta da combinação de instruções de um genitor (o que faz a “lavagem cerebral, programação, doutrinação”) e contribuições da própria criança para caluniar o genitor alvo. Quando o abuso e/ou a negligência parentais verdadeiros estão presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assim a explicação de Síndrome de Alienação Parental para a hostilidade da criança não é aplicável.

Compreende-se que a Síndrome de Alienação Parental (SAP) é a combinação de dois fatores, o primeiro são os atos negativos da “lavagem cerebral”, impostos por um dos genitores ao filho, programando-o no intuito de romper a relação do mesmo com o outro genitor, o segundo são os efeitos causados pela “lavagem cerebral”, em que surge do próprio filho a iniciativa para denegrir a imagem do genitor alienado.

A legislação pátria, Lei n. 12.318/2010, assim define alienação parental:

Art. 2° Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que detenham a criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento familiar ou à manutenção de vínculos com este.

Entende-se por Alienação Parental no ordenamento jurídico brasileiro como um termo concentrado na campanha de desmoralização de um dos genitores, através da influência de quem detenha a guarda e que causa danos no desenvolvimento da personalidade da criança ou adolescente.

Gonçalves (2011, p. 305) aponta que “A Lei n. 12.318, de 26 de agosto de 2010, visa coibir a denominada alienação parental”, assim, ressalta-se que a lei supracitada foi criada para repudiar qualquer obstáculo de desenvolvimento digno da criança.

 Enfim, considerando a Lei 12.318/10, quaisquer pessoas que prestarem-se à ação de colocar filhos contra pais, normalmente após dissolução conjugal, pode incorrer em punições, que vão desde a advertência, multas, ampliação do tempo de convívio da criança com o genitor atacado, indo até a perda da guarda do menor e até mesmo da autoridade parental.

5 Responsabilidade civil do alienador

O ordenamento jurídico é constituído por um complexo de normas que colocam parâmetros nas relações jurídicas entre indivíduos de uma sociedade, sendo que o objetivo final é estabelecer a paz social. Entretanto, se alguém violar a norma tem o dever de reparar o mal causado, na tentativa de restabelecer o status quo ante da relação ou diante da sua impossibilidade, deve o ofensor ser responsabilizado compensando ou indenizando a vítima, com o objetivo de atenuar os prejuízos suportados.

Cavalieri Filho (2010, p. 72) aponta a importância do dano para responsabilidade civil “O dano é sem dúvida, o grande vilão da responsabilidade civil. Não haveria que se falar em indenização, nem em ressarcimento, se não houvesse o dano. Pode haver responsabilidade sem culpa, mas não pode haver responsabilidade sem dano”.

O que fundamenta a responsabilidade civil é a reparação do dano, pois o dano causado é elemento preponderante para o litígio, enquanto que a sua reparação é o elemento necessário para colocar um fim no conflito.

Para Gonçalves (2008, p. 337) o dano pode recair sobre diversos bens, sendo que “o conceito clássico de dano é o de que constitui ele uma ‘diminuição do patrimônio’, alguns autores o definem como a diminuição ou subtração de um ‘bem jurídico’, para abranger não só o patrimônio, mas a honra, a saúde, a vida, suscetíveis de proteção”.          

Reitera-se que bem jurídico não é apenas aquele cujo valor pecuniário se possa expressar, ou seja, possível de se atribuir um valor econômico equivalente. Existem outros bens que apesar de não possuírem um valor agregado, também merecem tutela, pois seu valor é inestimável.

Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, tornou-se efetiva a reparação do dano moral, haja vista a previsão da matéria no corpo da mesma:

Art. 5º[...]

V – é assegurado o direito de resposta proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Nesse sentido, pontua Cavalieri Filho (2010, p. 82):

Logo no seu primeiro artigo, inciso III, a Constituição Federal consagrou a dignidade humana como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. Temos hoje o que pode ser chamado de direito subjetivo constitucional à dignidade. Ao assim fazer, a Constituição deu ao dano moral uma nova feição e maior dimensão, porque a dignidade da pessoa humana nada mais é do que a base de todos os valores morais, a essência de todos os direitos personalíssimos.

Portanto, o dano moral ganhou ênfase, no que diz respeito à sua proteção, pois se viu que os bens ligados à personalidade humana são fundamentais para uma vida digna.

Depois da Carta Magna de 1988, veio a reforma do CC/02, que consolidou de vez a responsabilidade civil por danos ainda que exclusivamente morais, conforme seu art. 186, mais adiante complementa o art. 927 do mesmo código “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.

Para que haja a configuração do dano moral, prevê a doutrina que deve recair sobre a vítima ato ofensivo ao seu direito à dignidade da pessoa humana. Ressalta que o sentimento de dor é mera conseqüência e não causa da violação do direito, isto significa que mesmo não havendo sentimento de dor, o simples fato de ter agredido os direitos à dignidade da pessoa humana caracterizará o dano moral. Cavalieri Filho (2010, p. 87) relata sua experiência:

Como julgador, há mais de 35 anos, tenho utilizado como critério aferidor do dano moral se, no caso concreto, houve alguma agressão à dignidade daquele que se diz ofendido (dano moral em sentido estrito e, por isso, o mais grave) ou, pelo menos, se houve alguma agressão mínima que seja, a um bem integrante da sua personalidade (nome, honra, imagem, reputação etc). Sem que isso tenha ocorrido, não haverá que se falar em dano moral, por mais triste e aborrecido que alega estar aquele que pleiteia a indenização.

A Lei 12.318/2010 ainda dispõe em seu art. 6º medidas a serem tomadas para coibir a alienação parental, sem qualquer prejuízo da responsabilidade civil.

Portanto, cabe destacar que tanto o pai quanto a mãe alienados sofrem danos morais, seja pela imagem denegrida ou pela restrição de se conviver com o filho, como ainda pela perda de afetividade do filho injustificadamente, isso é um mínimo de dignidade, por esta razão passível de responsabilização pelo genitor alienador.

Assevera Freitas[4](s.a):

Outrossim, no tocante a prática ativa e nefasta da alienação parental, a situação muda de contexto, tornando o dano moral indenizável na prática de conduta alienadora, afinal, aqui há uma prática ilícita, culpável, ativa, geradora de dano, constituindo os elementos mínimos e necessários para configuração da responsabilidade civil à luz dos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil.

Entretanto, o dano não se configura só pelo genitor alienado, mas pelo filho que também foi privado de conviver com o pai e que teve a sua integridade psíquica e moral atingidas, por falta de liberdade de pensamento e pelas influências de “falsas memórias” implantadas pelo genitor alienador, que formarão sua personalidade e identidade.

O Estatuto da criança e adolescente (ECA), Lei Federal n° 8.069, é enfático ao citar em seu art. 15alguns direitos da criança e adolescente “à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis”.

Ratifica Duarte [5]o dever do genitor alienador de indenizar pelos danos causados às vítimas, ainda que inexista lei específica que a regulamente, toma-se por base a lei genérica de responsabilidade civil, restando a iniciativa da população para que se possa efetivar o direito.

A decisão prolatada pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais [6]abre precedente para indenização por danos morais causados pela alienação parental do genitor alienador:

Indenização danos morais. Relação paterno-filial. Princípio da dignidade da pessoa humana. Princípio da afetividade. A dor sofrida pelo filho, em virtude do abandono paterno, que o privou do direito à convivência, ao amparo afetivo, moral e psíquico, deve ser indenizável, com fulcro no princípio da dignidade da pessoa humana. [...] a responsabilidade (pelo filho) não se pauta tão-somente no dever de alimentar, mas se insere no dever de possibilitar desenvolvimento humano dos filhos, baseado no princípio da dignidade da pessoa humana.

Enfim, entende-se que tanto na Alienação Parental, quanto na Síndrome decorrente desta, tanto a criança e/ou o adolescente, quanto o genitor alienado, devem ser reavidos de seus direitos e indenizados, pelo dano moral, pois, ambos sofrem conseqüências negativas, o primeiro pela implantação de “falsas memórias” para renegar o genitor alienado, causador de transtornos mentais, o segundo pela desmoralização da imagem da vítima decorrente da Alienação, ambos ferindo a dignidade da pessoa humana.

6 Conclusões

O presente trabalho, com base na legislação, na doutrina e nos estudos bibliográficos, buscou identificar a possibilidade de o alienador responder civilmente perante o estímulo da Alienação Parental.

Assim, o contexto apresentado possibilitou perceber que com a concepção atual sobre família, legitimando e fortalecendo a afetividade, o ordenamento jurídico brasileiro passou a defender a dignidade das pessoas que constituem a família, em especial a criança e o adolescente. Mas, para que esses mesmo direitos fossem garantidos, viu-se ainda que durante a dissolução conjugal, foi necessária a criação de um dispositivo que puni os possíveis danos gerados por conflitos que podem surgir com tal condição.

E como se não bastasse, existem casos em que esses conflitos podem ser agravados pelo que se denomina Alienação Parental, ou seja, uma campanha articulada por um dos genitores, normalmente o detentor da guarda do filho, no sentido de denegrir a imagem do outro e, consequentemente, induzido o filho, ao ódio do outro genitor, o que pode acarretar para criança sequelas gravíssimas em seu desenvolvimento comportamental e psíquico, que forma um processo patológico de Síndrome de Alienação Parental, inclusive na sua fase adulta.

Assim, a partir da análise feita sobre as ideias de doutrinadores, operadores do Direito, entre outros, pode-se concluir que as normas devem ser criadas para adaptar a realidade da sociedade, que sofre constantes mutações, a fim de preservar o direito e manter a paz social. Dessa forma, observou-se que o genitor alienador é passível de multa porquanto ocorrer a Alienação Parental, porém, nos casos de sinais da Síndrome da Alienação Parental, também é passível da responsabilização civil por dano moral em face do filho como do genitor alienado.

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Notas:

[2]Disponível em: <www.mariaberenice.com.br/uploads/70015224140.doc>. Acesso em: 12 de dezembro de 2011.

[3]Disponível em: <www.mediacao parental.org./richard_gardner.php>. Acesso em: 23 de outubro de 2011.

[4]Disponível em: <www.douglasfreitas.adv.br>. Acesso em: 19 de abril de 2012.

[5]Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=516>. Acesso em: 03 de março de 2012.