Arbitragem: aspectos gerais da Lei 9.307-96


Porwilliammoura- Postado em 12 junho 2012

Autores: 
SILVA, Gustavo Pamplona

1. Introdução

                   Alguns autores sustentam que a eficiência da tutela jurisdicional no Brasil é passível de questionamentos sobre o cumprimento de seu papel constitucional. Esculpiram inclusive algumas frases de efeito, tais como: “justiça tardia é justiça negada”, “justiça que tarda, falha”, etc.. Tal assertiva se comprova mediante o seguinte silogismo. O acesso ao Judiciário, preceituado na Constituição Federal, constitui um direito Individual e coletivo (ex., art. 5º, XXXIV, XXXV e XXXVII). Não é mero conceito formal, mas de efetiva tutela judicial. O não exercício efetivo e a eficiente tutela jurisdicional impõe ao cidadão o ônus da pretensão postergada ou inócua. Portanto, toda definição jurisdicional que não é eficaz avilta a cidadania e a dignidade da pessoa humana (art. 1º, II e III), não restando outra via senão constatar que a tutela jurisdicional ineficiente não observa os fundamentos do Estado Democrático de Direito, logo, não cumprindo o seu papel constitucional.

                   As principais críticas à tutela jurisdicional do Brasil são a ineficiência do Judiciário, o papel dos juizes e a ineficiência de suas decisões. No dizer do Ministro e processualista Sálvio de Figueiredo Teixeira, constitui-se preocupação e inquietação

"ante a ineficiência das decisões judiciais, ensejadas pelo arcaísmo das organizações judiciárias e pela inexistência de órgãos permanentes de planejamento e reflexão no universo estatal do judiciário" (Atualidades Nacionais, Repro 85, jan./mar. 1997).

                   Notadamente, a demora nas decisões traz um risco adicional às partes, que já convivem com as incertezas de terem suas questões decididas por juizes muitas vezes inexperientes e sobrecarregados de processos. O alto custo dos pleitos também é um dado importante que dificulta o acesso à Justiça. O excesso de formalismo e a sacramentalização do rito processual, manifesto de todos aqueles que participam do sistema e os procedimentos emperrados, descritos nos nossos códigos, fazem com que o processo perca seu objetivo, que é conhecer a verdade dos fatos e determinar, em função disto, os direitos que cada uma das partes em conflito possui, afastando qualquer medida protelatória. Esta discussão não é nova e já era tema de um brocardo latino: "summum jus summa in juria" - o excesso de formalismo processual leva à injustiça.

                   O acesso à Justiça eficiente é meio de promover o Estado Democrático de Direito. A materialização da Justiça é direito intrínseco ao cidadão que cabe ao Estado promover, inclusive para a manutenção do próprio Estado e da governança. Não se trata de um direito delegado pelo Estado, mas dever de promover a eficiente tutela jurisdicional e a pacificação social.

                   Miguel Reale Jr. afirma que

"no fundo, estamos cada vez mais inclinados a viver segundo o predomínio do social sobre o estatal, preferindo sempre que possível, resolver nossas questões por nós mesmos".[1]

                   Inúmeros autores defendem a mesma tese e ressaltam as vantagens do instituto arbitral. Francisco Cláudio de Almeida Santos, citando trecho José Carlos de Magalhães, em artigo publicado sob o título "Considerações Gerais sobre a Arbitragem e seu Reordenamento", escreveu que:

"Recorrer ao Poder Judiciário é provocar a ruptura nas relações entre as partes, enquanto a arbitragem representa uma harmonização dos interesses em jogo" (Atualidades Nacionais, Repro 85, jan./mar. 1997).

2. Contexto da Lei FEDERAL nº  9.307 DE 23 DE SETEMBRO DE 1996

                   A hegemonia do pensamento neo-liberal imperante nas relações sociais, redireciona o cenário jurídico para uma releitura da autonomia da vontade, segundo a qual o elemento volitivo é substrato para a consecução de acordos como possíveis soluções para conflitos surgidos de diferentes pretensões.

                   A autonomia da vontade e a satisfação efetiva do direito pleiteado são mais que Princípios Gerais de Direito, são verdadeiros elementos constitutivos da cidadania. A liberdade para contratar e a efetiva composição da lide extrapolam a esfera pessoal e tornam-se, neste início de século, pilares da Democracia brasileira. Não sendo atendida com presteza em suas necessidades, a população desacredita na Justiça, e passa-se a viver um ambiente de insegurança jurídica bastante nocivo à vida social.

                   fiuza (1995:13) afirma:

“A morosidade da Justiça entrava a própria vida democrática desse país, na medida em que nossas pretensões quedam sem o devido retorno. É essencial à democracia garantir não só os direitos individuais em si, mas, também, sua realização. Ora, quem garante a realização dos direitos individuais é, exatamente, o Judiciário.”

                   O jurista José Alfredo de Oliveira Baracho (1995:12) citando Ernesto Pedraz Penalva afirma que:

"(...) como o cidadão tem direito de participação política, deve intervir na aplicação da lei ao caso concreto. É daí que a administração da justiça é uma das mais significativas atividades do Estado."

                   Já pela ótica do empresariado, a morosidade da tutela jurisdicional, principalmente dos processos concernentes a conflitos sobre bens econômicos, resulta em prejuízos, posto que gera gastos improdutivos, desestimula possíveis investimentos de capitais, produzindo, enfim, perdas econômicas relevantes.

                   Ademais, os litígios que tramitam nos tribunais em muito extrapolam as questões meramente jurídicas e invadem outros ramos do conhecimento, que o magistrado sequer domina. Logo ficam as partes e o togado reféns dos peritos e seus laudos.

                   Novamente o filósofo e jurista REALE JR (1996) afirma que a crescente necessidade de conhecimento técnico, exigindo atualmente perícias altamente especializadas

"torna cada vez mais inseguros os julgamentos proferidos por juizes togados, por mais que estes, com a maior responsabilidade ética e cultural, procurem se inteirar dos valores técnicos em jogo".

                   A avanço tecnológico elevou o grau de complexidade dos contratos. Sigilo, confiabilidade e segurança nas decisões dos litígios são variáveis cruciais para os grandes contratos privados, que o Judiciário infelizmente não consegue responder.

                   Parafraseando Montesquieu, pode-se afirmar que a justiça negada a um único cidadão é uma ameaça a toda sociedade. Defendem menor formalismo nos ritos processuais e humanização das decisões, possibilitando o julgamento apenas por eqüidade, com base nas idiossincrasias das partes. Sendo assim, a arbitragem surge como alternativa à justiça estatal.

                   Conforme os autores, uma das vantagens oferecidas pela arbitragem em relação à Justiça comum seria, principalmente, a celeridade. A arbitragem é essencialmente mais rápida que o Judiciário, que se caracterizaria pela sua rigidez e formalismo.

                   Outro aspecto seria o custo reduzido, pois o seu dispêndio costuma ser menos oneroso que o do processo judicial, o que reflete na formação dos preços dos produtos e serviços ofertados pelas empresas.

                   Um diferencial importante é a confidencialidade. Para alguns setores produtivos o sigilo sobre seus negócios ou sobre seus produtos são essenciais para a sua lucratividade, logo, optam pela arbitragem, pois é o único instrumento processual que lhes conferem certeza absoluta sobre a confidencialidade do mérito debatido. Ao contrário do que ocorre com o Judiciário, o conteúdo da arbitragem fica circunscrito às partes e aos árbitros, que estão obrigados ao sigilo profissional. As provas, a natureza da controvérsia, seu valor e a decisão através do laudo arbitral não são divulgados, como ocorre com o procedimento e a decisão judiciários.

                   Há autores que advogam a tese que o instituto do “segredo de justiça” seria capaz de reproduzir a mesma efetividade do sigilo que existe na arbitragem. Contudo, o juízo arbitral garantia total sigilo, ou seja, somente e apenas as partes envolvidas possuem acesso aos outros. Segundo, o sigilo é inerente ao processo arbitral enquanto no judiciário é um pedido que pode ou não ser deferido. Terceiro, a instauração do litígio também é sigilosa, isto é, ninguém além das partes e dos árbitros saberão que há um conflito entre aquelas partes, o que não ocorre no judiciário.

                   Da mesma forma, a arbitragem também propiciaria a conciliação, pois a confidencialidade do procedimento cria uma atmosfera capaz de gerar uma ambiência de colaboração entre as partes, dentro da qual elas podem autocompor o conflito através da conciliação ou mediação, encerrando, assim, elas mesmas, o problema.

                   Outra vantagem primordial na arbitragem é a livre escolha dos árbitros. As partes poderão contratar especialistas na matéria controversa, ou seja, os árbitros podem ser técnicos na matéria controversa, diferentemente do que ocorre no Judiciário.

                   O professor Cézar Fiuza, citando Paulo Nader, lança ácidos comentários sobre o Judiciário, que merecem ser repetidos:

“Outro problema sério (do Judiciário) é a baixa qualidade da tutela jurisdicional. É princípio de segurança jurídica a boa organização do Estado, implicando isso um Judiciário de alto nível, com juizes competentes e bem pagos.[2] (parênteses nosso)

                   Ademais, há a garantia de tratamento equânime. Esta vantagem fica evidente nos casos de arbitragens internacionais, envolvendo partes de países diferentes. A garantia de tratamento igualitário entre as partes, sustentada pela arbitragem, afasta a natural incerteza quanto à isenção dos tribunais locais em litígios entre nacionais e estrangeiros domiciliados no exterior.

                   Outra vantagem inédita é a possibilidade de decisão por direito ou por eqüidade, a critério das partes. Os árbitros desenvolvem o mesmo raciocínio lógico dos juizes, porém, se o compromisso o autoriza, eles poderão não ficar adstritos à aplicação do direito positivo e poderão decidir por eqüidade. Além do mais, os litigantes poderão ainda escolher livremente as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem, respeitando-se sempre os bons costumes e a ordem pública. Logo, o diploma permite que as partes convencionem que a arbitragem se realize com base nos princípios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio. Destaca-se, portanto, a possibilidade de que os julgamentos se procedam alicerçados sobre as regras da lex mercatoria, o que enfatiza o princípio da autonomia privada.

                   Outro ponto de destaque da Lei nº 9.307/96 é o artigo 3º: “as partes interessadas podem submeter a solução dos seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral”. Constata-se que a Lei não faz mais distinção entre cláusula arbitral e compromisso, e tanto a primeira quanto a segunda são suficientes para constituir validamente o juízo arbitral. Não há mais, portanto, a imprescindibilidade do compromisso arbitral.

                   Na letra da Lei nº 9.307/96, o que se extrai da arbitragem não seria um simples laudo, mas verdadeira sentença, portanto, equivale a dizer, que não se exige mais a homologação do Judiciário como condição para a execução da decisão judicial, haja vista que a Lei equiparou as sentenças arbitrais às judiciárias. Não mais haveria o reexame pelo Judiciário e a possibilidade de se desfazer todo o feito. Todavia, reserva-se debater este tema em capítulo próprio.

                   Finalmente, a confiança, elemento importantíssimo para os negócios de grande monta e de risco. O juiz tradicional não é escolhido pelas partes, enquanto que os árbitros o são. Razão pela qual a arbitragem se baseia na confiança das partes, na possibilidade delas terem o conflito resolvido por alguém que elas mesmas escolheram.

                   Corroborando esta tese, há a necessidade da quebra de paradigmas e da modernização das normas, de sorte a arbitragem permite ao cidadão o exercício de escolha de a quem confiar a solução de litígios. Constitui na mais humana das expressões da individualidade dentro do mundo jurídico, não podendo ser obstada.

                   Dentro deste contexto, iniciou-se um processo de formulação de um novo diploma legal que estivesse afinado com as demandas internas e externas, ao mesmo tempo munido de instrumentos que garantissem a sua eficiência de modo a solucionar os litígios fora da jurisdição do Estado, com maior agilidade, especialização e menor formalismo.

                   Após várias discussões, principalmente com o setor empresarial brasileiro, foi promulgada a Lei nº 9.307 em 23 de setembro de 1996 que dispôs sobre a arbitragem no Brasil. Os juristas que trabalharam em seu texto tinham como escopo a elaboração de um documento claro e objetivo, que disciplinasse o funcionamento da arbitragem sem infringir os postulados constitucionais que asseguram amplo direito de defesa, igualdade entre as partes, isenção e idoneidade dos árbitros e, quando necessária, a intervenção do Poder Judiciário.

                   Segundo os teóricos, a nova lei de arbitragem inauguraria uma forma eficaz e ágil para resolver controvérsias que envolvam direitos patrimoniais disponíveis no Brasil. Todavia, alguns aspectos deste novo instituto ainda suscitam controvérsias. O estudo da Lei é importante na medida em que possibilita a correção de eventuais falhas e lacunas em seu texto, permitindo o aperfeiçoamento desse instituto de tanta tradição internacional e de tão escasso aproveitamento nacional. O presente trabalho procura elucidar alguns deles, conforme estipulado no capítulo a seguir.

3. DO ESCOPO DA PESQUISA

                   Uma vez discorrido propedeuticamente sobre a arbitragem, parte-se para a proposta de trabalho desta pesquisa.

                   Para tanto, inicia-se conceituando arbitragem, objetivos e principal característica com a finalidade de familiarizar o leitor com o tema. Logo após, discorre-se sobre as noções históricas da arbitragem no Brasil e acesso à justiça “alternativa”. Em seguida, debate-se sobre a natureza jurídica da arbitragem abordando temas como: jurisdição, competência, as finalidades da jurisdição, o monopólio da jurisdição pelo Estado, concluindo com a concepção da natureza da arbitragem em sede da Lei nº 9.307/96.

                   O tema central da pesquisa, a constitucionalidade do instituto arbitral nos dizeres da Lei nº 9.307/96 analisa se a Lei em pauta subtraiu o monopólio do controle do Poder Judiciário. Discute-se se é admissível o exercício da função jurisdicional por órgão ao qual não tenha sido delegado constitucionalmente tal atribuição. Tais temas são preparatórios para finalmente abordar-se a constitucionalidade da Lei nº 9.307 e a suposta violação ao art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, ao criar sistema arbitral que subtrai a possibilidade de apreciação do Poder Judiciário lesão a direito. Em outras palavras, debate-se a constitucionalidade da proibição do reexame de mérito das sentenças arbitrais, ou seja, a vedação ao duplo grau de jurisdição, logo da insuscetibilidade de recurso ou revisão de mérito.

                   O escopo do trabalho é indagar sobre os limites da jurisdição privada e o entendimento da doutrina e da jurisprudência sobre a arbitragem exclusivamente no âmbito interno brasileiro. Absolutamente, discutir-se-á a arbitragem internacional ou mesmo no Mercosul.

                   Portanto, estarão afastadas as análises mais aprofundadas acerca do processo arbitral, das vantagens da arbitragem sobre o processo judicial, da cláusula compromissória, do compromisso arbitral, sobre o papel do árbitro, sobre a participação do advogado, ou até mesmo diferenciar mediação de conciliação e de arbitragem e outros. Tal razão se funda no argumento que tais temas já foram expostos à exaustão pela mais renomada doutrina. Sendo que, de outro lado, os temas que são objetos desta pesquisa ainda não foram trabalhados pela doutrina com o enfoque que se pretende neste ensaio.

4. ARBITRAGEM: CONCEITO, OBJETIVOS E PRINCIPAL CARACTERÍSTICA

                   Mister se faz explicar minimamente neste ensaio, o conceito, os objetivos e a principal característica do instituto da arbitragem no Brasil, em suas linhas gerais, não se pretendendo esgotar o tema.

               Opta-se pela investigação do conceito de arbitragem na doutrina – em nada impedindo a criação de novo conceito forjado ao objetivo do trabalho – delimitar o objeto e destacar a principal característica que estabelece íntima relação com a tese defendida neste ensaio.

               A arbitragem deve ser compreendida, segundo a doutrina do francês Jean Robert (1993:3), como:

“(...) instituição de justiça privada, graças à qual os litígios são subtraídos das jurisdições de direito comum, para serem resolvidos por indivíduos investidos, pela circunstância, da missão de julgar, ou seja, as partes devem confiar aos árbitros, livre ou institucionalmente designados, a missão de solucionar seus litígios fora da esfera estatal.”

Segundo o professor Cézar Fiúza (1995:43), tem-se que:

“Arbitragem, enquanto equivalente jurisdicional, constitui espécie autônoma, ocorrendo sempre que duas ou mais pessoas submetem suas disputas ao arbítrio de terceiro, não integrante dos quadros do Poder Judiciário.”

                   Em ambos conceitos, tanto do doutrinador francês Jean Robert quanto do professor Cézar Fiuza, depreende-se que a arbitragem seria espécie autônoma da tutela jurisdicional do Estado, onde as partes delegariam a um terceiro a decisão do litígio. Data vênia, não se discutirá neste momento se a arbitragem é equivalente jurisdicional ou não, abordar-se-á este tema em capítulo específico. Entretanto, é interessante ressaltar que a grande maioria dos doutrinadores entendem a arbitragem como uma forma de tutela jurisdicional privada, ou seja, uma jurisdição paralela à do Estado. Ao nosso ver tal entendimento está equivocado. A arbitragem no termos da Lei nº 9.307/96 não institui no ordenamento jurídico brasileiro a jurisdição privada, seria outra a sua natureza jurídica. Com a entrada em vigor da Lei nº 9.307/96, criou-se uma forma de arbitragem ainda não conhecida alhures ou algures.

                   Em suma, a arbitragem para o autor seria uma tutela jurisdicional autônoma, exercida por partes capazes submissas à decisão de um terceiro que não estaria investido nas funções de juiz estatal.

                   Já na concepção de José Eduardo Carreira Alvim[3]:

“A arbitragem é a instituição pela qual as pessoas capazes de contratar confiam a árbitros, por elas indicados ou não, o julgamento de seus litígios relativos a direitos transigíveis. Esta definição põe em relevo que a arbitragem é uma especial modalidade de resolução de conflitos; pode ser convencionada por pessoas capazes, físicas ou jurídicas; os árbitros são juízes indicados pelas partes, ou consentidos por elas por indicação de terceiros, ou nomeados pelo juiz, se houver ação de instituição judicial de arbitragem; na arbitragem existe o “julgamento” de um litígio por “sentença” com força de coisa julgada.”

                   CARMONA (1993:19) define a arbitragem, em sentido amplo, como: “uma técnica para solução de controvérsias através da intervenção de uma ou mais pessoas.”

                   Enquanto KROETZ (1997:16) citando Antoine Kassis afirma que:

“A arbitragem em sentido amplo caracteriza-se todas as vezes que um conflito de interesses for solucionado através da decisão de um terceiro que não esteja investido das funções de Magistrado.”

                   Novamente, pede-se licença ao autor para analisar o seu conceito. A concepção citada trabalha a arbitragem lato sensu, logo, não deixando clara a diferença entre conciliação, mediação[4] e arbitragem propriamente dita (arbitragem stricto sensu). O conceito de arbitragem do autor é muito amplo, pois "conflito de interesse solucionado através da decisão de terceiro" engloba tanto a arbitragem quanto a mediação e principalmente a conciliação. Na arbitragem há a decisão de terceiro com poder vinculante, ou seja, título executivo, enquanto naquelas há a sugestão de solução sem poder de imposição. É um conceito amplo que pouco informa sobre o instituto estabelecido nos termos da Lei nº 9.307/96.

                   E finalmente, a

“definição sumária e tradicional de arbitragem, como a instituição pela qual as partes confiam a terceiro, livremente designado por elas, a missão de solucionar suas controvérsias, (...)”.[5]

                   O mesmo questionamento pode ser feito sobre este conceito. Não se podendo destinguir entre mediação, conciliação e arbitragem.

                   Em síntese, conforme a doutrina dominante, arbitragem seria jurisdição privada autônoma, instituída por convenção entre pessoas capazes sobre direitos disponíveis, a terceiro designado por elas com a missão de elidir o conflito através de uma sentença arbitral irrecorrível.

                   Sob o pálio da Lei nº 9.307/96, somente se podem submeter ao juízo arbitral conflitos que versem sobre direitos patrimoniais disponíveis, como, por exemplo, questões comerciais e industriais de modo geral, questões condominiais e imobiliárias, questões pecuárias e agrárias, questões de trânsito de veículos automotores, questões do consumidor, questões de transporte, dentre outras. Isso se faz, na prática,

"mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral" (art.3, Lei nº 9.307/96).

"A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato" (art. 4, caput, Lei nº 9.307/96).

"O compromisso arbitral é a convenção através da qual as partes submetem um litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou extrajudicial"(art. 9, caput, Lei nº 9.307/96).

                   Jurisprudências sobre a cláusula compromissória, sob o pálio da nova Lei nº 9.307/96 de Tribunais Superiores, são ainda escassas. O tema é recente sendo que o Brasil não possui tradição de arbitragem interna, tal como Inglaterra e Estados Unidos, encontrando-se parcos entendimentos dos tribunais pátrios. Destaca-se o entendimento jurisprudencial da Terceira Câmara Civil do Tribunal de Alçada de Minas Gerais, no processo nº 0254852-9, julgado por unanimidade em 03/06/1998.

Ementa Técnica: ARBITRAGEM - COMPROMISSO ARBITRAL - EXTINCAO DO PROCESSO IMPOSSIBILIDADE JURIDICA - ART. 1211 DO CPC - A TEOR DOS ARTS. 4 E 9, DA LEI N.º 9.307/96, C/C OS ARTS. 267, VII E 301, IX DO CPC, A SIMPLES EXISTENCIA DE QUALQUER DAS FORMAS DE CONVENCAO DE ARBITRAGEM ESTABELECIDA PELA LEI Nº 9.307/96, CLAUSULA COMPROMISSORIA OU COMPROMISSO ARBITRAL, CONDUZ, DESDE QUE ALEGADA PELA PARTE CONTRÁRIA, A EXTINCAO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, VISTO QUE NENHUM DOS CONTRATANTES, SEM A CONCORDÂNCIA DO OUTRO, PODERÁ ARREPENDER-SE DE OPÇÃO ANTERIOR, VOLUNTÁRIA E LIVREMENTE ESTABELECIDA NO SENTIDO DE QUE EVENTUAIS CONFLITOS SEJAM DIRIMIDOS ATRAVES DO JUÍZO ARBITRAL. - EM TEMA DE JUÍZO ARBITRAL, MATÉRIA ESTRITAMENTE PROCESSUAL, E IRRELEVANTE QUE A ARBITRAGEM TENHA SIDO CONVENCIONADA ANTES DA VIGENCIA DA LEI N.º 9.307/96, VISTO QUE, COMO SE DEPREENDE DO ART. 1211 DO CPC, A LEI TEM INCIDENCIA IMEDIATA, SENDO, DESTARTE, INTEIRAMENTE APLICÁVEL A EXECUÇÃO APRESENTADA EM JUÍZO NA VIGÊNCIA DA LEI NOVA.”

                   No mesmo sentido, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal julgou por unanimidade no agravo de instrumento nº 19990020016095AGI DF, registro do acórdão nº 121025 de 25/10/1999, da 1ª turma cível, cuja relatora foi a desembargadora Vera Andrighi.

Ementa técnica: JUÍZO ARBITRAL - CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA - HAVENDO CONVENÇÃO DAS PARTES PARA SOLUÇÃO DOS EVENTUAIS CONFLITOS ATRAVÉS DE ARBITRAGEM, E EM SENDO AS MESMAS CAPAZES E O DIREITO DISPONÍVEL, EXCLUI-SE A PARTICIPAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO NA SOLUÇÃO DE QUALQUER CONTROVÉRSIA. RECURSO PROVIDO.

                   Constata-se com total clareza que uma vez convencionada pelas partes a via arbitral, conforme as exigências formais, automaticamente afasta-se o envio da lide ao Judiciário.

                   Louvável é o entendimento dos Tribunais, pois se mesmo convencionada a arbitragem pelas partes, estas pudessem optar pela via Judiciário para compor o litígio, não haveria nenhuma valia a convenção de arbitragem.

                   Afora as conhecidas vantagens já enumeradas tais como celeridade, sigilo e tantas outras honrosas especificidades, destaca-se como a principal característica da nova lei a importância que ela confere à vontade das partes. A vontade das partes é soberana, desde a decisão de submeter o litígio ao juízo arbitral – seja na cláusula arbitral, seja no compromisso arbitral - como na eleição do árbitro – escolhido livremente por elas -, e mesmo na determinação do critério a ser utilizado pelo árbitro na decisão do conflito.

                   Constitui a nova lei, um ressurgimento da teoria da autonomia da vontade, segundo a qual o elemento volitivo é determinante da formação de acordos e da previsão de seus efeitos. A revitalização da arbitragem nessa nova lei vem a exemplificar, ao lado do fortalecimento dos contratos, o ressurgimento do império da vontade no âmbito da justiça, reflexo das idéias liberais que embasam a atuação política do Estado. Platão já afirmava que o tribunal escolhido e criado de comum acordo pelas próprias partes é o mais legítimo dos tribunais. Se conjugar esta idéia com a lição de Hugo de Brito Machado (mimeo), que a arbitragem "é para os que sabem e podem ser livres", tem-se que a consolidação do instituto arbitral demonstra a evolução e amadurecimento dos agentes econômicos.

                   Vem, portanto, a arbitragem, a reconhecer a oficialização das idéias liberais, mostrar sua face jurídica. Parece ser supostamente a arbitragem, nesse contexto, a "privatização da justiça", entretanto, debater-se-á este tema em capítulo específico.

5. HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO ARBITRAL BRASILEIRA

                   A arbitragem, apesar de moderna, não é uma criação do Direito contemporâneo. Segundo Sálvio de Figueiredo Teixeira (1997), na Roma Antiga a arbitragem antecedeu à própria solução estatal jurisdicional.

                   A Constituição portuguesa, atualizada de acordo com a Lei Constitucional 1/97, de 20 de setembro, autoriza a instituição de tribunais arbitrais, cometendo à Lei a disciplina sobre os casos e as formas em que estes tribunais se podem constituir. A arbitragem voluntária é regida pela Lei 31/86 e a institucional pelo Decreto-Lei 425/86. Sobre a arbitragem no direito comparado, consulte-se a obra do magistrado, de Goiás, Vítor Barboza Lenza, Cortes Arbitrais, AB Editora, 1997, e, no direito espanhol, Legislación Arbitral, edición a cargo de José G. Llobregat, Editorial Colex, 1998, Madrid.

                   Além do Tratado de Tordesilhas e com base no direito romano, Portugal e Espanha fizeram também suas primeiras Ordenações do Reino, conhecidas como Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas, que acabaram influenciando a sistematização das leis brasileiras. Mesmo após a independência, as Ordenações continuaram vigorando no Brasil por algum tempo.

                   Iniciou-se a legislar a respeito da arbitragem no Brasil a partir de 1850 com o regulamento 737, que do art. 411 até 475 relacionava diversos temas que deveriam ser submetidos a iniciativa privada para a tomada de decisões arbitrais, inclusive, tornando-os obrigatórios em determinados assuntos comerciais.

                   Quase simultaneamente ao regulamento 737 entrou em vigor no país o Código Comercial Brasileiro através da Lei 556 de 25 de junho de 1850 que estabeleceu a justiça arbitral obrigatória para questões resultantes de contrato de locação mercantil. Dizia o artigo 245, já revogado: “Todas as questões que resultarem de contrato de locação mercantil serão decididas em juízo arbitral”.

                   Em 13 de setembro de 1866 a Lei 1.350 revogou o juízo arbitral compulsório e vários artigos do Código Comercial tiveram sua vigência suspensa. Poucos meses depois, em 26 de junho de 1867, sempre por influência das relações de comércio marítimo, tornava a falar-se de justiça arbitral no Brasil através do decreto 3.900 que surgiu para regulamentar e disciplinar a Lei que havia extinto o juízo arbitral obrigatório.

                   O antigo Código de Processo Civil previa a arbitragem nos arts. 1.031 à 1.046. Com a entrada em vigor do Código atual, a matéria continuou sendo disciplinada entre os arts. 1.072 e 1.102.

                   A arbitragem voluntária manteve-se no Código Civil, em seus artigos 1.037 a 1.048. O compromisso era o instrumento básico do juízo arbitral, não se fazendo qualquer menção à cláusula arbitral ou cláusula compromissória. O Código Civil fixava, portanto, os requisitos essenciais do compromisso arbitral, cuja inobservância poderia acarretar a nulidade do juízo arbitral. As previsões do juízo arbitral estão nos arts. 1.037 à 1.048.

                   O Código Civil enquanto afirmava que o compromisso arbitral se apresentava indispensável à instituição do juízo arbitral, o mesmo, porém, não se dava com a “cláusula arbitral” ou “compromissória”, que constituía simples promessa de contratar (“pactum de contrahendo”, obrigação de fazer), a não ensejar execução específica mas condenação em perdas e danos em casos de inobservância do pactuado.

                   Os Códigos de Processo Civil, de 1939 e 1973, estabeleciam a arbitragem como uma faculdade de “juízo arbitral” onde os pactuantes, mediante compromisso, podiam submeter seu conflito ao arbitramento. Os árbitros apreciavam questões de fato e de direito, sendo que poderiam fundamentar suas decisões “secundum ius” ou “segundum equitatem”. Entretanto, diferentemente do sistema atual, a decisão deveria ser homologada judicialmente, donde se extraia a eficácia executiva. Tornando, portanto, o procedimento por demais vulnerável a delongas e a riscos de invalidação. O instituto apesar de vigorar, sob o pálio dos diplomas citados, não possuía a eficácia desejada para a sua perfeita implantação nas transações privadas.

                   Enfim, o assunto não é novo para o país. Há presenças contundentes de antecedentes da arbitragem no ordenamento jurídico brasileiro.

                   A diferença é que agora, com a Lei nº 9.307/96, os dispositivos anteriores foram revogados e o tema é tratado de uma forma que viabiliza sua aplicação.

                   No plano internacional, o Brasil é um dos signatários do “Protocolo de Genebra” de 1923 e, igualmente, aderiu à “Convenção Interamericana sobre arbitragem comercial internacional” (Panamá – 1975).

                   Com a recentíssima Lei nº 9.307, de 23.09.96, altera-se profundamente a história do instituto da arbitragem no Brasil. O Brasil resgata o instituto da arbitragem indo ao encontro das mais modernas legislações do mundo, e dos princípios preconizados nas convenções internacionais.

6. ARBITRAGEM: JURISDIÇÃO PRIVADA?

                   A análise científica da natureza jurídica tem sua importância na medida em que elucida a essência e os atributos do instituto estudado evitando alegações equivocadas. A investigação científica da natureza jurídica se faz mediante a comparação com institutos jurídicos conhecidos, inserindo-se as indagações a seu respeito dentro dos quadros da dogmática jurídica. Além da análise conceitual, a determinação da natureza jurídica de um instituto deverá fazer-se principalmente sob a ótica de seus efeitos.

                   No caso do juízo arbitral não poderia ser diferente. Mais que uma discussão ontológica, o debate sobre a natureza jurídica da arbitragem é um questionamento epistemológico, cuja análise se baseia na própria divisão de poderes do Estado e à tutela jurisdicional por seus órgão, o Judiciário. A classificação jurídica que se pretende alcançar com tal estudo nos apontará o regime jurídico positivo a ser aplicado ao instituto arbitral. Reside aqui, portanto, a grande relevância prática de sua definição.

                   A grande maioria dos doutrinadores entendem a arbitragem como uma forma de tutela jurisdicional privada, ou seja, uma jurisdição paralela ao Estado realizada por particulares. Dentre estes teóricos destaca-se o doutrinador francês JEAN ROBERT (1993:3) que define a arbitragem como “instituição de justiça privada”. Por sua vez, o professor CÉZAR FIUZA (1995:43) entende a arbitragem “enquanto equivalente jurisdicional”. Todavia, em sede da Lei nº 9.307/96, não se pode concordar com a assertiva de que a arbitragem é justiça privada, como definir-se-á a seguir.

                   Na busca de tal desiderato, inicialmente, tratar-se-á um sucinto apanhado histórico da evolução do Estado, da função jurisdicional e do órgão que a expressa. Analisar-se-á o tratamento constitucional da matéria, onde apontar-se-á os pressupostos inafastáveis da tutela jurisdicional. Após, dentro do contexto de dissidência citado, indicar-se-á o nosso posicionamento, procurando contribuir para a definição da natureza jurídica da arbitragem brasileira no contexto da Lei nº 9.307/96.

6.1. A evolução histórica do Estado – Aspectos gerais

                   A separação de poderes foi tema de reflexão de vários expoentes do pensamento filosófico clássico e contemporâneo. Platão, ao elaborar seu modelo de Pólis perfeita, esboçou a divisão de funções para o “bom governo”. Porém, somente em Aristóteles, a tripartição das funções do “Estado” adquire sua maior compreensão. A teoria aristotélica define as três funções orgânicas do "Estado", como corpos: "dos deliberativos", "dos magistrados" e "dos juízes".

                   Após os clássicos, a grande sistematização da teoria da separação de poderes e sua consolidação, foi elaborada por Montesquieu. Com total lucidez o filósofo defende que, se em uma única pessoa política se reunissem os três poderes (funções) do Estado, por via de conseqüência a liberdade estaria ameaçada em face da concentração de poder. Assim escreveu Montesquieu, em O Espírito das Leis: “Para que não se possa abusar do poder é necessário que, pela disposição das coisas, o poder freie o poder”. Portanto, deveria haver a separação de poderes do Estado para não existir usurpação e domínio exclusivo de um dos “poderes-funções” do Estado sobre os outros. Historicamente, constata-se que a doutrina da separação de poderes influenciou profundamente o Estado Constitucional.

6.2. Função jurisdicional, função judiciária, o Poder Judiciário e a Constituição da República Federativa do Brasil (1988)

                   Neste sentido, a Constituição Brasileira  não se esquivou desta evolução histórica. A tripartição de Poder do Estado está consagrada na Constituição brasileira, em seu artigo 2º: "São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário". A separação de poderes é um Princípio Fundamental da ordem constitucional brasileira e, portanto, do Estado brasileiro.

                   Propedeuticamente, poder-se-ia estabelecer como marco teórico a definição de jurisdição, para fins desse estudo como sendo, dizer o direito no caso concreto com caráter de definitividade sob o pálio do monopólio legítimo da força do Estado. Analisar-se-á em seguida este definição em face a outro autores que se seguem.

                   As funções do poder são as formas diversas pelas quais se exterioriza a atividade de império do Estado. É fato que o exercício do poder se faz através de órgãos. Os órgãos constitucionalmente instituídos são entes estatais dotados de capacidade de operacionalizar as funções formais do Estado expressas precipuamente na Constituição. Logo, os órgãos são a primeira manifestação dinâmica da Constituição.

                   A Constituição brasileira estabelece exclusivamente os “três grupos distintos de Poder” em seu artigo 2º para assim posteriormente derivar, a partir deles, suas respectivas funções, por exemplo, o Poder Judiciário (Poder), instituído pelo artigo 2º, é exercido pelo Supremo Tribunal Federal e outros[6] (órgãos do Poder Judiciário[7]), discriminados taxativamente pelo artigo 92 pela Constituição. Em suma, a Constituição  primeiro define o “poder-força” (art. 2º) para depois estabelecer quais os órgãos que irão materializar estas funções.

                   Nesta linha de pensamento acrescenta-se o pensamento do professor Aroldo Plínio Gonçalves (1994:94):

“No Brasil ele (o Judiciário) é um Poder porque retira sua autoridade diretamente da fonte genuína de todo Poder, que é a nação, o povo organizado em uma unidade, politicamente representada pelo Estado. A autoridade dele não é derivada de outro poder instituído, não é delegada ou consentida por outro poder organizado dentro do Estado. O Poder Judiciário exerce a função jurisdicional porque a soberania popular, expressa na Constituição, o instituiu diretamente, e não por via oblíqua, para exercê-la.”

                   O Judiciário é o órgão do Poder Estatal, que pelo poder emanado pelo povo, via Constituição, deteria legitimamente a função jurisdicional[8]. Portanto, ao Judiciário, como uma das manifestações de Poder do Estado, cabe a função de julgar, ou seja, aplicar e interpretar o direito ao caso concreto. Novamente as sábias palavras do professor Aroldo Plínio Gonçalves[9], in verbis:

“O poder de dizer o direito, aplicando a norma genérica e abstrata ao caso concreto, é um poder do Estado.(...)

Por pertencer ao Estado, a função jurisdicional tem sido contraposta à função judiciária. Aquela poderia ser atribuída a outros órgãos que não ao Judiciário. Esta perderia a substância, porque o Judiciário não se institui para desempenho de uma função judiciária, mas para o exercício da jurisdição. O Judiciário é, efetivamente, órgão que se institui especificamente para o exercício da função jurisdicional do Estado.” (grifo nosso)

                   Mister se faz, portanto, entender o conceito de “jurisdição”. LIEBMAN (1998:10), citado por Humberto Theodoro Júnior, define

“a jurisdição, como o poder que toca ao Estado, entre as suas atividades soberanas, de formular e fazer atuar praticamente a regra jurídica concreta que, por força do direito vigente, disciplina determinada situação jurídica.”[10]

                   Segundo os ensinamentos do professor José Alfredo Baracho[11] tem-se que a garantia jurisdicional efetiva-se por meio de: a) função jurisdicional do Estado, b) que é exercida por órgãos judicantes, c) compostos de magistrados. A jurisdição se diferencia das outras atividades estatais pela aplicação do direito ao fato concreto, com caráter de definitividade, ou seja, formando coisa julgada.

                   E continua o jurista:

"É um poder (o judiciário) cuja origem e determinação, apensar de estar assentado na lei, encontram seu amparo maior na Constituição. A Constituição, como norma maior, delimita, genericamente, a sua atuação, ao mesmo tempo em que proclama a sua competência essencial: aplicar a lei nos julgamentos e executar o que foi julgado, de conformidade com as normas processuais. Essa estabilidade, obriga o Estado a colocar à disposição de todos órgãos específicos e direitos a que todos devem submeter-se."[12]

                   Em suma, a jurisdição é forma de exercício da soberania estatal. A partir da deslegitimação da defesa privada, como forma de se obter a paz social, o Estado se instituiu como o único poder capaz de dirimir os litígios não só pelo monopólio legítimo da força como também por presumir-se que estaria assegurando a ordem jurídica estabelecida e a paz social.

                   A jurisdição somente não seria função exclusiva do Poder Judiciário nos casos em que a Constituição prevê, como o julgamento do crime de responsabilidade pelo Senado Federal. Ademais, é incontrovertível que os órgãos competentes para o cumprimento das três funções do Estado não as exercem de forma unívoca.

                   Como o escopo de fortalecer a tese defendida agregam-se os ensinamentos do jurista lusitano CANOTILHO (1997:577), ex verbis:

"A jurisdição (jurisdictio, jus dicere) pode ser qualificada como a actividade exercida por juízes e destinada à revelação, extrinsecação e aplicação do direito num caso concreto. Esta actividade não pode caracterizar-se tendo em conta apenas critérios materiais ou substantivos. Está organizatoriamente associada ao poder jurisdicional, e é subjectivo-organicamente atribuída a titulares dotados de determinadas características (juízes). Está ainda jurídico-objetivamente regulada quanto ao modo de exercício por regras e princípios processuais (processo)".

                   A jurisdição é a atividade de aplicação do direito ao caso concreto, associada organizativamente ao poder jurisdicional constitucionalmente criado que estaria exclusivamente e excludentemente atribuída ao Estado.

                   Nesta esteira de raciocínio, continua nos ensinando CANOTILHO:

"Desta imbricação entre direito de acesso aos tribunais e direitos fundamentais resultam dimensões inelimináveis do núcleo essencial da garantia institucional da via judiciária. A garantia institucional conexiona-se com o dever de uma garantia jurisdicional de justiça a cargo do Estado. Este deve resultar não apenas do texto da constituição, mas também de um princípio geral (`de direito´, das `nações civilizadas`) que impõe um dever de proteção através dos tribunais como um corolário lógico: 1) do monopólio de coacção física legítima por parte do Estado; 2) do dever de manutenção da paz jurídica num determinado território; 3) da proibição de autodefesa a não ser em circunstâncias excepcionais definidas na Constituição e na lei". (1997:452)

                   A jurisdição é uma das manifestações da soberania, portanto, do monopólio do Estado por excelência em dirimir o litígio no caso em concreto. Sobre o monopólio estatal da jurisdição, encontra-se a lição histórica de Ada P. Grinover, Antonio C. Cintra e Cândido Dinamarco (1997):

“Mesmo na ultrapassada filosofia política do Estado Liberal, extremamente restritiva quanto às funções do Estado, a jurisdição esteve sempre incluída como uma responsabilidade estatal.”

                   O mesmo entendimento depreende-se dos fragmentos jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal – STF – no Agravo Regimental na sentença estrangeira nº 5.206-7 Reino da Espanha, o Ministro Nélson Jobim, entendeu que:

"a Constituição proíbe que a lei exclua da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (art. 5o, XXXV). Ela não proíbe que as partes pactuem formas extrajudiciais de solução de seus conflitos, atuais ou futuros". (grifo)

                   No mesmo sentido se pronunciou, no caso em tela, o Ministro Ilmar Galvão:

"Não se cuida, entretanto, de ato [refere-se ao pacto comissório] por meio do qual alguém declara haver renunciado, de forma absoluta, a todo e qualquer direito de ação, a partir de determinado momento, o que seria inadmissível, mas de simples cláusula contratual em que as partes vinculadas a determinada avença, (...)" (grifo)

                   Destaca-se nos julgados supra que ambos ministros do STF entendem que a arbitragem possui um caráter não-jurisdicional, ipsis literis, “formas extrajudiciais” e “simples cláusula contratual”.

                   O princípio da separação dos poderes, dogma adotado pela Constituição Federal, seria negado pela presença de dois órgãos jurisdicionais. A obrigatória observância da gênese do Poder e seu império vinculante, tende a garantir dois valores absolutamente importantes para o sistema jurídico nacional: a segurança jurídica e a democracia.

                   O cidadão precisa saber de modo claro e absoluto que os seus atos e negócios jurídicos serão ou não julgados de acordo com a ordem constitucional posta. Em caso de litígio fica, portanto, submetido ao livre arbítrio do juiz vinculado à lei, visto que, não haveria o risco de se estabelecer uma forma não legítima de jurisdição paraestatal. A questão da legitimação também deve ser observada. O Poder Judiciário é o único órgão legitimado pela sociedade para, em regra, aplicar o direito ao caso concreto com definitividade. Tal legitimação é o principal fundamento da democracia representativa adotada como pilar do Estado, onde todo poder emana do povo e em seu nome será exercido. A CONSTITUIÇÃO estabeleceu, como cláusulas pétreas, a separação dos poderes e determinou que o Poder Judiciário seria exercido por um número fixo de órgãos.

                   A Constituição deixa claro que os juízes estão vinculados à lei produzida segundo os processos estabelecidos e vigentes, caso contrário, estariam violando a legitimação popular outorgada aos mandatários do povo, representantes no Congresso Nacional, e o princípio constitucional da separação dos poderes.

                   Os dispositivos constitucionais de definição das alçadas de cada Poder podem ser denominados como normas de competência. As normas de competência não denotam, por vezes, no seu próprio enunciado sintático, a conseqüência gerada pela sua violação, mas tal resultado pode ser extraído do ordenamento jurídico como sistema, qual seja, a invalidade dos atos irregularmente produzidos. Utilizando-se um conceito mais amplo do vocábulo "competência", estendendo-o ao estágio dos Poderes Constituídos, o ato produzido com esse vício seria considerado inexistente. Assim, mesmo quando é utilizada a classificação triangular kelseniana, o constituinte conferindo competência, não pode esquecer o elemento coativo do Direito, que se materializa, em última análise através da força física. Esta, por sua vez, é monopólio legítimo exclusivo do Estado.

                   Destarte, não é a simples equiparação dada pela Lei nº 9.307, que fará com que o árbitro seja entendido como um juiz, pois ela não possui a mesma fonte de validade, que é a Constituição.

“Art. 18. O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário.”

                   Observa-se que possivelmente a vontade do legislador é equiparar o árbitro ao juiz. Todavia, adota a via errada. O árbitro, numa leitura pragmática, é um verdadeiro “juiz de fato”, pois conduz o processo, aufere provas e define o direito. Contudo, a leitura da norma não se faz de forma isolada, é mister o entendimento de todo o ordenamento. Não há, como argumentado à exaustão, qualquer fundamento no sentido kelseniano de validade na assertiva de que o árbitro teria os mesmos poderes que o juiz. Em suma, o sistema brasileiro de arbitragem não se assemelha ao norte americano baseado no “juiz de aluguel”[13]. Ademais, não possui o árbitro as mesmas garantias constitucionais dos magistrados, problema que enseja uma discussão filosófica e prática da maior importância para os defensores da arbitragem.

                   Cabe um parênteses para se discutir a validade das normas no Direito Brasileiro. É uma análise que pretende esgotar a tese até aqui defendida, com base numa vertente constitucional de gênese de validade normativa.

                   No ordenamento jurídico nacional, a validade de uma norma jurídica depende do critério adotado pelo titular do Poder Constituinte, seja originário ou derivado, não pelo jurista que representa apenas um agente interpretador dos critérios de validade adotados pela norma jurídica, sem qualquer poder real de criação do Direito. Os que têm uma visão do Direito como linguagem afirmam que o jurista tem um papel fundamental no preenchimento do conteúdo semântico de uma norma, mas, ainda assim, o mesmo não tem o poder de criar, pois ninguém nega que o Direito, hodiernamente, se origina basicamente do Estado.

                   A validade da norma jurídica pode ser vista como o vínculo estabelecido entre a proposição jurídica, considerada na sua totalidade lógico-sintática e o sistema de Direito posto, de modo que ela é válida se pertencer ao sistema. Mas, para pertencer a tal sistema dois aspectos devem ser observados: a adequação aos processos anteriormente estabelecidos para a criação da proposição jurídica (exceto no caso da recepção pela Constituição) e a competência constitucional. Por isso, o doutrinador não teria o condão de criar um instituto jurídico válido por mera convicção sem respaldo no ordenamento jurídico.

                   Outro aspecto do modelo Kelseniano de aferição de validade de uma proposição jurídica é a dedutibilidade. Assim, oportuna se faz a invocação de alguns aspectos da dinâmica jurídica, vez que a dedução acontece quando o sistema atesta a validade de uma proposição jurídica, quando aquela é conseqüência lógica das normas hierarquicamente superiores. Tal método tem sempre como parâmetro final de validade a norma fundamental hipotética.

                   A validade de um instituto jurídico está em sua relação com o sistema, sendo que devem ser deduzidos dois aspectos já tratados, a dedutibilidade extraída da dinâmica jurídica e a conformidade com os processos e órgãos estabelecidos pela Norma Maior.

                   Neste sentido, o clamor social, legislativo, por mais legítimo que seja, não terá a felicidade de demonstrar, em sede na Constitucional, que a arbitragem seria uma forma de jurisdição privada legitimamente construída no direito brasileiro.

                   Deve ser, portanto, alvo de investigação doutrinária mais ampla a obtenção de uma caracterização ontológica para a arbitragem. Destarte, faz-se necessário a definição de um marco teórico de análise do direito e a importância da hermenêutica na construção dos novos paradigmas do Direito.

6.3. Dúvidas conceituais

                   Chega-se a um momento crítico da análise da função jurisdicional e da arbitragem. Em síntese, o Estado detém o poder jurisdicional que se expressa através de seus órgãos. Os órgãos exercem funções estatais, como a função judiciária. Todo este edifício normativo e organizacional encontra seu amparo na Constituição. Antecedendo ao gesto pacificador do juiz, ou seja, a sentença dirimindo o litígio, há toda uma lógica constitucional e uma estrutura legítima dos Estados modernos em fundamentar a tutela jurisdicional via Poder Judiciário. Impossível seria não indagar os seguintes tópicos.

                   Se a arbitragem é jurisdição privada, conforme defendem vários autores, qual seria seu sustentáculo constitucional ou mesmo dentro da Teoria do Estado moderno? Existiria função jurisdicional fora do poder de império do Estado? Qual é a natureza jurídica da arbitragem brasileira, em sede da Lei nº 9.307/96? Há que se falar em uma arbitragem brasileira diferente em sua natureza dos modelos estrangeiros?

                   Da análise organizacional estabelecida pela Constituição em seus artigos 92 e seguintes não se encontra absolutamente nenhuma referência ao árbitro ou tribunal arbitral. Os órgãos jurisdicionais enumerados no capítulo III “do Poder Judiciário” são taxativos e não amparam absolutamente a fundamentação da arbitragem como um órgão constitucional investido legitimamente da função jurisdicional. A arbitragem brasileira, conforme a Lei n.º 9.307/96, não possui sustentáculo constitucional para a doutrina, que persiste em afirmar que o juízo arbitral é jurisdição privada, ou seja, o particular possui poderes legítimos e constitucionais para dizer o direito no caso concreto.

                   A função jurisdicional monopolizada pelo Estado, mesmo no contexto liberal, deduz que não cabe ao particular dizer o direito no caso concreto, pois esta atribuição é exclusiva do Estado, oriundo de uma evolução histórica e constitucional. Não resta, portanto, outra via senão a estreita afirmação que na ordem constitucional em vigor no Brasil, a arbitragem não é jurisdição privada.

                   Ao contrário de outros países, como França e Estados Unidos da América, cujo sistema de arbitragem possui outras bases históricas e de legitimação, a arbitragem brasileira, em sede da Lei nº 9.307/96 e da Constituição em vigor, é ilegítima e inconstitucional, caso a doutrina insista em afirmar que o juízo arbitral é jurisdição privada. Não é por estabelecer a lei de arbitragem que o árbitro é juiz de fato e de direito e que o mesmo profere sentença (art. 18 da Lei 9.307/96) que está criada a jurisdição privada na ordem jurídica brasileira. A função jurisdicional não é fruto da lei, mas produto de construção constitucional e histórica.

                   Após a longa discussão sobre a função jurisdicional, não é difícil afirmar que não haveria, portanto, a função jurisdicional fora do poder de império do Estado. Estaria a arbitragem brasileira, portanto, ferida de morte na sua fundamentação e constituição? Absolutamente.

                   A natureza da arbitragem brasileira, na forma da Lei nº 9.307/96, é diversa da jurisdição privada. A arbitragem brasileira possui características próprias, inéditas no direito comparado e com natureza ontológica própria.

                   Em que pese as críticas a essa metodologia que se segue, mister se faz primeiramente conhecer o conceito de arbitragem para posteriormente defende-se a tese da natureza arbitral.

7. O CONCEITO DE ARBITRAGEM DO AUTOR

                   Uma vez demonstrado à exaustão que a natureza jurídica da arbitragem, em sede da Lei nº 9.307/96, não é de justiça privada e nem jurisdição privada, fica a pergunta inexorável: qual seria, portanto, a natureza jurídica do instituto brasileiro?

                   Após a análise dos diversas concepções sobre o instituto arbitral, estabelece-se para este ensaio um conceito especificamente esculpido com o objetivo de demonstrar a natureza da arbitragem, conforme a Lei nº 9.307/96. A arbitragem é processo autônomo parajudiciário heterocompositivo.

                   A primeira característica da arbitragem, em face a Lei nº 9.307/96, é sua característica de processo. O pleito arbitral baseia-se no procedimento em contraditório, pois no arbitramento realiza-se a oposição concatenada de teses. Destarte, seu caráter de rito de debates e contestação é notório.

                   É autônomo porque uma vez convencionada a cláusula arbitral, já está presente a gênese para a arbitragem. Ou seja, a existência do processo arbitral não mais depende da vontade das partes que lhe deram origem. Uma vez convenciona não há mais a faculdade de uma das partes desautorizar o início da arbitragem. Uma ilustração que deixa esta característica evidente é a possibilidade de imposição judicial da via arbitral à parte que não a aceita. Se a arbitragem não detivesse este caráter autônomo em oposição à vontade original bastaria um dos contratantes se opuser a sua instauração para que a mesma não ocorresse. Todavia, não é isto que se observa, o alvedrio das partes não mais tangencia o instauração arbitral. A cláusula arbitral possibilita esta autonomia à arbitragem em face ao talante dos que a convencionaram.

                   A característica parajudicial da arbitragem expressa-se por estar às margens do aparelho estatal judicial. Não há a intervenção do Estado-juiz no nascedouro nem na definição dos termos do laudo arbitral.

                   É heterocompositiva porque as partes optam por submeter a lide à decisão de um terceiro (arbitro singular ou tribunal) que substitui a vontade das partes. O terceiro autônomo ao litígio (hetero) assume a função de compor, ou seja, solver a lide das partes que lhe outorgaram este Poder.

                   Poder-se-ia questionar que o atributo da heterocompositividade não é exclusivo da arbitragem se comparar com o processo judicial, que também é heterocompositivo. Portanto, tal característica não identificaria o instituto. Todavia, é mister complementar o conceito com tal identificador, não em função da justiça estatal, mas, em razão das outras formas alternativas de soluções de litígios, como por exemplo, a mediação, transação e a conciliação. Estas últimas são opções de composições, mas que extraem-se da decisão das partes litigantes e não de um terceiro. A definição do litígio na mediação e na transação parte das próprias partes envolvidas, o que não ocorre na arbitragem e nem na esfera judicial. Logo, a heterocompositividade é um elemento importante na cunhagem do conceito da arbitragem para distingui-la de outros institutos alternativos de solução litigiosa.

8. NATUREZA JURÍDICA DA ARBITRAGEM

                   Entendendo a arbitragem como processo autônomo parajudiciário heterocompositivo torna-se mais claro a identificação de sua natureza jurídica.

                   A doutrina tem se dividido em afirmar que a arbitragem possui natureza jurisdicional ou contratual. Como foi demonstrado à exaustão, não se pode coadunar com a afirmativa que a arbitragem brasileira seja jurisdição.

                   E, ainda, em que pese ser a arbitragem oriunda da vontade das partes, também não se pode aderir à tese que defende seu caráter contratual. Pois, se assim o fosse bastaria a oposição de uma das partes para tornar ineficiente o início do juízo arbitral; todavia, não é isto que ocorre, ou seja, há uma autonomia do processo arbitral em face ao alvedrio das partes.

                   A natureza jurídica da arbitragem é de relação processual privada derivada de bens protegidos constitucionalmente.

                   Seria, portanto, o objeto de estudo uma relação processual privada, pois trata-se de um vínculo litigioso de alçada privada. Ou seja, uma vez firmada a cláusula arbitral e dado o início no compromisso arbitral e no arbitramento propriamente dito há entre as partes um vínculo jurídico. Tal conexão se dá em sede de pretensões resistidas, daí seu caráter litigioso. O elemento privado extrai-se da constatação que a arbitragem se processa na órbita civilista, contando com apenas o arbitro ou tribunal arbitral nomeado pelos particulares.

                   A arbitragem é corolário da propriedade privada (art. 5º c/c art. 170, II). O senhorio privado, como um direito individual e coletivo e como princípio da Ordem Econômica brasileira, é direito material consagrado pela Constituição. O arbitramento é a derivação do bem privado, notadamente os bens disponíveis, mas enquanto direito adjetivo da propriedade privada.

                   Com o advento da Lei processual extravagante (Lei nº 9.307/96) inaugurou-se no ordenamento jurídico brasileiro o direito subjetivo privado a arbitragem. O cidadão brasileiro além do Direito Subjetivo Público que é o direito de recorrer ao judiciário estatal para compor seu litígio, com o arbitramento adquire mais uma alternativa, mas em sede de direito subjetivo privado, pois trata-se de uma faculdade dada aos particulares. Trata-se de instituto processual restrito ao âmbito instrumental de direitos disponíveis.

8.1. A Arbitragem nas constituições, uma visão histórica

                   Antes de se adentrar na discussão quanto a tratamento constitucional em face ao instituto arbitral da Lei nº 9.307/96, mister se faz abordar historicamente este tema nas constituições brasileiras.

8.1.1. Primeira fase – Autonomia e participação

                   A Constituição Imperial de 1824 continha, no que diz respeito ao poder judicial, interessante sistema a evidenciar a implicação da função de julgar com a própria sociedade, deixando explícitos mecanismos de participação e de fiscalização.

                   A leitura atenta de seus termos se mostra bastante instrutiva, em face da precariedade democrática da organização constitucional atual.

                   A virtude desta primeira fase é em deixar claro no próprio texto constitucional os institutos de participação da sociedade na distribuição da justiça (por meio de jurados, juízes de paz eleitos e juízes árbitros escolhidos livremente pelos interessados, segundo sua conveniência sendo estabelecido o processo e a necessidade ou não de recurso). A Constituição Imperial deixava evidente a composição do poder judicial não apenas pelos juízes e tribunais mas também pelas demais figuras encarregadas de realizar a função de julgar.

8.1.2. Segunda fase – Obrigatoriedade e vinculação corporativa

O advento do Código Comercial (Lei 556 de 25.6.1850) e do Regulamento 737, de novembro do mesmo ano, inicia um processo de alteração na postura do legislador em relação à concepção dos meios voluntários de solução de litígios.

                   Nota-se a tentativa de tornar obrigatórios procedimentos que deveriam permanecer na esfera de vontade dos interessados, mesmo o encaminhamento de processo de monopolização da tarefa de prestar justiça pelo Estado, seja ao demonstrar a sucumbência em face de um interesse corporativo e na ingerência de juiz e tribunal na escolha de árbitros.

8.1.3. Terceira fase – Monopólio e tutela

                   Aqui ocorre a consolidação do monopólio estatal: Código Civil (Lei 3071 de 1º.1.1916), Decreto-Lei 1.608 (Código de Processo Civil de 1939) e Código de Processo Civil (Lei 5.869 de 11.1.1973).

                   Exceção seja feita ao disposto nos artigos 1.025 e 1.030 do Código Civil, cuja abertura não parece ter sabido devidamente explorar a criatividade dos profissionais de direito.

                   A exigência de homologação - a quebrar a garantia do sigilo, tão importante enquanto qualidade dos meios voluntários - a regulação excessiva e a falta de garantia de validade da cláusula compromissória - a quebrarem os princípios da autonomia da vontade e da boa-fé - acabaram por desestimular o emprego do instituto.

                   As Constituições republicanas, aliás, não se mostraram nada simpáticas à idéia da participação da sociedade na administração e distribuição da justiça. Tanto as instituições do júri, nas esfera penal, quanto dos juízes classistas, na justiça do trabalho, permaneceram limitadas a critérios de controle estatal e corporativo.

                   Devem permanecer nesta fase as considerações sobre os juizados especiais.

                   Malgrado as tentativas de fomentar a idéia da conciliação, nos primeiros passos do instituto, a atual Lei acabou - a par de demonstrar a pouca intimidade do legislador com a matéria dos meios voluntários, em geral, e da arbitragem, em particular - por sucumbir diante de tentações corporativas - v. a instituição do juiz leigo - e prescindir, ao que tudo indica, no mínimo por preconceito, da participação da sociedade. A idéia de circunscrever o trabalho dos juizados aos profissionais do direito, afastando a contribuição de outros especialistas e de entidades da sociedade, já se iniciava na Lei anterior, dos juizados de pequenas causas. A Lei atual, enfim, fez pouco caso das qualidades da especialidade e do sigilo, típicas dos meios voluntários de solução de conflitos e controvérsias.

8.1.4. Quarta fase – Busca de inserção global

                   A pressão internacional para a adoção de mecanismos de uniformização para o desenvolvimento livre do comércio internacional, como principal fator, ao lado da consciência das limitações crescentes e dos problemas dos meios tradicionais de solução de litígios, acabaram por determinar o surgimento de inúmeras iniciativas para a introdução da arbitragem em nosso país, como alternativa para a decisão de litígios e como meio de construir credibilidade para a sua inserção em uma nova ordem internacional, inclusive no que diz respeito ao reconhecimento das decisões arbitrais estrangeiras.

                   Importantes, nesta fase, são a entrada em vigor da Lei nº 9.307/96, cuja virtude precípua esteve na atenção aos dispositivos e princípios sugeridos na Lei-Modelo UNCITRAL e a ratificação, em 1996, da Convenção Interamericana sobre Arbitragem Comercial Internacional, firmada no Panamá, em 1975, bem como a busca para a ratificação da Convenção para o reconhecimento e execução das decisões arbitrais estrangeiras, firmada em Nova York, em 1958.

                   Devem ser referidos, ainda, os protocolos visando à mediação e arbitragem de litígios na área do Mercado Comum do Sul (Mercosul).

9. DA CONSTITUCIONALIDADE DA LEI nº 9.307/96

                   A Lei de arbitragem (Lei nº 9.307/96) é uma norma recente e que ao estabelecer novas alternativas de soluções de litígios, com a potencialidade de romper com antigos paradigmas, está permeada de discussões sobre a sua aplicabilidade no ordenamento jurídico brasileiro, ou seja, a constitucionalidade do instituto ainda está sobre o crivo da análise do judiciário e a sua admissibilidade no ordenamento nacional face ao inciso XXXV, art. 5º da Constituição.

                   Dispõe o artigo 5º da CONSTITUIÇÃO, ex verbis: “A Lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;...”.

                   A discussão jurídica que se estabelece está adstrita se o artigo 18 da Lei de Arbitragem não estaria excluindo da apreciação exclusiva do Poder Judiciário ao dispor que: “O arbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário”.

                   A exegese deste artigo e seus reflexos na aplicabilidade do instituto arbitral no Brasil será o tema a ser atacado neste capítulo.

                   Preconizou o jurisconsultor romano Celso no Digesto[14]: “Conhecer as leis não é compreender as suas palavras, mas o seu alcance e a sua força.”

                   BARACHO (1994:57) define a atividade interpretativa com total clareza, suas palavras:

"A atividade interpretativa, que tem por objeto norma constitucional, deve ser vista à luz de uma metodologia própria, sem que se esqueçam as regras gerais de interpretação, pertinentes à ciência jurídica. A atividade interpretativa parte da norma constitucional geral, para compreender sua natureza, conteúdo e modalidade. (...) Na interpretação da norma constitucional existe, inicialmente, uma dificuldade hermenêutica, devido ao caráter multiplicidade das normas e da variedade do conteúdo. Existem disposições que são breves, esquemáticas e incisivas. A linha de conduta do intérprete constitucional, em relação à dificuldade do trabalho, deve partir de certos critérios gerais: valer-se indistintamente de todos os instrumentos e critérios, desde que sejam legalmente consentidos e admissíveis; empregar o método lógico; usar, com cuidado, o estruturamente teleológico e sistemático; considerar os princípios informadores do ordenamento constitucional; não esquecer a realidade concreta, na qual opera a norma constitucional."

                   O Brasil relutou em adotar a arbitragem e mesmo agora há vozes respeitáveis erguendo-se contra pretensa inconstitucionalidade da Lei, por entenderem que esta estaria a conflitar com o princípio consagrado pelo artigo 5º, XXXV da C.F, segundo o qual, a Lei não excluirá lesão ou ameaça a direito da apreciação do Judiciário.

                   Todavia, há de se compreender a inteligência da Lei nº 9.307/96 à luz do orientação da interpretação constitucional, ou seja, analisar cada artigo perante os “princípios informadores do ordenamento constitucional”, mas almejando obter um entendimento, antes, um ajustamento “estruturamente teleológico e sistemático”.

                   Dar-se início ao entendimento da arbitragem com “a realidade concreta” que não há exclusão, mas sim proposta consentânea com o pensamento moderno de se superar formalismos ainda enraizados na cultura nacional, e o Judiciário, ao revés de estar sendo legado ao oblívio, estará mais desobstruído para que possa cumprir seu objetivo jurisdicional, melhor e com mais rapidez.

                   Além do fato da Lei jamais ter se distanciado dos cânones constitucionais, pois previu a participação do Judiciário em todas as etapas do procedimento arbitral (vide arts. 7º, §§, art. 20, § 1º, art. 25, art. 33 e art. 35 da Lei nº 9.307/96), a renúncia à jurisdição estatal é prerrogativa do cidadão (art. 2º do CPC) – “Ne procedat index ex officio”. A via judicial não poderá constituir-se em obrigação imposta, pois, nesta hipótese, despontaria o arbítrio, antitético do que Reale denomina Estado Democrático de Direito.

                   A Lei nº 9.307/96 não deixa margem a qualquer dúvida, quanto a sua constitucionalidade, porquanto o artigo 25 comanda que, sobrevindo, no curso da arbitragem, dissensão acerca de direitos indisponíveis, de cuja existência ou não, dependerá o julgamento, o arbitro ou o tribunal arbitral mandará as partes, para o Juízo competente. O artigo 31, erige a sentença arbitral, se condenatória, em título executivo, com os mesmos efeitos da decisão proferida pelo Poder Judiciário e não inibe a parte de ingressar, em Juízo, seja para embargar possível execução, seja para demandar sua nulidade (artigos 31 a 33). Neste sentido, a opinião dos doutos (Célio Borja, Frederico Marques e Hamilton de Moraes e Barros, apreciando a Lei anterior, e, já, recentemente, José Janguiê Bezerra Diniz, Geraldo Brindeiro, Cláudio Vianna de Lima, Fátima Nancy Andrighi, Cláudio Santos, Carlos de Laet, Stefânia Guimarães, Regis de Oliveira, José Augusto Delgado, Sálvio Figueiredo e Regina Michelon).

                   Tal atitude não significará, portanto, violação ao preceito constitucional que assegura o acesso ao Judiciário quando houver ameaça ou perda de um direito. Nesse sentido seria pertinente reproduzir "in totum" as palavras do Procurador Geral da República, Geraldo Brindeiro, em parecer favorável a Constitucionalidade da nova Lei de arbitragem, proferido em processo de homologação de sentença arbitral estrangeira junto ao Supremo Tribunal Federal:

"as pessoas físicas ou jurídicas não estão obrigadas a ingressar em juízo toda vez que seus direitos são afrontados por outrem, pois o princípio constitucional (direito ao acesso à justiça nas hipóteses de lesão ou ameaça a direito) garante o direito de ação, não o impõe. O direito de ação à luz do princípio da autonomia das vontades representa uma faculdade inerente à própria personalidade".

                   No Agravo Regimental na sentença estrangeira nº 5.206-7 Reino da Espanha, o Ministro Nélson Jobim, entendeu que:

"a Constituição proíbe que a lei exclua da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (art. 5o, XXXV). Ela não proíbe que as partes pactuem formas extrajudiciais de solução de seus conflitos, atuais ou futuros". (grifo)

                   No mesmo sentido se pronunciou, no caso em tela, o Ministro Ilmar Galvão:

"Não se cuida, entretanto, de ato [refere-se ao pacto comissório] por meio do qual alguém declara haver renunciado, de forma absoluta, a todo e qualquer direito de ação, a partir de determinado momento, o que seria inadmissível, mas de simples cláusula contratual em que as partes vinculadas a determinada avença, que tenha por objeto direito patrimonial de natureza disponível, deliberem, de livre e espontânea vontade, que toda dúvida que o contrato vier a suscitar será, obviamente, por elas próprias dissipadas de comum acordo; e, com certeza, se não lograrem êxito nesse propósito, será ela, aí já qualificada como controvérsia, resolvida, necessariamente, por terceiro ou por terceiros de sua confiança, cuja decisão será obrigatoriamente por eles acatada. (...) A renúncia que a inserção de tal cláusula poderá implicar, ao direito público de ação, quanto às lides suscetíveis de eclosão no âmbito restrito de contrato determinado, não pode ser tachada de genérica, posto que insuscetível de alcançar atos ou fatos diversos." (grifo)

                   Por seu turno, a Ministra Ellen Gracie, no mesmo Agravo, decidiu:

“A leitura que faço da garantia enfocada no art. 5º, XXXV, é de que a inserção da cláusula assecuratória de acesso ao judiciário, em nosso ordenamento constitucional, tem origem e se explica pela necessidade de precatarem-se os direitos dos cidadãos contra a atuação de órgãos administrativos, próprios de regimes autoritários. A arqueologia da garantia da via judiciária leva-nos a verificar que a cláusula sempre teve em mira, preponderantemente, o direito de defesa ante os tribunais, contra atos dos poderes públicos. Por isso mesmo é, ineludivelmente, o legislador o destinatário da norma que reza: "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Creio que essa leitura é coerente com as anteriores manifestações do Supremo Tribunal Federal, pois verifico que a Corte já se posicionou no sentido de inadmitir que barreiras econômicas se anteponham ao exercício do direito de acesso ao judiciário, quando, por exemplo, eliminou a obrigatoriedade de depósito preparatório nas ações que tenham por objeto discutir o débito para com o INSS, suspendendo a vigência do artigo 19, caput, da Lei n° 8.807/94 (ADIN 1.074-3/DF, Medida Cautelar, Rel. Min. Francisco Rezek, in D.J.U. de 23/9/94, p. 25.314). Da mesma forma, quando, ao suspender a eficácia de lei estadual, considerou que "a exigência de taxa judiciária ilimitada (incidente sobre o valor da causa ou da condenação), pode inviabilizar, em certos casos, o próprio acesso ao Poder Judiciário, o que não é permitido pela Constituição (art. 5º, XXXV)." (ADIN 1.651-2/Paraíba, Medida Cautelar, Rel. Min. Sydney Sanches, in D.J.U. de 11/09/1988, p. 2).”

                   Depreende-se da jurisprudências da Ministra Ellen Gracie que a garantia de acesso ao judiciário é daqueles direitos fundamentais nos quais se reconhece maior peso ao que CANOTILHO (1997:401) denomina de função de direitos de defesa dos cidadãos. Ou seja, no plano jurídico-objetivo, representa a impossibilidade, para o Estado-legislador, de excluir da apreciação judicial determinadas matérias e, no plano jurídico-subjetivo, "o poder de exercer positivamente o direito de ação".

                   Coaduna-se o entendimento que se segue com a exegese histórica do art. 5º XXXV que o cidadão pode invocar o judiciário, para a solução de conflitos, mas, não está proibido de valer-se de outros mecanismos de composição de litígios. Já o Estado, este sim, não pode afastar do controle jurisdicional as divergências que a ele queiram submeter os cidadãos.

                   Em suma, partindo de um pressuposto estruturamente teleológico e sistemático; considerar os princípios informadores do ordenamento constitucional; não esquecer a realidade concreta, na qual opera a norma constitucional chega-se a conclusão de que a Lei 9.306/97 não exclui a apreciação do judiciário em nenhuma de suas fases, entretanto, garante a eficiência do laudo arbitral independente de homologação e, principalmente, respeita-se a autonomia da vontade esculpida na cláusula compromissória.

9.1. Do Juízo de exceção e a arbitragem

                   Baseado nos trabalhos de Emillio Betti, Gadamer investigou a diferença existente entre o comportamento do historiador jurídico e o do jurista diante de um mesmo texto jurídico, dado e vigente. Gadamer quis saber se havia uma diferença unívoca entre eles.

                   O jurista descobre o verdadeiro sentido da lei a partir de um determinado caso concreto, ou seja, ele tem que descobrir o conteúdo normativo da lei, respeitando o caso ao qual irá aplicá-la. Assim, o aplicador do direito deve, ao especificar este conteúdo, analisar o valor histórico que convém a lei, em relação ao período histórico de sua publicação. Quanto ao comportamento do jurista, GADAMER (1997:485) nos adverte:

" ... não pode sujeitar-se a que, por exemplo, os protocolos parlamentares lhe ensinariam com respeito à intenção dos que elaboraram a lei. Pelo contrário, está obrigado a admitir que as circunstâncias foram sendo mudadas e que, por conseguinte, tem que determinar de novo a função normativa da lei."

                   É importante notar-se que, para o jurista, a compreensão histórica é um meio para se chegar a um fim. Savigny, antes de 1814, preocupava-se com o significado textual da lei, interpretar era determinar o sentido expresso nas normas; daí surgiram as quatro técnicas:

" ... a interpretação gramatical, que procurava o sentido vocabular da lei, a interpretação lógica, que visava ao seu sentido proposicional, a sistemática, que buscava o sentido global ou estrutural, e a histórica, que tentava atingir o sentido genético. "(FERRAZ JR, 1998:265)

                   Em 1840, Savigny acreditou ser puramente histórica a função da hermenêutica jurídica e ignorou o atrito entre sentido jurídico atual e originário. Ernst Forsthoff, em seus valiosos trabalhos, demonstrou ser necessária, por motivos estritamente jurídicos, uma reflexão a respeito da mudança histórica das coisas, distinguindo-se o sentido original do conteúdo de uma lei e o efetivamente aplicado na práxis jurídica.

                   O historiador jurídico, aparentemente, busca o sentido originário da lei, busca seu valor e qual a intenção no momento de sua promulgação.

                   Questiona GADAMER (1997:485-486):

"Mas como chegará a reconhecer isso? Ser-lhe-ia possível compreendê-lo sem se tornar primeiro consciente da mudança de circunstâncias que separa aquele momento da atualidade? Não estaria obrigado a fazer exatamente o mesmo que o juiz, ou seja, distinguir o sentido originário do conteúdo de um texto legal desse outro conteúdo jurídico em cuja pré-compreensão vive como homem atual?"

                   Nesse ponto, não há diferença entre a situação hermenêutica do jurista e do historiador jurídico. Ambos, diante de todo e qualquer texto, encontram uma certa expectativa de sentido imediato, ou seja, ninguém possui um acesso imediato ao objeto histórico capaz de proporcionar objetivamente seu valor posicional. O historiador deve realizar a mesma reflexão que orienta o jurista. O jurista faz uso do conhecimento histórico quando em seus casos concretos não desvincula o passado do presente, considerando-os (passado e presente) como um processo contínuo. A Hermenêutica Jurídica é responsável por esta ligação entre passado e presente.

                   Ao julgar o caso concreto, o juiz adapta a lei às necessidades atuais, o que não implica, necessariamente, numa tradução arbitrária da lei.

                   A função do aplicador do Direito é compreender, conhecer e reconhecer um sentido vigente para dada norma. O interprete jurídico procura corresponder à `idéia jurídica´ da lei, intermediando-a com o presente. É evidente, ali, uma mediação jurídica. O que tenta reconhecer é o significado jurídico da lei, não o significado histórico de sua promulgação ou certos casos quaisquer de sua aplicação. Assim, não se comporta como historiador, mas se ocupa de sua própria história, que é seu próprio presente. Por conseqüência, pode, a cada momento, assumir a posição do historiador, face às questões que implicitamente já o ocuparam.

                   Por fim, para Gadamer, existe uma relação essencial entre a hermenêutica jurídica e a dogmática jurídica; entretanto, a hermenêutica ocupa uma posição dominante em virtude de não ser sustentável a idéia de uma dogmática jurídica total - onde se pudesse baixar qualquer sentença por um simples ato de subsunção.

                   Compreender os contextos históricos e, ainda, a reação a cada fase da evolução social são instrumentos indispensáveis para a cognição do Direito, notadamente, para estabelecer a dinâmica da Ciência Jurídica.

                   Se adotado este pressuposto, é indispensável a leitura que acabou de se fazer de Gadamer. O jurisconsulto introduz na hermenêutica jurídica o entendimento histórico como sendo uma das formas de se compreender o real sentido do dispositivo normativo. Com efeito, o doutrinador com ousadia afirma que a hermenêutica ocupa uma posição dominante em relação à dogmática jurídica. Tal entendimento é também defendido por Celso no Digesto ao afirmar que “conhecer as leis não é compreender as suas palavras”. Para se conhecer a Lei não basta interpretar gramaticalmente suas palavras. A norma jurídica é uma construção social e, portanto, para sua total compreensão deve ser entendida conforme esta mesma sociedade e em seu tempo. Daí a importância do entendimento de Gadamer e sua historiciedade jurídica.

                   Uma norma jurídica legislada para um exercício de entendimento da doutrina de Gadamer é aquela contida no artigo 5º, inciso XXXVII, da Constituição da República.

                   Art.5º, inciso XXXVII: “não haverá juízo ou tribunal de exceção;"

                   Da primeira leitura entende-se que é inconstitucional qualquer instituição de Poder Jurisdicional paralelo ao criado pela Constituição.

                   Neste sentido, há de se realizar duas observações a primeira, que baseia-se na tese defendida por este trabalho e na leitura gramatical do dispositivo constitucional supra, é que a arbitragem não é juízo, no sentido de Poder Jurisdicional, portanto, não encontra obste no citado inciso. Todavia, reconhece-se que trata-se de um posicionamento particular e ainda minoritário.

                   Contudo, caso se faça a leitura do citado trecho adotando o entendimento de Gadamer concluir-se-á que há um contexto histórico para vir grafado na Constituição este dispositivo e que, a bem da verdade, não obsta a arbitragem no Estado Democrático Brasileiro.

                   No sentir da investigação histórica há de se compreender que o Brasil em 1988 estava numa fase de ruptura com um período de exceção. Havia um entendimento que a Constituição iria inaugurar uma nova era de liberdades e garantias no Brasil. Portanto, toda e qualquer possibilidade de se estabelecer um novo Estado leviatânico e opressor deveria ser rechaçada. Por conseguinte, a possibilidade de se estabelecer os tribunais de exceção, que poderiam ser afastar as garantias constitucionais e legais, deveria totalmente afastada pelo texto constitucional, como assim o fez.

                   O mesmo entendimento se depreende do voto, já citado, da Ministra Ellem Gracie. Destaca-se:

“A arqueologia da garantia da via judiciária leva-nos a verificar que a cláusula sempre teve em mira, preponderantemente, o direito de defesa ante os tribunais, contra atos dos poderes públicos.”

                   Ou seja, buscando-se nos registro da história recente do Brasil deparar-se-á com a tese de que, o Art.5º inciso XXXVII da CONSTITUIÇÃO versa sobre proteção do cidadão contra os atos dos poderes públicos e não concerne a impedir a instituição de alternativas paralelas de solução de conflitos de bens disponíveis.

                   Ademais, sendo o direito disponível, isto é, o próprio ordenamento público o reconhece como sendo um bem sob o pálio da vontade do cidadão, não há que se argumentar ser a defesa destes direitos (que em tese não importam ao Estado) devam ser obrigatoriamente solvidos na esfera estatal.

10. CONCLUSÃO

                   Perante um conflito de interesses, uma pretensão de uma parte, resistida pela outra, observa-se o exercício da função jurisdicional. Uma vez que as partes não podem solucionar o conflito por si próprias, ou seja, não podem fazer justiça com as próprias mãos, cabe aos juízes dar andamento à jurisdição.

                   Ao Estado cabe o direito subjetivo de realizar a jurisdição, detendo a função pacificadora e, conseqüentemente, a capacidade de decidir imperativamente e impor decisões.

"A jurisdição (jurisdictio, jus dicere) pode, - observou, com lucidez inexcedível, o mestre lusitano J.J. Gomes Canotilho, in direito constitucional e teoria da constituição, editora Almedina, 1997, pág. 577 - ser qualificada como a actividade exercida por juízes e destinada à revelação, extrinsecação e aplicação do direito num caso concreto. Esta actividade não pode caracterizar-se tendo em conta apenas critérios materiais ou substantivos. Está organizatoriamente associada ao poder jurisdicional, e é subjectivo-organicamente atribuída a titulares dotados de determinadas características (juízes). Está ainda jurídico-objetivamente regulada quanto ao modo de exercício por regras e princípios processuais (processo)". (FONTES, 2002).

                   Todavia, o Direito não é um sistema estático e evolui mediante os movimentos da sociedade. Neste sentido, inaugurou-se no ordenamento jurídico brasileiro a Lei de Arbitragem.

                   Surge assim a oportunidade de quebrar-se o paradigma do monopólio estatal da resolução de conflitos, que gera insatisfação com sua comprovada morosidade, levando-nos a conclamar total apoio e incentivo ao instituto da arbitragem, que, nas sábias palavras do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, "retoma força e passa a ser verdadeiro respiradouro da jurisdição estatal".

                   No âmbito processual, mutatis mutandis, o princípio é o mesmo. O Estado assumiu a jurisdição a fim de tornar igualitária a distribuição da justiça. Assim como hoje, na época em que o direito era privado, exclusivamente, nem todos a ele tinham acesso. Não tanto por razões econômicas, mas porque o direito era formular e, portanto, extremamente difícil de se fazer exercido com justiça. Uma vez que o Estado, cujo fim maior é proporcionar às pessoas a paz social, assumiu a função de aplicar o direito ao caso concreto, buscou ele oportunizar às pessoas a obtenção da justiça, efetivamente.

                   Entretanto, a realidade econômica típica do capitalismo é capaz de fazer com que mesmo a distribuição da Justiça pelo Estado seja movida por fatores econômicos. As concepções econômicas prevalecem, inevitavelmente, no capitalismo, sobre as filosóficas ou jurídicas. Assim sendo, o acesso à Justiça tornou-se novamente difícil, agora em razão de obstáculos econômicos. A Jurisdição estatal tornou-se cara e lenta, perdendo a função que pretendia ter, a princípio. Daí por que novamente surge a solução privada de conflitos, agora como alternativa àquela jurisdição estatal.

                   A nova concepção de solução de conflitos trouxe de volta o predomínio da teoria da autonomia da vontade. Na verdade, esta teve mitigada sua utilização no âmbito jurídico, embora prevalecesse no âmbito econômico desde o mercantilismo. Especialmente no Brasil, em que a jurisdição estatal ainda era a regra, sendo outros tipos de solução de controvérsias consideradas ineficazes, a Lei da Arbitragem veio a mostrar-se estranhamente o instrumento jurídico capaz de resolver tanto o problema do acesso à Justiça como o do abarrotamento da vias tradicionais de exercício jurisdicional.

                   A arbitragem trouxe à solução de conflitos a possibilidade de que se realize de forma sigilosa, rápida, eficaz, definitiva. Permite às partes convencionarem se pretendem ou não submeter seu conflito à análise de um terceiro, escolhido livremente por elas próprias. Aqueles mesmos princípios que regem a autonomia da vontade no âmbito contratual aplicam-se, mutatis mutandis, ao processo.

                   Neste sentido, a Hermenêutica Jurídica desempenha uma função essencial no Direito. A existência do ordenamento jurídico, por si só, não garante o fim do Direito, qual seja, a Justiça. Como nos ensinou Hans-George Gadamer, ao jurista é imprescindível, muito mais que aplicar a lei ao caso concreto, saber interpretá-la de modo a alcançar o justo. Esta interpretação deve considerar, essencialmente, a causa do homem - visto como ser humano que vive em sociedade, que aspira ao Bem Comum.

                    Com efeito, tanto a criação da lei como a sua aplicação devem visar ao Bem Comum. Se assim não for, a lei não estará cumprindo a sua finalidade.

                   Elaborar a lei para benefício de minoria é uma aberração.

                   Aplicar e interpretar a lei sem visar ao Bem Comum é outra aberração.

                   Aos profissionais do Direito cabe o estudo dedicado da Hermenêutica Jurídica, pois, mais importante que aplicar a lei ao caso concreto, é saber porquê se aplica a lei e, fazer com que, desta aplicação/interpretação, seja realizada a Justiça.

 

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Notas:

[1] Privatização da Justiça – Artigo Publicado no Jornal O Estado de São Paulo, em 05 out. 1996.

[2] NADER, Paulo. Introdução ao estudo do direito. 7ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1992, p. 131 et. Seg.

[3] ALVIM, José Eduardo Carreira. Arbitragem no Direito Interno Brasileiro. Manuscrito. p. 7

[4] Dos três institutos, a mediação é o mais informal, atuando o mediador como interlocutor das partes para maximizar a eficiência da troca de informações, dinamizando reuniões, contemporizando as discussões, pleiteando, mas sem tem o poder de definir a melhor solução, somente, trabalha com as partes com o escopo de se atingir uma escolha ótima os interessados. De outro lado, o conciliador possui uma participação mais incisiva sobre a matéria da pretensão resistida. Ele elabora toda a fase probande, ou seja, ouvindo testemunhas, analisando documentos, periciando, inferindo e direcionando o acordo que poderá ser aceito ou não pelos litigantes.

[5] KROETZ, Tarcísio Araújo. Op. cit. p. 19.

[6] São órgãos do Poder Judiciário:

I – o Supremo Tribunal Federal;

II – o Superior Tribunal de Justiça;

III – os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais;

IV – os Tribunais e Juízes do Trabalho;

V – os Tribunais e Juízes Eleitorais;

VI – os Tribunais e Juízes Militares;

VII – os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Território.

[7] A Constituição francesa garante a independência do Judiciário (art. 64), e, na Itália, este não comparece como um “Poder” na Constituição, embora esta complete a Magistratura em título próprio (Título IV da Parte II).

[8] A legitimidade do magistrado não advêm diretamente da vontade popular, por meio da representação, já que o seu ingresso se dá via concurso ou indicação e não via eleição. A legitimidade da função do juiz deve ser analisada, portanto, sob o prisma da sua fundamentação das sentenças nos princípios e valores que a soberania nacional consideram como fundamentais positivada na própria Constituição e no Ordenamento Jurídico em vigor.

[9] op. cit. p. 88 e seg.

[10] Theodoro Jr., op cit. p. 34.

[11] Op. cit. p. 10

[12] Idem. Op. cit. p. 13

[13] Tradução livre do inglês: “Rent a judge”.

[14] Digesto de Celso, Livro I, fragmento 3, parágrafo 17: “Scire leges non hoc est verba earum tenere sed vim ac potestatem”.