Aspectos da eutanásia no biodireito


Porwilliammoura- Postado em 26 setembro 2012

Autores: 
PINHEIRO, Raphael Fernando

 

O tema em análise versa sobre dois princípios maximus em nosso ordenamento jurídico,positivados em nossa Carta Magna, sendo esses o principio da dignidade da pessoa humana e o respeito à vida do homem em face de sua existência como sujeito de direito.

Ressalta-se que tais princípios são decorrentes de lutas históricas pelo respeito à condição humana inerente a cada pessoa, de modo que, na situação fática, a primeira vista assumem posições antagônicas, mas como ficará demonstrado, ambos estão em consonância nesta questão, sendo favoráveis a realização da eutanásia piedosa no referido caso.

Alexandre de Moraes conceitua o princípio da dignidade da pessoa humana da seguinte maneira:

A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos[1].

Tem-se em nosso Estado Democrático de Direito, o princípio da dignidade da pessoa humana com um dos pilares basilares de toda a sociedade, tanto que não se restringe apenas ao ordenamento jurídico nacional, mas assume caráter supranacional, dada a sua importância.

Partimos do princípio que a vida humana vai além da simples existência biológica, sendo algo maior que isso, envolvendo o próprio reconhecimento do indivíduo sobre sua condição humana, sua história de vida, sua relação com o corpo social, seus vínculos de afeto e acima de tudo sua felicidade.

No caso em tela, o Estado de forma cruel, visa manter um ser humano em estado de extrema dor física e psíquica, submetendo seus familiares a compartilhar das mesmas dores do senhor Ciclano. Até o presente momento e após exaustiva pesquisa, não foi encontrada justificativas para que se negue o direito ao paciente de ter uma morte digna e piedosa, sendo assim, o Estado prefere que um ser humano tenha um final de vida humilhante e de extrema dor, com base em preceitos religiosos e ideológicos martirizados.

Salienta que o direito positivado torna a situação mais injusta ainda, pois permite que em caso de estupro, mesmo quando a vida é viável, seja realizado o aborto a pedido da gestante, sendo que quando a vida se torna inviável e perto do fim, o legislador continua a manter-se em uma posição conservadora e inadequada. Então entende o Estado que um nascituro que teria toda uma vida pela frente, pode ter sua morte decidida por outra pessoa, e que uma pessoa em estado terminal, para evitar demasiado sofrimento, não pode optar por uma morte digna???? Que realidade paradoxal e essa que optou nosso legislador em inibir uma vida inteira e proibir a morte certa e próxima como um ato de piedade?!

A questão em tela nos traz a certeza que o estado do senhor Ciclano só trará a ele dor e sofrimento, refletindo tal situação em seus familiares, sendo desejo de todos que o paciente tenha direito a uma morte digna e sem sofrimento desnecessário.

Ricardo Royo-Vilanova y Morales, citado por Flamínio Fávero, define a eutanásia da seguinte forma:

 É a morte doce e tranquila, sem dores físicas nem torturas morais, que pode sobrevir de um modo natural nas idades mais avançadas da vida, surgir de modo sobrenatural como graça divina, ser sugerida por uma exaltação das virtudes estóicas, ou ser provocada artificialmente, já por motivos eugênicos, ou com fins terapêuticos, para suprimir ou abreviar uma inevitável, larga e dolorosa agonia, mas sempre com prévio consentimento do paciente ou prévia regulamentação legal[2]

A Constituição traz o respeito a vida humana como algo que vai além da simples condição biológica, é direito do homem ter uma morte digna, sendo inviável e irracional que um Estado submeta seus filhos a dores e sofrimentos infundados, alegando de forma hipócrita que está salvaguardando a vida humana  pergunta-se que vida é essa..... é a de quem sofre...........ou a dos familiares obrigados a verem seu ente querido sofrendo no final de uma vida marcada pelo amor e afeto......... ou tal posição tem origem em um conceito de vida voltado ao “bem comum”, marcado pelo conservadorismo e crueldade?????

Partindo da mesma posição, explana Luis Flávio Gomes:

Na nossa opinião, a eutanásia, qualquer que seja a modalidade (incluindo-se aí a morte assistida), desde que esgotados todos os recursos terapêuticos e cercada de regramentos detalhados e razoáveis, não pode ser concebida como um fato punível, porque não é um ato contra a dignidade humana senão, todo o contrário, em favor dela. Pensar de modo diferente levaria ao seguinte paradoxo: quem não padece nenhum sofrimento e tenta dar cabo a sua vida (tentativa de suicídio) não é penalmente punível; seria passível de sanção o ato de pôr em prática, não arbitrariamente, o pedido de morte de quem, em condições terminais, já não suporta tanto sofrimento físico e/ou mental ?

Já é hora de passar a limpo o emaranhado de hipocrisias, paradoxos, obscuridades e preconceitos que estão em torno da questão da eutanásia que, em última análise, envolve a própria liberdade humana, tão restringida pelas barbáries históricas que nada mais exprimem que a volúpia de dominar o homem para sujeitá-lo escravocratamente a crenças ilógicas e, muitas vezes, irracionais. Com urgência nosso Congresso Nacional deve se debruçar sobre o assunto. Os médicos não podem continuar com a "espada da Justiça" sobre a cabeça. Os pacientes terminais devem decidir sobre a hora e local da sua morte. Necessitamos de uma legislação nacional clara e objetiva sobre a matéria. Mesmo porque, a grande maioria da população brasileira está de acordo com isso (cf. nesse sentido enquete feita pelo portal do Estadão – sem grifos no original)[3].

Assim, com base na hipervalorização do princípio da dignidade da pessoa humana em nossa Lei Maior e tendo em vista o respeito a existência e a própria vida humana, compreendendo também o direito que cada um tem a uma morte digna após uma vida de felicidade e realizações, transcrevemos os ensinamentos do mestre Canotilho:

"Os exemplos anteriores apontam para a necessidade de as regras do direito constitucional de conflitos deverem construir-se com base na harmonização de direitos, e, no caso, de isso ser necessário, na prevalência (ou relação de prevalência) de um direito ou bem em relação a outro (D1 P D2). Todavia, uma eventual relação de prevalência só em face das circunstâncias concretas se poderá determinar, pois só nestas condições é legítimo dizer que um direito tem mais peso do que o outro (D1 P D2)C, ou seja, um direito (D1) prefere (P) outro (D2) em face das circunstâncias do caso (C).[4]

E ensina Bonavides que:

 Uma das aplicações mais proveitosas contidas potencialmente no princípio da proporcionalidade é aquela que o faz instrumento de interpretação toda vez que ocorre antagonismo entre direitos fundamentais e se busca daí solução conciliatória, para a qual o princípio é indubitavelmente apropriado. As cortes constitucionais européias, nomeadamente o Tribunal de Justiça da Comunidade Européia, já fizeram uso freqüente do princípio para diminuir ou eliminar a colisão de tais direitos[5].

Destarte, tendo-se em vista o respeito a dignidade da pessoa humana, a falta de justificativa em submeter um ser humano e seus familiares a crueldade de um fim de vida humilhante e doloroso e embasado no próprio respeito a vida humana, a eutanásia piedosa é a medida mais justa que se impõe ao caso concreto.

Jussara Meirelles e Eduardo Didonet Teixeira ponderam que

"é possível entender que o acharnement subverte o direito à vida e, com certeza, fere o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, assim como o próprio direito à vida. Se a condenação do paciente é certa, se a morte é inevitável, está sendo protegida a vida? Não, o que há é postergação da morte com sofrimento e indignidade [...] Se vida e morte são indissociáveis, e sendo esta última um dos mais elevados momentos da vida, não caberá ao ser humano dispor sobre ela, assim como dispõe sobre a sua vida?[6]

CASOS SIMILARES E ABORDAGEM JURISPRUDENCIAL

Apesar de não existir casos que autorizaram a eutanásia piedosa em nossos precedentes jurisprudenciais, as posiões e discussões na doutrina e nos tribunais tem-se mostrado favorável ao seu uso em um futuro próximo.

Extrai-se da doutrina de Luis Flávio Gomes a seguinte:

Os Códigos Penais europeus, em geral, admitem a eutanásia passiva (desligar aparelhos) e punem a eutanásia ativa (código espanhol, art. 143.4; português, art. 134 etc.). No Brasil, neste momento, não há nenhuma disciplina jurídica específica sobre o assunto no Código Penal (quem pratica eutanásia, segundo a jurisprudência, responde por homicídio, eventualmente privilegiado). No Código de Ética dos Médicos há proibição expressa (art. 66). Apesar disso, sabe-se que é uma prática comum nas UTIs (Folha de S. Paulo de 20.02.05, p. C1). Na linha das tendências européias posicionou-se a Sub-Comissão de Reforma do Código Penal em 1994 (Alberto Silva Franco, Luíza Eluf, Paulo Sérgio Pinheiro e Jair Leonardo Lopes). Esse projeto de reforma do CP continua parado no Congresso Nacional.

Assim, devida a grande carga emocional que a situação da eutanásia provoca naqueles acompanham o triste estado do paciente e levando em conta a questão da morte piedosa como um ato de compaixão, a lei ainda que injusta, já reconheceu que o autor do fato responde por homicídio privilegiado, tendo uma pena mais branda do que aquele que comete homicídio por um motivo de natureza vil.

Nesse sentido, transcreve o anteprojeto do Código Penal Brasileiro:

Não constitui crime deixar de manter a vida de alguém por meio artificial, se previamente atestada por dois médicos, a morte como iminente e inevitável, e desde que haja consentimento do paciente, ou na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão[7].

A própria população brasileira tem se mostrado favorável a eutanásia piedosa, como demonstra os resultados da pesquisa abaixo, não havendo assim justificativa para vedar a faculdade de morte digna ao paciente,

São Paulo - A legalização da eutanásia foi amplamente aprovada pelos leitores que votaram na pesquisa promovida pelo estadao.com.br. O direito de o doente em estado terminal optar pela morte foi aprovado por 68% dos internautas[8].

Trazemos ao parecer para elucidação, casos análogos que tratam da situação da eutanásia e de seu caráter piedoso:

CASO JOÃO

O recepcionista Jeson de Oliveira, 35 anos, vai pedir autorização à Justiça para realizar eutanásia em seu filho, João, 4. O menino, que está internado em um hospital de Franca (SP) há quatro meses, é vítima de uma síndrome metabólica degenerativa que aos poucos está paralisando os movimentos de seu corpo. Segundo os médicos, não há chances de cura.

Segundo o jornal Comércio da Franca, que revelou o caso à imprensa, ele é alimentado por meio de uma sonda ligada diretamente a seu estômago e respira com ajuda de aparelhos. João ainda registra atividades cerebrais, mas não pode mais enxergar, não fala e não tem mais os movimentos do pescoço, braços e pernas.

Os médicos que cuidam do menino, internado no Centro de Terapia Intensiva (CTI) do Hospital Unimed, em Franca, disseram que a doença não tem cura e que a progressão natural é a morte. Entretanto, eles não têm previsão de quando isso possa acontecer.

Jerson justifica a decisão dizendo que seu filho não merece viver sofrendo. "É um garoto lindo, muito amado, mas que não tem o direito de acompanhar o nascer do sol... Não pode brincar, nunca vai saber o que é jogar futebol na rua ou brigar com os colegas de escola", lamentou.

"Ninguém sabe o que passo. É um sofrimento que não tem fim. Sei que é proibido, mas vou até o fim porque não agüento ver meu filho sem sorrir, brincar ou caminhar"(sem grifos no original)[9].

CASO TERRI SCHINDLER-SCHIAVO

Theresa Marie (Terri) Schindler-Schiavo, de 41 anos, que supostamente estava em processo de separação conjugal com seu marido, Michael Schiavo, teve uma parada cardíaca, em 1990, talvez devido a perda significativa de potássio associada a Bulimia, que é um distúrbio alimentar. Ela permaneceu, pelo menos, cinco minutos sem fluxo sanguíneo cerebral. Desde então, devido a grande lesão cerebral, ficou em estado vegetativo, de acordo com as diferentes equipes médicas que a tem tratado. Após longa disputa familiar, judicial e política, teve retirada a sonda que a alimentava e hidratava, vindo a falecer em 31 de março de 2005 [10]

CASO NANCY CRUZAN

Em 11 de janeiro de 1983, Nancy Cruzan, de 25 anos, casada, perdeu o controle de seu carro quando viajava no interior do estado de MIssouri;EUA. O carro capotou e ela foi encontrada voltada com rosto para baixo em um córrego, sem respiração ou batimento cardíaco detectável. Os profissionais de emergência que a atenderam foram capazes de recuperar as funções respiratória e cardíaca, sendo a paciente transportada inconsciente para o hospital. Um neurocirurgião diagnosticou a possibilidade de dano cerebral permanente devido a falta de oxigênio. O período de tempo de anóxia foi estimado em 10 a 12 minutos. Em média se estima que ocorram danos cerebrais permanentes com anóxia de 6 minutos ou mais.

A paciente ficou em coma por três semanas. O quadro evoluiu para um estado de inconsciência onde a paciente podia se alimentar parcialmente por via oral. Com a finalidade de facilitar a sua alimentação, foi introduzida uma sonda de alimentação. O seu marido autorizou este procedimento.  Em outubro de 1983, ou seja, dez meses após o acidente, ela foi internada em um hospital público. Todas as tentativas de reabilitação foram mal sucedidas, demonstrando que ela não teria possibilidade de recuperar a vida de relação. Os seus pais, que também eram considerados como seus representantes legais, em conjunto com o esposo, solicitaram ao hospital que retirassem os procedimentos de nutrição e hidratação assistida, ou seja a sonda que havia sido colocada. Os médicos e a instituição se negaram a atender esta demanda sem autorização judicial.

Os pais entraram na justiça do estado do Missouri solicitando esta autorização em junho de 1989. Um representante legal foi indicado para atuar durante o julgamento. O tribunal, em junho de 1990, após realizar audiências, ordenou à instituição que atendesse a demanda da família. Esta decisão se baseou em três argumentos básicos: no diagnóstico, na previsão legal desta demanda e na manifestação prévia da vontade pessoal da paciente. O diagnóstico de  dano cerebral permanente e irreversível, em conseqüência do longo período de anóxia, foi confirmado e não questionado. A lei do estado do Missouri e da Constituição norte-americana permitem que uma pessoa no estado da paciente pode recusar ou solicitar a retirada de "procedimentos que prolonguem a morte". Considerando que ela, aos vinte anos, tinha manifestado em uma conversa séria com uma colega de quarto, que se estivesse doente ou ferida, ela não gostaria de ser mantida viva, salvo que pudesse ter pelo menos metade de suas capacidades normais. Esta posição sugeriu que ela não estaria de acordo com a manutenção da hidratação e da nutrição nas suas condições atuais.

No túmulo de Nancy Cruzan consta a seguinte indicação:

Nascida em 20 de julho de 1957
Partiu em 11 de janeiro de  1983
EM PAZ EM 26 DE DEZEMBRO DE 1990[11]

DIREITO COMPARADO

EUTANÁSIA NA HOLANDA

Na Holanda a eutanásia é regulada, mas continua ilegal.

Desde 1990 o Ministério da Justiça e a Real Associação Médica Holandesa (RDMA) concordaram em um procedimento de notificação de eutanásia. Desta forma, o médico fica imune de ser acusado, apesar de ter realizado um ato ilegal.

A Lei Funeral (Burial Act) de 1993 incorporou os 5 critérios para eutanásia e os 3 elementos de notificação do procedimento. Isto tornou a eutanásia um procedimento aceito, porém não legal. Estas condições eximem o médico da acusação de homicídio.

Os cinco critérios estabelecidos pela Corte de Rotterdam, em 1981, para a ajuda à morte não criminalizável:

1) A solicitação para morrer deve ser uma decisão voluntária feita por um paciente informado;

2) A solicitação deve ser bem considerada por uma pessoa que tenha uma compreensão clara e correta de sua condição e de outras possibilidades. A pessoa deve ser capaz de ponderar estas opções, e deve ter feito tal ponderação;

3) O desejo de morrer deve ter alguma duração;

4) Deve haver sofrimento físico ou mental que seja inaceitável ou insuportável;

5) A consultoria com um colega é obrigatória.

O acordo entre o Ministério da Justiça e a Real Associação Médica da Holanda, estabelece 3 elementos para notificação:

1) O médico que realizar a eutanásia ou suicídio assistido não deve dar um atestado de óbito por morte natural. Ele deve informar a autoridade médica local utilizando um extenso questionário ;

2) A autoridade médica local relatará a morte ao promotor do distrito;

3) O promotor do distrito decidirá se haverá ou não acusação contra o médico.

Se o médico seguir as 5 recomendações o promotor não fará a acusação.

Em 1990, na Holanda ocorreram 11.800 mortes por eutanásia, suicídio assistido e overdose de morfina, perfazendo uma participação de 9% na mortalidade do país.

TIPO

Com consentimento

Sem consentimento

Total

Eutanásia ativa

2300

1000

3300

Suicídio assistido

400

-

400

Eutanásia por duplo efeito

3159

4941

8100

Total

5859

5941

11800

 

Em 1990, foram feitas 9000 solicitações de eutanásia ativa, mas somente 2300 foram atendidas por preencherem os critérios estabelecidos[12].

EUTANÁSIA NO URUGUAI

O Uruguai, talvez, tenha sido o primeiro país do mundo a legislar sobre a possibilidade de ser realizada eutanásia no mundo. Em 1º de agosto de 1934, quando entrou em vigor atual Código Penal uruguaio, foi caracterizado o "homicídio piedoso", no artigo 37 do capítulo III, que aborda a questão das causas de impunidade.

De acordo com a legislação uruguaia, é facultado ao juiz a exoneração do castigo a quem realizou este tipo de procedimento, desde que preencha três condições básicas:

ter antecedentes honráveis;

ser realizado por motivo piedoso, e

a vítima ter feito reiteradas súplicas.

A proposta uruguaia, elaborada em 1933, é muito semelhante a utilizado na Holanda, a partir de 1993. Em ambos os casos, não há uma autorização para a realização da eutanásia, mas sim uma possibilidade do indivíduo que for o agente do procedimento ficar impune, desde que cumpridas as condições básicas estabelecidas. Esta legislação foi baseada na doutrina estabelecida pelo penalista espanhol Jiménez de Asúa.

Vale destacar que, de acordo com o artigo 315 deste mesmo Código, isto não se aplica ao suicídio assistido, isto é quando uma pessoa auxilia outra a se suicidar. Nesta situação há a caracterização de um delito, sem a possibilidade de perdão judicial[13].

EUTANÁSIA NA COLÔMBIA

Segundo notícia recentemente publicada no Jornal a Folha de São Paulo, em 22.05.97, a Corte Constitucional da Colômbia autorizou a eutanásia em casos de doentes terminais e com o consentimento prévio do envolvido.

Segundo pesquisa publicada pelo Jornal "El Tiempo", de Bogotá(capital colombiana), 84% dos entrevistados apoiam a legalização da Eutanásia[14].

EUTANÁSIA NA AUSTRÁLIA

Nos territórios do Norte da Austrália, esteve em vigor de 1º de julho de 1996 a março de 1998, a prática da Eutanásia, ocasião que oportunizou a morte de quatro pessoas. Tal lei recebeu o nome de "Lei dos Direitos dos Pacientes Terminais".

Porém, para utilizar-se da lei, era necessário seguir o seguinte roteiro:

1.Paciente faz a solicitação a um médico;

2.O médico aceita ser seu assistente;

3.O paciente deve ter 18 anos, no mínimo;

4.O paciente deve ter uma doença que, no seu curso normal, ou sem a utilização de medidas extraordinárias, acarretará sua morte.

5.Não deve haver qualquer medida que possibilite a cura do paciente;

6.Não devem existir tratamentos disponíveis para reduzir a dor, sofrimento ou desconforto;

7.Deve haver a confirmação do diagnóstico e do prognóstico por um médico especialista;

8.Um psiquiatra qualificado deve atestar que o paciente não sofre de uma depressão clínica tratável;

9.A doença deve causar dor ou sofrimento;

10.O médico deve informar ao paciente todos os tratamentos disponíveis, inclusive tratamentos paliativos;

11.As informações sobre os cuidados paliativos devem ser prestadas por um médico qualificado na área;

12.O paciente deve expressar formalmente seu desejo de terminar com a vida;

13.O paciente deve levar em consideração as implicações sobre a sua família;

14.O paciente deve estar mentalmente competente e ser capaz de tomar decisões livres e voluntariamente;

15.Deve decorrer um prazo mínimo de sete dias após a formalização do desejo de morrer;

16.O paciente deve preencher o certificado de solicitação;

17.O médico assistente deve testemunhar o preenchimento e a assinatura do Certificado de Solicitação;

18.Um outro médico deve assinar o certificado atestando que o paciente estava mentalmente competente para livremente tomar a decisão;

19.Um interprete deve assinar o certificado, no caso em que o paciente não tenha o mesmo idioma e origem dos médicos;

20.Os médicos envolvidos não devem ter qualquer ganho financeiro, além dos honorários médicos habituais, com a morte do paciente;

21.Deve ter decorrido um período de 48 horas após a assinatura do certificado;

22.O paciente não deve ter dado qualquer indicação de que não deseja mais morrer;

23.A assistência ao término voluntário da vida pode ser dada[15].

CONCLUSÃO

Tendo-se em vista o principio da dignidade da pessoa humana, um dos pilares basilares do Estado Democrático Brasileiro (artigo 1°, inciso terceiro, da Constituição da República Federativa do Brasil) e o respeito a vida humana e a uma morte digna, a eutanásia piedosa e medida da mais justa aplicável nesses casos.

Notas:

[1] FERNANDES, Carolina Curi. A tutela do consumidor superendividado e o princípio da dignidade da pessoa humana. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2619, 2 set. 2010. Disponível em:<http://jus.uol.com.br/revista/texto/17312>. Acesso em: 19 set. 2010.

[2] WENDT, Emerson. Eutanásia. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1864>. Acesso em: 20 set. 2010.

[3] LUIS FLÁVIO GOMES. Caso Terri Schiavo. Eutanásia: dono da vida, o ser humano é também dono da sua própria morte? Disponível em: <http://www.lfg.com.br>. Acesso em: 19 set. 2010.

[4] Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Almedina, 1999, p.1189.

[5] BONAVIDES, Paulo. Controle Jurisdicional da Administração Pública. São Paulo: Dialética, 1999.

[6] BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Eutanásia, ortotanásia e distanásia:: breves considerações a partir do biodireito brasileiro. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7571>. Acesso em: 20 set. 2010.

[7] Anteprojeto do Código Penal, art. I21, § 4º .

[8] http://www.ciberacores.net/correiodahorta/2002/Julho/Opiniao2838.shtm.

[9] FOLHA DE SÃO PAULO. Eutanásia volta as manchetes. Disponível em: <http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI648322-EI306,00.html>. Acesso em: 19 set. 2010.

[10] UFRGS. Caso Terri Schiavo. Caso Terri Schiavo: Retirada de Tratamento. Disponível em: <http://www.ufrgs.br/bioetica/terri.htm>. Acesso em: 19 set. 2010.

[11] UFRGS. Caso Terri Schiavo. Caso Nancy Cruzan: Retirada de Tratamento. Disponível em: <http://www.ufrgs.br/bioetica/nancy.htm>. Acesso em: 19 set. 2010.

[12] CARNEIRO, Antonio Soares et al. Eutanásia e distanásia.: A problemática da Bioética. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1862&p=2>. Acesso em: 20 set. 2010.

[13] Idem.

[14] Idem.

[15] COELHO, Milton Schmitt. Eutanásia: uma análise a partir de princípios éticos e constitucionais. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/lista.asp?assunto=645>. Acesso em: 20 set. 2010.