Assédio Moral: desarmonia e mal-estar no ambiente de trabalho


Porwilliammoura- Postado em 21 março 2012

Autores: 
OLIVEIRA, Claudinéa Silva de

 

Assédio Moral: desarmonia e mal-estar no ambiente de trabalho


Claudinéa Silva de Oliveira

Advogada, bacharel em Direito pela Faculdade de Minas (FAMINAS) campus Muriaé/MG, pós graduada em Direito Civil, Processual Civil com ênfase em Direito do Consumidor; pós-graduada em Direito do Trabalho, Processual do Trabalho e Previdência Social pela Universidade Castelo Branco.

Inserido em 14/03/2012

Parte integrante da Edição no 966

Código da publicação: 2498

 


RESUMO – Assédio moral são maus-tratos aplicados reinteradamente aos indivíduos nas organizações, emanados de uma perversidade na relação de poder encontrada nesses locais. A expressão assédio moral deixou de ser recente no universo do trabalho e a razão norteadora do esclarecimento desse instituto justifica-se pela importância do ser humano no contexto organizacional, buscando conhecer os motivos pelos quais tais práticas comportamentais persistem na atualidade e soluções para se alcançar uma coexistência harmônica e produtiva dos indivíduos no ambiente de trabalho.

PALAVRAS-CHAVE: Assédio Moral. Assédio Moral no Trabalho. Indenização.

INTRODUÇÃO

Analisando a evolução da valorização do trabalho humano no desenvolvimento da história da humanidade, vislumbra-se que a cada época correspondia um valor social. No decorrer dos tempos, as mudanças se deram pela influência da economia, da política e da conjuntura social de determinado período histórico. Assim, a cada momento da História, valores morais, sociais e econômicos determinavam o rumo da sociedade. É certo que, o Direito precisa acompanhar tais evoluções, para que as leis e os postulados supram as necessidades da sociedade.

Atualmente, há um acúmulo de mudanças estruturais em todos os aspectos sociais, principalmente no âmbito das relações humanas. Os valores sociais, políticos, éticos, morais, econômicos estão em constantes transformações. Não diferentemente, as relações de trabalho e os valores derivados dessas relações também sofrem mutações significativas e grande parte dessas transformações decorrem do fenômeno da globalização.

No que tange à flexibilização dos direitos trabalhistas, as alterações são muito preocupantes, visto que estamos numa época que, em alguns casos, nem mesmo as mais básicas condições de trabalho estão sendo respeitadas ferindo um dos maiores pilares da nossa Lei Maior, qual seja, o princípio da dignidade da pessoa humana.

Além do aspecto econômico, as mudanças ocorridas na organização do trabalho introduzem determinados fatores, dentre eles o assédio moral, que afeta direta ou indiretamente o ambiente e as condições de trabalho.

Hodiernamente, o desemprego e as suas consequências assustam a sociedade e a competição desenfreada é um fator preocupante que merece atenção. Frise-se que é uma competição desumana onde, na maioria das vezes, não se confere ao trabalhador nenhuma garantia de sua dignidade, muitas vezes a uma renúncia total. Com efeito, esse ambiente de trabalho opressivo tende a gerar empregados insatisfeitos, estressados, improdutivos e com saúde debilitada.

É sabido que a satisfação no trabalho e no ambiente que este envolve contribui para uma vida saudável, tanto pessoal quanto profissional. A contraprestação é importante e necessária, mas a valorização do trabalho e do trabalhador está no ápice.

Insta salientar que a prevenção ao assédio moral deve fazer parte de uma política geral de prevenção de riscos profissionais, pois a saúde no trabalho, principalmente a psíquica, é um direito fundamental dos empregados e garantia de sucesso para a empresa.

Observar-se que, no decorrer dos anos, o pleito de indenizações referentes ao assédio moral vem crescendo assustadoramente, mas é importante ressaltar que os Tribunais estão delimitando o conceito de assédio, pois este não pode ser confundia com dissabores do cotidiano, tampouco com o estresse, a pressão profissional, a sobrecarga de trabalho e as exigências modernas de competitividade e qualificação. Nesse ínterim, só ocorrerá o assédio moral quando se vislumbrar a intenção de humilhar, desmoralizar ou perseguir um “alguém” em particular e de forma repetitiva, pois uma atitude isolada não configura o assédio, podendo, no máximo, caracterizar uma hipótese de dano moral.

ASSÉDIO MORAL

O assédio moral remonta tempos imemoriais, porém toda a humanidade conviveu silenciosamente com esse fenômeno pouco discutido na Antiguidade. Considerado um terror psicológico, o assédio moral é destruidor das relações sociais, especialmente no ambiente de trabalho.

Luciana Santucci (2006) esclarece que o assédio moral é conhecido em todos os campos, quais sejam, familiar, escolar, entre amigos, colegas, relacionamentos e em todos os povos, cada qual com seu próprio juízo de valor e sua denominação pode variar de acordo com cada país. Na Itália, Alemanha e países escandinavos, por exemplo, o fenômeno é conhecido como mobbing; na Inglaterra e Estados Unidos, como bullying; nos países de Língua espanhola é conhecido como acoso moral ou psicológico e nos países de língua portuguesa o fenômeno foi denominado assédio moral. No entanto, segundo Leymann (apud GUIMARÃES, 2006, p. 184), “o termo mobbing deve ser aplicado a adultos no contexto ocupacional e o termo bullying aplicado a crianças e adolescentes, no contexto escolar, sendo, preferencialmente, uma forma de violência física”. 

Os estudos sobre os maus-tratos aplicados aos indivíduos em nosso país não são recentes. No período da escravidão, os trabalhadores se deparavam com atrocidades, tais como: humilhações, castigos, mortes, privações, separações familiares, perseguições etc. Com a substituição da mão-de-obra escrava pelo trabalho dos imigrantes, o resultado não foi muito diverso, pois se observava o descumprimento dos contratos, crimes de assédio moral e sexual, bem como maus-tratos. No período da industrialização brasileira, as relações de trabalho ainda apresentavam-se precárias, pois não havia o reconhecimento do direito dos empregados, havia uma extensa carga horária de trabalho, a falta de assistência médica, a ilegalidade do trabalho da mulher e do menor e a inexistência de métodos preventivos de acidentes (AGUIAR, 2006).

Atualmente, apesar de todo aparato tecnológico em termos de produção e o avanço na área administrativa, os empregados ainda sofrem maus-tratos ou, pelo menos, suportam comportamentos humilhantes como o denominado assédio moral.

Não existem explicações óbvias, mas, sim, um conjunto de sentimentos que começam pela recusa de uma diferença, um comportamento no limite da discriminação. 

A caracterização do assédio moral é subjetiva. Depreende-se que o elemento comum, além da finalidade de exclusão, é a modalidade da conduta, que se verifica agressiva e vexatória, sendo capaz de constranger a vítima, trazendo sentimento de inferiorização, humilhação, afetando, principalmente, a sua auto-estima.

No magistério de Rodolfo Pamplona Filho:

“O assédio moral pode ser conceituado como uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica do indivíduo, de forma reiterada, tendo por efeito a sensação de exclusão do ambiente e do convívio social”. (PAMPLONA, 2006, p.1)

Segundo entendimento de Luciana Santucci (2006, p. 18), assédio moral é a “manipulação perversa, terrorismo psicológico, mobbing ou harcèlemente moral”. A expressão mobbing tem o vocabulário derivado do verbo to mob e significa cercar, assediar, agredir, atacar. Na literalidade, é tipo de agressão praticada por um animal, que se sentindo ameaçado, provoca fuga do inimigo pelo pavor de ser atacado e morto. Assim, no assédio moral, a vítima se sente ameaçada, obrigada a se recolher intimamente ou abandonar o ambiente ameaçador.

ASSÉDIO MORAL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO

O assédio moral nas relações de trabalho é um fenômeno típico da sociedade atual, perfazendo-se um problema de amplitude global, variando de local para local, o que acaba dificultando sua definição.

Segundo entendimento de Marie-France Hirigoyen (2006), por assédio em um local de trabalho entende-se toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se, sobretudo, por comportamentos, atos, palavras, gestos, escritos que possam trazer dano à dignidade, à personalidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho.

Carmen Feijó (2007), na matéria especial: assédio moral na Justiça do Trabalho divulgada no TST (Tribunal Superior do Trabalho) conceitua o assédio moral como violência psicológica, constrangimento e humilhação, sendo estes os ingredientes básicos para a definição do quadro inerentes às relações humanas, sobretudo no mundo do trabalho.

Na década de 1980, o conceito de mobbing foi popularizado pelo psicólogo do trabalho Heinz Leymann, alemão, radicado na Suécia, considerado o “pai do mobbing”. Os estudos e resultados por ele trazidos relacionaram a conduta humana nas organizações laborais. Nesse escopo, Leymann (apud GUIMARÃES, 2006, p. 185) definiu como o fenômeno no qual uma pessoa ou grupo de pessoas exerce violência psicológica extrema, de forma sistemática e recorrente e durante um tempo prolongado – por mais de seis meses e que os ataques se repitam numa frequência média de duas vezes na semana – sobre outra pessoa no local de trabalho, com a finalidade de destruir as redes de comunicação da vítima ou vítimas, destruir sua reputação, perturbar a execução de seu trabalho e conseguir finalmente que essa pessoa ou pessoas acabem abandonando o local de trabalho.

Rodolfo Pamplona Filho (2006, p.3) conceituou o assédio moral como “uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica do indivíduo, de forma reiterada, tendo por efeito a sensação de exclusão do ambiente e convívio social”. Assim sendo, o emérito doutrinador extraiu deste conceito quatro elementos caracterizadores, quais sejam: a) conduta abusiva; b) natureza psicológica do atentado à dignidade psíquica do indivíduo; c) reiteração da conduta; d) finalidade na exclusão. Nessa trilha, a conduta do agressor deve extrapolar o aceitável e adentrar-se ao campo do abuso de direito; a prática dos atos deve violar algum dos direitos inerentes à pessoa humana, especialmente no que tange à dignidade psíquica; a prática de condutas deve ser reiterada; o elemento anímico, no assédio moral, não deve ser desprezado, ou seja, a pretensão e a finalidade de exclusão da vítima do ambiente devem ser sopesadas.

Sônia Mascaro Nascimento (2009) esclarece que o arco temporal deve ser suficientemente longo para que cause um impacto real e de verdadeira perseguição do assediador.

Ultimamente, não se fala em dias, meses, porém se constatou que o assédio moral, em regra, configura-se no prazo de 1 a 3 anos, o que não deve servir de parâmetro, visto que o assédio pode ser verificado em tempo mais exíguo, dependendo do tempo em que o dano levar para se instalar. Com efeito, para que se caracterize o assédio moral, tais elementos devem ser considerados e avaliados no caso concreto.

Delimitando o amplo conceito de assédio moral, Guimarães (2006) esclarece que devem ser excluídas do diagnóstico de mobbing as seguintes situações: o estresse causado pela premência de tempo na execução de algum trabalho ou a competitividade empresarial existente, ter um mau dia, manter conflito com um colega e sofrer por causa de um chefe exigente ou perfeccionista. Ficam também descartados os atritos habituais, as tensões e os incidentes isolados que são próprios das organizações modernas, nas quais o incremento do grau de interdependência entre os atores leva a numerosas situações de desencontro.

Hirigoyen (2005) exclui como pressuposto ao pleito do assédio moral o estresse, as virtudes do conflito, a gestão por injúria, as agressões pontuais, as más condições de trabalho, as imposições profissionais e outras formas de violência. 

O assédio deve ser distinguido do estresse profissional, pois este é um estado biológico e que as situações sociais e sócio-psicológicas o geram. Assim, em linguagem corrente, entende-se por estresse as sobrecargas e más condições de trabalho. O estresse só se torna destruidor pelo excesso, mas o assédio é destruidor por si só.

Quanto às virtudes do conflito, este é fonte de renovação e de reorganização, obrigando a se reconsiderar e a se funcionar sob novas formas e, sob esse prisma, as recriminações são faladas. O assédio moral, por sua vez, reside no fato de que nenhum conflito pôde ser estabelecido.

A renomada doutrinadora Hirigoyen (2005, p. 28) aduz que se denomina gestão por injúria “o tipo de comportamento despótico de certos administradores, despreparados, que submetem os empregados a uma pressão terrível ou os tratam com violência, injuriando-os e insultando-os, com total falta de respeito”. Por outro lado, os procedimentos de assédio moral são vedados, a violência é notada por todos e os dirigentes tirânicos às vezes também utilizam procedimentos perversos que consistem em colocar pessoas umas contra as outras.

Conforme enfatizado alhures, o assédio moral caracteriza-se, antes de tudo, pela repetição. São palavras, atitudes, comportamentos que, a princípio, podem parecer inofensivos, mas cuja repetição e sistematização os tornam destruidores.

Uma agressão verbal pontual, a menos que tenha sido reiterada, é um ato de violência e pode ser apenas uma expressão de reatividade e impulsividade. O assédio, ao contrário, é uma agressão perpétua.

No que tange às más condições de trabalho, deve-se observar a intencionalidade. Trabalhar em um espaço exíguo, mal-iluminado e mal-instalado não constitui, por si só, um ato de assédio, salvo se um único funcionário for tratado especificamente assim ou tais condições destinarem-se a desmerecê-lo. A dificuldade de diferenciação reside no fato de que, no caso de assédio moral, a degradação é feita progressivamente, sem que a vítima perceba e possa julgar em que momento suas condições de trabalho se tornaram deterioradas. Nesse ínterim, as más condições de trabalho são de competência dos fiscais do trabalho, que devem ir ao local para verificar e punir.

Ressalte-se que existem várias outras formas de violência que não podem ser consideradas assédio moral e, como exemplo, destaca-se a violência externa, física, sexual etc., pois estas já estão devidamente positivadas não entrando no registro do assédio moral.

Com a atitude perversa do assédio moral no local de trabalho, surgem 03 (três) sujeitos determinados, quais sejam: o agressor, os espectadores e a vítima.

O agressor é a pessoa que agride, é o invasor, o sujeito perverso que, estrategicamente, utiliza e depois destrói o outro sem o sentimento de culpa.

No magistério de Santucci (2006, p.23), os espectadores “são pessoas, colegas, superiores, encarregados da gestão de pessoal, que, querendo ou não, de algum modo participam dessa violência e a vivenciam, mesmo que por reflexo”. Vale ressaltar que, há dois tipos de espectadores: os ativos e os passivos. Estes, simplesmente presenciam, sem alterações de qualquer natureza, aqueles, contribuem com o agressor, pronunciam palavras ou gestos que demonstram coadunar com as atitudes do agressor, levam avante a humilhação, enquanto aqueles são considerados adversários indiretos da vítima, contribuindo com o verdadeiro agressor a destruí-la rapidamente.

Nos casos concretos, observa-se que as vítimas são aquelas pessoas que, de certa forma, incomodam o agressor. Em regra, são pessoas responsáveis, ingênuas em acreditar sempre nas outras pessoas, são bem educadas e possuidoras de valiosas qualidades profissionais. Santucci (2006) acrescenta que a vítima, na maioria das vezes, é escolhida por ter algo a mais e é justamente esse algo a mais que o agressor busca atingir.

CAUSAS E TIPOS DE ASSÉDIO MORAL 

Desde os primórdios, observa-se a perversidade do ser humano e, em análise ao velho ditado “o homem é o lobo do homem”, conclui-se que, desde que o homem passou a viver em sociedade, a figura do assédio moral é percebida. 

Vários são os motivos que levam uma pessoa à prática desse fenômeno. Como exemplos, Santucci (2006), esclarece que a competitividade desenfreada, o individualismo exacerbado, o medo de perder o emprego, a resistência do novo, são algumas razões para a prática do mobbing.

No que tange aos tipos de assédio, a corrente majoritária de doutrinadores e estudiosos do assédio moral coaduna com a existência de três tipos de assédio: ascendente, horizontal e descendente.

O assédio moral ascendente configura-se quando uma pessoa que pertence a um nível hierárquico superior da organização se vê agredida por um ou vários subordinados. Em regra, o início se dá quando alguém é introduzido na empresa em um cargo superior e seus métodos não são aceitos pelos trabalhadores veteranos ou porque o cargo por esta pessoa ocupado é desejado por algum deles. Outra hipótese seria aquela em que um (a) trabalhador (a) alcança um cargo de responsabilidade em virtude do qual se outorga a capacidade de organizar e comandar seus antigos companheiros de atividade. Nesse norte, o mobbing pode ser culminado contra aqueles chefes que se mostram autoritários e arrogantes no contato interpessoal.

Noutro giro, o assédio moral horizontal caracteriza-se quando o (a) trabalhador (a) é assediado por um companheiro com o mesmo nível hierárquico, mas esse nível pode ser de fato, superior. Cumpre ressaltar que o convívio em grupo é um processo dificultoso e, por vezes, pode ocasionar problemas puramente pessoais ou alguns membros do grupo não aceitam as normas de funcionamento tacitamente ou expressamente aceitas pelos demais. Outra circunstância é a existência de pessoas frágeis seja física ou psicologicamente, sendo estas diferenças exploradas pelos demais.

E, por derradeiro, o assédio moral descendente é o mais habitual e caracteriza-se por um comportamento no qual a pessoa que detém o poder, através de insultos e ofensas, falsas acusações, depreciações, agride a esfera psicológica do trabalhador hierarquicamente inferior para se destacar frente aos demais subordinados. Frise-se que o objetivo maior pode ser o abandono “voluntário” de uma pessoa sem recorrer à demissão legal, o que deflagraria em economia nas verbas trabalhistas para a empresa. (GUIMARÃES, 2006).

FASES E CONSEQUENCIAS DO ASSÉDIO MORAL

É abstruso determinar uma série fixa de fases e estabelecer uma sequência típica de fatos. Heinz Leyman (apud, GUIMARÃES, 2006), desenvolveu, a partir de suas experiências como psicólogo, quatro fases que assim se configuram:

1ª) Fase de conflito: são conflitos interpessoais que poderiam ser resolvidos através de diálogo, envolvem pessoas com interesses e objetivos distintos gerando problemas pontuais, choques, atritos que, vultuosamente, desencadeiam em ponto de partida para os enfrentamentos;

2ª) Fase de mobbing ou de estigmatização: exatamente nesta fase o assediador humilha a vítima, utiliza-se de uma série de comportamentos perversos e reiterados com o intuito de ridicularizar e isolar socialmente a vítima;

3ª) Fase de intervenção na empresa: o conflito é percebido pela direção da empresa através do departamento de recursos humanos ou pela direção pessoal. Se não se tratar de problemática da própria empresa, a solução do conflito poderá ser positiva ou negativa. Nesta, a direção somente encara a vítima como um problema sem se preocupar com a origem dos desentendimentos. Naquela, por sua vez, a direção da empresa realiza uma investigação pormenorizada, decidindo transferir o (a) trabalhador (a) ou o (a) assediador (a) para outro posto de trabalho, descobrindo estratégias para que o impasse não mais ocorra;

4ª) Fase de marginalização ou exclusão da vida laboral: como última e extrema fase, esta se encerra com a vítima abandonando seu emprego depois de haver suportado conseqüências deletérias para sua saúde, ter solicitado vários períodos de licença, mudança do local de trabalho etc. Excepcionalmente, os (as) trabalhadores (as) assediados (as) podem chegar ao suicídio.

Para que a vítima possa ser devidamente ressarcida numa eventual reclamação trabalhista, é importante o estudo das conseqüências do assédio moral e a lesão por ele causada.

Por fim, as consequências geradas pelo assédio moral não se limitam à saúde do trabalhador, mas também à esfera social da vida do empregado, trazendo consequências econômicas para o obreiro, para a empresa e para a sociedade.

No que se refere à consequência econômica, o processo de assédio moral quase sempre se encerra com a saída da vítima do emprego num estado de saúde tão debilitada, dificultando a sua recolocação no mercado de trabalho. Por outro lado, a empresa também acaba sentindo os reflexos na produtividade, ou seja, altos custos com a baixa produtividade, na diminuição dos benefícios e na seleção e formação de pessoal substituto. (FERREIRA, 2004)

Restou provado, cientificamente, que um trabalhador submetido à violência psicológica tem um rendimento inferior a 60% em termos de produtividade e eficiência, em relação a outros trabalhadores, e o seu custo para o empregador é de 180% a mais. (SANTUCCI, 2006).

Insta salientar que também existem consequências para o Estado, este paga um alto custo tanto no que diz respeito à saúde pública quanto no que concerne a aposentadorias precoces.

Quanto à pessoa do obreiro, o estado psicológico do empregado exposto a humilhações o torna uma pessoa fragilizada, irritada, sensível e, muitas vezes, agressiva. Ademais, o isolamento acompanha-o fora do ambiente de trabalho, inexistindo convívio social com a família e amigos.

O assédio moral não se confunde com o estresse, ressalvando-se que este pode transformar-se naquele, dependendo do grau de agressão e exposição da vítima.

Segundo Hádassa Dolores Bonilha Ferreira (2004), o resultado de toda essa reação orgânica se traduz em palpitações, insônia, extremo cansaço, ansiedade, irritabilidade, dores de cabeça, problemas digestivos etc. Quando o organismo não consegue estabelecer uma forma de defesa, surge uma segunda fase denominada descompensação, onde o obreiro pode perder a identidade ou mesmo praticar o suicídio, que é a atitude mais extrema e já identificada em alguns casos de assédio. Nessa trilha, dimensionar corretamente as consequências geradas na vítima, seja de ordem física, social ou econômica, ajudará o aplicador do Direito traçar a forma na qual a vítima deve ser ressarcida e descobrir o limite para a indenização pleiteada.

Sônia Mascaro Nascimento (2008) ressalta que a prova técnica para a constatação do dano deve ser produzida por perito da área médica, sem o que não há que se falar em assédio moral, eis que estaria ausente um pressuposto essencial. Reitera, nesse diapasão, que é requisito essencial a existência do dano psíquico, emocional ou psicológico.

A PREVENÇÃO

É imprescindível que exista uma regulamentação sobre o assédio moral no ambiente do trabalho para lembrar a existência de sanções e responsabilizar os agressores, mas ela não será capaz de açambarcar todas as situações existentes. Nessa trilha, sempre existirão os indivíduos inclinados a descumprir a legislação ou conseguirão utilizá-las em benefício próprio. Assim, é preciso agir com antecedência, estimulando as empresas e o poder público a adotar políticas de prevenção eficazes.

Quando se caracteriza o assédio moral, geralmente a vítima tem sua saúde afetada e, frequentemente, não há alternativa senão afastá-la do trabalho. Essa medida visa proteger a vítima, mas caracteriza um fracasso porque mostra que não se conseguiu agir a tempo, além de não estar evitando futuros casos de assédio. Ademais, são situações difíceis de resolver, pois passa do individual ao coletivo.

Hirigoyen (2006, p.200) aduz que “a prevenção do assédio moral deve fazer parte de uma política geral de prevenção de riscos profissionais, pois a saúde no trabalho, inclusive a saúde psíquica, é um direito fundamental dos empregados”.

Os dirigentes das empresas não podem negar e ignorar a existência do fenômeno. Assim, devem rever os métodos de gestão, deles extirpando o que contiverem violência visível ou oculta, pois as direções tendem a negar quando são alertadas sobre algum problema do assédio moral.

Liderar os subordinados com respeito pode evitar diversos problemas de mal-estar na empresa, melhorando a produtividade individual e consequentemente coletiva.

As empresas que se preocupam com o bem-estar de seu pessoal conseguem melhores resultados do que aquelas que se baseiam no controle através do medo e do estresse.

O primeiro passo da prevenção seria conscientizar e educar as pessoas para que sejam corretas com os seus companheiros de trabalho. Para que isso ocorra, a empresa deve discutir normas de bom comportamento e definir o que é tolerável e estabelecer limites e prever as possíveis consequências para os atos não suportados.

Dentro da política da empresa, far-se-á necessário rever o conceito de subordinação, para se averiguar o que é admissível ou não nas relações entre superiores hierárquicos e subordinados. Nesse norte, o poder disciplinar dá aos diretores a possibilidade de punir quem não se submeter ao seu poder de comando.

Hirigoyen (2005, p.325), com maestria, demonstrou como pode ser articulada intervenção em uma empresa:

• Primeira etapa

Informação e sensibilização de todos os empregados sobre a realidade do assédio moral por meio de um grande debate público. Ensinar os trabalhadores como se pode chegar a situações de assédio moral e esclarecer os recursos disponíveis através de uma publicação onde estarão resumidos os direitos das pessoas dentro da empresa.

• Segunda etapa

Formação de especialistas internos através de um treinamento incluindo recentes pesquisas realizadas sobre o assédio, a fim de incitar discussões em grupo e reflexões com o objetivo de instalação de cédulas de escuta dos empregados, fora da hierarquia e obrigadas a sigilo.

• Terceira etapa

Treinamento de funcionários dos Departamentos de Recursos Humanos quanto às providências a adotar para prevenir o assédio moral, detectá-lo ou administrar os casos já existentes, reagir corretamente sempre que alguém se queixar de estar sendo assediado.

• Quarta etapa

Redação de uma agenda social, sendo interessante fundir em um só texto as disposições concernentes ao assédio moral, ao assédio sexual e às discriminações, sendo o texto distribuído nominalmente a cada empregado.

É a oportunidade em que a empresa faz lembrar seus valores mais essenciais e esclarece quais são as sanções previstas para os transgressores.

No texto da agenda social é importante destacar uma definição clara do que é o assédio moral (sexual e discriminação), estabelecendo quais pessoas podem ser procuradas na hipótese de alguém se sentir vítima. Os procedimentos devem ser confidenciais, simples e oferecer opções.

Cumpre ressaltar que, deve-se tornar bem claro que as falsas alegações serão severamente punidas.

As pequenas empresas, por sua vez, podem organizar um treinamento similar através do médico do trabalho, reunindo os trabalhadores dos diversos setores para um seminário informativo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A evolução do Direito é reflexo dos costumes da sociedade em determinado momento histórico. Assim, o assédio moral no ambiente de trabalho não é um fenômeno novo, pelo contrário, é tão antigo quanto o próprio trabalho. Porém, nos derradeiros anos, o instituto vem chamando a atenção por provocar numerosos debates, reflexões e estudos.

Hodiernamente, observa-se maior ocorrência do assédio moral descendente e este se caracteriza por um comportamento no qual o empregador ou seu preposto, que detém o poder, através de insultos, ofensas, falsas acusações, depreciações, agride a esfera psicológica do trabalhador hierarquicamente inferior. 

Demonstra-se que, ao contrário do assédio sexual, já tipificado no Código Penal, o assédio moral ainda não faz parte do ordenamento jurídico brasileiro e que o número de pleitos vêm crescendo assustadoramente na Justiça do Trabalho.

Cumpre ressaltar que, no ambiente de trabalho, as relações entre empregador e obreiro são dinâmicas, uma vez que as obrigações das partes se desdobram em prestações sucessivas. O primeiro exerce o poder diretivo e o segundo obedece. Assim, o cotidiano é marcado por estresses, agressões ocasionais, imposições, gestão por injúria e conflito de interesses.

Há divergências entre empregado e empregador, mas estas devem ocorrer dentro de um clima de respeito mútuo, pois é algo normal e até construtivo pela existência de discussões e consenso entre as pessoas envolvidas em um mesmo projeto. Porém, o que não pode ocorrer é que, por detrás das divergências, aflore o desrespeito, a perseguição e a violência.

O assédio moral é uma situação em que o trabalhador é exposto a situações humilhantes, constrangedoras, vexatórias durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções.

Devido a não positivação, a conceituação do assédio moral, bem como suas consequências ainda são matérias controversas, mas pacificou-se no sentido de que, para que haja o assédio, a conduta deve ser repetitiva. Assim, os Tribunais do Trabalho têm decidido no sentido de que uma única ocasião e, se ademais, não teve também a finalidade de excluir o obreiro, não configura assédio moral por parte do empregador, o que não exclui, frise-se, a configuração do dano moral, igualmente indenizável, porque para a caracterização do dano moral não se requer os elementos demonstrados alhures. Entretanto, deverão se encontrar presentes os requisitos elencados nos artigos 186 e 927, caput, do Código Civil, quais sejam, dano, nexo causal e vinculação da conduta antijurídica do empregador que vão ao encontro ao disposto na teoria da responsabilidade objetiva. Assim, com espeque nesta fundamentação jurídica, o requerente receberia a indenização referente aos danos morais e não referente ao assédio moral.

Denota-se que, os recentes julgados demonstram que, as ações referentes ao assédio moral estão crescendo no decorrer dos anos, mas os eméritos julgadores estão analisando minuciosamente o conjunto probatório para que não haja a banalização do instituto assim como ocorreu com os pleitos de indenização por dano moral na Justiça Comum.

Merecendo aplausos, os Tribunais, através das suas Turmas, vêm considerando lícita a gravação da conversa pelos obreiros. Ademais, mostra-se razoável, pois a gravação é uma das formas de demonstrar as alegações quando não a única.

Por derradeiro, para evitar os conflitos na seara trabalhista, é indubitavelmente importante que a empresa, por meio de métodos de gestão, dê o exemplo de modo transparente de funcionamento que permita a todos agir de maneira sadia. Se a empresa respeitar verdadeiramente as pessoas que compõem o grupo, isto terá uma aura positiva sobre o comportamento desses indivíduos.

A prevenção a todas as formas de desvios relacionais pode produzir valor agregado e resultados, pois em estruturas sólidas e sadias, o assédio moral não tem lugar.

REFERÊNCIAS

AGUIAR, André Luiz Souza. Assédio moral: o direito à indenização pelos maus-tratos e humilhações no ambiente do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006.

FEIJÓ, Carmen. Matéria especial: Assédio moral na Justiça do Trabalho. Disponível em: http://tst.gov.br. Acesso em: 01 abr. 2007.

FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha. Assédio moral nas relações de trabalho. Campinas: Russell Editores, 2004.

GUIMARÃES, Liliane Andolpho Magalhães. “Mobbing” (Assédio Psicológico) no trabalho: uma síndrome psicossocial multidimensional. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Brasília, Mai-Ago 2006, Vol. 22, n. 2, pp.183-192.

HIRIGOYEN, Marie-France. Assédio moral: a violência perversa do cotidiano. – 8ª ed. – Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006

__________. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral. 2 ed. – Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.

NASCIMENTO, Sônia Mascaro. Assédio moral no trabalho. Disponível em: http://www.roraimaemfoco.com/nossos-arquivos/5248-artigo-asso-moral-no-t.... Acesso em 10 nov. 2009.

OLIVEIRA, Francisco Antônio de. Ações de assédio moral ganham espaço. RT Informa. Ano VIII. Nº 48. Março/Abril 2007. Editora Revista dos Tribunais.

PAMPLONA FILHO. Rodolfo. Noções conceituais sobre o assédio moral na relação de emprego. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1149, 24 ago. 2006. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8838. Acesso em: 27 mar. 2007.

SANTUCCI, Luciana. Assédio moral no trabalho. Belo Horizonte : Leiditathi, 2006.

SILVA, Jorge Luiz de Oliveira da. Assédio moral no ambiente de trabalho. Rio de Janeiro: Editora e Livraria Jurídica do Rio de Janeiro, 2005.

Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região. Site oficial: http://www.mg.trt.gov.br. Consultas em: http://as1.mg.trt.gov.br/jurisprudencia. Acesso em: 15 set. 2009.

Data de elaboração: julho/2009