Audiência: da obrigatoriedade a faculdade.


PorGisele Leite- Postado em 12 janeiro 2017

Autores: 
Gisele Leite

Audiência: da obrigatoriedade a faculdade.

 

 

A audiência ao tempo das Ordenações não se apresentava como ato processual e, sim, como ato coordenador da atividade forense em geral. Cumpria aos juízes da época designar uma ou mais audiências semanais, conforme exigisse o pronto expediente das causas (Ord., Livro 1, Tít. 65 §4º).

 

Inicialmente em seus primórdios a audiência significou a sessão em que o juiz pessoalmente ouvia as partes, seja pessoalmente ou através de seus procuradores, deferia seus requerimentos, proferia sua decisão sobre questões de fácil, de pronta solução e ainda publicava suas sentenças, fossem interlocutórias ou definitivas.

 

No inicio, os romanos, tal qual inúmeros outros primitivos povos, faziam mesmo justiça com as próprias mãos, defendiam literalmente o direito pela força. Mais tarde, e através de extensa evolução, é que houve a passagem da justiça privada para a justiça pública. Aventa-se até que a referida evolução ocorrera em quatro fases, a saber:

 

A primeira fase notabilizada pela vingança privada havia o predomínio da Lei de Talião (olho por olho, dente por dente), estabelecida ainda na Lei das XII Tábuas;

 

A segunda fase é a do arbitramento facultativo que durou por toda a evolução do direito romano, pois sempre se admitiu que os conflitos individuais fossem resolvidos por árbitros escolhidos sem a interferência do Estado e, através da eleição dos litigantes.

 

A terceira fase foi a do arbitramento obrigatório que compreendeu o sistema de ações da lei e do processo formulário, quando o Estado passou a obrigar o litigante a escolher o árbitro que determinasse a indenização a ser paga pelo ofensor e, também passou a assegurar a execução da sentença, se porventura, o réu não quisesse cumpri-la.

 

Por tal razão, vigorou o ordo indiciorum privatorum[1], a ordem dos processos civis, onde a instância se divida em duas etapas sucessivas, a saber; a in iure (a que se desenrolava no tribunal do magistrado);

 

E, a segunda etapa apud iudice (que se processava diante do iudex, que era um particular escolhido pelos litigantes para julgar o processo).

 

Existem controvérsias sobre a exata data em que surgiu em Roma, tal divisão. A maioria dos estudiosos entende que é datada da República, uma vez que, na realeza, o processo se desenrolava apenas diante do rei, que julgava as divergências entre particulares, as lides.

 

Enfim, a quarta e última fase foi a da justiça pública que compreendeu o processo extraordinário, onde a instância se desenrolava inteiramente diante de um juiz que era funcionário do Estado, conforme ocorre em nossos dias.

 

A legis actio sacramenti in personam, também se caracterizou por ser um rito solene e simbólico, diferenciando-se apenas no seu objeto, que correspondia à cobrança de crédito e, nas asserções fórmulas desenroladas durante a audiência.

 

Diferenciava-se também pelo fato de ser uma legis actiones[2] não abstrata, pois deveria indicar a causa da qual se afirmava derivar a obrigação.

 

Basicamente, a audiência da actio sacramenti in personam consistia na afirmação pelo demandante, a intentio que a outra parte lhe devia determinada obrigação.

 

E, diante de tal asserção, o réu poderia não comparecer perante o juiz, o iudex, ou confessar a dívida, hipóteses que o equiparavam à situação do vencido (iudicatus). Caso o réu contestasse a intentio, o autor pronunciava o desafio do sacramentum.

 

Esclareça-se que na actio sacramenti in rem a posição jurídica do autor era definida somente em relação à coisa vindicada, tornando-se indiferente a pessoa do réu, enquanto que na actio sacramenti in personam, ocorre a precisa individuação da pessoa do réu na declaração inicial do demandante que era fundamental para fazer sentido a sua pretensão.

 

Mas, em ambas as espécies, seja in rem ou in personam, a sentença teve natureza de provimento meramente declaratório, e trazia na prática diferentes consequências nas duas ações.

 

Pois na ação real ou in rem, quando o juiz declarava o sacramentum do possuidor provisório da coisa ilegítima (iustum) este a conservava definitivamente e o valor do sacramentum devia ser recolhido ao Estado pelo sucumbente.

 

Se declarado inistum, além do recolhimento da promessa feita, deveria restituir a coisa ao vencedor. Se não o fizesse, os praedes sacramenti sujeitar-se-ão aos efeitos da ação executória (manus ineictio).

 

Na ação[3] pessoal (in personarum) cuja finalidade era a cobrança de crédito, declarado justo o sacramentum do demandante, não sendo cumprida a obrigação pelo devedor, poderia aquele proceder à citação do mesmo em juízo, instaurando-se assim o processo executório.

 

A iudicis postulatio também denominada actio iudicis arbitrive postulatio era uma ação declaratória, especial e não abstrata, pois o autor tinha que indicar o fundamento da reivindicação.

 

Era utilizada para a divisão de herança (actio familiae erciscundae) e para cobrança de crédito decorrente de sponcio (espécie de processo relativo à coisa vindicada), onde o réu possuidor prometia indenizar o autor caso ficasse provado que o bem não era seu e, para divisão de bens comuns (actio comuni dividundo).

 

A palavra “audiência”[4] é derivado do latim audientia e do verbo audire (escutar, atender) exprime o sentido de escutar, dar atenção, audição. Desta forma, significa o ato de receber alguém a fim de escutar e atender sobre o que fala ou sobre o que alega.

Em linguagem processual, a audiência é sessão ou momento em que o magistrado, instalado em sua sala de despachos, ou outro local reservado para esse fim, atende ou ouve as partes, determinando medidas acerca das questões trazidas a seu conhecimento ou, proferindo decisões acerca das mesmas questões.

 

Na origem de direito de ação, as partes comparecimento perante o juiz (árbitro mais remotamente) ou a quem coubesse solver o conflito de interesses, para exporem suas alegações, fazerem a prova e ouvirem a sentença.

 

Na audiência[5] tudo era dito oralmente e, portanto, ouvido. Sendo um ato audível, havia uma troca oral de palavras, em suma, a audiência é o ato processual, durante o qual se fala e se ouve.

 

Com a evolução, o procedimento oral transmutou-se para a forma escrita que relata tudo que na audiência foi dito e ouvido. Foi deixando de ser um puro momento de exposição de oral do juiz, advogados, partes, representantes, testemunhas, peritos e etc.

 

Deixou de ser mera sessão para então se erigir em ato processual complexo que é indispensável para promover a autocomposição, preferencialmente com o auxílio de mediadores e conciliadores e os litigantes e que pode ocorrer a qualquer tempo conforme prevê o art. 139, V do CPC/2015 e, para o saneamento cooperativo do processo (art. 357,§3º do CPC/2015) e, para colher provas orais necessárias à instrução da causa (art. 361 do CPC/2015) dos incidentes (art. 920, CPC/2015) ou em justificação prévia (art. 562 do CPC/2015).

 

No que tange às provas orais se referem ao depoimento pessoal das partes, nos esclarecimentos dos peritos e assistentes técnicos. É forçoso admitir que seja a ocasião para haver oportunidade de defesa, a palavra audiência toma sentido amplo[6].

Já a audiência stricto sensu resulta num ato processual complexo e solene (ritualístico) e nem sempre obrigatório, designado pelo juiz, para ouvir e se expressar pessoalmente juntamente com os demais participantes do processo[7], decidir as questões pendentes processuais, determinar aas provas a serem produzidas e ainda ouvir as provas orais que se fizerem necessárias.

 

Existem basicamente três espécies de audiência stricto sensu, a saber: a conciliatória ou de conciliação; a audiência preliminar ou de ordenação do feito; e, a audiência instrutória ou de instrução.

 

Na evolução cognoscitiva apura-se que as três modalidades de audiência formam a base comum do ritual processual cível no procedimento ordinário padrão. Lembremos que foi extinto pelo CPC de 2015 o rito sumário.

 

Embora ainda prevaleça entre nós pela legislação especial o rito dos Juizados Especiais Cíveis que é, em verdade, sumariíssimo. Por essa razão, tem aplicação subsidiária e, querendo-se, também as subdivisões classificatórias.

 

Há audiências sui generis como a entrevista do interditando[8], e, ainda outras audiências especiais.

 

O vigente sistema processual civil brasileiro autoriza o julgamento do mérito, independente de qualquer audiência, posto que existam casos em que se afiguram perfeitamente dispensáveis, conforme o caso de audiências preliminares e conciliatórias e se o direito em litígio não admitir transação, ou ainda, se as partes não a quiserem, mas que se expressem de forma justificada. Ou ainda quando não houver necessidade de produção de outras provas (art. 355 do CPC/2015).

 

É preciso recordar que é proibido ao juiz indeferir produção de prova imprescindível à elucidação de fato controvertido e julgar antecipadamente a lide, deixando de acolher a pretensão exatamente por falta de comprovação do alegado.

 

Jurisprudencialmente é cerceamento de defesa quando houver o julgamento antecipado da lide, no sentido da improcedência do pedido por insuficiência de provas.

 

Com isso, conclui-se que é obrigatória a audiência quando efetivamente houver demonstração de que sem esta haverá prejuízo para qualquer das partes. O deslocamento gradual e progressivo em direção à efetiva prestação jurisdicional fez com que o processo sofresse alteração sem suas normas e, não é mais possível realizar as audiências desnecessárias como era no CPC de 1939.

 

A tentativa de conciliação também não é uma novidade dentro do ordenamento jurídico pátrio, ao revés, encontrou alguns momentos favoráveis e, outros, nem tanto, conforme previu o art. 164 da Constituição Imperial Brasileira que aludia à prévia tentativa de audiência conciliatória; o art. 5º da Lei Imperial de 15/10/1827 que impunha ao juiz da paz a tentativa de conciliar as partes; as Ordenações Afonsinas e as Filipinas (Livro III, Título XX, §1º) que já previam a tentativa conciliatória; o Regulamento 737/1850 que reservava um capítulo inteiro para a tentativa de conciliação no tocante às causas comerciais.

 

E, o Decreto 1.030/1890, a Lei 1.138/1905, Decreto 5.433/1905, mas, o Decreto 5.561/1905 que suprimiu as formas de conciliação até existentes; já os artigos 847 e 850 da CLT garantiram dois momentos de tentativa de conciliação; a Lei 968/1949 que tratava de conciliação no procedimento do desquite litigioso e, finalmente o CPC/1973 e, por derradeiro a consagração explícita no CPC/2015.

 

Desta forma, diante de tal contexto, a audiência preliminar notabiliza uma das mudanças trazidas pelas reformas processuais brasileiras, posto que contribua para aceleração da prestação jurisdicional, seja pelo fim amigável do litígio, seja pela facilitação e organização do procedimento processual.

 

Cogita-se de conciliação em razão da existência de conflito essa maior ou menor escala; E, nesse sentido ensinou Carnelutti que exclusivamente por meio da vida em sociedade, os homens podem atender grande parte de suas necessidades e, porquanto a guerra entre eles desagrega a sociedade, portanto, a composição do conflito se converte em interesse coletivo.

 

Cumpre trazer à colação a breve lição de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart: Cabe lembrar que a conciliação permite que as causas mais agudas do conflito sejam consideradas e temperadas, viabilizando a eliminação do litígio não apenas na forma jurídica, mas também no plano sociológico, o que é muito importante para a efetiva pacificação social.

 

Como alertou Mauro Cappelletti, a conciliação - ao contrário da decisão que declara uma parte vencedora e outra vencida - oferece a possibilidade de que as causas mais profundas dos litígios sejam examinadas, recuperando-se o relacionamento cordial entre os litigantes.

 

Convém frisar que a expressão “direitos indisponíveis” não corresponde aos direitos que não admitem transação conforme expressou a redação do art. 331 do CPC/73, a partir da alteração promovida pela Lei 10.444/2002.

 

Isso porque, há direitos indisponíveis que admitam transação, sendo exemplo disso, as questões de alimentos, guarda de filhos e outras causas de família, bem como causas coletivas, e demandas que envolvam entes públicos, conforme anota Fredie Didier Jr.,

 

Cumpre ainda ressalvar que não são somente os direitos patrimoniais privados que admitem a transação. Cumpre igualmente distinguir a conciliação e transação.

 

Para Didier Jr., a transação é espécie do gênero conciliação, sendo uma prova disso a possibilidade de se obter a conciliação sem transação, conforme ocorre nos casos de reconhecimento do pedido ou de renúncia do direito em que se funda a ação. Portanto, numa leitura adequada do art. 331 do CPC/73, deve ser direitos que admitam conciliação e, não apenas transação.

 

Ainda sobre a possibilidade de haver conciliação nas causas em que são partes entes públicos, refere-se Didier Jr., que existe mau hábito de se relacionarem tais causas com suposto interesse público e não permitir qualquer espécie de autocomposição.

 

Aliás, são inúmeras as hipóteses de autocomposição envolvendo interesse de ente público, não sendo temerário afirmar, por exemplo, que a maior parte dos conflitos fiscais se resolve por acordo de parcelamento firmado perante a repartição pública, longe das mesas de audiência do Judiciário.

 

A lei, também, prevê expressamente a possibilidade de conciliação em demandas que dizem respeitos aos entes federais. Em regra, são situações em que a cobrança integral do valor é muito dispendiosa, se comparada com o seu possível resultado. A renúncia ou a transação acaba sendo, portanto, de interesse público.

 

A Lei de Benefícios previdenciários, a Lei 8.213/1991 possui dispositivo que admite a prática de transação pelos procuradores que a representarem em juízo, consoante se extrai a redação do art. 132 do referido diploma legal.

 

Existe ainda uma série de atos normativos que regulamentam a possibilidade de conciliação e os seus limites, pelos membros da Advocacia Geral da União, superando-se a ideia de que os entes públicos não podem transigir sobre os direitos em litígio. Com efeito, a AGU vem difundindo, cada vez mais, a prática conciliatória aos seus membros, recebendo amplo respaldo, também, do Poder Judiciário.

 

A transação é negócio jurídico bilateral que implica em concessões recíprocas entre as partes visando à eliminação de controvérsias sobre o conteúdo, a extensão, a validade ou a eficácia de uma relação jurídica de direito material.

 

O Código Civil Brasileiro de 1916 admitia uma concepção restrita de transação, em que se pressupunha a existência de um conflito real entre as partes. Não se reconhecia a transação cujo objeto fosse a prevenção de litígios futuros, eventuais ou hipotéticos.

 

Mais tarde, com O Código Civil Brasileiro de 2002 adotou francamente a chamada transação mista, tão presenta nas tradições italiana e lusitana, e possibilitou a prevenção de litígios que também constituíssem objeto desse negócio jurídico.

 

Pontes de Miranda em sua doutrina já alertava sobre a transcionalibilidade de direitos públicos ou não patrimoniais, que era perfeitamente possível, desde que disciplinada por lei especial.

 

E, corrobora Sílvio Venosa: "Assim, nos termos do art. 841, não podem ser objeto de transação direitos não patrimoniais e os de natureza pública. O poder público só pode transigir quando expressamente autorizado por lei ou regulamento. Os direitos indisponíveis, direta ou indiretamente, afetam a ordem pública".

 

Com a frase "trasigere est alienare", a doutrina clássica enfatizava que a transação só poderia ser efetuada por aqueles que podem dispor de seus direitos e, quanto a isto, aduziu Pontes de Miranda:

                "A transação modifica a relação jurídica de direito das obrigações ou de direito das coisas, pois, para se eliminarem os litígios ou inseguridades, se fazem concessões. Não há reconhecimento puro, porque seria capitulação. por isso mesmo, os transatores exige-se o poder de dispor” (In: MIRANDA, Pontes de. Tratado De Direito Privado: Parte Especial. Direito das Obrigações. Extinção de dívidas e obrigações. Dação em soluto. Confusão. Remissão de dívidas. Novação. Transação. outros modos de extinção. 3.ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984, v.25 p.; 166-169).

 

Há diferentes conceitos de disponibilidade em doutrina. Em prima abordagem, o poder de dispor diz respeito ao valor social dos bens tutelados, de modo que a disponibilidade figura no campo dos interesses individuais, enquanto que a indisponibilidade se direciona para a tutela dos bens jurídicos essenciais ao bem-estar de toda a coletividade.

 

Noutro viés, alguns doutrinadores atentam para o fato de que nem sempre o fato de o interesse ser individual implica necessariamente em livre exercício do poder de disposição. Há algumas vezes, que a natureza dos direitos impede sua livre disposição, ainda que exista interesse legítimo do titular, configurando-se a chamada indisponibilidade objetiva.

 

Outras vezes, apesar da natureza do direito não impedir, por si só, a livre disposição, as características pessoais do titular ou de seu representante impõem restrições ou limitações ao poder de dispor. Quando se configura a indisponibilidade subjetiva.

 

Dentro da indisponibilidade objetiva, a doutrina majoritária defende que os direitos da personalidade são, por excelência, intransigíveis, e, em regra, não podem ser suprimidos, tendo em vista a sua estreita ligação com a dignidade da pessoa humana.

 

Em outras hipóteses, de indisponibilidade objetiva, mencionadas pela doutrina refere-se ao estado das pessoas, ao direito de família, ao direito sucessório de pessoa vida, ao poder familiar, às relações conjugais, à filiação e às questões de ordem pública.

 

Na seara da indisponibilidade subjetiva, há casos como o obstáculo ao livre exercício do poder de dispor. Os incapazes não podem dispor de seus diretos, salvo se representados ou assistidos. Os tutores e os curadores encontram restrições em relações aos negócios dos tutelados e curatelados.

 

Os pais não podem dispor dos bens e direitos de seus filhos, salvo se autorizados judicialmente. Os casados não podem livremente dispor de bens imóveis, salvo se autorizados por seu consorte. O sócio que não administra a sociedade empresária, encontra óbices para dispor os bens da pessoa jurídica.

 

O inventariante também não pode dispor sem autorização judicial os bens do espólio que administra e representa.

 

O mandatário não pode dispor sem os devidos poderes. E, os procuradores de pessoas jurídicas do poder público também enfrentam rigorosas restrições.

 

Convém ainda salientar que a indisponibilidade subjetiva sofre críticas, mas não se confunde incapacidade com indisponibilidade.

 

Para alguns doutrinadores, quando se cogita de incapacidade, a disponibilidade do direito torna-se até uma discussão secundária, ainda que um determinado direito seja disponível, o poder de dispor será limitado, se o titular não possuir capacidade para manifestar sua vontade ou se o representante legal não for legitimado a dispor livremente.

 

Os direitos indisponíveis são aqueles que não poderiam ser objeto de transação ou de composição, porquanto a proteção da lei é amplíssima que os protege até mesmo contra a vontade do seu próprio titular, mesmo que seja plenamente capaz.

 

Há afirmações doutrinárias e mesmo inovações legislativas que acenam com o conceito de direitos indisponíveis que admitem transação. Como por exemplo, a cessão dos direitos de imagem; da disposição de tecidos, órgãos e partes do corpo humano para transplante, da mudança de sexo, do direito a alimentos, dos direitos trabalhistas e previdenciários, dos contratos de concessão de serviços públicos e do crédito tributário.

 

De fato, existem decisões judiciais recentes em que a indisponibilidade dos direitos parece realmente relativizada tendo em vista a premente necessidade de pacificação social. Cogita-se mesmo da validade de transação que envolveu direitos difusos, vide Recurso Especial 299 400-RJ, Segunda Turma, Recorrente: MP do Estado do RJ; Recorridos: Município de Volta Redonda, Banco Bamerindus do Brasil S.A. Cia. Siderúrgica Nacional. Relator: Min. Francisco Peçanha Martins. Relatora para acórdão: Min>E liana Calmon. Brasília, 01.06.2006.

 

Em verdade, a audiência apresenta diferentes e relevantes funções à adequada solução das lides, destacando-se: a) conciliação; b) saneamento processual; c) a fixação de pontos controvertidos[9]; d) a determinação de provas a serem produzidas.

Observa-se que se deu a substituição da expressão “direitos indisponíveis” por uma expressão mais abrangente, ou seja, direitos que não admitam transação.

Ademais, a expressão “audiência de conciliação” apresenta-se imprópria, porquanto se cuida de ato processual, complexo destinado à tentativa de conciliação, ao saneamento das questões processuais pendentes, à ordenação de provas, à designação, se necessária, de AIJ (audiência de instrução e julgamento), daí a denominação de audiência preliminar.

Barbosa Moreira aponta com sua trivial lucidez que a audiência preliminar aproximou nosso sistema do modelo concentrado oral, o qual tem em destaque o direito austríaco.

E, ainda, advertiu que a introdução da audiência para conciliação é uma “faca de dois gumes”. Pois, por um lado, se vincar a conciliação, poderá abreviar o feito de modo considerável, porém, no caso contrário, alonga o curso processual, sem maiores ganhos como o da fixação[10] de pontos controvertidos, ou da solução de questões processuais pendentes, o da determinação de provas a serem produzidas e, também, a designação, se necessário for, da AIJ. Tais ganhos são justificáveis para compensar o aumento da duração dos pleitos.

 

Contemporaneamente cresceu extraordinariamente a importância de conciliação realizada em demanda judicial, o que não é privilégio do direito processual brasileiro, conforme assegura o Código Tipo de Processo Civil para a América Latina que aliás, influenciou o direito brasileiro, nessa questão.

 

Registrou-se o fato que renomados estudiosos do direito processual fundaram o Instituto Ibero-americano de Direito Processual, na cidade de Montevidéu, no ano de 1958, quando por sugestão de Niceto Alcalá Zamora u Castilho, passou a ser discutida a criação de Códigos-Modelo ou Códigos-Tipo.

 

Na realidade, a grande maioria dos ordenamentos processuais modernos reconhece a importância da conciliação, reservando o dispositivo legal próprio para o fim específico de disciplinar a matéria com o art. 414 do Código Processual Civil Português, o artigo 360, do CPC y Comercial de La Nación Argentina, arts 293 e seguintes do Código Uruguaio, art. 183 do Código Italiano e os §§ 273 a 279 da Lei processual alemã bem como os §§ 239 ao 243 da lei austríaca.

 

O CPC/1973 elegeu o vocábulo “transação”, mas esta não repele o propósito de enfrentar a audiência de conciliação.·.

A respeito de eventuais diferenças existentes entre conciliação e transação já sustentou Athos Gusmão Carneiro que: “A conciliação diverge da transação por seu caráter do ato praticado no curso do processo, mediante a iniciativa e com a intervenção do magistrado; por seu conteúdo substancial, nem sempre implicando em recíprocas concessões; pelas consequências de ordem processual”.

 

Estas últimas, entretanto, podem ser comuns à transação avançada diretamente pelas partes fora do processo, e comunicadas ao juiz ora como causa de cessação do objeto do litígio, ora para poder homologação e executoriedade do acordo que estabeleça prestações a serem cumpridas.

 

A conciliação é ato pelo qual as partes põem fim a um litígio, mediante concessões recíprocas, fundadas no tocante ao pretendido pedido, posto em disputa no Judiciário.

Afora isso, a conciliação pode ser vista como uma norma geral do processo e deve ser estimulada ao máximo, inclusive com o respaldo expresso do CPC/2015.

 

A guisa de comparação basta a constatação que noventa e cinco por cento das causas cíveis americanas são objeto de composição antes de um julgamento. E, conforme já salientou o grande doutrinador Ovídio Baptista da Silva os operadores do direito não estão preparados para conciliar e muito pouco tempo ou mesmo nenhum tempo destinado a tal aprendizado.·.

Cândido Rangel Dinamarco, por sua vez, acredita que a ausência de estímulo à conciliação deve-se por um problema cultura, além de existir pouco empenho dos juízes na realização da conciliação.

 

A ênfase é notoriamente adversarial. A conciliação poderá ser total ou parcial e, mesmo assim, há significativo mérito.  Por outro lado, a transação pode ter lugar o reconhecimento jurídico do pedido, a renúncia ao direito ou, até mesmo, a desistência da ação. Também em tais casos, há o fim do processo.

 

No que se refere aos direitos que não admitem transação, há controvérsia sobre a necessidade ou não da realização de audiência preliminar o que já denota a complexidade temática.

 

Há três entendimentos diferentes. O primeiro entendimento funda-se na premissa de que a audiência preliminar é ato essencial, sendo obrigatório, pouco importando a natureza dos direitos se comportam ou não transação. De sorte que o seu afastamento acarretaria a nulidade do processo.

 

No segundo entendimento, o dilema, fulcra-se na existência de direitos considerados indisponíveis e aceitarem como transação: a) o reconhecimento da paternidade; b) a forma de compartilhamento de guarda de menor; c) o valor de alimentos provisionais.

 

Em tais hipóteses, a posição é no sentido de que audiência deva ocorrer, sob pena de ficar frustrada a oportunidade conciliatória, operando consequente nulidade processual.

 

Observa-se que o segundo entendimento ganha força em razão da Exposição de Motivos do Anteprojeto nº13, sancionado como a Lei 10.444 de 07.05.2002 que substituiu a expressão “direitos disponíveis” para direitos que admitam transação.

 

O terceiro e último entendimento, baseado afastamento da realização de audiência preliminar quando à causa versar sobre os mesmos direitos que não admitam transação[11].

Há possíveis vantagens a serem extraídas dos dois entendimentos, sendo possível que, mesmo a parcial transação acredita-se ser relevante a realização da dita audiência.

Não se encontrando espaço em sua falta para acarretar possível nulidade do processo. E, nesse sentido, vige farta jurisprudência a confirmar a não nulidade do processo.

 

Muitos magistrados, infelizmente, não entendem como importante a realização de audiência preliminar. E, se deixa de fazê-la pois o juiz poderá deixar de designar a audiência, em questão, sob o fácil argumento de que as circunstâncias da lide, não apontam para possibilidade de ser obtida a conciliação.

 

O julgador não deve limitar-se a consultar as partes sobre a possibilidade de conciliação, deve ir além, mediante a análise dos elementos do litígio, procurando estabelecer os pontos controvertidos da causa e, principalmente aconselhar sobre os benefícios da conciliação em comparação com a disputa judicial.

 

Eduardo Couture ao comentar o Código Austríaco concebido por Franz Klein afirmou que: “O juiz, sentado ao lado das partes, é como um confessor; com uma autoridade considerável, é um verdadeiro diretor de juízo, tem aliás, amplas faculdades para aconselhar o espírito de conciliação e transação.”.

 

Contudo para haver êxito na condução da audiência conciliar, deve o juiz ter conhecimento prévio da causa e dos motivos dos litígios para efetivamente assumir em audiência preliminar, sua condução, auxiliando na confecção de solução amigável.

 

Merece destaque a Lei de Mediação brasileira, a Lei 13.140/20154 que instituiu a mediação como instituição paraprocessual como forma complementar de prevenção de conflitos.

 

A forma de realização de acordo não desperta dúvida, sendo clara a lei processual ao referir que este será reduzido a termo e, em seguida, o juiz homologará por sentença.

A homologação é feita por uma sentença e após o trânsito em julgado concretiza-se o título executivo judicial. Consequentemente há coisa julgada material com os decorrentes efeitos de imutabilidade e indiscutibilidade.

O referido termo lavrado deve ser vistoriado rigorosamente pelas partes e participantes de audiência, em especial, pelos julgadores e procuradores das partes.

 

Destaque-se ainda a importância da cláusula penal que pune o eventual descumprimento do acordo. É oportuno o alerto feito por Athos Gusmão Carneiro no sentido de que as propostas e recursos não devem integrar o termo de audiência quando não for obtida a conciliação.

 

E o motivo é simples, a saber: o registro do conteúdo de acordo inexitoso pode enfraquecer a posição de uma das partes e prejudicar uma composição futura.

 

Cumpre alertar que o não comparecimento injustificado à audiência de conciliação ou mediação é ato atentatório à dignidade da justiça[12].

 

O princípio da oralidade como método de investigação é usado desde a Antiguidade e, desde o século XVIII, quando a histórica começa a se constituir enquanto disciplina acadêmica, veio então, relegar a oralidade ao segundo plano em detrimento da escrita.

A oralidade identifica-se com o modo verbal de realização do processo e, primitivamente, firmou-se a noção segunda a qual somente tem validade para o processo aquilo que tenha deduzido a forma oral, perante o juiz.

 

Por exigências de celeridade e efetividade processual, passou-se do procedimento oral para um procedimento misto que permeia o oral e o escrito e, posteriormente, torna-se trifásico, oral, escrito e documental.

 

Não existem mais procedimentos puros, sejam estes orais ou escritos. Prevalecem atualmente os mistos o que caracteriza uma oscilação conforme o predomínio de um ou de outro modo de realização de atos.

 

É essa a noção generalizada na doutrina brasileira e estrangeira, embora possa merecer reparos quanto ao raro caso de procedimento quanto ao raro caso de procedimento verbal espanhol e mesmo diante de procedimentos puramente escritos e documentais, especialmente o mandado de segurança brasileiro.

 

Mesmo assim a oralidade subsiste em alguns atos processuais. Apesar de que os debates escritos podem ser reduzidos por memoriais escritos. Até de que, procedimentalmente o servidor lavrará, sob o ditado do juiz, termo que conterá em resumo, o ocorrido na audiência bem como, por extenso, os despachos, as decisões e a sentença, se proferida no ato (art. 367 CPC/2015).

 

A regra verbal em termos do direito processual cognitivo, no procedimento ordinário padrão é aplicável subsidiariamente conforme o art. 318 do CPC/2015.

A oralidade está presente no depoimento pessoal[13] da parte porque é interrogada em AIJ (art. 385 do CPC/2015) e responderá pessoalmente sobre os fatos articulados, não podendo servir-se de escritos anteriormente preparados, permitindo-lhe o juiz, todavia, pode realizar consulta as notas breves, desde que serviam para completar esclarecimentos.

 

Há também oralidade quando da oitiva de testemunhas, que depõe na AIJ perante o juiz da causa (art. 459 do CPC/2015). Também se faz presente na contradita à testemunha (vide art. 457§1º CPC/2015).

 

O conceito de oralidade[14] identifica-se por ser um procedimento por audiências e, é prestigiada por aproximar o juiz das partes e da prova oral, exigindo seu contato pessoal e imediato, realizando maior número de atos possíveis em melhor tempo.

 

Promove também a concentração e a economia processual além da identificação física do juiz, e, destacando-se que a irrecorribilidade das decisões interlocutórias em separado são igualmente princípios correlatos do princípio da oralidade.

 

O princípio da imediação ou imediatidade consiste na exigência de que o juiz a quem caiba proferir a sentença haja assistindo ao desenvolvimento de provas das quais tenha de extrair seu convencimento, que haja estabelecido contato direto com as partes, com as testemunhas, com os peritos e com os objetos do processo, de modo que possa apreciar de tais pessoas e as condições de lugar e outras, baseado na impressão imediata que delas teve e, não em informações de outros.

 

A coleta da prova é feita imediatamente, isto é, sem intermediação alguma entre magistrado e parte; ou existe juiz e a testemunha. Eis a essência da oralidade.

A imediação visa, portanto, promover o contato direto do julgador com as partes, peritos e testemunhas, para que colha de tudo, com sua impressão pessoal e imediata, de forma imparcial e, sem intermediários.

 

A maioria das legislações estrangeiras minguam as disposições expressas sobre o princípio da imediatidade apesar, haja alguns preceptivos espalhados por todo o ordenamento processual civil. Tal princípio se faz presente no campo probatório.

 

Na audiência instrutória, o juiz poderá inquirir a testemunha tanto antes quanto depois da inquirição feita pelas partes (art. 459, §1º do CPC/2015).

 

O juiz também pode, de ofício ou a requerimento da parte, em qualquer fase do processo, poderá inspecionar pessoas, ou coisas, a fim de esclarecer sobre o fato que o interesse à decisão da causa (vide art. 481 do CPC/2015).

 

Também pode determinar reconstituição dos fatos (art. 483, incisos I e III do CPC/2015), tendo as partes sempre o direito de assisti-la, prestando esclarecimento e fazendo observações que reputem de interesse para a causa (art. 483, § único do CPC/2015).

 

Por outro lado, basicamente a jurisdição tem amparo nos princípios da investidura, indelegabilidade e de aderência ao território. Já o princípio da unidade da audiência estabelece a unicidade da audiência como característica ou estado do que é o único, sem excluir a possibilidade de fracionamento.·.

A concepção de unidade prevê a ausência de divisão, mas o estado, a qualidade ou a condição de um ou a qualidade e condição de único.

 

A unidade pode fundar-se na singularidade e simplicidade, como pode observar-se da unificação, da uniformização ou da união de várias coisas, em virtude da formação da unidade, ou por se apresentar como unidade.

 

A descontinuidade no tempo não infringe a unidade conceitual e teórica da audiência. De sorte, que não há segunda e nem primeira audiência, mas apenas a audiência.

 

Conforme prevê o art. 365 do CPC/2015 decorre do fato de a instrução, os debates e o julgamento se conjugarem em um único ato complexo e múltiplo.

 

A referida unicidade encadeia-se também a de conciliação, incluída a audiência preliminar, conforme prevê o art. 357 do CPC/2015 sem prejuízo do intento do conciliador, no instante que fixará os pontos controvertidos, decidindo as questões processuais pendentes, determinando as provas necessárias a serem produzidas e designando audiência de instrução e julgamento, se necessária, para a coleta da prova oral.

 

Ainda em face do princípio da identidade física do juiz, é o magistrado quem preside a instrução e colhe as provas orais produzidas em audiência e declara encerrada a fase instrutória, devendo sentenciar o processo, exceto por alguma exceção legal.

 

A presença do juiz é uma das maiores garantias de boa decisão, a participação do julgador tem poderosos reflexos psicológicos (daí a relevância do princípio da identidade física do juiz).

 

Na sistemática do processo eletrônico há formas virtuais para ver, ouvir e compreender depoimentos coletados em audiência.

A cena comporta repetição, paradas, observação de talhes no áudio, no visual atinente. Havendo também a observância ampla defesa e ao contraditório como meio de convencer, e permitir que outrem, interessado ou sujeito de relação processual, o faça e reexamine até a valoração final do julgador.

Mesmo no processo eletrônico[15] as provas orais permanecem fielmente registradas e disponíveis para a consulta e apreciação.

 

É preciso estar atenta à jurisprudência prevalente que admite que para corresponder à eficácia instrumental que lhe costumam ser atribuído, o duplo grau de jurisdição há de ser concebido, à moda clássica, com seus dois caracteres que são a possibilidade, de reexame integral da sentença de primeiro grau e que esse reexame seja confiado à órgão diverso do que a proferiu e de hierarquia superior na ordem judiciária.

 

O Codice de Procedura Civile italiano também dispõe de rol taxativo de decisões interlocutórias recorríveis por agravo de instrumento. Porém, uma vez inexistente o recurso apropriado tanto a doutrina como as jurisprudências majoritárias admitem o manejo do mandado de segurança contra o ato judicial ou decisão teratológica; também contra decisão judicial contra a qual não caiba recurso; para imprimir efeito suspensivo ao recurso desprovido tal atributo; quando impetrado por terceiro prejudicado por decisão judicial (vide RMS 34837/RS, Rel. Min. Raul Araújo. Publicado 17.2.2014).

 

A correição parcial é remédio, teoricamente, sem interferir com os atos decisórios, beneficia os litigantes que se aleguem vítimas de erros ou de abusos que invertam ou tumultuem a ordem dos atos processuais.

 

Portanto, a adoção do princípio da irrecorribilidade das decisões interlocutórias em separado, como regra, representa uma garantia de celeridade processual conforme o princípio constitucional da duração razoável do processo.

Para a movimentação do processo é indispensável haver a comunicação de atos processuais que é, em regra, feita por meio eletrônico. Excepcionalmente, pelo advogado da parte, através de publicação no órgão oficial, ou através de oficial de justiça, caso necessário, seja por hora certa, ou ainda, por edital (art. 275, §2º).

Tais modalidades de intimação não devem conter vícios, sob pena de ferir o princípio da publicidade dos atos judiciais e do contraditório.

 

A transgressão ao princípio da publicidade e o devido processo legal pode ocorrer quando a redução a termo da audiência é infiel e inidônea.

Vide:

          A 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) anulou uma sentença proveniente da 1ª Vara do Trabalho de Santa Rosa, em processo ajuizado por um trabalhador contra a Brasil Foods. Na ação, ele pleiteava adicional de insalubridade e outras verbas trabalhistas. Entretanto, o juiz permitiu que fosse utilizada como prova uma ata de audiência de outra ação, que não continha os depoimentos das partes e das testemunhas. Os relatos só foram transcritos no final do prazo previsto para interposição de recursos.

          A empresa alegou que teve a defesa prejudicada ao não ter conhecimento sobre o que as partes e testemunhas disseram antes de elaborar seu recurso ao TRT-RS, argumento acolhido pelos desembargadores. Segundo os magistrados, o procedimento afronta os princípios do devido processo legal e da ampla defesa.

        Na sentença, o juiz da 1ª Vara do Trabalho de Santa Rosa utilizou o artigo 417 do Código de Processo Civil como embasamento de sua conduta. No primeiro parágrafo do referido artigo, está prevista a transcrição datilográfica dos depoimentos quando houver recurso à sentença, ou de ofício em casos determinados pelo juiz, mediante requerimento das partes.

        Entretanto, ao relatar o recurso da empresa na 8ª Turma, o desembargador Juraci Galvão Júnior observou que o uso do direito processual comum no processo do Trabalho obedece a dois requisitos: deve haver lacuna não preenchida pela CLT e, mesmo nestes casos, os princípios processuais civis não podem ser incompatíveis com os princípios processuais trabalhistas.      No caso dos autos, segundo o relator, não havia omissão da CLT e, portanto, não se justificava o uso de normas do Código de Processo Civil. Isto porque, como ressaltou o desembargador, o primeiro parágrafo do artigo 828 celetista prevê que os depoimentos sejam resumidos pelo secretário de audiências e que as atas sejam assinadas pelo juiz e pelos depoentes.

       A referida Consolidação também exige que as audiências sejam registradas em livro próprio e possibilita que as partes peçam certidão sobre o que ocorreu. (In: Notícias de 24/07/2014  ref. Processo 0020259-07.2013.5.04.0751 (RO)http://www.trt4.jus.br/portal/portal/trt4/comunicacao/noticia/info/NoticiaWindow?cod=941801&action=2Acesso em 14.12.2016).

 

Lembrando-se que o processo é procedimento em contraditório, assim com a comunicação do ato processual torna-se possível reagir e influenciar.

 

Intimar significa levar ao íntimo e, portanto, considera-se intimado quem tem ciência inequívoca da decisão por qualquer meio ainda que antes da publicação.·.

 

As intimações podem ocorrer de cinco formas: a) preferencialmente pelo meio eletrônico vide art. 270 do CPC/2015; b) por publicação oficial (art. 272); c) pelo escrivão ou chefe de secretaria, pessoalmente ou pelo correio (art. 273), sendo possível por ato do advogado da parte contrária; d) por oficial de justiça, seja por hora certa ou por edital (art. 275, §2º do CPC/2015).

 

Inexistindo previsão expressa quanto à antecedência da intimação para a realização da audiência, aplicar-se-á o art. 218, §3º do CPC/2015.

 

A linguagem na audiência é regulada no art. 192 do CPC/2015, deve ser feita em língua portuguesa culta. A língua portuguesa é o idioma oficial da República Federativa do Brasil (art. 13, caput do CF/1988). A Carta Política não especifica a competência para legislar sobre a língua nacional[16].

 

A audiência pode ser adiada por três razões, a saber: a) se não puder comparecer por motivo justificado qualquer pessoa que deva participar desta; b) convenção das partes; c) atraso injustificado de seu início em tempo superior a trinta minutos do horário marcado (art. 362 do CPC/2015).

 

A audiência pode ser adiada por via oblíqua quando as partes convencionarem pela suspensão do processo.

 

Para abordar sobre a audiência de saneamento, é curial, definir o conceito e a importância do saneamento que segundo Galeno Lacerda está fundado no despacho ordenador, concebido pelo direito processual português, com aplicação do procedimento sumário, com o propósito de determinar ao juiz o julgamento da nulidade.

 

Com a semente lusitana então, o despacho saneador passou a ser aplicado no Brasil e sua primeira presença é registrada em 1928, no Código de Mato Grosso, cuja autoria é de Ferreira Vasconcelos, depois no anteprojeto Batista Martins.

 

Sob a denominação inominada, mas com evidente cunho saneador, também constou do Decreto-Lei 960/1938, o qual versava sobre a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública.

 

A notável inserção no sistema processual pátrio ocorreu efetivamente através do CPC de 1939, em seus arts. 293 ao 296. Em seguida, o CPC de 1973 consagrou a possibilidade de o julgador decidir sobre os pressupostos processuais e as condições da ação, bem como ainda, sentenciar, antecipadamente, sem que seja necessária a realização da audiência.

 

Mais tarde, veio a Lei 8.952/1994 veio autorizar o saneamento do feito em audiência, e, por derradeiro, a Lei 10.444/2002 regulou também a possibilidade de saneamento do processo em cartório.

 

Atualmente o CPC/2015, prevê expressamente o saneamento comparticipativo e em audiência. Ao sanear o feito, o julgado profere juízo de admissibilidade da ação e de validade do processo. E, tal decisão deverá ser devidamente fundamenta e deverá ainda abordar as questões suscitadas pelas partes, como aquelas tratadas preliminarmente na contestação.

 

É importante frisar que a decisão saneadora não está adstrita a um único momento processual, e pode certamente ser verificada quando da presença de alguma irregularidade, seja antes, durante ou mesmo depois da audiência preliminar.

 

Para que a audiência atenda ao fim de instrumento facilitador de saneamento do processo, a exemplo do que ocorre na tentativa de conciliação, é fundamental que compareça o julgador ao ato tendo examinado os autos, sob pena de não extrair qualquer consequência benéfica dos princípios da imediatidade e da concentração.

 

Bastante óbvio é o estudo prévio dos autos que autorizará o julgador avaliar seriamente as eventuais irregularidades processuais, podendo, ciente dessa situação processual, questionar e dialogar diretamente com as partes.

 

O processo deve avançar sem defeitos que prejudiquem ou mesmo impeçam a discussão de mérito, provenientes de falta de pressupostos processuais ou de condições da ação[17]. Não obstante haver entendimento doutrinário que acredite que pelo CPC/2015 não mais se cogite na existência das condições da ação.

 

Ao sanear o feito, o julgador profere a decisão interlocutória, na forma oral ou escrita. O que antigamente era chamado de despacho saneador, mas que nunca fora verdadeiramente mero despacho. O ato tem conteúdo decisório. A designação mais apropriada seria de decisão de saneamento e organização do processo.

 

O NCPC enfatiza a função organizatória do processo, na decisão de saneamento, reafirmando a relevância da cooperação entre o juiz e as partes.

 

Quando a causa apresentar uma expressiva complexidade em matéria de fato ou de direito, ou mesmo em ambas as matérias. Há determinação do art. 357,§3º do CPC/2015 da realização de audiência para que o saneamento[18] seja feito em cooperação com as partes. O que faz ocorrer a organização compartilhada ou organização consensual do processo.

 

A rigor, a audiência deve ser realizada para a fixação dos pontos controvertidos de modo que as partes, e seus representantes e advogados participem ativamente, a fim de prover a exitosa delimitação da controvérsia e indicação das respectivas provas em regime de consenso, não havendo sequer interesse recursal para que a parte se insurja contra essa decisão, seja como preliminar de futura apelação, seja por meio de agravo de instrumento.

 

A audiência preliminar como fator de otimização processual, destacou Luiz Rodrigues Wambier, traz a probabilidade de redução da atividade recursal das partes.

 

Também por ocasião de saneamento, as partes podem também apresentar ao julgador negócios processuais propriamente ditos, que, sendo válidos, integrarão as balizas então fixadas para subsequente instrução probatória. (In: TALAMINI, Eduardo. Saneamento e organização do processo no CPC/15. Disponível em: http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI235256,11049-Saneamento+e+organizacao+do+processo+no+CPC15Acesso em 14.12.2016).

 

A função do juiz na direção do processo e em audiência é sempre permanecer de forma ética e respeitosa no exercício judicante. A atividade deve observar o lastro isonômico e a eticidade. Deve atuar em caráter impessoal, afinal da dignidade do juiz depender da dignidade do direito.

 

Para se evitar a infinitude de poder do juízo, definiram-se os limites fático-jurídicos estabelecidos pelas partes, por força do princípio da demanda (art.141 e 490) desde que observado o contraditório (arts. 9 e 10) o juiz tem o dever de decidir conforme o direito (art. 140, § único) e justificando (justificando as suas decisões observando a lógica (justificação interna) e com argumentação apoiada na CF/1988 (art. 489), em sendo o caso, tal como interpretadas pelo STF e pelo STJ em seus precedentes (justificação externa).

 

Igualmente tem-se de observar as normas de preferência argumentativa para mostrar a justificada escolha interpretativa que tem o dever de fazer ao julgar casos concretos.

 

A doutrina clássica divide os poderes do juiz em dois grupos internos distintos, a saber: os poderes jurisdicionais, os poderes de política (estes, considerados como poderes administrativos).

 

Os primeiros compreendem todos os atos desde o início e formação do processo, decidindo ou não a causa. Os poderes de polícia compreendem os poderes exercidos, pelo juiz, não como autoridade judiciária, mas como autoridade judicante e direcionados aos problemas oriundos do exercício dos trabalhos forenses.

 

Segundo a ciência política, a polícia é a função do Estado que se concretiza numa instituição de administração positiva e visa pôr em ação as limitações que a lei impõe a liberdade dos indivíduos e grupos na salvaguarda e manutenção da ordem pública, em suas variadas manifestações, ou seja, que vai desde a segurança individual, da propriedade, da proteção de qualquer outro bem tutelado pelas disposições penais.

 

O poder polícia é inerente à autoridade pública no exercício de suas funções, sendo implícito na atividade constitucional de todos os poderes do Estado, como função inerente ao desempenho das suas atribuições expressas de acordo com as limitações que, por construção constitucional se devem ter por subentendidas.

 

Os limites naturais do poder de polícia são os que na sua definição, como instrumento da ação pública para os fins superiores ao interesse geral.·.

Já seus limites objetivos, as normas legais ou regulamentares que condicionam o seu exercício e os princípios fundamentais da vida jurídica brasileira.

 

Enfim, a audiência surgiu em sua trajetória histórica como obrigatória e tornou-se facultativa principalmente com a preocupação do processo com a razoável duração tida como direito fundamental trazido pela Emenda Constitucional 45, de 08 de dezembro de 2004.

 

Referências:
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[1] O ordo iudiciorum privatorum englobou os dois primeiros períodos do processo civil romano – legis actiones e per formulas – que eram juízos privados.  O procedimento se desenrolava em duas fases distintas, uma in iure, diante do magistrado (pretor), incumbido de organizar e fixar os termos da controvérsia, e outra apud iudicem, perante um iudex privado.

[2] A origem do nome legis actiones – o mais antigo sistema processual romano – seria decorrência do fato de advirem de um texto legal ou em razão de as situações jurídicas por elas tuteladas serem fundadas em uma lei. Eram instrumentos processuais exclusivos dos cidadãos romanos, marcados pela tipicidade, pautados por extrema rigidez, formalismo, solenidade e oralidade, com procedimento bipartido.

Eram cinco as ações da lei para defesa dos direitos: a legis actio sacramenti (com formas solenes e simbólicas, em que havia a rigidez do formalismo, caracterizando-se pela lentidão e pela via tortuosa e indireta a que se chegava à emissão de juízo sobre o objeto real da controvérsia, por meio de uma aposta); a legis actio per iudicis arbitrive postulationem (ação especial para divisão de herança, cobrança de crédito decorrente da sponsio e divisão de bens comuns); a legis actio per condictionem (obrigações cuja pretensão seria um objeto determinado); a legis actio per manus iniectionem (ação executiva por excelência, servindo para introduzir a execução pessoal); e a legis actio per pignoris capionem (não se desenrolava diante do magistrado e consistia em se apoderar de coisas pertencentes ao devedor, sem prévia autorização do magistrado – penhora extrajudicial). As três primeiras ações da lei eram declaratórias, e as duas últimas, executivas.

[3] Os ritos eram aqueles exclusivamente traçados pela lei, ou seja, em numerus clausus. O processo era iniciado perante o pretor (autoridade estatal), que fixava, junto com as partes, os termos da controvérsia, seguindo-se, posteriormente, “perante o iudex, o qual, assistido por um consilium, conhecia do litígio e o julgava soberanamente, mesmo não sendo uma autoridade pública”. O procedimento das legis actiones originava-se, pois, numa fase pública (in iure), e terminava numa fase arbitral privada (apud iudicem).

O procedimento podia ser desenvolvido em três etapas: a introdução da instância (in ius vocatio), a instância diante do magistrado (in iure), e a instância diante do juiz popular (apud iudicem). A in ius vocatio, que era o chamamento do réu a juízo, ficava a cargo do autor.

Na fase in iure, as partes faziam os gestos rituais próprios de cada ação da lei, recitando as fórmulas solenes, e solicitavam ao magistrado (detentor da iurisdictio) a nomeação de um iudex.

As fórmulas para fixar o juízo eram orais, razão pela qual “tomavam os assistentes da audiência como testemunhas de que estava instaurado o contraditório, e a esse ato solene se dava a denominação de litis contestatio”. As partes precisavam estar presentes, não se admitindo a contumácia. (In: PAIM, Gustavo Bohrer. Breves Notas sobre o Processo Civil Romano. Disponível em:http://www.temasatuaisprocessocivil.com.br/edicoes-anteriores/50-v1-n3-setembro-de-2011/144-breves-notas-sobre-o-processo-civil-romano   Acesso em 10.12.2016).

[4] Na audiência, procedia-se à litis contestatio, que era o momento processual em que eram “definidos os termos da controvérsia sobre a qual o órgão julgador deveria se pronunciar”. Após, passava-se à produção das provas. O juiz, então, analisava os elementos existentes nos autos e os argumentos das partes e prolatava a sentença em audiência pública. A decisão era, em princípio, passível de impugnação em audiência, mediante appellatio ou retractatio.

[5] Já o processo no período justinianeu, começava-se com libellus conventionis que era o meio normal de chamamento a juízo. O juiz então fazia um exame sumário da petição e autorizava a citação do réu para que comparecesse na data e hora aprazada. Tanto autor como réu deveriam prestar caução, comprometendo-se a acompanhar o processo e se apresentar na data designada para a audiência. Assim, a resposta do réu dava no prazo de vinte dias, e mediante o chamado libellus contradictionis, também era escrito e transmitido ao mencionado funcionário do juízo e, em seguida, por ordem do juiz, ao autor.

[6] A confissão tratada pelo ordenamento jurídico pátrio deita suas raízes no Direito Romano Clássico, quando ocorria a confessio in iudicio, ou seja, a confissão judicial, quando o réu, uma vez levado à presença do pretor pelo autor, confessava o pedido, sendo que o título para ter lugar a execução contra o réu. que condenara a si mesmo: confessus pro iudicato est, qui quodammodo sua setentia damnatur,"m conforme afirmou Paulo (Digesto, 42,2,1).

Aliás, no sistema de prova legal ou tarifada, muito usado no Direito Medieval, onde havia a previsão em lei para a valoração da prova testemunhal e isso vinculava o magistrado. Assim, o depoimento de um servo, por exemplo, não tinha o mesmo peso que o de um nobre, mas a declaração realizada por dez servos correspondia a de um nobre, ou mesmo de um senhor feudal, muito embora, o juiz tivesse a certeza de que o testemunho de um único servo era de todo verdadeiro.

Convém frisar que o interrogatório e o depoimento pessoal não se confundem, pois aquele é sempre ordenado de ofício pelo juiz, enquanto este, deve ocorrer a requerimento da parte. O primeiro pode ocorrer em qualquer fase processual, mas o segundo verifica-se por ocasião de despacho saneador, na audiência de instrução e julgamento.

Apesar de o interrogátio servir como meio de prova, é precipuamente um instrumento realizado pelo juiz a fim de elucidar os esclarecer situações que lhe apresentam no processo e que ele repute importantes para a decisão da causa.

Desta forma, o depoimento pessoal é meio de prova destinado a realizar o interrogatório da parte, no curso processual e tanto se aplica ao autor como ao réu, pois ambos se submetem ao ônus de comparecer em juízo.

[7] Sempre se cogitou de depoimento pessoal de pessoas físicas, mas com relação pessoas jurídicas tal como a sociedade civil ou comercial, o diretor formalmente instituído pelo estatuto, muitas vezes não tem conhecimento direto dos fatos ou circunstâncias do caso.

Nesses casos, os representantes legais da pessoa jurídica podem incumbir ao preposto que presta o depoimento pessoal em juízo. E, este deve ser devidamente documentado, para prestar o depoimento em nome da empresa que representa, tendo inclusive poderes para confessar, fato este que acarretará as consequências da confissão, sem a possibilidade de discussão sobre a legitimidade do preposto.

A única ressalva é que será necessário que o preposto esteja expressamente autorizado pela pessoa jurídica a prestar o depoimento tendo inclusive os poderes para confessar.

Aliás, para entabular acordos perante os Juizados Especiais Cíveis, infelizmente, a exigência de prepostos é fraca e titubeante, pois diferentemente da justiça trabalhista que cobra efetivamente o vínculo trabalhista do preposto, a justiça comum, não faz o mesmo, o que contribuiu para a profissionalização anômala da figura do preposto que comparece despido e destituído de reais poderes de representação e nenhum poder para confissão e negociação razoável.

[8] O art. 751 do CPC/2015 aperfeiçoou a redação anterior do art. 1.181 do CPC/73 pois o contato com o juiz se dá sob o enfoque de conferir maior dignidade a pessoa do interditando, na medida em que este é citado para comparecer em juízo e ser entrevistado, e, não mais examinado ou inspecionado, conforme denominava o código revogado.

É de fato a oportunidade para que o juízo em contato direto com o interditando, possa aferir as condições de sanidade mental do interditando. É fase de máxima relevância para que o amplo direito de defesa e ainda para o pleno exercício do contraditório pelo próprio interditando possam ser exercidos, na medida em que o cunho restritivo sobre ele requerida.

Extremamente adequado foi o legislador do novo codex ao prescrever a necessidade do contato pessoal do juiz, prevendo a obrigatória vinda do interditando a juízo, para que tanto o juiz quanto o representante do MP possam aferir as reais e concretas circunstâncias da saúde física e mental do interditando, bem como analisar as razões de cunho afetivo e emocional daqueles que requerem a medida.

Nota-se ainda a importância que se reveste o ato que evita abusos contra uma pessoa vulnerável, porém ainda não incapaz. Registre-se ainda que o juiz deverá inclusive ira até o interditando, na hipótese deste não ter como ser conduzido até a sala de audiência. Restam reforçados os poderes do magistrado para seu livre convencimento, por que os parágrafos do artigo ainda autorizam, que de ofício ou a requisição, da presença de um expert para aferir as reais condições do interditando, quando de sua oitiva ou como do chamamento de parentes e/ou pessoas mais próximas que possam, inclusive, ter sido referida por ele em seu depoimento.

É tal audiência, um momento singular, e de sensível percepção para o julgador diante do drama e das consequências da medida de interdição e curatela.

[9] O conceito de fixação de pontos controvertidos significa definir as questões de fato ou de direito sobre as quais deverá versar o embate processual. Há o choque de alegações ou razões envolvendo fatos e fundamentos. Geralmente, apresentados, do confronto da inicial e a contestação, surgem os fatos controvertidos. A controvérsia é gerada pela simples negação do que foi afirmado. Fato impugnado é o fato controvertido, conforme ensinou Calmon de Passos. É esta controvérsia de fatos que provoca a necessidade de prova. Daí, a grande necessidade de o julgador ponderar e definir sobre quais pontos versará a atividade probatória.

[10] A referida fixação não pode significar engessamento do feito e nem da atividade probatória, até porque, depois da audiência preliminar, muitas mudanças ocorrem, isto é, o julgador e as partes não estão livres de encontrarem aspectos e fatores até então desconhecidos.

[11] É impossível negar que o cenário jurídico contemporâneo está permeado de casos de solução alternativa de conflitos e que recaem não somente sobre matéria ambiental, como também sobre outros direitos antes classificados como indisponíveis.

Portanto, é possível identificar a distinção entre a transação do direito propriamente dito e aquela que se ocupa de aspectos secundários, como as condições de cumprimento das obrigações as vantagens patrimoniais relacionadas a direitos indisponíveis. A título de ilustração, destaca-se o comentário de Venosa sobre o direito alimentar que era tipicamente indisponível.

In litteris: "Assim como não se admite renúncia ao direito de alimentos, também não se admite transação. O quantum de alimentos já devidos pode ser transigido pois se trata de direito disponível. O direito, em si, não o é. O caráter personalíssimo desse direito afasta a transação”.

 

[12] Os atos de litigância de má-fé causam potencial dano a uma das partes e dano marginal ao Estado-Juiz. O art. 80 do CPC/2015. As sanções estão contidas no dispositivo legal, aplica-se multa superior a um por cento e inferior a dez por cento do valor corrigido da causa, e ainda, a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu e a arcar com os honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou.

Por sua vez, os atos atentatórios à dignidade da Justiça violam o necessário respeito às decisões do Poder Judiciário ou à autoridade judiciária no que se refere à execução forçada.

O descumprimento de provimento mandamental tem sido chamado de contempt of court, ou seja, o desacato à Corte, assim como na common law e, nesse caso a lei determina expressamente que a multa não paga seja inscrita na dívida ativa da União do Estado.

[13] Há de se ficar atento às distinções havidas entre o depoimento pessoal e interrogatório que são dois institutos diferentes. A saber, o depoimento pessoal é requerido pela parte, corresponde ao meio de prova. Há pena de confesso, é realizado, apenas uma única vez, em AIJ, enquanto que o interrogatório é determinado de ofício, sendo meio de convencimento, e onde não há pena de confesso, podendo ser realizado a qualquer tempo ao longo do curso do processo.

Em verdade o interrogatório não é propriamente modalidade de prova, e, sim meio de convencimento do juiz, o qual não visa à obtenção de confissão. A ausência da parte intimada não gera a aplicação de confissão. Há doutrinadores que defendem como correta denominação o depoimento da parte, posto que seja pessoais os depoimentos das testemunhas, dos peritos e a confissão da parte, que por exemplo, pode ser feita até por procurador.

[14] Aliás, tive oportunidade no texto "Os olhos e ouvidos da justiça (comentários sobre a prova testemunhal, pericial e inspeção judicial)" disponível em http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_... Acesso em 10.12.2016, a prova testemunhal com sua má fama de ser a "prostituta das provas", talvez seja o meio de prova mais antigo que existe.(...) E foi o advento da escrita que pode ter decretado a decrescente importância da testemunha principalmente no âmbito processual, passou a ser vista como mera prova subsidiária com nítido caráter complementar da escrita.

Historicamente, o depoimento pessoal também é antigo meio de prova no direito processual. Há referências bíblicas com relação à juramento e à confissão, até mesmo pela passagem em S. João, pelo comparecimento de Jesus ao pretório de Pilatos (Cap. 18 Vc 33 e ss.).  A história do referido instituto surgiu no direito romano (interrogativo), o qual prevaleceu no direito canônico, bem como o surgimento na França pela Ordenação de 1498 (através de perguntas e respostas de forma escrita).

O referido instituto veio a ser substituído em meados de 1539 pelo interrogatório sobre fatos e artigos. E, por influência do direito alemão e italiano houve a inovação que o instituto teve apreciado no CPC de 1939, o instituto do depoimento pessoal da parte.

O depoimento pessoal é meio prova que tem com finalidade de extrair da parte a confissão de fatos relevantes à solução da causa, seja diante de provocação ou de forma espontânea.

Humberto Theodoro Júnior conceitua depoimento pessoal e aponta sua dupla finalidade: provocar a confissão da parte e esclarecer os fatos discutidos na causa.

Para Humberto Theodoro Júnior o depoimento pessoal se submete tanto ao autor quanto ao réu. Vejamos: “Depoimento pessoal é o meio de prova destinado a realizar o interrogatório da parte, no curso do processo. Aplica-se tanto ao autor como ao réu, pois ambos se submetem ao ônus de comparecer em juízo e responder ao que lhe for interrogado pelo juiz.”.

 

[15] A Lei 11.419/2006 iniciou a gradual transição do processo físico, de papel para o processo eletrônico, colimando conferir maior velocidade à atividade jurisdicional. O genial Cândido Rangel Dinamarco simplifica o conceito de processo justo, aduzindo que outra coisa não é senão o processo apto a produzir resultados justos. Um processo acessível a todos e a todas as causas, ágil e simplificado, aberto à participação efetiva dos sujeitos interessados e contando com a atenta vigilância do juiz sobre a instrução e sua interferência até o ponto em que não atinja a própria liberdade dos litigantes.

A oralidade abarca alguns subprincípios, que lhe são essenciais. E, segundo Chiovenda, divide os postulados fundamentais da oralidade na concentração dos atos processuais em audiência, na imediatidade entre o juiz e afronte da prova oral, na identidade física do juiz e, na irrecorribilidade em separado das decisões interlocutórias. E a finalidade máxima é a de que o mesmo juiz que colheu as provas orais venha a prolatar a sentença. No processo eletrônico, a oralidade pode ser totalmente preservada e até radicalizada, pois as audiências podem ser certificadas nos autos em sua pura verbalização sonora, através de arquivos eletrônicos de voz.

Pode-se pensar na plena hiper-realização dos atos processuais, isto é, na preservação não só de dados sonoros, mas também imagéticos. (In: ARoNNE, Bruno Costa. Reflexões sobre a oralidade no processo eletrônico. Disponível em:http://www.arcos.org.br/periodicos/revista-eletronica-de-direito-processual/volume-iii/reflexoes-sobre-a-oralidade-no-processo-eletronico Acesso em 10.12.2016).

[16] No caso de depoimento de estrangeiro que precise de tradução, será nomeado intérprete para atuar no processo. O art. 162 do CPC/2015 prevê que o juiz nomeará intérprete ou tradutor quando necessário: traduzir documento redigido em língua estrangeira; para verter para o português as declarações das partes e das testemunhas que não conhecerem o idioma nacional; realizar a interpretação simultânea dos depoimentos das partes e testemunhas com deficiência auditiva que se comuniquem por meio da Língua Brasileira de Sinais, ou equivalente, quando assim for.

O intérprete é o profissional que traduzirá para o vernáculo, de modo que o conhecimento seja dado na língua portuguesa, para que todos entendam. Sua participação é semelhante à do perito, que auxilia o Juiz quando este julgar necessário, em razão das suas limitações de ordem técnica.  A tradução que se dá nos autos do processo é comumente conhecida como “tradução juramentada” no Brasil. O intérprete que realizará a tradução é conhecido como “tradutor juramentado” ou “tradutor público”.

[17] Fredie Didier Jr. esclarece que ao adotar o binômio, as condições da ação não desapareceriam (legitimação ad causam e interesse de agir ou processual). É o conceito de condição da ação que seria eliminado. Aquilo que por meio dele se buscava identificar permaneceria existente, obviamente. O órgão jurisdicional ainda teria de examinar a legitimidade, o interesse e a possibilidade jurídica do pedido. Tais questões seriam examinadas como questões de mérito (possibilidade jurídica do pedido e legitimação ad causam ordinária) ou como pressupostos processuais (interesse de agir e legitimação extraordinária). Não tiveram êxito as críticas doutrinária de proscrever esse conceito jurídico processual do repertório teórico do pensamento jurídico brasileiro.

[18] A decisão saneadora tem eficácia preclusiva.  E a preclusão tem como fim tornar possível o ordenado desenvolvimento do processo com a progressiva e definitiva eliminação de obstáculo. Não se podendo voltar às matérias já decididas. Mas, se sabe, que as questões de ordem pública não são alcançadas pela preclusão, o que significa dizer que podem ser apreciadas, a qualquer tempo e grau ordinário de jurisdição. Mas, frise-se que o julgador não está sujeito à preclusão temporal.