Colisão e ponderação entre princípios constitucionais


Porvinicius.pj- Postado em 06 dezembro 2011

Autores: 
ALVES, Andre Luis Dornellas

 

RESUMO

            Este estudo tem o intuito de averiguar como são solucionadas as colisões entre princípios via ponderação. Sendo assim, tratou com ênfase a abordagem dos princípios da supremacia da constituição, da unidade da constituição e o da concordância prática, como também as peculiaridades e as subdivisões do princípio da proporcionalidade, uma vez que este é usado como instrumento para a realização da técnica da ponderação, método utilizado para sopesar os enunciados normativos quando há incidência de interesses opostos e que busca aplicar a norma que possui aptidão para o fim a que se destina, que dentre todas, seja a menos gravosa para o alcance de tais fins, e que ainda seja capaz de causar benefícios superiores às desvantagens proporcionais.

Palavras-chave: Princípios. Colisão. Proporcionalidade. Ponderação.

ABSTRACT

This study aims to examine how the collisions are solved via weighting principles. Therefore, emphasis has dealt with the approach of the principles of supremacy of the constitution, the constitution and the unity agreement practice, but also the peculiarities and the subdivisions of the principle of proportionality, since it us used as a tool for the technique of weighting method used to weigh the normative statements where there incidence of opposing interests and seeks to apply a rule that has fitness for the purpose it was intended that, among all, is the least onerous to the achievement of these ends, and still is capable of causing proportional benefits outweight the disadvantages .

Key words: Principles. Collision. Proportionality. Weighting.

 


SUMÁRIO: 1-INTRODUÇÃO; 2-CONCEITO DE PRINCÍPIO SOB A ÓTICA CONSTITUCIONAL; 3-DISTINÇÃO ENTRE PRINCÍPIOS E REGRAS 3.1-CRITÉRIO DA GENERALIDADE; 3.2-CRITÉRIO TUDO OU NADA; 3.3-CRITÉRIO DO PESO E DA IMPORTÂNCIA 3.4-CRITÉRIO QUALITATIVO; 4-COLISÃO ENTRE PRINCÍPIOS 4.1-PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO 4.2-PRINCÍPIO DA UNIDADE DA CONSTITUIÇÃO 4.3-PRINCÍPIO DA CONCORDÂNCIA PRÁTICA 5-O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E A PONDERAÇÃO 5.1-PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE 5.1.1-DIFERENÇA ENTRE O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE 5.1.2-FUNDAMENTO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE 5.1.3-TRÍPLICE DIMENSÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E SUA APLICAÇÃO 5.1.3.1-ADEQUAÇÃO 5.1.3.2-NECESSIDADE 5.1.3.3-PROPORCIONALIDADE EM SENTIDO ESTRITO; 5.2-PONDERAÇÃO 5.2.1-PRIMEIRA ETAPA:IDENTIFICAÇÃO DOS ENUNCIADOS NORMATIVOS EM TENSÃO 5.2.2-SEGUNDA ETAPA:IDENTIFICAÇÃO DE FATOS RELEVANTES, 5.2.3:TERCEIRA ETAPA:DECISÃO 5.2.4-PRETENSÃO DE UNIVERSALIDADE 5.2.5-BUSCA PELA CONCORDÂNCIA PRÁTICA 5.2.6-CONSTRUÇÃO DO NÚCLEO ESSENCIAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS; 6-CONCLUSÃO; 7-REFERÊNCIAS. 


 

1 INTRODUÇÃO:

                O objetivo deste trabalho é verificar o modo de resolução na incidência de colisão entre princípios via o método da ponderação, uma vez que este conhecimento é de suma importância para a aplicação do direito na atualidade. Haja vista que é sobre estas normas princípiológicas que é construído e validado todo o sistema.

             É essencial conseguir visualizar os princípios e observar a sua distinção com as regras quando estiver diante de uma análise normativa, como também, ter a capacidade de ponderá-los quando estiverem em colisão.

              Esses pressupostos são ferramentas indispensáveis no trato com as normas jurídicas.

              O sentido, o fundamento aplicado no momento da concorrência entre normas-princípio é específico, tendo em vista o valor das normas a serem tratadas. A especificidade do procedimento a ser aplicado no momento em que ocorre uma colisão entre princípios é demonstrada distinguindo-a das regras e ratificando a todo o momento a importância com que é tratada a aplicação da estrutura, base de nosso ordenamento jurídico.

                Para uma melhor compreensão de como se dá essa resolução de conflito entre princípios via ponderação, o trabalho trará o conceito de princípios sob a ótica constitucional, a distinção entre princípios e regras e os critérios utilizados para tal aferição, abordará como surgem e em que consistem as colisões entre princípios, examinará o princípio da proporcionalidade e por fim demonstrará como é realizado o método da ponderação.

 

 2. CONCEITO DE PRINCÍPIOS SOB A ÓTICA CONSTITUCIONAL

Para se analisar o conceito de princípio no Direito, é necessário buscar as suas significações fora do âmbito do saber jurídico, para, depois, perscrutar-se as significações que lhe foram conferidas por diferentes posturas metodológicas no interior da Ciência Jurídica. Afirma Espíndola (2002) que, para evidenciar, em letras claras, os predicados de sua normatividade, tanto como conceito jurídico quanto como norma de direito, será preciso detalhar a configuração de sua idéia no interior do sistema jurídico positivo, em termos analítico-dogmáticos, e sua transmigração de significado normativo, nos quadrantes do Direito Positivo.  

Para o jurista Luis Dies-Picazo, (1983 apud BONAVIDES, 2004, p.255), fora do âmbito do saber jurídico

 a idéia de princípio deriva da linguagem da geometria, ‘onde designa as verdades primeira’, (...). Exatamente por isso são ‘princípios, ou seja, ‘porque estão ao princípio’, ‘sendo as premissas de todo um sistema que se desenvolve more geométrico.

Na opinião da constitucionalista Cármen Lúcia Antunes Rocha, (1994 apud ESPÍNDOLA, 2002,p.53) “O Princípio é o Verbo (...) No princípio repousa a essência de uma ordem, seus parâmetros fundamentais e direcionadores do sistema normado”.

Segundo Espíndola, (2002,p.53) conclusão que pode-se tirar da idéia de princípio ou sua conceituação é que:

 seja lá qual for o campo do saber que se tenha em mente, designa a estruturação de um sistema de idéias, pensamentos ou normas por uma idéia mestra, por um pensamento chave, por uma baliza normativa, donde todas as demais idéias, pensamentos ou normas derivam, se reconduzem e/ou se subordinam.

A respeito deles, observa Celso Antônio Bandeira de Mello:

  Princípio- já averbamos alhures- é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo. Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. (MELLO, 1991, p. 230)

Sob uma análise crítica, Espíndola (2002) adverte que o termo princípio é usado na Ciência Jurídica de várias formas, e afirma que esta polissemia não é benéfica, uma vez que a confusão de conceitos e idéias pode levar a sonegação da prática jurídica por uma prática equívoca, de direitos protegíveis pelo sistema jurídico posto. Ora o termo é usado para designar a formulação dogmática de conceitos estruturados por sobre o direito positivo, ora para designar determinado tipo de normas jurídicas e ora para estabelecer os postulados teóricos, as proposições jurídicas construídas independente de uma ordem jurídica concreta ou de institutos de direito ou normas legais vigentes.

Ademais, o supracitado autor aduz que é necessário distinguir entre a norma e o texto para tratar de princípio, ou seja, os princípios constantes no texto devem distinguir-se dos princípios próprios à integração das normas, sendo assim, exercendo esta prática, “conclui-se que a noção de princípio antes apontada é apenas o primeiro momento de uma indagação teórica tendente a dar conta dos grandes problemas que são colocados aos operadores do Direito, no momento de lidarem com os ‘princípios no Direito.’”(ESPÍNDOLA, 2002,p.56).

Espíndola (2002) focalizando a efetividade do princípio constitucional enquanto imperativo metodológico observa que este além de princípio jurídico é um princípio que haure sua força teórica e normativa no Direito enquanto ciência e ordem jurídica, sendo assim, este deverá ter uma correlação com a idéia de princípio no Direito. Adverte para não se estabelecer dicotomia incompossível entre Teoria do Direito e Direito Constitucional, haja vista que o objeto de cada uma destas disciplinas do conhecimento jurídico se beneficiam mutuamente, dos avanços especulativos produzidos pelos teoristas do Direito e pelos constitucionalistas.  

3. DISTINÇÃO ENTRE PRINCÍPIOS E REGRAS

            Tendo em vista que as normas jurídicas podem se configurar como princípios e regras e necessário avaliar a diferença entre eles, sendo assim verifique a abordagem adiante.

            Segundo Barroso (2005,p.15) há uma diferença significativa entre princípios e regras, para ele regras “são, normalmente, relatos objetivos, descritivos de determinadas condutas e aplicáveis a um conjunto delimitado de situações”. A regra, pelo mecanismo da subsunção deve incidir na hipótese prevista no seu relato, enquadrando-se os fatos na previsão abstrata e produzindo uma conclusão, de modo direto e automático, produzindo seus efeitos. Ou a regra regula a matéria em sua inteireza ou é descumprida, na modalidade do tudo ou nada. Uma regra somente deixará de incidir sobre a hipótese de fato que contempla se for inválida, se houver outra mais específica ou se não estiver em vigor. Quando estas entram em conflito só uma irá prevalecer .

 Já os princípios, “contêm relatos com maior grau de abstração, não especificam a conduta a ser seguida e se aplicam a um conjunto amplo, por vezes indeterminado, de situações”, comportando uma série indefinida de aplicações. Os princípios devem ser aplicados mediante ponderação, uma vez que frequentemente entram em tensão dialética. O intérprete, à vista do caso concreto, irá aferir o peso que cada princípio deverá desempenhar na hipótese, mediante concessões recíprocas, e preservando o máximo de cada um, na medida do possível. 

Segundo Alexy (1993 apud FARIAS, 2000) a distinção entre princípios e regras torna-se evidenciada nos casos de colisão de princípios e confiltos de regras, porquanto a maneira de solucioná-los é diversa. No caso de conflito entre regras, quando não for possível introduzir uma cláusula de exceção uma das regras será considerada inválida, sendo expurgada do ordenamento jurídico, tendo assim uma dimensão de validez. Na colisão de princípios, como só podem colidir princípios válidos, acontece na dimensão do peso. Assim, quando dois princípios entram em colisão um deles prevalecerá sobre o outro e isso não significa que o princípio preterido deva ser declarado inválido, haja vista que sob determinadas condições um princípio tem mais peso ou importância do que outro e em outras circunstâncias poderá suceder o inverso. 

Para que se realize efetivamente a constatação da distinção entre princípios e regras torna-se necessário a aplicação dos critérios da generalidade, do tudo ou nada, do peso e da importância e qualitativa.

3.1 Critério da generalidade

Tanto os princípios quanto as regras possuem em comum o caráter de generalidade, no entanto, a generalidade da regra jurídica é diversa da generalidade de um princípio jurídico. Para Jean Boulanger (1950, p. 55-56, apud, GRAU,2005,p.174)) “um princípio jurídico é senão uma regra jurídica particularmente importante em virtude das conseqüências práticas que dele decorrem”. No entanto para ele há entre ambos além de uma desigualdade de importância, uma diferença de natureza, verificando a diversidade de generalidade demonstra Boulanger:

A regra é geral porque estabelecida para um número indeterminado de atos ou fatos. Não obstante, ela é especial na medida em que não regula senão tais atos ou tais fatos: é editada para ser aplicada a uma situação jurídica determinada.

Já os princípio, prossegue, ao contrário, é geral porque comporta uma série indefinida de aplicações.(1950 apud GRAU, 2005,p.174)

   Os princípios possuem a generalidade em grau maior, haja vista que as regras contêm relatos mais objetivos, com incidência restrita às situações específicas às quais se dirigem. Já os princípios incidem sobre uma pluralidade de situações, tendo em vista possuírem um maior teor de abstração.

Para melhor compreensão, veja as palavras de Márcio Gil Tostes Santos (SANTOS, 2007, p.121):

 Os princípios são detentores de um elevado grau de abstração, fato este, impeditivo de uma imediata identificação das possíveis situações submetidas à sua égide, pois esta abstração fornece a eles grande amplitude de incidência permitindo, assim, aplicação dos mesmos não apenas sobre alguns fatos, mas também sobre vários, por isso que, paradoxalmente, a abstração dos princípios exige a concretude dos casos para que sejam determinados os pontos de incidência dos mesmos. Já as regras, detêm um menor grau de abstração, visto que são especificados previamente em seu conteúdo quais serão seus pontos de atuação, ou seja, os fatos suscetíveis de serem por elas regulados, tornando restrita sua aplicação a uma quantia e tipo pré-determinado de casos.  

Entende-se que, por serem mais direcionadas especialmente para certos casos as regras são menos abstratas, menos gerais do que os princípios.

3.2 Critério tudo ou nada “all-or-nothing”

Neste critério desenvolvido sobre as premissas teóricas de Dworkin (2002) e Alexy (2002) traz que as Regras são proposições normativas aplicáveis sobre a forma do tudo ou nada, ou seja, sendo válida a regra, tendo os fatos nela previstos ocorridos, a regra deve incidir, de modo direto e automático, produzindo seus efeitos, e em tal caso, deve-se aceitar a resposta que ela fornece; ou não, caso a regra seja inválida, se houver outra mais específica ou se não estiver em vigor, inexistido um meio termo para a sua aplicação.

Já os princípios contêm uma maior carga valorativa, um fundamento ético, uma decisão política relevante, indicando uma direção a ser seguida, não possuem aplicação automática ao caso concreto, “não apresentam conseqüências jurídicas que seguem automaticamente quando as condições são dadas” (DWORKIN 2002 apud SANTOS, 2007,p. 122). 

3.3 Critério do peso e da importância

Ainda na visão de Dworkin (2002 apud SANTOS,2007,p.123)

 os princípios possuem uma dimensão do peso e da importância ausentes nas regras, podendo ser verificado quando dois ou mais princípios entram em conflito. Nessa hipótese, a colisão seria solucionada levando-se em conta o peso ou importância relativa de cada princípio, a fim de se escolher qual(is) dele(s) no caso concreto prevalecerá ou sofrerá menos constrição do que os outros(s).

As regras jurídicas não possuiriam aquela dimensão. No caso de conflito de duas regras apenas uma delas poderá ser válida, cumprindo ao intérprete-aplicador identificar qual a válida. Para levar a cabo esta decisão o operador do direito será orientado por critérios fornecidos em geral pelo próprio ordenamento jurídico, a regra outorgada pela autoridade superior ou a regra outorgada posteriormente, ou a regra mais específica.

Neste sentido, tendo em vista que os princípios, e apenas eles são dotados da dimensão do peso e da importância, diante de uma colisão entre eles deverá ser aplicada à norma principiológica de maior relevância para o caso concreto, sendo necessário levar em consideração o peso de cada um frente aos elementos fáticos, realizando concessões recíprocas.

No entanto, as regras não admitem tal medição, quando elas entram em conflitos somente uma delas será considerada válida e aplicada ao caso concreto.  

3.4 Critério qualitativo

Neste critério que trata da diferença qualitativa entre princípios e regras, critério este utilizado por Alexy para aprimorar a teoria dos princípios e considerado o mais importante, assim como o da generalidade, tendo em vista que “entre princípios e regras existe não só uma diferença gradual senão qualitativa”. Traz que os princípios são “mandatos de optimización” uma vez que são normas que determinam o fazer da melhor forma possível. (ALEXY, 2002 apud SANTOS, 2007,p.124).

Sob a visão de Robert Alexy (1986, apud FARIAS,2000, p.30):

O ponto decisivo para a distinção entre regras e princípios está em que estes últimos são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidade jurídicas e materiais existente. Logo, os princípios são mandamentos de otimização, cuja principal característica está no fato de poderem ser cumpridos em diferentes graus e de a medida devida de seu cumprimento não depender exclusivamente das possibilidades matérias, mas também das possibilidades jurídicas. O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras em oposição.

As regras, ao contrário, são normas que somente podem ser cumpridas ou não-cumpridas. Se uma regra é válida, então se há de fazer exatamente o que ela exige: nem mais, nem menos. Logo, as regras são determinações no âmbito do fática e juridicamente possível. Isso significa que a diferença entre regras e princípios é qualitativa, e não de grau, e que toda norma é uma regra ou um princípio.

Sendo assim, “os princípios se caracterizam pelo fato de poderem ser cumpridos proporcionalmente às condições reais e jurídicas existentes.”(FARIAS, 2000,p.30)

Será observado adiante, especificamente entre princípios e regras, as circunstâncias individualizadas na medida em que entram em conflito.

4. COLISÃO ENTRE PRINCÍPIOS

            Diferentemente do que ocorre entre as regras os princípios não são incompatíveis entre si, mas concorrentes. No caso de princípios, o conflito pode existir em nível fático, e em existindo, não há necessidade de uma das normas-princípio serem eliminada do sistema. O conflito, quando manifestado, não conduz a uma antinomia jurídica.

            Se os conflitos entre regras ocorrem no plano de validade, os conflitos entre princípios se verificam em nível de peso. Na hipótese de conflito entre princípios, a adoção de um não implica na eliminação do outro do ordenamento jurídico.diante de situações fáticas, diversos jogos de princípios podem ocorrer de tal forma que a solução dos mesmos pode variar de um caso para outro, ora privilegiando um princípio, ora outro. Uma conseqüência imediata é que ao se afastar um princípio a regra que lhe dá concreção perde efetividade. (SARMENTO,2004 apud SANTOS, 2006)

             Diferentemente das regras em que o conflito entre elas ocorre na dimensão da validade, a colisão de princípios é resolvida levando em consideração o peso ou a importância relativa de cada princípio para que seja determinado qual deles prevalecerá no caso concreto. (FARIAS, 2000)

Veja a explicação na visão de Alexy:

Os princípios possuem textura aberta, são mandados de otimização que exigem o cumprimento de algo da melhor maneira possível, logo não é identificável previamente a situação concreta que estarão sob sua égide. Tal característica faz com que não raramente estas normas entrem em colisão, todavia, os métodos clássicos de resolução de conflitos são inadequados, por não tratar, como no caso das regras, de validade ou invalidade, visto que, apenas princípios válidos podem colidir, sendo assim, não é declarando a invalidade de um princípio que será solucionado o conflito.(1993,apud FARIAS, 2000, p. 30). 

Nas palavras de Daniel Sarmento(SARMENTO,2004, p.55):

O equacionamento das tensões principiológicas só pode ser empreendido à luz das variáveis fáticas do caso, as quais indicarão ao intérprete o peso específico que deve ser atribuído a cada cânone constitucional em confronto. E a técnica de decisão que, sem perder de vista os aspectos normativos do problema, atribui especial relevância às sua dimensões fáticas, é o método de ponderação de bens.

Neste sentido, é necessário ao intérprete avaliar a importância de cada norma principiológica, no caso concreto, e realizar uma ponderação entre elas. Na colisão de dois princípios um deles tem que ceder entre o outro.

“Sobre esta perspectiva, é lícito concluir que uma espécie normativa, princípios ou regras, apenas entra em conflito com outra da mesma estirpe, isto é, princípios conflitam com princípios, regras com regras”. (SANTOS,2006,p.98) As regras são concreções dos princípios, logo, não se manifesta jamais antinomia jurídica entre princípios e regras jurídicas. Estas operam concreções daqueles. Em conseqüência, quando em confronto dois princípios, um prevalecendo sobre o outro, as regras que dão concreção ao que foi desprezado são afastadas, embora permaneçam plenas de validade, perdem eficácia, isto é, efetividade, em relação à situação diante da qual o conflito entre princípios manifestou-se.”Quando aparentemente estiver ocorrendo conflito de uma regra com um princípio, na realidade estará havendo a colisão de um princípio com o principio densificado pela regra supostamente conflitante”. (SANTOS, 2006, p. 98)

Tendo em vista ser um método de hermenêutica, é essencial o conhecimento de alguns princípios inerentes à interpretação constitucional para a operacionalização da resolução de uma colisão entre princípios. (SANTOS, 2006). Desta feita, nas palavras de Edílson Pereira de Farias “nessa tarefa, pode guiar-se pelos princípios da unidade da constituição, da concordância prática e da proporcionalidade” (FARIAS, 2000, p.122) aos quais acrescenta-se o princípio da superioridade da Constituição, como será visto adiante.

4.1 Princípio da supremacia da constituição

Este princípio trata que a constituição é norma que está acima de todas as outras e têm seu fundamento associado ao fato de ser uma norma que funda o Estado, por ser uma norma que não foi criada por um poder legislativo constituído, secundário e sim por um poder constituinte, primário que estabelece as bases, os fundamentos para a criação das outras normas sem qualquer limitação normativa, haja vista ser possuidora de um poder supremo. Tem como característica fundamentadora de sua autoridade suprema também o fato de ser classificada com uma constituição rígida, no que se refere ao quorum exigido para que possa ser efetivada alguma alteração em seu conteúdo. (SANTOS, 2006)

Para melhor compreensão sobre sua supremacia observe as palavras Márcio Gil Tostes Santos (2006, p.100)

Haja vista que, se o quorum de votação de uma lei fosse idêntico ao exigido para a realização de emendas na Constituição bastaria qualquer alteração no Código Civil ou Penal para que se revogasse disposições constitucionais que dispusessem de forma contrária, já que não existiria hierarquia entre elas, assim não haveria que se falar em inconstitucionalidade.

José Afonso da Silva (1998 apud SANTOS, 2006, p.100) assevera que “a rigidez constitucional decorre da maior dificuldade para sua modificação do que para alteração das demais normas jurídicas da ordenação estatal. Da rigidez emana, como primordial conseqüência, o princípio da supremacia da constituição”.

Por fim, devido a essa supremacia, nenhuma norma infraconstitucional irá subsistir validamente se for incompatível com a Constituição, ou seja, a Constituição é a norma que está acima de todas as outras, donde estas retiram sua validade formal e material sob pena de inconstitucionalidade e consequente expurgo do ordenamento jurídico. (SANTOS, 2006) 

4.2 Princípio da unidade da constituição

A ordem é um sistema, o que pressupõe unidade, equilíbrio e harmonia. Em um sistema suas diversas partes devem conviver sem confrontos inarredáveis. Na colisão de   princípios constitucionais, emprega-se a técnica da ponderação. Diferente do que ocorre nas soluções de eventuais conflitos entre normas jurídicas infraconstitucionais, nas quais, utilizam-se, como já visto, os critérios tradicionais da hierarquia, da norma posterior e o da especialização. (SANTOS, 2006)

Por força do princípio da unidade, inexiste hierarquia entre normas da Constituição, cabendo ao intérprete a busca da harmonização possível, in concreto, entre comandos que tutelam valores ou interesses que se contraponham. Conceitos como os de ponderação e concordância prática são instrumentos de preservação do princípio da unidade, também conhecido como princípio da unidade hierárquico-normativa da Constituição.

A idéia de unidade da ordem jurídica se irradia a partir da Constituição e sobre ela também projeta. Aliás, o princípio da unidade da Constituição assume magnitude precisamente pelas dificuldades geradas pela peculiaríssima natureza do documento inaugural da ordem jurídica. É a Carta fundamental do Estado, sobretudo quando promulgada em via democrática, e o produto dialético do confronto de crenças, interesses e aspirações distintos, quando não colidem. Embora expresse um consenso fundamental quanto a determinados princípios e normas, o fato é que isso não apaga “ o pluralismo e antagonismo de idéias subjacentes ao pacto fundador” (BARROSO, 2004, p. 196)   

“A Constituição não é um conjunto de normas justapostas, mas um sistema normativo fundado em determinadas idéias que configuram um núcleo irredutível, condicionante da inteligência de qualquer de suas partes”. (BARROSO,2004,p.196).

O princípio da unidade da Constituição, usualmente, operará através da utilização de outros princípios e regras de interpretação. Para a real efetividade deste princípio o aplicador, em um momento de incidência, tem o dever de harmonizar os dois preceptivos, sem que tornasse qualquer deles letra morta.

Segundo Luis Roberto Barroso (2004,p.200):

O papel do princípio da unidade é o de reconhecer as contradições e tensões-reais ou imaginárias que existam entre normas constitucionais e delimitar a força vinculante e o alcance de cada uma dela. Cabe-lhe, portanto o papel de harmonização ou “otimização” das normas, na medida em que se tem de produzir em equilíbrio, sem jamais negar por completo e eficácia de qualquer delas.

Cabe ao aplicador, por força do princípio da unidade, um esforço de otimização: é necessário estabelecer os limites de ambos os bens a fim de que cada um deles alcance uma efetividade ótima. Na busca dessa concordância prática, passa-se por um outro princípio, que será apreciado mais adiante: o da proporcionalidade.

4.3 O Princípio da concordância prática

Este princípio aparece com a finalidade de direcionar a ponderação, com o dever de harmonizar os valores de modo que eles sejam protegidos ao máximo.(ÁVILA, 2005)

 Nas palavras de Edílson Pereira de Farias (2000, p.123):

O princípio da concordância prática ou da harmonização seria consectário lógico do princípio da unidade constitucional. De acordo com o princípio da concordância prática, os direitos fundamentais e valores constitucionais deverão ser harmonizados, no caso sub examine, por meio de juízo de ponderação que vise preservar e concretizar ao máximo os direitos e bens constitucionalmente protegidos.

 No mesmo sentido Humberto Ávila (2005, p.96) assevera que:

     Esse postulado surge da coexistência de valores que apontam total ou parcialmente para sentidos contrário. Daí se falar em dever de harmonizar os valores de modo que eles sejam protegidos ao máximo. Como existe uma relação de tensão entre os princípios e as regras constitucionais, especialmente entre aqueles que protegem cidadãos e aqueles que atribuem poderes ao estado, deve ser buscado um equilíbrio entre eles.

    Para melhor compreensão sobre a aplicação dos princípios guiadores das resoluções de conflitos entre princípios através da ponderação, verificamos as palavras de Santos (2006, p.104).

 Pelo Princípio da Supremacia Constitucional a Constituição é a norma ápice do ordenamento jurídico e dentre as normas integrantes de seu conteúdo, por força do Princípio da Unidade Constitucional, inexiste qualquer tipo de hierarquia normativa entre elas, pois todas são normas constitucionais, isto, todavia, não impede a ocorrência de tensão entre as mesmas. Diante desta colisão, por exigência do Princípio da Unidade Constitucional, mister realizar a concordância prática, pela qual o conflito deve ser harmonizado com o maior acatamento possível das normas envolvidas. Mas, como averbado, esta concordância é viabilizada via ponderação e esta via princípio da proporcionalidade. 

            Sendo assim, devido à essencialidade do princípio da proporcionalidade, uma vez que este é o instrumento usado pelo aplicador do direito para viabilizar a técnica da ponderação, será visto adiante suas propriedades com mais ênfase. 

 

5. O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E A PONDERAÇÃO

Nesta parte do artigo será analisada a função exercida pelo princípio da proporcionalidade e a sua importância na realização da técnica da ponderação.

5.1 PRINCÍPIO DA PROPORCIONAIiDADE

            O princípio da proporcionalidade se caracteriza pelo fato de presumir a existência de relação adequada entre um ou vários fins determinados e os meios com que são levados a cabo, devendo obedecer-lho tanto os que exercem quanto os que padecem o poder. (ÁVILA, 2005)

            O postulado da proporcionalidade cresce em importância no Direito Brasileiro. Cada vez mais ele serve como instrumento de controle dos atos do Poder Público. A idéia da proporção perpassa todo o Direito, sem limites ou critérios. No entanto, este postulado não se confunde com a idéia de proporção em suas mais variadas manifestações. Segundo Humberto Ávila:

 Ele se aplica apenas a situações em que há uma relação de causalidade entre dois elementos empiricamente discerníveis, um meio e um fim, de tal sorte que se possa proceder aos três exames fundamentais: o da adequação (o meio promove o fim?), o da necessidade (dentre os meios disponíveis e igualmente adequados para promover o fim, não há outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamentais afetados?) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoção do fim correspondem às desvantagens provocadas pela adoção do meio?). (ÁVILA,2005,p112): 

Este princípio é muito utilizado no momento da aplicação do método da ponderação em uma situação de conflito entre princípios, ou seja, as restrições recíprocas entre eles, são realizadas sobre a égide da proporcionalidade.

Este princípio desempenha um papel extremamente relevante no controle de constitucionalidade dos atos do poder público, na medida em que ele permite de certa forma a penetração no mérito do ato normativo, para aferição da relação custo-benefício da norma jurídica e da análise da adequação entre conteúdo e a finalidade por ela perseguida (SARMENTO, 2004,p.57 apud SANTOS,2006,p.115).  

            Sua aplicação depende de elementos sem os quais não pode ser aplicada. Sem um meio, um fim concreto e uma relação de causalidade entre eles não há aplicabilidade do postulado da proporcionalidade em seu caráter trifásico (fim, meio e situação), ou seja, uma norma jurídica para atender ao preconizado pelo princípio da proporcionalidade, deverá, a um só tempo, possuir aptidão para os fins a que se destina, dentre todas, ser a menos gravosa para o alcance de tais fins, e ainda causar benefícios superiores às desvantagens proporcionais.

            Há violação do principio da proporcionalidade, com ocorrência de arbítrio, toda vez que os meios destinados a realizar um fim não são por si mesmos apropriados e ou quando a desproporção entre meios e fim é particularmente evidente, ou seja, manifesta.(SANTOS, 2006)

5.1.1 Diferença entre o princípio da proporcionalidade e da razoabilidade

            Verifica-se algumas diferenças entre estes postulados, entre elas constata-se que o postulado da razoabilidade foi cunhado no seio do direito administrativo, atuando como instrumento de controle do exercício, pela administração, de discricionariedade, e ele aplica-se, primeiro, como diretriz que exige a relação das normas gerais com as individualidades do caso concreto, quer mostrando sob qual perspectiva a norma deve ser aplicada, quer indicando em quais hipóteses o caso individual, em virtude de suas especificidades, deixa de se enquadrar na norma geral. Segundo, como diretriz que exige uma vinculação das normas jurídicas com o mundo ao qual elas fazem referências, seja reclamando a existência de um suporte empírico e adequado a qualquer ato jurídico, seja demandando uma relação congruente entre a medida adotada e o fim que ela pretende atingir. Terceiro, como diretriz que exige a relação de equivalência entre duas grandezas. (ÁVILA,2005)

            Já o postulado da proporcionalidade aplica-se nos casos em que exista uma relação de causalidade entre um meio e um fim concretamente perceptível. A exigência de realização de vários fins, todos constitucionalmente legitimados, implica a adoção de medidas adequadas, necessárias e proporcionais em sentido estrito.

           Adverte Góes em dissertação apresentada por Márcio Gil Tostes Santos que o princípio da proporcionalidade, além de realizar o bloqueio é detentor de uma função positiva que é a materialização da melhor medida possível dos direitos constitucionais fundamentais ( GOES,2004, apud SANTOS, 2006,p.117)

5.1.2 Fundamento do princípio da proporcionalidade

            O princípio da proporcionalidade é um princípio que foi redescoberto nos últimos duzentos anos, é considerado antiqüíssimo, e atualmente tem tido aplicação no campo do Direito Administrativo, assim como no Direito Constitucional.

            Segundo Paulo Bonavides (2006, p.398) :

     O princípio da proporcionalidade, enquanto princípio constitucional, somente se compreende em seu conteúdo e alcance se considerarmos o advento histórico de duas concepções de Estado de Direito: uma, em declínio, ou de todo ultrapassada, que se vincula doutrinariamente ao princípio da legalidade, com apogeu no direito positivo da Constituição de Weimar; outra, em ascensão, atada ao princípio da constitucionalidade, que deslocou para o respeito dos direitos fundamentais o centro de gravidade da ordem jurídica.

     Foi esse segundo Estado de Direito que fez nascer, após a conflagração de 1939-1945, o princípio constitucional da proporcionalidade, dele derivado. Transverteu em princípio geral de direito, agora em emergência na crista de uma revolução constitucional, relativa ao incremento expansão sem precedentes do controle de constitucionalidade.

            Este princípio converteu-se em princípio constitucional, por obra da doutrina e da jurisprudência, sobretudo na Alemanha e Suíça.(BONAVIDES, 2006)

            “Na Constituição Federal de 1988 este princípio esta configurado implicitamente e pode-se vislumbrá-lo em diversos dispositivos, por exemplo: os inc.,V, X, XXV do art. 5°; os inc. IV, V, XXI do art. 7°; § 3° do art. 36 e inc. IX do art. 37”. (FARIAS,2000,p.47)

            Vejamos a seguir um exemplo da presença deste princípio na Constituição de 1988 nas palavras de Edílson Farias:

Como exemplo de princípios implícitos ou princípios gerais do Direito com respaldo na Constituição de 1988, pode-se inicialmente, mencionar o relevante princípio da proporcionalidade, que, entendido na acepção de garantia dos cidadãos contra os excessos praticados pelo Poder Público teria arrimo, principalmente no § 2° do art. 5°.(FARIAS, 2000, p.47).

            O Direito Constitucional brasileiro acolhe expressões nítidas e especiais de proporcionalidade, isto é, regras de aplicação particularizada ou específica do princípio, a que se refere à Constituição, sem, todavia explicitá-lo, como ocorre, por exemplo, com alguns direitos sociais ou no campo do Direito Tributário (§ 1°  do art. 149) ou ainda no Direito Eleitoral relativamente à representação proporcional como regra constitucional de composição de uma das casas do Poder Legislativo (caput do § 1° do art. 45).(BONAVIDES,2006)

“É inegável sua positivação na Constituição Federal, haja vista que as discussões doutrinárias estão circunscritas a sua localização no texto magno e não sobre normatividade”. (BONAVIDES,2006, p. 399)

É na qualidade de princípio constitucional ou princípios gerais de direito, apto a acautelar do arbítrio do poder o cidadão e toda a sociedade, que se faz mister reconhece-lo já implícito e, portanto, positivado em nosso Direito Constitucional.

5.1.3 Tríplice dimensão do princípio da proporcionalidade e sua aplicação

Quando se dá um imbricamento entre bens jurídicos torna-se necessária à aplicação do princípio da proporcionalidade onde haja uma relação de causalidade entre meio e fim como medida concreta para que se realize uma finalidade. E para a efetivação da realização deste princípio é essencial verificar se a medida é adequada, necessária e proporcional em sentido estrito, ou seja, a norma tem que possuir aptidão para os fins a que se destina, dentre todas, ser a menos gravosa para o alcance de tais fins, e ainda causar benefícios superiores às desvantagens proporcionais.

            Nas palavras Humberto Ávila (2005,p.113):

     O exame de proporcionalidade aplica-se sempre que houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidade. Nesse caso devem ser analisadas as possibilidade de a medida levar à realização da finalidade (exame da adequação), de a medida ser a menos restritiva aos direitos envolvidos dentre aquelas que poderiam ter sido utilizadas para atingir a finalidade (exame de necessidade) e de a finalidade pública ser tão valorosa que justifique tamanha restrição (exame da proporcionalidade em sentido estrito).

Estas subdivisões, como será visto a seguir, também identificadas como subprincípios, fornecem parâmetros para que se realize tal finalidade.

5.1.3.1 Adequação

            Neste subprincípio é necessário buscar o meio mais adequado cuja eficácia contribua para a promoção gradual do fim. No entanto,segundo Humberto Ávila (ÁVILA,2005, p.116) “a compreensão da relação entre meio e fim exige respostas a três perguntas fundamentais: o que significa um meio ser adequado à realização de um fim? Como deve ser analisada a relação de adequação? Qual deve ser a intensidade de controle das decisões adotadas pelo Poder Público ? “

            Para responder estas perguntas o citado autor aduz que é importante analisar essa relação em três aspectos, veja:

     Sob os aspectos quantitativo(intensidade) um meio pode promover menos, igualmente ou mais o fim do que outro meio, em termos qualitativos (qualidade), um meio pode promover pior, igualmente ou melhor o fim do que outro meio, e em termos probabilístico (certeza) um meio pode promover com menos, igual ou mais certeza o fim do que outro meio.

Verifica-se a princípio que a administração e o legislador têm que julgar a escolha do meio, mediante a consideração das circunstâncias existentes no momento da escolha; do meio mais intenso, o melhor e o mais seguro para atingir o fim, como melhor explica Ávila (2005, p.117):

 A comparação entre meios que o legislador ou administrador terá de escolher nem sempre se mantém em um mesmo nível (quantitativo, qualitativo ou probalístico), como ocorre na comparação entre um meio mais fraco e outro mais forte, entre um meio pior e outro melhor, ou entre um meio menos certo e outro mais certo para a promoção do fim. A escolha da administração na compra de vacinas que acaba com todos os sintomas da doença (superior em termos quantitativos), mas, que não tem eficácia comprovada para a maioria da população (inferior em termos probalísticos) e outra vacina que, apesar de curar apenas os principais efeitos da doença (inferior em termos quantitativos), já teve sua eficácia comprovada em outras ocasiões (superior em termos probalísticos). 

            No entanto, é possível reconhecer que nem sempre é possível aplicar a otimização, sendo assim, reconhece-se que o Poder Executivo e o Poder Legislativo devem escolher um meio que promova minimamente o fim, mesmo que esse não seja o mais intenso, o melhor, nem o mais seguro.

5.1.3.2 Necessidade

            A aplicação deste subprincípio tem suma importância na medida de seus efeitos, uma vez que para se promover o fim entre os meios alternativos, é necessário adotar o meio que promova, mesmo que em menor intensidade o fim em exame, mas com mais intensidade outros cuja promoção também é determinada pelo ordenamento jurídico. A verificação do meio menos restritivo, ou seja, que promovam menor agressão a direitos colidentes, deve indicar o meio mais suave, em geral e nos casos evidentes.

                        O exame da necessidade, segundo Ávila (2005, p.122):

     Envolve duas etapas de investigação: em primeiro lugar, o exame da igualdade de adequação dos meios, para verificar se os meios alternativos promovem igualmente o fim, em segundo lugar, o exame do meio menos restritivo, para examinar se os meios alternativos restringem em menor medida os direitos fundamentais colateralmente afetados.

Veja um exemplo da aplicação do exame da necessidade, nas palavras de Humberto Ávila, (2005, p. 123):

     A 1º Turma do Tribunal deferiu pedido de hábeas corpus impetrado pelo paciente que seria o pai presumido de menor nascido na constância de seu casamento, que respondia à ação ordinária de reconhecimento de filiação combinada com retificação de registro movida por terceiro que se pretendia pai biológico da criança. O impetrante usou o hábeas corpus para se livrar do constrangimento de ser submetido ao teste de DNA. Neste caso sustentou-se que a investigação de paternidade poderia ser feita sem a participação do paciente, eis que o autor da ação poderia ele mesmo fazer o teste de DNA. O Tribunal considerou que o meio alternativo (exame de DNA pelo autor da ação investigação de paternidade) seria menos restritivo que aquele escolhido pelo julgador a quo (exame de DNA pelo réu da ação de investigação de paternidade).

            Torna-se necessário à aplicação do processo da ponderação entre o grau de restrição e o grau de promoção quando os meios são diferentes não só no grau da restrição dos direitos, mas também no grau de promoção da finalidade. Do contrário, como escolher entre um meio que restringe pouco um direito, mas, em contrapartida, promove pouco o fim, e um meio que promove bastante o fim, mas, em compensação, causa muita restrição a um direito fundamental?.A forma de exercer esta escolha será demonstrada no próximo tópico que trata da proporcionalidade em sentido estrito. (ÀVILA, 2005)

            Conclui Ávila, dando ênfase a necessidade de que o processo de ponderação envolva o esclarecimento do que está sendo objeto de ponderação, da ponderação propriamente dita e da reconstrução posterior da ponderação.(ÁVILA, 2005, p.124).

5.1.3.3 Proporcionalidade em sentido estrito

            Neste subprincípio verifica-se uma complexidade e um aspecto subjetivo, uma vez que é necessário julgar o grau de importância do fim e o grau de restrição, ou seja, as vantagens causadas pela promoção do fim, ou as desvanatgens, as desvalia da restrição causada na adoção do meio.

            Observa-se no julgamento em que foi considerado desproporcional a media de ser pesados obrigatoriamente os botijões de gás no momento de sua venda em vista do consumidor, no tocante a intensidade das restrições causadas aos princípios da livre iniciativa e da propriedade privada (ônus excessivo às companhias, pois elas teriam de dispor de uma balança para cada veículo, elevando o custo, que seria repassado para o preço dos botijões, e exigindo dos consumidores que se locomovessem até os veículos para acompanhar a pesagem superava a importância da promoção do fim (proteção dos consumidores, que podiam ser enganados na compra de botijões sem o consentimento indicado) um exemplo de meio adotado para atingir uma finalidade pública, causando como efeito colateral, restrição a direitos fundamentais, sendo esta uma decisão proferida pelo STF citado na obra de Humberto Ávila,(2005,p.124).

            Destaca-se a essencialidade do exame da comparação entre a importância da realização do fim e a intensidade da restrição aos direitos fundamentais tanto sobre a ponderação tanto como no princípio da proporcionalidade manifestando-se em sentido estrito. 

5.2 PONDERAÇÃO

            “A ponderação (também chamada, por influência da doutrina norte-americana, de balancing) será entendida neste estudo como a técnica jurídica de solução de conflitos normativos que envolvem valores ou opções políticas em tensão, insuperáveis pelas formas hermenêuticas tradicionais” (BARCELLOS, 2005, p. 23).    

A decisão pela ponderação consiste, nas palavras de Luis Roberto Barroso, em uma técnica decisão jurídica aplicável a casos difíceis, em relação aos quais a subsunção se mostrou insuficiente, especialmente quando uma situação concreta dá ensejo à aplicação de normas de mesma hierarquia que indicam soluções diferenciadas.(BARROSO,2004,p. 358).

“A ponderação de bens consiste num método destinado a atribuir pesos a elementos que se entrelaçam, sem referência a pontos de vista materiais que orientem esse sopesamento”.(Ávila, 2005, p.94).        

            Com bem explicita Humberto Ávila, é importante destacar e separar os objetos da ponderação, ainda que sejam relacionados entre si, uma vez que esta distinção é necessária para que a clareza impere na aplicação deste método como resolução de um conflito.

     “Os bens jurídicos são situações, estados ou propriedades essenciais á promoção dos princípios jurídicos. Por exemplo, o princípio da livre iniciativa pressupõe, como condição para sua realização, liberdade de escolha e autonomia. Liberdade e autonomia são bens jurídicos, protegidos pelo princípio da livre iniciativa, algum sujeito pode ter, em função de determinadas circunstâncias, condições de usufruir daquela liberdade e autonomia. Liberdade e autonomia passam, então, a integrar a esfera de interesses de determinado sujeito. Os valores constituem o aspecto axiológico das normas, na medida em que indicam que algo é bom e, por isso, digno de ser buscado ou preservado. Nessa perspectiva, a liberdade é um valor,e, por isso, deve ser buscado, determinam que esse estado de coisas deve ser promovido.” ( ÁVILA,2005,p. 95)

Nesse sentido, quando o caso concreto admitir aplicação de vários princípios de mesmo nível hierárquico é imprescindível à conjugação dos mesmos, e desta ponderação de princípios emergirá a regra a ser aplicada ao caso em julgamento. Sendo assim, a decisão final, a regra, deverá, em maior ou menor intensidade, acatar todos os princípios aplicáveis naquele caso.

            Veja nas palavras de Luis Roberto Barroso (2004, p.357):

Imagine-se uma hipótese em que mais de uma norma possa incidir sobre o mesmo conjunto de fatos, várias premissas maiores, portanto para apenas uma premissa menor, como no caso clássico da oposição entre liberdade de imprensa e de expressão, de um lado, e os direitos à honra, à intimidade e vida privada, de outro. Como se constata singelamente, as normas envolvidas tutelam valores distintos e apontam soluções diversas e contraditórias para a questão. Na sua lógica unidirecional (premissa maior- premissa menor), a solução subsuntiva para esse problema somente poderia trabalhar com uma das normas, o que importaria na escolha de uma única premissa maior, descartando-se as demais. Tal formula, todavia, não seria constitucionalmente adequada: por força do princípio instrumental da unidade da Constituição, o intérprete não pode simplesmente optar por uma norma e desprezar outra em tese também aplicável, como se houvesse hierarquia entre elas.

     A clareza é muito importante para que se possa conhecer a sutil diferença entre os objetos da ponderação que são dignos de sopesamento. E de alguma forma, cada um desses elementos deverá ser considerado na medida de sua importância e pertinência para o caso concreto, de modo que na solução final, tal qual em um quadro bem pintado, as diferentes cores possam ser percebidas, ainda que uma ou algumas delas venham a se destacar sobre as demais. Esse é, de maneira geral, o objeto daquilo que se convencionou denominar Técnica da ponderação.

            Barroso (2004,p.358) aduz que, “a estrutura interna do raciocínio ponderativo ainda não é bem conhecida, embora esteja sempre associada às noções difusas de balanceamento e sopesamento de interesses, bens, valores ou normas”. 

Pode-se, no entanto, sejam quais forem os elementos objetos de ponderação, evoluir para umas ponderações intensamente estruturadas, que poderá ser utilizada na aplicação dos postulados específicos. Para atingir esse desiderato, algumas etapas são fundamentas.

 Segundo Ana Paula de Barcellos (2005,p.91), é possível, de forma simplificada descrever a ponderação como um processo de três etapas sucessivas, assim relatadas:

5.2.1 Primeira etapa: Identificação dos enunciados normativos em tensão.  

É necessário identificar claramente, na primeira etapa da realização do método da ponderação, os elementos fundamentais dos quais são compostas as colisões.

Nesta fase devem ser analisados, todos os elementos e argumentos, o mais exaustivamente possível, é importante “identificar todos os enunciados normativos que aparentemente se encontram em conflito ou tensão e agrupá-los em função da solução normativa que sugerem para o caso concreto”.(BARCELLOS, 2005,p. 92).

“Esta primeira etapa consiste exatamente em identificar os enunciados normativos aparentemente em conflito: afinal, esta é a circunstância que justifica o recurso à técnica da ponderação”(BARCELLOS, 2005,p. 92).

Sendo assim, após a identificação preliminar dos enunciados em tensão, será o caso de verificar se o conflito não pode ser solucionado por técnicas tradicionais de soluções de antinomias, por envolver uma disputa grave entre valores ou opções políticas. Apenas se isso não for possível é que o processo de ponderação terá continuidade. 

Dentre algumas observações que se deve tecer sobre esta primeira etapa, destaca-se a que traz que, em qualquer caso, o que estará sendo examinado é o enunciado normativo no qual o interesse encontrou respaldo lógico, e não o interesse propriamente dito.

Na ponderação jurídica, que é uma técnica de decisão jurídica, deverão ser considerados apenas os elementos normativos em conflito, diferentemente do que ocorre nas decisões políticas, nas quais, são consideradas as vantagens e desvantagens de uma determinada decisão.(BARCELLOS,2005).

O uso exclusivo de enunciados normativos na medida em que se exige, desde o início, que as diferentes pretensões demonstrem sua vinculação com o sistema jurídico, tem por objetivo preservar o espaço de determinação democrática e a legitimidade da própria operação ponderativa. Haja vista que não se admite na discussão, interesses que não possam demonstrar alguma conexão com a ordem jurídica.  

Ou seja, como bem observa Ana Paula Barcellos(2005, p. 99),

A ponderação, como já se mencionou, é uma técnica de decisão jurídica. Se o intérprete a quem cabe decidir considerar, ao lado de elementos normativos pertinentes, e no mesmo nível deste, interesses não qualificados pelos órgãos competentes como juridicamente relevantes e dignos de proteção, isto é, se admite o ingresso de meros interesses no processo, a ponderação acaba por se transformar em uma avaliação puramente política. (...) na ponderação jurídica deverão ser considerados apenas os elementos normativos em conflito. Equiparar disposição normativas e interesses não judicializados é uma forma ilegítima de refazer o ofício do legislador.

Para melhor esclarecimento sobre o ponto, nota-se este exemplo concedido por Ana Paula de Barcellos:

Imagine-se que os vizinhos de um edifício em construção-regularmente licenciado- preferissem que nada fosse edificado no lote ao lado , para preservar a tranqüilidade atual da área. O simples interesse ou desejo, porém, não é um elemento normativo. Há algum fundamento jurídico capaz de respaldar esse interesse? O advogado do grupo talvez pudesse cogitar, na esfera constitucional, dos princípios que consagram os direitos difusos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e á sadia qualidade de vida, previstos no art. 225 da Constituição.

Assim um hipotético conflito entre, de um lado, as disposições normativas que regulam o direito de construir e a autorização para edificar na cidade e, de outro, o desejo dos vizinhos de não verem coisa alguma construída no local deve ser descrito, nessa primeira fase do processo ponderativo, como um conflito entre as disposições normativas que tutelam o direito de construir e concedem a autorização para edificar na cidade e os princípios constitucionais que tratam do meio ambiente e da qualidade de vida, inscritos no caput do art.225 da Carta. (BARCELLOS,2005,p.99)

5.2.2 Segunda etapa: Identificação de fatos relevantes. 

            Cabe nesta etapa apurar os aspectos de fato relevantes e sua repercussão sobre diferentes soluções indicadas pelos grupos formados na etapa anterior. Assim, o exame dos fatos e os reflexos sobre eles das normas identificadas na primeira fase poderão apontar com maior clareza o papel de cada uma delas e a extensão de sua influência.

             Segundo Ana Paula de Barcellos, (2005,p.116) “a ponderação depende substancialmente do caso concreto e de suas particularidades, daí a necessidade de examinar as circunstâncias concretas do caso e suas repercussões sobre os elementos normativos”.

            Ainda sob a ótica de Barcellos, após destacar as circunstâncias de fato relevantes, estes terão influência sobre o peso ou a importância a ser reconhecida aos enunciados identificados na fase anterior e ás normas por eles propugnadas.

            Neste sentido é importante reproduzir as palavras de Eros Roberto Grau, para quem a interpretação abrange os fatos e não apenas as normas:

     A interpretação abrange também os fatos, o intérprete os reconforma, de modo que podemos dizer que o direito institui a sua própria realidade. Daí a importância do relato dos fatos (=narrativa dos fatos a serem considerados pelo intérprete) para interpretação. Pois, é certo que os fatos não são, fora de seu relato ( isto é, fora do relato a que correspondem), o que são.

     O que desejo afirmar é a fragilidade do compromisso entre o relato e seu objeto, entre relato e o relatado. Esse compromisso é, antes de mais nada, comprometido em razão (1) de jamais descrevermos a realidade;o que descrevemos é nosso modo de ver a realidade. Além de não descrevermo-la, porém o nosso modo de ver a realidade, (2 ) essa mesma realidade determina o nosso pensamento e, (2 b) ao descrevermos a realidade, nossa descrição da realidade será determinada (i) pela nossa pré-compreensão dela (= da realidade) e (ii) pelo lugar que ocupamos ao descrever a realidade ( = nosso lugar no mundo e lugar desde o qual pensamos). Por isso caberá aqui tudo o que digo no Ensino a pré-compreensão.

     Também no que tange aos fatos não existe, no direito, o verdadeiro. Inútil buscarmos a verdade dos fatos, porque os fatos que importarão não é para a construção da norma são aqueles recebidos/percebidos pelo intérprete- eles, como são percebidos pelo intérprete, é que informarão/conformarão a produção/criação da norma. ( GRAU,2005, p.3)  

            Um determinado fato é considerado relevante se a experiência social assim o considera, ou seja, este fundamento é dado pelo senso comum, e é necessário a existência de disposições normativas que autorizam essa conclusão.

            Para melhor compreensão, vejamos o exemplo dado por Ana Paula de Barcellos:

     Com fundamento apenas no senso comum, e considerando a realidade brasileira, a cor dos cabelos do indivíduo será irrelevante para a decisão acerca da maior ou menor proteção de sua vida privada, quando este bem esteja em confronto com a liberdade de imprensa. Já mesclando o senso comum com fundamento jurídico, à solução desse mesmo conflito normativo será certamente influenciado pelo fato de a pessoa envolvida ser, titular de um mandato eletivo, de modo que este será agora um aspecto de fato relevante. As disposições normativas que tratam da democracia, da obrigação de prestar contas por parte dos agentes políticos e do princípio da publicidade qualificarão a circunstância como relevante nessa espécie de conflito. (BARCELLOS,2005, p.117)      

            A repercussão dos fatos sobre os enunciados normativos pode atribuir um peso maior ou menor de importância. “Assim, em um confronto entre duas soluções – publicar ou não matéria jornalística sobre a rede de amigos de um deputado federal-, o fato de se tratar de matéria envolvendo um deputado federal atribuiria maior peso, nesse caso, ao grupo de enunciados normativos que sugere a publicação da matéria” (BARCELLOS,2005, p.120).

            Por fim, conclui-se que a “identificação desses fatos permitirá ao intérprete apurar se existe alguma possibilidade fática de atender a todas as soluções em um nível ótimo e, em qualquer caso, servirão de importante subsídio para a última etapa da ponderação” (BARCELLOS, 2005,p.123), que é a fase em que é tomada a decisão. No entanto, caso não consiga o atendimento em nível ótimo, o intérprete deverá optar por uma solução que cause menos restrição às demais.

5.2.3 Terceira etapa: Decisão

 “É nesta etapa que se estará examinando conjuntamente os diferentes grupos de enunciados, a repercussão dos fatos sobre eles e as diferentes normas que podem ser construídas, tudo a fim de apurar os pesos que devem ser atribuídos aos diversos elementos em disputa”. (BARCELLOS,2005,p.123).

Determinando estes valores, e em consequência disto, será resolvida a colisão de princípios, seja conciliando ou indicando qual deles deverá preponderar naquele caso, sem declarar a invalidade de nenhum deles. Os princípios, por sua estrutura e natureza, e observados determinados limites, podem ser aplicados com maior ou menor intensidade, à vista de circunstâncias jurídicas ou fáticas, sem que isso afete sua validade.

Nesse sentido, Luis Roberto Barroso assevera o seguinte:

Pois bem: nessa fase dedicada á decisão, os diferentes grupos de normas e repercussão dos fatos do caso concreto estarão sendo examinados de forma conjunta, de modo a apurar os pesos que devem ser atribuídos aos diversos elementos em disputa, portanto, o grupo de normas que deve preponderar no caso. Em seguida, é preciso ainda decidir quão intensamente esse grupo de normas-e a solução por ele indicada- deve prevalecer em detrimento dos demais, isto é: sendo possível graduar a intensidade da solução escolhida, cabe ainda decidir qual deve ser o grau apropriado em que a solução deve ser aplicada. Todo este processo tem como fio condutor o princípio instrumental da proporcionalidade ou razoabilidade ( BARROSO, 2004,p.360).

            Portanto, depois de concluídas as duas primeiras etapas da aplicação do método da ponderação, ou seja, depois de identificadas às normas pertinentes, selecionados os fatos relevantes com atribuição geral de pesos deverá ser produzida uma conclusão. No entanto, esta fase é a mais complexa de toda a operação. Para melhor compreensão de sua complexidade vejamos a explicação de Ana Paula de Barcellos:

     As questões que são colocadas nesta fase são várias. Que peso deve ser atribuído a cada elemento normativo? Por que uns receberão um peso maior que outros? Por qual razão uma solução indicada por determinados elementos normativos deve prevalecer sobre outra? A técnica da ponderação não oferece respostas definitivas para essas perguntas. Em si mesmas, a ponderação é apenas uma técnica instrumental, vazia de conteúdo. É bem de ver que essa limitação não retira o valor de aprimorar-se a técnica da ponderação propriamente dita. A organização do raciocínio ponderativo facilita o processo decisório, torna visíveis os elementos que participam desse processo e, por isso mesmo, permite o controle da decisão em melhores condições.(BARCELLOS,2005,p.124).

             Para aquisição de um entendimento mais claro sobre a técnica da ponderação, as restrições aplicáveis e a proteção a um bem mais valorado, serão citadas um exemplo apresentado por Ana Paula de Barcellos em sua obra.

     A cantora Glória Trevi, ao descobrir-se grávida, acusou de estupro os policiais que trabalhavam na carceragem. Quando do nascimento da criança, os acusados apresentaram seus seus padrões de DNA e solicitaram que fosse realizado o exame na criança, de modo que a veracidade das acusações formuladaspela mãe pudesse ser submetida à prova. A questão acabou sendo decidida pelo STF, que, a despeito da oposição da mãe, deferiu o pedido. A decisão do Suprem Tribunal Federal levou em conta especialmente a possibilidade de realizar o exame com material da placenta, o que não importaria qualquer restrição importante à integridade física da mãe ou da criança.

     Note-se que o dado fático em questão - a circunstância de ser possível realizar o exame de DNA a partir de material da placenta - não confere maior importância à honra dos policiais. Ele simplesmente revela que o atendimento dessa pretensão no caso não causa qualquer restrição relevante ao outro elemento em disputa, a saber: a integridade física da mãe e, sobretudo, da criança. Por outro lado, a adoção de uma norma que vedasse a realização do teste impediria a comprovação da falsidade da acusação meio pelo qual se poderia restaurar a honra e o bom nome dos acusados. (BARCELLOS,2005,p. 121)

            Como bem apresentado e explicado por Barcellos, no momento da definição do conflito deve ser analisado o bem a ser protegido e também o bem que vai sofrer menos restrição, sendo que a questão definidora do conflito no exemplo acima foi calcada na restrição mínima que a integridade física da autora iria sofrer em relação à restrição do outro elemento em disputa que é a honra dos acusados de estupro, que neste momento poderiam tê-la restaurada, uma vez que poderiam comprovar a falsidade da acusação.     

            A citada autora indica três diretrizes gerais que devem orientar a atividade do interprete na fase de decisão da ponderação. São elas: 1ª- pretensão de universalidade; 2ª-  busca pela concordância prática; 3ª- Construção do núcleo dos direitos fundamentais. (BARCELLOS, 2005)

5.2.4 Pretensão de universalidade.

“Com esta expressão, pretende-se significar, na verdade, duas necessidades distintas: uma relacionada com a argumentação jurídica propriamente dita e outra com a decisão final do intérprete”. (BARCELLOS, 2005,p 126).

Primeiramente, é necessário que o intérprete jurídico empregue uma argumentação universal, entendida e aceitável de forma geral dentro da sociedade e do sistema jurídico no qual ela está inserida. Uma vez que a seleção inicial dos enunciados pertinentes e a atribuição de relevância aos fatos, poderá depender de avaliações não apenas jurídicas, mas também culturais, verificando-se assim a possibilidade de haver decisões pautadas em opiniões pessoais não justificáveis publicamente dominarem o processo.

O segundo sentido da pretensão de universalidade é que a decisão deve poder ser simples e generalizada para todas as outras situações semelhantes ou equiparáveis. “Essa exigência decorre naturalmente do dever de isonomia aplicado á prestação da jurisdição, pelo qual todos aqueles que se encontrem em situação equivalente devem receber a mesma resposta do Poder Judiciário” (BARCELLOS, 2005, p.131).

5.2.5 Busca pela concordância prática

            A busca pela concordância prática é uma diretriz metodológica com a finalidade de direcionar a ponderação e harmonizar os valores na medida em que realize as menores restrições sobre as disposições normativas envolvidas e de maneira mais proporcional possível. Esse postulado surge da coexistência de valores que apontam total ou parcialmente para sentidos contrários.

            Nessa diretriz impera o dever de realização máxima de valores entre as normas imbricadas, com a finalidade de encontrar uma otimização entre os valores em conflito.

            Nesse sentido Humberto Ávila (2005,p.96) assevera que:

     Nem a ponderação nem a concordância prática indicam os critérios formais ou materiais por meio dos quais deve ser feita a promoção das finalidades entrelaçadas. Consubstanciam estruturas exclusivamente formais e despidas de critérios. Como será oportunamente investigado, são os postulados da razoabilidade e da proporcionalidade que permitem estruturar a realização das normas constitucionais. 

            A concordância prática dos enunciados em tensão, e sua harmonização recíproca de modo que nenhum deles tenha sua incidência totalmente excluída na hipótese é o objetivo final do processo de ponderação, mesmo sabendo que haverá hipóteses onde não será possível o alcance de qualquer harmonização o que levará o afastamento de um dos elementos normativos aplicáveis ao caso concreto.

            Conclui Barcellos (2005,p.139) que : “A não incidência em nenhuma medida de um enunciado válido e pertinente em determinado caso, não afastado por qualquer das exceções admitidas pela ordem jurídica, constitui uma quebra de sistema e deve, tanto quanto possível , ser evitada”

5.2.6 Construção do núcleo essencial dos direitos fundamentais

            “Esta diretriz busca proteger o núcleo dos direitos fundamentais, uma vez que esses direitos não podem ser restringidos (pelo legislador ou pelo Juiz) a ponto de tornarem invólucros vazios de conteúdo, sobretudo em sistemas onde desfrutem do status de cláusulas pétreas”.(BARCELLOS,2005,p.140).

            O núcleo dos direitos fundamentais deve funcionar como um limite último de sentido, invulnerável com relação a conformações ou restrições que possam ocorrer em virtude de conflitos específicos envolvendo direitos entre si ou direitos e enunciados que consagram fins coletivos.

            É importante, para melhor compreensão sobre esta diretriz sabermos o que é o núcleo de cada direito fundamental, vejamos nas palavras de Barcellos o que aduz as chamadas teorias relativas e absolutas:

     A teoria relativa sustenta que o conteúdo essencial de um direito só pode ser visualizado diante do caso concreto e que, portanto, apenas depois da ponderação será possível identificar o que é afinal o núcleo. Não se pode falar, assim, de um conteúdo abstrato que não possa sofrer restrições; esse conteúdo será identificado caso a caso, em função das circunstancia da hipótese examinada.

     Já a teoria absoluta, fornece uma diretriz teoricamente consistente, mas a verdade é que não existe pronto, á disposição do aplicador, um manual com a descrição do núcleo de cada direito fundamental. Mais que isso, parece realmente impossível (e mesmo inconveniente) que se possa delinear esse núcleo de forma absoluta-“dura” e permanente, como se fosse humanamente viável formular um juízo “all things considered”, capaz de antever e considerar todos os elementos relevantes, ou como se o sentido dos conceitos jurídicos não variasse em função da compreensão histórica dos fenômenos sociais. (BARCELLOS,2005,p.143) 

            Conclui-se que a decisão que vier a ser apurada no processo de ponderação não poderá violar o núcleo dos direitos fundamentais, como limite à atuação do intérprete e protegendo em alguma medida esses direitos de ações arbitrárias e abusivas, sendo perfeitamente possível que a doutrina se ocupe de construir os sentidos próprios de cada direito, propondo parâmetros ou standardsespecíficos capazes de identificar o que deve ser considerado como prerrogativa essencial de cada direito, o que pode sofrer restrição, em que circunstancia isso pode acontecer, dentre outros elementos necessários para sua melhor compreensão.

            Para fechar um entendimento conciso sobre todo o exposto, fornecido será mais um exemplo, anteriormente citado no subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito, que trata da aplicação da técnica da Ponderação através da proporcionalidade na resolução de um conflito entre princípios.

            O exemplo trata de uma lei estadual nº 10248/93 que exigia a obrigatoriedade da pesagem dos botijões de gás no momento de sua comercialização, verifique parte desta lei:

     Art. 1º É obrigatória a pesagem, pelos estabelecimentos que comercializarem GLP- Gás Liquefeito de Petróleo, à vista do consumidor, por ocasião da venda de cada botijão ou cilindro entregue e também do recolhido, quando procedida a substituição.

     Parágrafo único. Para efeito do disposto no caput deste artigo, os postos revendedores de GLP, bem como os veículos que procedam à distribuição a domicílio, deverão portar balança apropriada para essa finalidade.

Art. 2º Verificada a diferença menor entre o conteúdo e quantidade líquida especificada no botijão ou cilindro, o consumidor terá direito a receber no ato do pagamento, abatimento proporcional ao preço do produto.

Art. 3º Caso se constate, na pesagem do botijão ou cilindro que esteja substituído, sobra de gás, o consumidor será ressarcido da importância correspondente, através de compensação no ato do pagamento do produto adquirido.

            No entanto, tal lei foi declarada inconstitucional pelo STF na ADI 885, com fundamento na intensidade das restrições causadas aos princípios da livre iniciativa e da propriedade privada, uma vez que tal medida causaria um ônus excessivo às companhias, pois elas teriam de dispor de uma balança uma balança para cada veículo, elevando o custo, que seria repassado para o preço dos botijões, e exigindo dos consumidores que se locomovessem até os veículos para acompanhara pesagem. Esta restrição superava a importância da promoção do fim, que era a possibilidade dos consumidores serem enganados na compra de botijões. Sendo assim o STF optou por restringir, neste caso, um direito fundamental.  (ÁVILA, 2005)

5. CONCLUSÃO

            Ao final deste estudo, pode-se concluir o seguinte:

a)      Que a conceituação de Princípios Jurídicos é que ele é a base, o alicerce de todo o sistema jurídico, ele designa a estrutura de um sistema de idéias, pensamentos ou normas, e todas as demais idéias, pensamentos ou normas derivam dele.

b)      Tornou-se evidente o papel fundamental dos princípios na ordem jurídica. Os princípios expressam valores e o sentido pelo qual um ordenamento existe. Da sua inserção no plano constitucional resulta a ordenação dos preceitos constitucionais segundo uma estrutura hierarquizada. A lógica jurídica parte dos princípios em direção as regras. 

c)      Tornou-se evidente a distinção entre princípios e regras uma vez que a maneira de solucionar os casos de colisão de princípios e conflitos de regras é diversa, pois, a colisão de princípios é resolvida levando em consideração o peso ou a importância relativa de cada princípio, já o conflito entre regras ocorre na dimensão da validade.

d)      Que possuem a posição estrutural mais importante dentro do sistema.

e)      Que a resolução de uma colisão entre eles será realizada através de ponderação, tendo em vista que os métodos tradicionais se mostraram insuficientes.

f)       Que o princípio da proporcionalidade é utilizado no momento da aplicação do método da ponderação.

g)      E para efetivação da realização deste princípio é essencial verificar se a medida é adequada, necessária e proporcional em sentido estrito, ou seja, a norma tem que possuir aptidão para os fins a que se destina, dentre todas, ser a menos gravosa para o alcance de tais fins, e ainda causar benefícios superiores às desvantagens proporcionais.

h)      A ponderação consiste em atribuir pesos a interesses opostos definindo por um interesse de maior importância no caso concreto.

i)        Para realizar este sopesamento é muito importante conhecer a diferença entre os objetos da ponderação e esta clareza somente é alcançada após um processo de três etapas sucessivas, sendo elas: 1ª Identificação dos enunciados normativos em tensão; 2ª Identificação dos fatos relevantes; 3ª Decisão.

j)        É na etapa da decisão que é determinado qual dos valores deverá preponderar no caso concreto, sem declarar a invalidade dos preteridos, e para chegar nesta conclusão é necessário que o intérprete seja orientado por três diretrizes gerais. São elas: 1ª Pretensão da Universalidade; 2ª Busca pela concordância prática; 3ª Construção do núcleo dos direitos fundamentais.

k)      Com isso, através destes conhecimentos, foi possível obter uma melhor definição e um entendimento mais claro potencialmente proporcionadores de uma aplicação justa de princípios e de regras na operacionalização do direito.

 


6.  REFERÊNCIAS:

 

ÁVILA,Humberto.Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 4º. ed. Brasil: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2005.

BRASIL,Constituição da República federativa do Brasil.São Paulo:Revista dos Tribunais, 2007.

BRASIL, Código Civil. Revista dos Tribunais, 2007.

BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderação, Racionalidade e Atividade Jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. 6º. ed. rev., atual. e ampl.-São Paulo: Saraiva, 2004.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 14a ed. São Paulo: Malheiros: 2004.

ESPÍNDOLA, Ruy Samuel.Conceito de Princípios Constitucionais: Elementos teóricos para uma formulação dogmática constitucionalmente adequada. 2º. ed. rev.., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

FARIAS, Edílson Pereira de. Colisão de Direitos: A honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informação. 2º. ed.  Porto Alegre: PC Editorial Ltda, 2000.  

GRAU, Eros Roberto. Ensaio e Discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito. 3º. ed. São Paulo: PC Editorial, 2005.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de Direito Administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991.

SANTOS, Márcio Gil. Reflexão sobre princípios constitucionais. Revista Estação Científica. Vol. 1, N. 2, Agosto/Setembro 2007  Juiz de Fora: Faculdade Estácio de Sá, 2007.

SANTOS, Márcio Gil Tostes. Ponderação de interesses entre princípios processuais constitucionais. 2006.203. Dissertação (Mestrado em Direito) Universidade Vale do Rio Verde, 2006.

SARMENTO, Daniel. Os Princípios Constitucionais e a Ponderação de Bens. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.

TORRES, Ricardo Lobo.Teoria dos Direitos Fundamentais. 2º. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.