A colisão entre princípios constitucionais em casos de liminares inaudita altera pars e as formas de solução – análise de casos.


Porbarbara_montibeller- Postado em 03 abril 2012

Autores: 
ARAUJO, José Henrique Mouta

SUMÁRIO: I- Introdução. II- BREVE REFERENCIAL  SOBRE OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS. III- AINDA SOBRE OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS - O PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL EM  ASPECTOS GERAIS. IV - PRINCÍPIOS E REGRAS  - AS FORMAS DE SOLUÇÃO DAS COLISÕES E CONFLITOS. IV.A- Grau de generalidade. IV.B- Os princípios são mandatos de otimização – diferenças quanto a qualidade. V- A COLISÃO ENTRE PRINCÍPIOS E OS MEIOS DE SOLUÇÃO – A IMPORTÂNCIA DA CORRETA INTERPRETAÇÃO.  VI – AS LIMINARES INAUDITA ALTERA PARS E OS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO – A NECESSIDADE DE PONDERAÇÃO ENTRE OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. VI.A- As liminares e os princípios constitucionais – análise de casos concretos

 

Resumo: No presente trabalho, pretende o autor enfrentar  aspectos ligados à efetividade da prestação jurisdicional nos casos envolvendo as liminares inaudita altera pars, principalmente no que respeita aos atendimento aos princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa.

 

 

I- INTRODUÇÃO

 

O presente trabalho tem por objetivo discutir a eficácia dos princípios constitucionais da ampla defesa, contraditório e devido processo legal em face de decisões judiciais concedidas sem a audiência da parte contrária.

Destarte, uma das grandes preocupações quando do direito constitucional e mesmo do processual é a correta interpretação de seus princípios fundamentais, principalmente quando se analisam casos concretos, considerando a presença de indagações em relação a correta interpretação do texto constitucional visando a solução de eventuais colisões.

Com efeito, por diversas vezes o intérprete enfrenta situações onde se alega que determinada decisão judicial violou este ou aquele princípio constitucional. Aliás, no campo das tutelas de urgência essas indagações são ainda mais comuns.

É nesse aspecto que se elaborou o presente trabalho, com o intuito de colaborar na solução dos casos concretos envolvendo a interpretação dos princípios constitucionais em face das tutelas de urgência.

Destarte, essas tutelas emergenciais visam a superação do problema atinente ao binômio morosidade-efetividade, sendo um dos temas mais atuais no direito processual constitucional.

Assim, a busca da efetividade passa, necessariamente, pelo enfrentamento das tutelas de urgência e sua aplicação em face do réu, posto que a Constituição Federal lhe assegura o acesso à justiça, o atendimento aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Nesse particular, enfrentar-se-á a seguinte indagação: será que as medidas liminares inaudita altera pars violam esses princípios?

Destarte, a constante preocupação com a questão do acesso à justiça, com o intuito de oferecer a todos os que lamentam uma pretensão em  juízo, o direito a um ordenamento jurídico eficaz e, acima de tudo, ensejador da chamada justiça social passa necessariamente pelo enfrentamento da indagação acima.

Ademais, trazendo à lume o enfoque de Helmann Hassen[1], percebe-se que o Direito, que possui uma série de valores a serem alcançados, tem como valor fim ou valor precípuo a Justiça Social.

Enfim, é com vista a uma perspectiva crítica-contributiva, que será enfrentado o problema envolvendo a utilização efetiva do processo com uma forma de acesso à ordem jurídica justa, com especial enfoque às liminares inaudita altera pars e os princípios constitucionais do devido processo legal, contraditório e ampla defesa.

Não se trata de obra de fôlego, mas meras observações quanto a correta interpretação dos casos concretos envolvendo medidas liminares para que se posa alcançar a chamada ordem jurídica justa.

 

II- BREVE REFERENCIAL  SOBRE OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

 

Antes de se adentrar no ponto central do trabalho, cumpre fazer breve análise sobre o tema ‘princípios fundamentais’, com especial enfoque aos princípios do contraditório e devido processo legal.

Com efeito, esses princípios estão previstos na Carta Constitucional de 1988 no art. 5º, LIV e LV. Contudo, em muitos casos concretos, há aparente contradição – mera colisão entre os dois primeiros e o último[2].

Logo, observa-se que os princípios fundamentais devem ser analisados em seu conjunto, de acordo com uma interpretação em consonância com a concepção de Estado e de realidade social[3]. Nesse aspecto, vale a pena transcrever as lições de Konrad Hesse: “A norma constitucional não tem existência autônoma em face da realidade. A sua essência reside na sua vigência, ou seja, a situação por ela regulada pretende ser concretizada na realidade”[4].

Destarte, deve o texto constitucional estar em consonância com a realidade social em que foi promulgado. Apenas à guisa de exemplificação, a sociedade vem mudando profundamente com o passar do tempo e, neste século XXI, deve o texto constitucional e a interpretação de seus princípios estar em consonância com tal realidade social. Há corrente doutrinária que afirma que a Constituição poderia ser meramente procedimental, cabendo-lhe apenas estabelecer as regras de funcionamento do processo político[5].

De outra banda, claro está que deve o intérprete fazer uso da deontologia para melhor aplicar os princípios fundamentais, principalmente considerando a sua função de organizar o sistema jurídico e adequá-lo à realidade social. Ademais, os princípios também têm o papel de orientar e direcionar a aplicação das regras jurídicas, já que possuem papel hierarquicamente superior, como restará comprovado posteriormente.

Aliás, Bockenford elenca, na obra já citada, várias teorias sobre os direitos fundamentais, aduzindo que: “Este estado de cosas hace preciso que se haga consciente de modo general y expreso el nexo necesario, existente entre la teoria y la interpretación de los derechos fundamentales, y que se plante la cuestión acerca de que diferentes teorias de los derechos fundamentales influyen actualmente en la interpretación de los derechos fundamentales influyen actualmente en la interpretación de los derechos fundamentales, y con que consecuencias para el contenido de los concretos preceptos de derechos fundamentales lo hacen. Esta cuestión solo se puede tratar aqui, ciertamente, en la forma de una visión de conjunto, con la limitación a problemas ejemplificativos y con la evidente simplificación que trae consigo un procedimiento tipificador”[6].

Percebe-se, portanto, que na correta interpretação dos princípios constitucionais, deve o intérprete atentar para alguns critérios visando dirimir as colisões existentes no dia-a-dia forense[7].

Esses critérios podem variar de acordo com cada caso concreto, devendo ser verifica cada circunstância dentro da realidade social discutida.  Logo, nada impede em determinada hipótese a solução seja X, já em outra Z, sem que se possa falar em qualquer contradição, consideradas as circunstâncias isoladas de cada situação.

 

III- AINDA SOBRE OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS - O PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL EM  ASPECTOS GERAIS

 

O princípio do devido processo legal está previsto em nosso texto constitucional, no art. 5º, LIV, com a expressão de que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.

Contudo, pode-se mencionar como o marco de seu surgimento  a Magna Carta Libertatum,  de 1215, na Inglaterra, durante o reinado de João Sem Terra[8], com a denominação de due process of law.

O devido processo legal, ligado ao direito processual constitucional, assegura a todos os cidadãos, o direito ao chamado trinômio : vida, liberdade, patrimônio, com a observância de toda a sistemática processual[9]. Aliás, processo justo, sentença justa e sem qualquer espécie de nulidade, apenas poderá  alçada com o devido processo legal[10].

Não se pode negar o importante papel do Poder Judiciário nesse aspecto, considerando que se trata do principal guardião da liberdade, propriedade, liberdade e cidadania, em tudo observado o devido processo legal[11].

Evidente que, nesse importante papel de dirimir litígios, deve o Judiciário observar os princípios processuais constitucionais, dentre os quais o devido processo legal, sob pena de eivar a prestação jurisdicional de nulidade insanável. Destarte, o princípio da legalidade está atrelado ao princípio do devido processo legal[12]ao conceito de justiça[13].

De outra banda, não se pode negar que o due process of law mantém íntima ligação com os demais princípios processuais, como o contraditório, ampla defesa, etc. Nesse sentido, o Professor Nelson Nery Júnior chega inclusive a afirmar que: “Em nosso parecer, bastaria a norma constitucional haver adotado o princípio do due process of law para que daí decorressem todas as conseqüências processuais que garantiriam aos litigantes o direito a um processo e a uma sentença justa. É, por assim dizer,  gênero do qual todos os demais princípios constitucionais do processo são espécies”[14].

Portanto, percebe-se claramente a colocação como raiz de todos os princípios processuais previstos na CF/88 o due process of law. Contudo, como restará posteriormente enfrentado no presente trabalho, em alguns casos concretos poderá ocorrer colisão entre este e o princípio do contraditório, ocasião em que a interpretação deverá enfrentar as diretrizes das chamadas ‘leis de colisão’.

Como demonstrado anteriormente, o devido processo legal é de importância fundamental para o atendimento aos demais princípios processuais, dentre os quais o da legalidade, ampla defesa e contraditório, sob pena de se comprometer a integridade e mesmo a justiça da decisão. Comumente o Poder Judiciário vem decretando nulidade processual  em virtude do não atendimento ao devido processo legal[15].

Percebe-se, portanto, que nos processos judiciais e administrativos deve ser atendido o devido processo legal, sob pena de fulminá-los de nulidade insanável. E mais, a interpretação de tal princípio deve ser atinente à axiologia, em um sentido protetor[16].

Destarte, o devido processo legal é princípio basilar da atuação estatal no campo processual, assegurando e mesmo salvaguardando a proteção judicial para todos aqueles que lamentam pretensões em juízo através de um processo adequado e justo[17].

 

IV - PRINCÍPIOS E REGRAS  - AS FORMAS DE SOLUÇÃO DAS COLISÕES E CONFLITOS

 

 

Até o presente momento, utilizou-se genericamente a expressão ‘princípios’. Contudo, cumpre estabelecer o correto enquadramento dos princípios e das regras, já que constituem um marco na teoria normativa dos direitos fundamentais[18].

Há uma série de elementos que auxiliam na diferenciação entre princípios e regras, dentre as quais pode-se destacar:

 

IV.A- Grau de generalidade

 

Os princípios possuem grau de generalidade, enquanto as regras possuem grau baixo de generalidade (grau de abstração relativamente reduzido)[19]. Destarte, os princípios gozam de certa indeterminabilidade na aplicação ao caso concreto, enquanto as regras são suscetíveis de aplicação imediata[20].

 

Aliás, nesse aspecto, vale a pena citar os ensinamentos de Robert Alexy: “Los principios son normas de un grado de generalidad relativamente alto, y las reglas con un nivel relativamente bajo de generalidad. Un ejemplo de una norma con un nivel relativamente alto de generalidad es la norma que dice que cada cual goza de libertad religiosa. En cambio, una norma según la cual todo preso tiene derecho a convertir a otros presos tiene un grado relativamente bajo de generalidad. Según el criterio de generalidad, se podría pensar que la primera norma podría ser clasificada como principio y la segunda como regla”[21].

Os princípios, portanto, fundamentam toda a ordem jurídica através do universo de valores, devendo ser utilizados para preencher as lacunas existes na lei, além de originarem outros princípios correlatos[22].

Ademais, ainda segundo as lições de Robert Alexy, os princípios e as regras, que fazem o conjunto de normas jurídicas, constituem condutas, permissões e mandamentos, fazendo parte do chamado juízo do dever ser[23].

De outra banda, deve-se observar que, ocorrendo choque entre princípio e regra, aquele deve prevalecer, ao passo que se o caso envolver colisão entre princípios, a solução passará pelo exame da lei de colisão[24].

 

IV.B- Os princípios são mandatos de otimização – diferenças quanto a qualidade

 

Além do aspecto da generalidade, outra diferença importante entre princípios e regras diz respeito ao fato de que aqueles configuram ordem, e devem ser atendidos, enquanto as regras devem ser cumpridas ou não.

Com efeito, os princípios constituem ordem, não deixando margem para descumprimento. Nos casos onde ocorrer colisão entre princípios, deve-se interpretá-los para se alcançar a solução do caso concreto, mas jamais desatendê-los[25]. Portanto, havendo conflito entre regras, o problema será resolvido no campo da validade, enquanto que ocorrendo colisão entre princípios, a solução envolverá cada caso concreto, considerando a necessidade de preponderância de um sobre o outro dentro de um juízo de ponderação[26].

Com isso, percebe-se que os princípios permitem o balanceamento de valores e interesses, consoante o seu peso e a ponderação de outros princípios eventualmente conflitantes. As regras, por sua vez, não deixam margem para outra solução[27].

Ainda visando comprovar a imperatividade do princípio, vale a pena transcrever o posicionamento de Rui Portanova: “Logo, os princípios não são meros acessórios interpretativos. São enunciados que consagram conquistas éticas da civilização e, por isso, estejam ou não previstos em lei, aplicam-se cogentemente a todos os casos concretos”[28].

Pelo exposto, percebe-se que quanto às regras, há possibilidade de melhor interpretá-las no campo da validade, já quanto aos princípios há a imperatividade na sua observância. Aliás, apenas exemplificando, no campo do direito processual civil recentemente houve a alteração no art. 588, deixando claro em seu caput que se trata de regras e não princípios – como mencionava a redação anterior - envolvendo a execução provisória de sentença, tanto que em seu parágrafo segundo contém exceções à sua aplicação[29]

Após breves considerações acerca dos critérios para identificação e diferenciação entre  princípios e regras, cumpre a partir do presente momento enfrentar as diretrizes envolvendo as hipóteses de colisões entre princípios nos casos envolvendo tutelas de urgência e os meios para solucioná-las.

 

V- A COLISÃO ENTRE PRINCÍPIOS E OS MEIOS DE SOLUÇÃO – A IMPORTÂNCIA DA CORRETA INTERPRETAÇÃO

 

Antes de se enfrentar casos concretos envolvendo as chamadas regras de colisão, deve-se fazer uma afirmação inicial: os princípios se correlacionam e se interagem. De acordo com o caso concreto, deve o intérprete dar privilégio a um em detrimento de outro, caso ocorra eventual colisão, dentro de um juízo de ponderação. Por outro lado, não pode, jamais, desatender ou violar um princípio, sob pena de colocar em risco a integralidade do sistema jurídico[30].

Com efeito, há uma conjugação dos objetivos previstos em cada princípio, para que se escolha qual será prevalente em determinado caso concreto[31].

Em determinados casos concretos, poderá existir conflito entre regras e colisões entre princípios. No primeiro caso, a solução caminha pela cláusula de exceção – pela análise quanto a validade, enquanto no segundo a solução caminha pelas regras de colisão[32].

Mesmo não sendo o objeto principal do presente trabalho a discussão quanto aos conflitos entre regras, vale a pena lançar alguns comentários.

Com efeito, existindo conflito entre regras, a solução passa pela chamada cláusula de exceção, que poderá declarar inválida uma das regras conflitantes, passando pelos critérios cronológico ou hierárquico[33].

Percebe-se, portanto, que quando duas regras estão em confronto, uma delas é expurgada do sistema, abrindo-se a cláusula de exceção. O mesmo não ocorre com as colisões entre princípios, já que há a necessidade de correta interpretação e valoração, sem que isso signifique qualquer exclusão[34].

Destarte, em casos de colisão entre princípios, deve-se alcançar um raciocínio envolvendo a precedência condicionada – dando mais relevância de um princípio sobre outro. Contudo  --  vale ratificar -- isso não significa expurgar um princípio, mas apenas dar prevalência a outro, em determinado caso concreto, aplicando-se os critérios valorativos[35].

Ronald Dworkin, em obra clássica, analisa com profundidade os casos de integridade no direito, abordando um exemplo envolvendo acidente de trânsito e o cabimento de indenização. Após enfrentar as diversas soluções que poderiam ser encontradas, apresenta o critério da subordinação como solução para o problema. Afirma que: “Em minha opinião, a melhor maneira de fazer isso consiste em subordinar o primeiro princípio ao segundo, pelo menos nos casos de acidentes de automóveis em que o seguro de responsabilidade seja possível de obter, junto à iniciativa privada, em termos razoáveis. Faço essa escolha porque acredito que, embora cada um dos dois princípios seja atraente, o segundo é mais poderoso em tais circunstâncias[36]”.

Evidente que, para se alcançar a solução para determinado caso concreto onde ocorra colisão entre princípios, deve-se buscar a lei de colisão, através de uma argumentação jurídica plena e justa. Aliás, como exemplo pode-se citar a liberdade de imprensa em contraponto com o direito de imagem.

Nesse prisma, necessário indagar: até que ponto a liberdade de imprensa e de informação devem prevalecer sobre o direito à imagem do indivíduo, nos casos envolvendo apuração de ato ilícito? A resposta a esta indagação não é simples e deve passar, necessariamente, pela valoração entre os princípios e a aplicação da lei de colisão, concluindo-se pelo princípio de maior peso.

Aliás, Robert Alexy cita um exemplo interessante sobre a liberdade de imprensa. Trata-se de um caso  envolvendo um programa de televisão que iria explorar um documentário sobre o assassinato de soldados em Lebach. Contudo, uma pessoa que havia sido condenada por cumplicidade neste crime estava na iminência de deixar a prisão, e a referida reportagem iria publicar fotos suas e, por certo, prejudicar seu reengajamento social[37].

No caso em questão, há clara colisão entre princípios, chegando o Tribunal local a impedir a publicação da película. Destarte, com a divulgação da reportagem iriam ocorrer danos talvez insuperáveis ao cidadão que estava na iminência de sair da prisão, dificultando sua socialização e criando preconceitos injustificáveis.

Logo, a melhor interpretação para o caso concreto passou necessariamente pela discussão quanto a importância da matéria jornalística; a sua atualidade; o direito de informação, e o direito de reengajamento social do ex-presidiário, etc.

Enfim, para se alcançar a solução ao caso concreto, deve o intérprete fazer a melhor interpretação, sendo que isso não significa a extirpação de um princípio, mas apenas uma ponderação valorativa. Nada impede que em outra hipótese, o princípio a ter maior peso é o que, no caso anterior, foi afastado, considerando a ocorrência do chamado jogo de princípios[38].

 

VI – AS LIMINARES INAUDITA ALTERA PARS E OS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO – A NECESSIDADE DE PONDERAÇÃO ENTRE OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

 

A partir do presente momento, mister é enfrentar o pano de fundo do presente trabalho - a análise do cabimento de decisões inaudita altera pars (medidas acautelatórias ou antecipatórias[39]) e a eventual existência colisão entre alguns princípios constitucionais do processo.

Não se deve olvidar que existem vários princípios constitucionais processuais, dentre os quais o devido processo legal[40], ampla defesa, contraditório[41]e mesmo o acesso à justiça. Por essa razão, comumente se indaga se as medidas liminares constituem violação aos princípios constitucionais do processo, principalmente em relação ao réu que, antes mesmo de ser citado para apresentar defesa, é instado a adotar determinada conduta, em atendimento à determinação judicial initio litis.

Como restou claro nos capítulos anteriores, não há que se falar em violação a princípio, e sim análise visando uma correta valoração, dentro da chamada lei de colisão.

Contudo, existem casos concretos onde se pode observar clara colisão entre princípios constitucionais, como nas hipóteses envolvendo as ‘tutelas de urgência’.

Com efeito, utilizar-se-á como exemplo uma  demanda cominatória, onde o autor pretende medida liminar para obstar a publicação de matéria na imprensa, com fundamento nos arts. 287 e 461, parágrafo 3º do Código de Processo Civil. O autor será chamado hipoteticamente de José e o réu Jornal X.

O jornal, por hipótese, já possui totalmente editada e pronta para divulgação matéria jornalística que irá causar prejuízos financeiros e morais à José (suposto comerciante).

O demandante, sabedor do conteúdo da matéria e visando comprovar a falta de veracidade da reportagem, propõe demanda declaratória com base nos arts. 5º, 282, 287 e 461 do CPC, requerendo tutela antecipada para que seja determinada  conduta negativa ao réu, antes mesmo de sua citação, fundamentada no parágrafo 3º do último artigo citado.

As principais questões que serão enfrentadas pelo julgador são: a liminar antes da citação do réu violará os princípios da ampla defesa e contraditório; não seria adequado e correto deixar publicar a matéria e, após, solucionar o litígio mediante indenização pelos danos eventualmente causados? Qual a saída para o julgador, proteger a liberdade de imprensa – com a publicação da reportagem, ou o direito individual do autor?

In casu, é mister observar que há clara colisão entre disposições constitucionais quando se contrapõe a liberdade de imprensa com o direito individual[42].

Mais uma vez é necessário indagar: a liminar requerida pelo autor viola os princípios da ampla defesa e contraditório, devendo apenas ser concedida (se for o caso) após a resposta do réu? Particularmente, entende-se que não, inclusive considerando os principais objetivos da tutela inibitória, os quais serão ratificados posteriormente.

Contudo, não se pode deixar de aduzir que o problema em questão também enfrenta a colisão entre os princípios do devido processo legal, efetividade da prestação jurisdicional e mesmo o acesso à justiça (considerando que de nada servirá a apreciação da tutela de urgência após a publicação da matéria jornalística) de um lado e de outro os princípios do contraditório e ampla defesa, razão pela qual merece item específico.

 

VI.A- As liminares e os princípios constitucionais – análise de casos concretos

 

Como se mencionou anteriormente, o tema tutela antecipada sempre causou profunda divergência de interpretação, inclusive quanto ao momento de cabimento. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso, na decisão a seguir transcrita, entendeu que:

 

“TUTELA ANTECIPATÓRIA – Pretensão de concessão da medida antes da citação do réu – Inadmissibilidade  ressalvada a hipótese do art. 461, parágrafo 3º do CPC – Necessidade de preenchimento de todos os requisitos elencados no art. 273 também do CPC.

Em princípio, não existe previsão de outorga da tutela antecipada, antes da citação do réu, com exceção da hipótese  prevista no art. 461, parágrafo 3º, do CPC. Não se deve confundir a tutela antecipada, que adentra no âmago  da questão com as medidas cautelares, que a garantia da efetividade do processo. Em homenagem à garantia do devido processo legal, a antecipação só será viável ante o preenchimento de todos os requisitos elencados no art. 273 do CPC, em casos excepcionalíssimos, onde se faça necessária a antecipação provisória” (TJMT – 1ª Câmara – Ai n. 6.849, julgamento em 24.02.97, rel. Dês. Salvador Pompeu de Barros Filho – RT 743/97).

O voto do relator caminha no sentido de somente admitir a concessão da tutela de urgência inaudita altera parte em casos absolutamente excepcionais, como os ligados à vida e à saúde.

Ora, considerando que o problema colocado como paradigma envolve o direito à imagem e a proteção à honra, será que seria possível a concessão de tal medida de urgência?

Utilizando um primeiro raciocínio axiológico, a colisão entre princípios caminhará no sentido de indeferimento da tutela de urgência, sob o argumento da liberdade de imprensa e da possibilidade de ressarcimento posterior dos danos causados. O intérprete teria que enfrentar os seguintes aspectos, com a relação de precedência[43]: a) Quais os princípios envolvidos no problema?  b) Quais serão os maiores prejuízos: o da empresa que já elaborou a matéria que está pronta para divulgação, o da liberdade de imprensa, o da sociedade de ser corretamente informada ou o do autor de evitar danos à sua imagem, honra, etc; c) Existe possibilidade de ressarcimento dos danos eventualmente causados ao autor após a publicação da matéria, acaso comprovada sua irregularidade?

Assim, poderá o intérprete chegar a conclusão quanto ao cabimento ou não da tutela antecipada requerida na exordial. Utilizando tal raciocínio, poderá concluir pelo seu incabimento, dando prevalência ao princípio da ampla defesa e contraditório[44], sob o argumento de que os danos eventualmente causados poderão ser ressarcidos posteriormente.

Contudo, mais uma vez é necessário ressaltar que, sob o aspecto do correto andamento processual, esta não seria a solução mais adequada à solução da questão, como se passa a demonstrar:

Com efeito, mais uma vez interpretando o problema já apresentado entre José e o Jornal X, a concessão de medidas liminares inaudita altera pars apenas poderá ocorrer em casos excepcionais, desde que comprovados os requisitos do art. 461, parágrafo 3º. Logo, para conseguir impedir a publicação da reportagem, deverá comprovar todos os requisitos ensejadores da tutela de urgência de não fazer inibitória.

Por outro lado, importante destacar que a decisão initio litis não estará violando os princípios do contraditório / ampla defesa, mas apenas fazendo o exercício de valoração, visando encontrar a correta aplicação da lei de colisão. No problema colocado, portanto, o julgador deveria verificar se os requisitos da probabilidade e da urgência estão presentes, hipótese em que deverá conceder a tutela de urgência inibitória.

Necessário ressaltar que as tutelas antecipatórias são concedidas em regra diante de cognição sumária e são revogáveis, sendo mais uma razão que corrobora com a afirmação de que não viola o princípio do contraditório e da ampla defesa.

Essa matéria não é nova no âmbito doutrinário e mesmo jurisprudencial[45]. Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco ensinam que: “O contraditório não admite exceções: mesmo nos casos de urgência, em que o juiz, para evitar o periculum in mora, provê inaudita altera parte (CPC, arts. 929, 32, 937, 813 ss.), o demandado poderá desenvolver sucessivamente a atividade processual plena e sempre antes que o provimento se torne definitivo”[46].

Ademais, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery aduzem que: “Liminar sem a ouvida do réu. Quando a citação d réu puder tornar ineficaz a medida, ou, também, quando a urgência indicar a necessidade de concessão imediata da tutela, o juiz poderá fazê-lo inaudita altera pars, o que não constitui ofensa, mas sim limitação imanente do contraditório, que fica diferido para momento posterior do procedimento”[47].

Com efeito, deve-se verificar, em determinado caso concreto, a presença dos requisitos da tutela de urgência. Nas hipóteses envolvendo tutela inibitória, deve o intérprete ter maior cuidado na apreciação dos requisitos, considerando o fato de que pretende o litigante evitar a ocorrência do dano, exatamente como ocorreu no exemplo discutido no presente trabalho, onde José pretende evitar a divulgação de reportagem supostamente danosa à sua imagem e honra. Logo, o direito a uma decisão justa passa, necessariamente, pela não divulgação da matéria, evitando-se um dano muito maior[48][49]e jamais recuperável in natura.

Por fim, cumpre enfrentar a terceira solução envolvendo o problema posto, que passa pela afirmação de cabimento da tutela de urgência antes da citação do réu, sem que se possa falar em violação ao contraditório ou ampla defesa.

Antes de se apresentar toda a justificativa teórica do presente entendimento, deve-se transcrever a seguinte decisão:

 

“PROCESSUAL CIVIL – ADMINISTRATIVO – POSSIBILIDADE – ANTECIPAÇÃO DE TUTELA – SEM PRÉVIA AUDIÊNCIA DO RÉU – GRAU DE RECURSO – PRERROGATIVA DO PODER GERAL DO JUIZ – PRESENÇA DOS PRESSUPOSTOS DO ART. 273 DO CPC.

1-      A lei não estabeleceu um momento preclusivo para a antecipação da tutela, podendo a mesma ser concedida a qualquer momento, mesmo em grau de recurso, bastando, para tanto, que seja necessária.

2-      Antecipação parcial da tutela concedida, em razão da demonstração da prova inequívoca  da verossimilhança da alegação, aliada ao receio de dano irreparável, que poderia ser causado à requerente, em ter os débitos em discussão inscritos em Dívida Ativa, bem como seu nome incluído no CADIN, passível, ainda de uma execução fiscal por parte da União Federal / Fazenda Nacional.

3-      Inexiste violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa, em conceder tutela antecipada, inaudita altera pars, diante da prerrogativa do poder geral do juiz de determinar as medidas provisórias que julgar adequadas.

4-      Negado provimento ao agravo interno, Mantida inalterada a r. decisão agravada”(TRF 2ª. Região. Ac – Apelação Cível – 146894. Processo 9702283639 – RJ - 3ª Turma – Relator Juiz Francisco Pizzolante - Data da decisão 02/10/2002. DJU de 28.10.2002).

A grande questão que se coloca é o relacionamento entre as tutelas de urgência e o direito ao contraditório. Como destacado anteriormente, há colisão entre princípios constitucionais, devendo o intérprete utilizar as leis de colisão e aplicar aquele que deve prevalecer em determinado caso concreto.

A partir da reforma que ocorreu em 1994, no Código de Processo Civil, o tema ‘tutela antecipada’ passou a ficar democratizado em todo o processo de conhecimento, desde que presentes os requisitos presentes do art. 273. Contudo, estando presente o requisito negativo – perigo de irreversibilidade – a conduta deverá ser no sentido de negar a tutela de urgência, sob pena de violar o contraditório, conforme previsão expressa do art. 273, parágrafo segundo da legislação adjetiva.

Por outro lado, o grande objetivo da tutela antecipada foi acelerar a marcha procedimental[50],considerando que o fator tempo é um dos maiores obstáculos à efetividade do processo.

Com efeito, a sistemática da tutela antecipada objetivou exatamente, mediante pronunciamento satisfativo, enfrentar o fator tempo de duração da litispendência, permitindo a obtenção de um resultado positivo até mesmo sem a audiência da parte contrária, o que por certo diminui as frustrações e as incertezas decorrente da demora na prestação jurisdicional[51]. O raciocínio leva a uma só conclusão: a tutela antecipada tem como maior objeto o alcance da efetividade do processo e o acesso à justiça.

Aliás, cumpre nesse momento fazer breve transcrição dos Professores Mauro Cappelletti e Bryant Garth acerca do conceito de acesso à justiça: “A expressão ‘acesso à justiça’ é reconhecidamente de difícil definição, mas serve para determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico – o sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os auspícios do Estado. Primeiro, o sistema deve ser igualmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir  resultados que sejam individual e socialmente justos”[52].

É no aspecto do resultado justo e breve é que se permite concessão de medidas de urgência sem a audiência da parte contrária. Aliás, dentro dos chamados novos direitos, o acesso à justiça ganha cada vez maior espaço, devendo ser observado, em cada caso concreto, se estão ou não presentes os requisitos ensejadores da tutela de urgência.

Ademais, a decisão acima transcrita também serve para se observar que não existe qualquer discricionariedade na concessão da tutela antecipada. Deve o julgador verificar se estão presentes os requisitos positivos e se há ou não o perigo de irreversibilidade (óbice à concessão da medida emergencial).

Portanto, se no caso concreto houver a comprovação dos requisitos previstos na legislação adjetiva, a tutela antecipada deve ser concedida, inexistindo qualquer juízo de discricionariedade ao julgador. Nesse sentido, vale mais uma vez citar Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery: “Concessão da liminar. Embora a expressão ‘poderá’, constante no CPC 273, caput, possa indicar faculdade e discricionariedade do juiz, na verdade constitui obrigação, sendo dever do magistrado conceder a tutela antecipatória, desde que preenchidos os pressupostos legais para tanto, não sendo lícito concedê-la ou negá-la pura e simplesmente”[53].

No mesmo sentido, entende José Carlos Baptista Puoli:“A contrário do que sugere a utilização do verbo poderá no caput do art. 273 do Código de Processo Civil, a decisão a respeito da concessão da tutela antecipada nada tem de discricionária, pois, como visto quando se tratou de forma genérica da questão dos conceitos indeterminados, o ato de preenchimento dos conceitos de prova inequívoca, verossimilhança, etc., não corresponde a ato integralmente livre do juiz, o qual deverá, à luz das circunstâncias do caso concreto, e dos elementos extraídos da doutrina e dos precedentes jurisprudenciais dizer o direito no caso concreto (lembrando-se que o direito não admite a indicação de duas soluções para o caso concreto, entre as quais o juiz poderia livremente escolher uma”[54].

Já José Roberto dos Santos Bedaque ensina que:“Não tem o juiz, portanto, mera faculdade de antecipar a tutela. Caso se verifiquem os pressupostos legais, é seu dever fazê-lo. Existe, é verdade, maior liberdade no exame desses requisitos, dada a imprecisão dos conceitos legais. Mas essa circunstância não torna discricionário o ato judicial”[55].

Pois bem. A partir da observação da presença dos requisitos da concessão das tutelas de urgência, sem a audiência da parte contrária, deve o julgador ponderar os princípios constitucionais em colisão: efetividade (rapidez – brevidade) do processo, devido processo legal e acesso à justiça, de um lado, e  contraditório e ampla defesa, de outro.

Hodiernamente, várias decisões vêm reconhecendo que as medidas liminares não violam, mas simplesmente adiam o exercício do contraditório. Além da citada anteriormente, vale mencionar mais algumas, deixando claro que o assunto em questão é atual e condiz com a necessidade de ponderação entre princípios constitucionais:

“ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REAJUSTE DE 11,98%. NÃO CABIMENTO. PRELIMINAR DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. REJEITADA.

1-      A possibilidade de concessão de liminar, inaudita altera parte, não atenta contra as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Preliminar rejeitada.

2-      É partir o entendimento, das Primeira e Segunda Turmas deste Tribunal, de que, em hipóteses como a em causa, além de não se fazerem presentes os requisitos estabelecidos pelo art. 273 do Código de Processo Civil, obsta a antecipação da tutela a norma inscrita no art. 1º da Medida Provisória nº 1.570/97, convertida na Lei nº 9.494/97.

3-      Agravo provido”(Tribunal Regional Federal da 1ª Região – Agravo de Instrumento 01000649650 – Processo 199701000649650/MG – 2ª Turma – Relator  José Carlos Moreira Alves – DJ de 01.02.1999).

 

Em seu voto, corretamente registrou o relator que:

 

“O instituto da tutela antecipada não atenta contra a garantia de acesso ao Poder Judiciário, nem contra o princípio do contraditório e da ampla defesa. Nos termos em que foi introduzida no Código de Processo Civil a tutela antecipada pode ser pleiteada no processo de conhecimento e para sua concessão, no caso do inciso I do art. 273 do CPC, inclusive inaudita altera parte, devem estar presentes três requisitos indispensáveis: prova inequívoca, verossimilhança da alegação; e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Esse último requisito, a me ver, é que determinará ou não a possibilidade e, conseqüentemente, a legitimidade da concessão in limine da medida.

O argumento de que a antecipação de tutela sem oitiva da parte contrária é inconstitucional, por ofensa ao princípio do contraditório, soa desarrazoada, porquanto, a admitir-se sua procedência, ter-se-ia de entender coactada, no próprio ordenamento jurídico, a possibilidade de existência de medida dessa natureza”.

 

Em outra decisão, assim entendeu o Tribunal Regional Federal da 3ª. Região:

 

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. FGTS. SAQUE. PRELIMINAR DE LEGITIMIDADE AD CAUSA E INFRINGÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. LEI 8036/90. PERDA DO OBJETO.

1-                Preliminar de legitimidade `ad causam` rejeitada tendo em vista que a mesma deverá ser analisada nos autos da ação principal, não cabendo fazê-lo em recurso de agravo de instrumento.

2-                Preliminar de infringência aos princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa rejeitada pois é discrição do magistrado conceder a liminar inaudita altera pars, não constituindo desrespeito aos princípios citados.

3-                O art. 20, inciso VIII da Lei 8036/90 autoriza o saque quando a conta vinculada do trabalhador no FGTS permanecer sem crédito de depósito por 03 anos ininterruptos.

4-                A concessão ou não de medida liminar é ato que fica ao prudente arbítrio do magistrado, encontrando-se dentro de seu poder geral de cautela.

5-                Preliminares rejeitadas. Agravo prejudicado pela manifesta perda do objeto”(Tribunal Regional Federal da 3ª Região – Agravo de Instrumento – Processo 94031062940 – Relator Roberto Haddad – DJ de 21.01.1997).

 

Já o Tribunal Regional Federal da 1ª Região tem os seguintes precedentes:

 

“ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA.

1. A antecipação, inaudita altera parte, dos efeitos da tutela não atenta contra os princípios constitucionais assecuratórios da ampla defesa e do contraditório, podendo ser deferida, sem a audiência da parte contrária, sempre que seja a providência para evitar a ocorrência de dano irreparável ou de difícil reparação.

2. É verossímil, no caso, a alegação de que a previsão editalícia sobre ser inadmissível recurso contra o resultado do exame psicotécnico não se compatibiliza com a garantia de contraditório e ampla defesa, podendo, ademais, advir aos ora agravados dano irreparável ou de difícil reparação se não lhes for assegurado prosseguir no concurso público, diante da inexorável e definitiva eliminação daí conseqüente.

3. Agravo de instrumento a que se nega provimento, prejudicado o agravo regimental. (TRF - PRIMEIRA REGIÃO - Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO – 01000071430 - Processo: 199901000071430 UF: MT Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA - Data da decisão: 25/04/2000 Documento: TRF100099478  - DJ DATA: 10/08/2000 PAGINA: 17 – Rel. Juiz JUIZ CARLOS MOREIRA ALVES).

 

ANTECIPAÇÃO   DE   TUTELA.   REAJUSTE  DE  11,98%.  NÃO  CABIMENTO. PRELIMINAR    DE   OFENSA   AOS   PRINCÍPIOS   CONSTITUCIONAIS   DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA REJEITADA.

1. A possibilidade de concessão liminar, inaudita altera parte, não atenta  contra  as  garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Preliminar rejeitada.

2.  É  partir  o  entendimento, das Primeira e Segunda Turmas deste Tribunal, de  que,  em  hipótese  como  a  em causa, além de não se fazerem  presentes  os  requisitos estabelecidos pelo artigo 273 do Código  de  Processo  Civil,  obsta a antecipação da tutela a norma inscrita no art. 1º da Medida Provisória nº 1.570/97, convertida na Lei nº 9.494/97.

3. Agravo provido “(Origem: TRF - PRIMEIRA REGIÃO - Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO – 01000649650 - Processo: 199701000649650 UF: MG Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA - Data da decisão: 20/10/1998 Documento: TRF100071717 - DJ DATA: 01/02/1999 PAGINA: 623 – Rel. JUIZ CARLOS MOREIRA ALVES).

 

As decisões em questão bem expressam o tratamento que deve ser dado à colisão entre princípios. Mais uma vez é mister ressaltar que não se está, com isso, afirmando que haverá qualquer violação ao contraditório, mas apenas seu adiamento, inclusive pelo fato de que a decisão initio litis é provisória e poderá ser alterada ou mesmo revogada após o exercício do contraditório. Se acaso fosse outro o entendimento, praticamente se iria retirar toda a eficácia da tutela antecipada, transformando-a em verdadeira letra morta dentro do sistema processual.

Com efeito, no caso em questão o problema resolve-se interpretando o peso de cada princípio, prevalecendo o que mais se adequar à realidade discutida nos autos. Se no caso concreto restar comprovada a necessidade de prestação da tutela de urgência em atendimento ao princípio do devido processo legal e visando assegurar o acesso à justiça, assim deverá proceder o intérprete, assegurando em seguida o atendimento ao princípio do contraditório. Também Luiz Guilherme Marinoni enfrenta a questão envolvendo a colisão entre princípios, aduzindo que: “No caso de conflito de regras, o problema é de validade, enquanto, na hipótese de colisão de princípios, a questão é de peso.  Quando há colisão de princípios, um deve ceder diante do outro, conforme as circunstâncias do caso concreto. Isso significa que, aí, não há como declarar a invalidade do princípio de menor peso, uma vez que ele prossegue íntegro e válido no ordenamento, podendo merecer prevalência, em face do princípio que o precedeu, diante de outro caso concreto. Esse juízo, pertinente ao peso dos princípios, é um juízo de ponderação, que assim permite que os direitos fundamentais tenham efetividade diante de qualquer caso concreto, considerandos os princípios que com eles possam colidir”[56].

Portanto, estando presentes os requisitos, deverá o magistrado conceder a tutela de urgência, inclusive com a utilização das chamadas `medidas de apoio` e os meios de coerção existentes no sistema[57]. Haverá, nesses casos, limitação imanente ao princípio do contraditório, permitindo ao demandado exercê-lo logo após a concessão da tutela de urgência[58]. Nesse aspecto, vale ressaltar as lições de José Roberto dos Santos Bedaque: “Se já presentes os pressupostos legais no momento da propositura da ação, nada impede seja a antecipação concedida antes mesmo do ingresso do réu no processo. Nem mesmo a exigência do contraditório constitui empecilho insuperável à posição ora adotada. São inúmeras as hipóteses de liminar inaudita no sistema processual. Tal solução, excepcional evidentemente, não viola o contraditório, pois a parte contrária, ao tomar conhecimento da medida, possui meios prontos e eficazes para alterá-la. E o princípio em questão, como, de resto, todos os demais, deve ser analisado em conformidade com os escopos maiores do sistema processual”[59].

Percebe-se, portanto, que tanto a doutrina quanto a jurisprudência caminham no sentido de indicar que as medidas liminares sem a audiência da parte contrária não configuram qualquer violação ao princípio do contraditório. Aliás, no exemplo que vem sendo discutido diversas vezes - liminar inibitória evitando divulgação de matéria jornalística – deverá ocorrer a necessária ponderação entre os princípios constitucionais.

Deve-se ressaltar, por oportuno, que entre a tutela inibitória[60]e a ressarcitória, deve-se dar preferência à primeira, justamente pelo fato de que possui como móvel evitar a ocorrência do ato ilícito.

Logo, como se mencionou anteriormente, seria discutível quanto a efetividade da tutela jurisdicional se acaso não fosse concedida medida liminar visando obstar a veiculação da reportagem, resolvendo-se os danos supostamente causados no campo financeiro. Entre ‘apagar o incêndio’ e ‘evitar que ele ocorra’ deve o intérprete buscar a segunda solução; logo, deve ser concedida a tutela de urgência, adiando-se o atendimento ao contraditório e evitando-se que os danos à vida privada possam ocorrer.

Ademais, como mencionado anteriormente, o dano individual eventualmente sofrido em virtude da divulgação da matéria jornalística, jamais poderá ser ressarcido in natura. Sobre o assunto, cumpre destacar as lições de Sérgio Cruz Arenhart, ainda sobre a concessão de liminar inaudita altera pars: “De qualquer forma, é bom advertir-se: na dúvida, o privilégio sempre há de ser da vida privada. Diante da impossibilidade concreta de se encontrar a fronteira entre os conceitos, sempre é preferível tutelar a vida privada, em detrimento da liberdade de informação. Isto por uma razão óbvia: este direito, se lesado, jamais poderá ser recomposto em forma específica; ao contrário, o exercício do direito à informação sempre será possível a posteriori, ainda que, então, a notícia não tenha mais o mesmo impacto”[61].

Contudo, não se pode deixar de afirmar que a questão realmente é delicada, tendo em vista que enfrenta os limites da liberdade de imprensa. A colisão existe e deve ser analisada pelo intérprete visando alcançar a melhor solução.

Em face de todo o exposto, havendo colisão de princípios nos casos de liminares sem a audiência da parte contrária, as regras de colisão devem ser aplicadas, prevalecendo, sob esse aspecto, a possibilidade de concessão de liminar inaudita altera pars, sem que se possa falar em violação a ampla defesa / contraditório.

 

VII - Conclusões

 

Com o presente trabalho conclui-se que:

 

1)                  Nas demandas judiciais comumente se discute quanto a correta interpretação dos princípios constitucionais;

2)                  Nas hipóteses envolvendo tutelas de urgência há colisão entre princípios constitucionais;

3)                   Essas tutelas de urgência visam superar o problema atinente ao binômio: morosidade-efetividade, sendo um dos temais mais atuais dentro do chamado direito processual constitucional;

4)                   A busca da efetividade do processo passa, necessariamente, pelo enfrentamento das tutelas de urgência e sua aplicação em face do réu, exatamente pelo fato de que a Constituição Federal lhe assegura o acesso à justiça, o atendimento aos princípios do contraditório e da ampla defesa;

5)                   Os princípios constitucionais devem ser analisados em seu conjunto, de acordo com uma interpretação em consonância com a concepção de Estado de Direito e de realidade social;

6)                   A correta interpretação dos princípios constitucionais passa pelo enfrentamento das eventuais colisões com outros princípios;

7)                   No importante papel de dirimir litígios, deve o Poder Judiciário observar os princípios processuais constitucionais, dentre os quais o devido processo legal, sob pena de eivar a prestação jurisdicional de nulidade insanável;

8)                   Aliás, o devido processo legal é de importância fundamental para o atendimento aos demais princípios processuais, dentre os quais o da legalidade, ampla defesa e contraditório, sob pena de comprometer a integralidade e mesmo a justiça da decisão;

9)                   Os princípios e regras, que fazem o conjunto de normas jurídicas, constituem condutas, permissões e mandamentos, fazendo parte do juízo do dever ser;

10)              Ocorrendo o choque entre princípio e regra, aquele deverá prevalecer, ao passo que se o caso concreto envolver colisão entre princípios, a solução passará pelo exame da lei de colisão;

11)               Além do aspecto da generalidade, outra diferença importante entre princípios e regras diz respeito ao fato de que aqueles configuram ordem, e devem ser atendidos, enquanto as regras podem ser cumpridas ou não. Os princípios constituem ordem, não deixando margem para descumprimento;

12)              Ocorrendo colisão entre princípios, deve-se interpretá-los para alcançar a solução para o caso concreto, mas jamais desatendê-los. Por outro lado, ocorrendo conflito entre regras, o problema será resolvido no campo da validade, observando-se cláusula de exceção;

13)               Em cada caso concreto, deverá ser observado se o litigante atendeu aos ditames legais estabelecidos para a concessão de medidas liminares;

14)              As decisões inaudita altera pars devem ser fundamentadas, evitando-se alegação de nulidade;

15)               Estando presentes os requisitos legais, não há juízo discricionário ao interprete quanto a concessão das medidas liminares;

16)               As decisões initio litis, em que pese a existência de divergência de posicionamento à nível jurisprudencial, não configuram qualquer violação aos princípios do contraditório, ampla defesa ou devido processo legal;

17)               Com efeito, estando presentes os requisitos legais, a concessão de medidas liminares em juízo de probabilidade apenas adiam o exercício do contraditório. A colisão entre princípios deve ser atendida dentro das circunstâncias de cada caso concreto, evitando-se ‘deferimento’ou mesmo ‘indeferimento’ automático;

18)              As tutelas inibitórias devem prevalecer, como regra, em relação às tutelas ressarcitórias, considerando que procuram evitar a ocorrência do ato ilícito. Entre ‘apagar o incêndio’ e ‘evitar que ele ocorra’, deve ser busca, ao máximo, a última solução;

19)               A revogabilidade das medidas liminares também corroboram para a afirmação de que não geram qualquer violação aos princípios constitucionais assegurados ao réu. Nada impede, portanto, que após a concessão da medida, o julgador retifique sua decisão;

20)               O acesso à justiça e a efetividade do processo passam, necessariamente, pela correta aplicação das medidas judiciais inaudita altera pars, assegurando-se, logo em seguida, o exercício do contraditório pelo réu.

 

VIII - Referência Bibliográfica

 

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[1]Teoria dos Valores, Coimbra: Armênio Amado.

[2]Deve-se, portanto, buscar a correta interpretação de tais princípios. Ernst Wolfgang Bockenforde inclusive afirma a existência de uma teoria dos direitos fundamentais, senão vejamos: Semajante interpretación decifradora y, ante todo, concretizadora del contenido, no encuentra ningún ponto  de conexión suficiente en la literalidad, el significado de las palabras y el contexto normativo. Se establece y se deriva – consciente o inconsciente – de una determinada teoria de los derechos fundamentales, entendiendose por tal teoria una concepción sistematicamente orientada acerca del carácter general, finalidade normativa, y el alcance material de los derechos fundamentales. Esta teoria tiene su ponto de referencia (la orientación sistemática) por regla general en una determinada concepción del Estado y/o en una determinada teoria de la Constitución. Su función consiste en no abandonar la interpretación de los singulares preceptos de derechos fundamentales únicamente a una técnica jurídica conformada a partir de detalladas regulaciones legales, sino en integrarla en el contexto general de una concepción del Estado/ teoria de la Constitucion”. Escritos sobre Derechos Fundamentales. Baden – Baden : Nomos , 1993, p. 45.

[3]Posteriormente serão enfrentados alguns critérios visando a distinção entre princípios e regras.

[4]A força normativa da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre : Sérgio Fabris, 1991, p. 14.

[5]. Nesse sentido, ver BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais – o princípio da dignidade da pessoa humana. Rio de Janeiro : Renovar, 2002, p. 21. Aliás, de acordo com suas lições, “a expressão `constituição procedimental’ identifica uma concepção  restritiva do papel da Constituição, pela qual se entende que lhe cabe apenas estabelecer as regras de funcionamento do processo político, e não assumir posições acerca de valores ou alternativas ideológicas. Sua função se limitaria a zelar para que as ‘regras do jogo político’funcionem adequadamente, cabendo aos representantes eleitos as decisões a respeito de valores materiais, fins que haverão de orientar o Estado, etc” (nota de rodapé n. 31, p. 21).

[6]Op. Cit. P. 47.

[7]Luiz Guilherme Marinoni afirma que os direitos fundamentais têm natureza de princípios. De acordo com as lições do professor paranaense: “frise-se que os direitos fundamentais têm natureza de princípio. Assim, se os princípios constituem mandatos de otimização , dependentes das possibilidades, o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva (por exemplo) – que então pode ser chamado de princípio à tutela jurisdicional efetiva – também constitui um mandato de otimização que deve ser realizado diante de todo e qualquer caso concreto, dependendo somente de suas possibilidades, e assim da consideração de outros princípios ou direitos fundamentais que com ele possam se chocar”. Técnica processual e tutela dos direitos. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004, p. 228. Aliás, nos itens posteriores serão enfrentadas as diferenças entre princípios e regras, dentre as quais a de que aqueles são mandatos de otimização.

[8]Nesse sentido, ver RAMOS JÚNIOR, Luiz Galdino. Princípios Constitucionais do Processo – visão crítica. São Paulo : Juarez de Oliveira, 2000, p. 12 e NERY JUNIOR. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. 6ª edição. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2000, p. 32.

[9]Não é intenção da presente obra enfrentar os vários enfoques acerca do devido processo legal (sentido genérico, material e processual). Sobre o assunto, ver NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. Cit. p. 31 e seguintes e LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Devido processo legal substancial. Divulgado no endereço eletrônico http://www.cpc.adv.br/doutrina/processual_civil/devido_processo_legal_su....

[10]Mauro Cappelletti e Bryant Garth, em obra clássica, ensinam, sobre o acesso à justiça profundamente relacionado com o devido processo legal,  que: “o acesso à justiça pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar o direito de todos”. Acesso à Justiça. Tradução de Ellen Gracie Northfleet.  Porto Alegre : Sérgio Fabris, 1988, p. 12. Ainda sobre acesso à justiça, ver obra de minha autoria intitulada Acesso à Justiça e Efetividade do Processo. Curitiba: Juruá, 2001.

[11]Maria Tereza Sadek apresenta importantes observações acerca do papel do Estado – Poder Judiciário – nesse particular. De acordo com suas lições: “Os direitos são letra morta na ausência de instâncias que garantam o seu cumprimento. O Judiciário, deste ponto de vista, tem um papel central. Cabe a ele aplicar a lei e, conseqüentemente, garantir a efetivação dos direitos individuais e coletivos. Daí ser legítimo afirmar que o Judiciário é o principal guardião das liberdades e da cidadania. No exercício de suas funções, o Judiciário, segundo prescreve a Constituição brasileira, tem duas faces: uma, de poder de Estado; outra, de prestador de serviços. Tanto em um caso como no outro, há, primordialmente, a distribuição da justiça. Não se trata, é claro, de uma justiça abstrata, mas de possuir a palavra final, quer sobre os conflitos de natureza eminentemente política, quer sobre disputas privadas”. Acesso à justiça. Maria Tereza Sadek (org). São Paulo : Fundação Konrad Adenauer, 2001, p. 7 e 8.

[12]Como bem informa Lúcia Valle Figueiredo, “o princípio da legalidade está, pois, atrelado ao devido processo legal, em sua faceta substancial e não apenas formal. Em sua faceta substancial – igualdade substancial – não basta que todos os administrados sejam tratados da mesma forma. Na verdade, deve-se buscar a meta da igualdade na própria lei, no ordenamento jurídico e em seus princípios”. O devido processo legal e a responsabilidade do Estado por dano decorrente do planejamento. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, out/dez, 1996, n. 2.1, p. 93.

[13]Segundo Hans Kelsen, “a justiça, no sentido de legalidade, é uma qualidade que se relaciona não com o conteúdo de uma ordem jurídica, mas com sua aplicação. Nesse sentido, a justiça é compatível e necessária a qualquer ordem jurídica positiva, seja ela capitalista ou comunista, democrática ou autocrática”. Teoria Geral do Direito e do Estado. Tradução de Luiz Carlos Borges. São Paulo : Martins Fontes, 2000, p. 20.

[14]In Princípios do processo civil na Constituição Federal. Cit. P.  31.

[15]Nesse sentido, no STJ, ver  HC 33324, 6 Turma, Julgado em 06.04.2004, DJ. 03.05.2004; Resp 279291, 5ª Turma, Julgado em 20.04.2004, DJ de 07.06.2004 e Resp. 605652, 3ª Turma, J. 03.06.2004, DJ de 21.06.2004).

[16]Discutindo sobre o fundamento axiológico dos direitos fundamentais, Bockenford afirma que: “ De ahi que los derechos fundamentales tengan primariamente, del mismo modo que en la teoria institucional, el carácter de normas objetivas, no de pretensiones subjetivas. Reciben su contenido objetivo como emanación del fundamento axiológico de la comunidad estatal y como expresión de una  decisión axiológica (Wertentscheidung) que esta comunidad adopta para si misma. Esto repercute en el contenido de la  libertad de derecho fundamental. Ella es en cada caso libertad para la realización de los valores expresados en los derechos fundamentales y en el marco de un orden de valores instaurado por los derechos fundamentales en su conjunto; no preexiste a la totalidad estatal entendida axiologicamente, tal y como se expresa en las decisiones axiológicas de la Constituición, sino que ya está comprendida con ella”. Op. Cit. P. 57 e 58.

[17]José Roberto dos Santos Bedaque também atenta para tal situação, considerando que, de acordo com suas lições, ao ver do legislador constitucional, o processo, com suas características essenciais, é mecanismo adequado a proporcionar não apenas acesso à Justiça, mas à ordem jurídica justa. Daí falar-se no processo équo e justo, ou seja, aquele instrumento apto a assegurar efetivamente os direitos estabelecidos no ordenamento jurídico material”. Os elementos objetivos da demanda examinados à luz do contraditório. In Causa de Pedir e Pedido no Processo Civil – questões polêmicas. José Rogério Cruz e Tucci e José Roberto dos Santos Bedaque (coord). São Paulo : Revista dos Tribunais, 2002, p.14.

[18]Sobre o assunto, Galdino Luiz Ramos Júnior ensina que: “Essa manifesta sistemática aberta envolve necessariamente as duas espécies de normas jurídicas: regras e princípios, pelo fato de que, ao considerarmos o Direito como um sistema unicamente composto por princípios ou regras, além de impossibilitarmos uma visão jurídica fática social, o condenaríamos à estagnação, contrariando o seu dinamismo natural. Além disso, seria limitado pela tentativa absurda e irreal de tipificar todos os infinitos comportamentos humanos de maneira estreita e fechada (regras) ou alargar as possibilidades de maneira a gerar instabilidade e desprezo aos valores jurídicos (princípios)”. Op. Cit. P. 6.

[19]Segundo Ana Paula de Barcellos, as regras “são normas que pretendem produzir efeitos já definidos e delimitados em seu comando, e aplicáveis a um conjunto de situações que pode ser previamente identificado, apenas tendo em conta o dispositivo normativo. Sua lógica de aplicação, por força dessas características, é a do `tudo ou nada`”. Cit. p. 77.

[20]Nesse sentido, ver CANOTILHO,  J. J. Gomes. Direito Constitucional e a Teoria da Constituição. 3ª edição. Coimbra : Almedina, 1998, p. 1086.

[21]Teoria de los derechos fundamentales. Centro de Estúdios Constitucionales : Madrid, 1993, p. 83 e 84.

[22]Maria Helena Diniz chega inclusive a afirmar que: “O conhecimento dos princípios gerais é imprescindível para que se possa compreender a construção de um sistema jurídico, que se apresenta em diferentes subconjuntos. Não é o princípio geral uma simples idéia, algo celebrino, mas um elemento constitutivo do próprio sistema”. As Lacunas no Direito. 4ª edição. São Paulo : Saraiva, 1997, p. 213.

[23]Segundo o jurista alemão: “A menudo, no se contraponen regla y principio sino norma y principio o norma y máxima. Aquí las reglas y los principios serán resumidos bajo el concepto de norma. Tanto las reglas como los principios son normas porque ambos dicen lo que debe ser. Ambos pueden ser formulados con la ayuda de las expresiones deónticas básicas del mandato, la permisión e la prohibición. Los principios, al igual que las reglas, son razones para juicios concretos de deber ser, aun cuando sean razones de un tipo muy diferente. La distinción entre reglas y principios es pues una distinción entre dos tipos de normas”. Cit. 83.

[24]Aliás, Geraldo Ataliba chega a afirmar que: “mesmo no nível constitucional, há uma ordem que faz com que as regras tenham sua interpretação e eficácia condicionada pelos princípios. Estes se harmonizam, em função da hierarquia entre eles estabelecida, de modo a assegurar plena coerência interna ao sistema (a demonstração cabal disso está em J. M. Teran, Filosofia del Derecho, p. 146)”.República e Constituição. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1985, p. 6.

[25]Segundo Robert Alexy: “El punto decisivo para la distinción entre reglas y principios es que los principios son normas que ordenan que algo sea realizado en la mayor medida posible, dentro de las posibilidades jurídicas e reales existentes. Por lo tanto, los principios son mandatos de optimización, que están caracterizados por el hecho de que pueden ser cumplidos en diferente grado y que la medida debida de su cumplimiento no solo depende  de las posibilidades reales sino también de las jurídicas (...). En cambio, las reglas son normas que sólo pueden ser cumplidas o no”.  Cit. P. 86 e 87.

[26]Nesse sentido, MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela dos direitos. Cit. P. 226 e 227 e ALEXY,  Robert. Cit. P. 88 e seguintes.

[27]MARTINS, Luciana Mabilia. Interesse público e interesse privado : é possível colisão? Revista da Procuradoria Geral do Estado do Rio Grande do Sul, vol. 24, n. 53.  Rio Grande do Sul : Publicação  da Procuradoria de Informação, documentação e aperfeiçoamento profissional, 2001, p. 52.

[28]PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. Quinta edição. Porto Alegre : Livraria do Advogado, 2003, p. 14.

[29]Aliás, em artigo publicado recentemente, tive oportunidade de explorar a alteração processual em questão. Sobre o assunto, ver ARAÚJO, José Henrique Mouta. Anotações sobre a ‘nova’disciplina da execução provisória e seus aspectos controvertidos. Revista Dialética de Direito Processual n. 14 – maio-2004, p. 53-73.

[30]Nesse aspecto, as lições de Celso Antônio Bandeira de Mello merecem transcrição: “É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo. Violar um princípio é muito mais greve que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço e corrosão de sua estrutura mestra”. Curso de Direito Administrativo. 8ª edição.  São Paulo : Malheiros,  1996, p. 546.

[31]Aliás, apesar de um pouco longa, é imprescindível a transcrição das palavras  Paulo Henrique dos Santos Lucon: “Entre os princípios não se admite antinomia jurídica, ou seja, não é possível a extirpação de um deles do sistema. Quando duas normas jurídicas estão em confronto, uma delas é simplesmente excluída do ordenamento jurídico. No entanto, quando dois princípios estão em conflito nenhum deles é expulso ou excluído do sistema. Na realidade, há uma conjugação dos objetivos neles contidos ou, quando isso não for possível, a escolha do princípio prevalente sobre o caso concreto. Nesses casos, a fundamentação de tal opção é muito mais política e social do que jurídica; há verdadeiramente uma escolha do aplicador do direito ou do intérprete por um deles  em detrimento do que a ele, diante de uma situação substancial, se opõe”. Garantia do tratamento paritário das partes. In Garantias Constitucionais do Processo Civil. José Roger Cruz e Tucci (coord). 1ª edição, 2ª tiragem. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1999, p.93 e 94.

[32]Por outro lado, quando ocorre conflito entre princípios e regras, a solução é de mais fácil alcance, considerando a superioridade daqueles sobre estas.

[33]. O exemplo citado por Alexy é importante para bem esclarecer o assunto: “Un ejemplo de un conflicto de reglas que puede ser eliminado a través de la introducción de una cláusula de excepción es el que se da entre la prohibición de abandonar la sala antes de que suene el timbre de salida y la orden de abandonarla en caso de alarma de incendio. Si todavía no ha sonado el timbre de salida y se da alarma de incendio, estas reglas conducen a juicios concretos de deber ser contradictorios entre sí. Este conflicto  se soluciona introduciendo en la primera regla una cláusula de excepción para el caso de alarma de incendio’. Cit. P. 88.

[34]Aliás, citando Karl Engish, afirma Paulo Henrique dos Santos Lucon que “as diversas concepções de idéias fundamentais são resultantes dos diferentes critérios políticos e sociais adotados pelo constituinte ou pelo legislador. Por isso, a solução de um caso concreto exige verdadeira opção teleológica, ou seja, a escolha de certos critérios políticos e sociais com vista a atingir determinados resultados, dentro de parâmetros que o próprio ordenamento jurídico estabelece”. Garantia do tratamento paritário das partes. Cit. P. 93 (nota de rodapé n. 4).

[35]Aliás, Eros Roberto grau menciona a existência de jogo de princípios, tendo em vista que a aplicação de um princípio pelo intérprete poderá importar no afastamento do outro. A ordem econômica na Constituição de 1988. 4ª edição, São Paulo : Malheiros, 1998, p. 187.

[36]O império do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 322.

[37]Op. Cit. P. 95.

[38]Sobre jogo de princípios, ver GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. Cit. p. 187.

[39]Não há o objetivo de apresentar a diferenciação entre as duas tutelas de urgência, mas sim abordar seu cabimento em face dos princípios do devido processo legal / o acesso à justiça em contraposição com o contraditório e ampla defesa. Contudo, quanto a análise e pontos de aproximação e diferenciação entre a  cautelar e a tutela antecipada podem ser indicadas as seguintes obras: SOARES, Rogério Aguiar. Tutela jurisdicional diferenciada – tutelas de urgência e medidas liminares em geral. São Paulo : Malheiros, 2000, BEDAQUE, José Roberto dos Santos.  Tutela cautelar e tutela antecipada : tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização). 3ª. Edição. São Paulo : Malheiros, 2003, CHIAVASSA, Tércio. Tutelas de urgência cassadas – a recomposição do dano. São Paulo : Quartier Latin do Brasil, 2004, THEODORO JÚNIOR, Humberto. Tutela Jurisdicional de Urgência  - medidas cautelares e antecipatórias. Rio de Janeiro : América Jurídica, 2001 e RODRIGUES. Marcelo Abelha. Elementos de Direito Processual Civil. Volume 2. 2ª edição. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2003, p. 183 e seguintes.

[40]Ainda sobre o princípio do devido processo legal, Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco ensinam que: “Entende-se, com essa fórmula, o conjunto de garantias constitucionais que, de um lado, asseguram às partes o exercício de suas faculdades e poderes processuais e, do outro, são indispensáveis ao correto exercício da jurisdição. Garantias que não servem apenas aos interesses das partes, como direitos públicos subjetivos (ou poderes e faculdades processuais) destas, mas que configuram, antes de mais nada, a salvaguarda do próprio processo, objetivamente considerado, como fator legitimante do exercício da jurisdição”. Teoria Geral do Processo. 14ª edição. São Paulo : Malheiros, 1998, p. 82.

[41]Já sobre o princípio do contraditório, assim se manifestam os citados professores: “O princípio do contraditório também indica a atuação de uma garantia fundamental da justiça: absolutamente inseparável da distribuição da justiça organizada, o princípio da audiência bilateral encontra expressão no brocardo romano audiatur et altera pars. Ele é tão intimamente ligado ao exercício do poder, sempre influente sobre a esfera jurídica das pessoas, que a doutrina moderna o considera inerente mesmo à própria noção de processo”. Idem. Ibidem. P. 55.

[42]. Ainda sobre as colisões entre disposições, vale a pena transcrever os ensinamentos de Victor Ferreres Comella: “En el caso de las colisiones, lo que sucede es que varias disposiciones protegen distintos derechos que concurren en muchos supuestos de la vida real. Hay que presuponer que el legislador constitucional que formuló esas disposiciones sabía que los conflictos entre los derechos protegidos serían frecuentes. Por tanto, debe interpretarse que su intención fue proteger los diversos derechos y, en caso de que surgieran conflictos, evitar que la protección de unos se hiciera a costa de un sacrificio desproporcionado de los otros. En consecuencia, hay que interpretar las diversas disposiciones sistemáticamente, como partes de un todo coherente. Esto exige la construcción de reglas  más específicas que permitan conciliar las exigencias de las disposiciones, evitando que determinados derechos sufran restricciones desproporcionadas”. Justicia constitucional y democracia. Madri : Centro de Estudios Políticos y Constitucionales: 1997, p. 28.

[43]Chegará o intérprete à conclusão sobre qual princípio pesa mais, adotando a ponderação e a proporcionalidade. Sobre a lei de colisão, ver Robert Alexy. Op. Cit. P. 90.

[44]Paulo Henrique dos Santos Lucon apresenta observações importantes envolvendo o princípio do contraditório. De acordo com suas lições: “Hodiernamente, o contraditório representa verdadeira meta política de legitimação do provimento jurisdicional ou administrativo mediante a outorga, pelo ordenamento jurídico, de garantias de participação igualitária das partes no processo. Ao juiz, sujeito também do contraditório, cabe observar e fazer observar essas garantias. Por isso, contraditório e ampla defesa relacionam-se tão intimamente com o tratamento paritário das partes no processo, pos nele se inclui a igualdade de oportunidades de participação, absolutamente necessária para a defesa dos direitos em juízo”. Garantia do tratamento paritário das partes. Cit. P. 102.

[45]No item seguinte serão apresentados precedentes que reconhecem o cabimento de medidas liminares sem audiência da parte contrária, sem que se possa discutir violação aos princípios constitucionais discutidos no presente trabalho.

[46]Op. Cit. P. 57.

[47]Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor. 6ª edição. São Paulo : RT, 2002, p. 614 – nota 11 – art. 273 do CPC.

[48]Realmente, seria absolutamente discutível nos aspectos efetividade/ acesso à justiça uma decisão proferida após a ocorrência do dano, se o litigante procurou exatamente evitá-lo mediante ajuizamento de demanda inibitória.

[49]José Afonso da Silva, analisando o art. 5º., XXXV da CF/88,  assevera que : “É preciso repisar aqui a idéia, já lançada antes, de que o direito de acesso à Justiça, consubstanciado no dispositivo em comento, não pode e nem deve significar apenas o direito formal de invocar a jurisdição, mas o direito a uma decisão justa. Não fora assim, aquela apreciação seria vazia de conteúdo valorativo”. Poder Constituinte e Poder Popular- estudos sobre a Constituição .1ª edição, 2ª tiragem. São Paulo : Malheiros, 2002, p. 155.

[50]José Rogério Cruz e Tucci, em obra clássica, indica a importância da tutela antecipada na distribuição do tempo no processo. De acordo com suas lições, “a tutela antecipada, mediante o expediente técnico da condenação com reserva, exatamente porque enseja a generalização da tutela distributiva do tempo do processo, evita que se entreveja na aceleração da execução qualquer privilégio conferido a um determinado seguimento social em detrimento de outro. Diante do exposto, fácil fica concluir que essa tendência atual, com a finalidade de acelerar a marcha procedimental, deve ser individuada na intolerância da excessiva lentidão da estrutura do processo tradicional, visto resultar pacífico que a rápida prestação jurisdicional é ele mento indispensável para a efetiva atuação das garantias constitucionais da ação e da defesa”.  Tempo e Processo.  São Paulo : RT, 1997, p. 128 e 129.  Ainda sobre o tempo no processo, Paulo César Santos Bezerra aduz que: “Na maioria das vezes, porém, sua pretensão será resistida, o que acarretará o que chamamos de tempo do processo, custas com provas periciais, quando não em conciliações quase que forçadas pela desilusão da justiça ou por juízes tendenciosos e incautos que, no afã de desobstruir seus pretórios, forçam acordos não poucas vezes, injustos”. Acesso à justiça- um problema ético-social no plano da realização do direito.  Rio de Janeiro : Renovar, 2001, p. 187.

[51]O Professor argentino Augusto A. Morello apresenta importante comentário sobre a importância da tutela antecipada nesse particular, senão vejamos: “se  obtendría un saludable equilibrio interior dentro del proceso ordinario, porque receptada esa tutela intermedia con prudencia, aunque de manera nada conservadora ni pegada a lo establecido (es decir, con intensidad no desdeñable) al hacerse cargo de una necesidad insoslayable reduciría los riesgos e frustraciones de aconpañan en el presente el uso del tipo instrumental común. Con todo lo que ello significa en la realidad operativa del proceso justo constitucional”. Antecipación de tutela. La Plata : LEP. 1996, p. 24. Apud TUCCI, José Rogério Cruz e.  Tempo e processo. Cit. P. 126 e 127.

[52]Cit. P. 8.

[53]CPC Comentado. Cit. P. 614, Nota 10 – art. 273.

[54]In Os poderes do juiz e as reformas do processo civil. São Paulo : Juarez de Oliveira, 2002, p. 155.

[55]Tutela Cautelar e Tutela Antecipada.  Cit. p. 355.

[56]Técnica processual e tutela dos direitos. Cit. P. 226 e 227.

[57]Aliás, a alteração do art. 14 do CPC, proveniente da recente reforma processual, deixa claro que é obrigação das partes e de todos aqueles que atuam no processo cumprir as determinações judiciais, sob pena de sanção. Sobre a efetividade da decisão judicial e os meios de coerção, ver SOUZA JÚNIOR, Adugar Quirino do Nascimento. Efetividade das decisões judiciais e meios de coerção. São Paulo : Juarez de Oliveira, 2003, p. 45 e seguintes.

[58]Aliás, Nelson Nery Júnior afirma que: “Há, contudo, limitação imanente à bilateralidade da audiência no processo civil, quando a natureza e a finalidade do provimento jurisdicional almejado ensejarem a necessidade de concessão de medida liminar, inaudita altera pars, como é o caso da antecipação da tutela de mérito (CPC, art. 273), do provimento cautelar ou das liminares em ação possessória, mandado de segurança, ação popular, ação coletiva (art. 81, parágrafo único, CDC) e ação civil pública. Isto não quer significar, entretanto, violação do princípio constitucional, porquanto a parte terá oportunidade de ser ouvida, intervindo posteriormente no processo, inclusive com direito a recurso contra a medida liminar concedida sem sua participação. Aliás, a própria provisoriedade dessas medidas indica a possibilidade de sua modificação posterior, por interferência da manifestação da parte contrária, por exemplo”. Princípios do processo civil na Constituição Federal. Cit. P. 143 e 144.Ainda à nível doutrinário, Alexandre Freitas Câmara também observa que não há qualquer violação aos princípios constitucionais quando ocorre concessão de medidas liminares. De acordo com suas lições: “A possibilidade, assegurada ao demandado, de manifestar-se posteriormente sobre o provimento antecipatório não afasta o contraditório, mas apenas o difere para momento posterior”. Escritos de Direito Processual. Rio de Janeiro : Lumen Juris, 2001, p. 104.

[59]Tutela Cautelar e Tutela Antecipada. Cit. p.  368.

[60]As tutelas inibitórias visam justamente evitar o início ou a continuação do ato ilícito, sendo autônoma em relação à tutela ressarcitória. Aliás, Luiz Guilherme Marinoni corretamente aduz que: “Quando a inibitória é proposta para impedir a continuação ou a repetição do ilícito, não há muita dificuldade para se demonstrar o perigo de ilícito. Quando um ilícito anterior já foi praticado, da sua modalidade e natureza se pode inferir com grande aproximação a probabilidade da sua continuação ou repetição no futuro”. Tutela inibitória – individual e coletiva. 2ª edição. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2000, p. 48.

[61]A tutela inibitória na vida privada. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2000, p. 95