Crise secular da hermenêutica


PorJeison- Postado em 29 outubro 2012

Autores: 
CAMINATA, Mauricio Peluso.

 

Resumo:  O escopo deste trabalho é apresentar ao leitor, implicitamente, a importância do estudo da hermenêutica jurídica e a grande ciência que é o Direito, visto sob o prisma interpretativo em suas diversas facetas.


 

Eis um tema de relevante importância para o Direito, para a tentativa de uma aplicação legal satisfatória, em consonância do instinto subjetivo do intérprete. Desde que a lei existe, existe para alguém lhe interpretar, mormente a consolidação da mesma nos introitos societários de todo o mundo e de eminente clareza nos países latino-americanos encontra dificuldades de solução prática. As normas de caráter brumoso são complementadas com a subjetividade analítica do aplicador, que têm, agora, uma meta-responsabilidade de satisfazer os anseios de justiça. O costume criado sobre a interpretação normativa, precipuamente no Brasil é estanque, não acompanhando o teor societário, aquele dotado de vida, o real organismo social. O problema é a comunicabilidade Constitucional com a sociedade. Salvo melhor observação caímos no problema conhecido desde as raízes liberais, que nos caracteriza como objeto da Constituição e não ao contrário.

Desde muito se vê a interpretação como o obstáculo a ser superado pelo homem como um todo, e especificamente pelos exegetas no Direito. Pelo fato subjetivo do intérprete, a plenitude adequável da hermenêutica jurídica é de relevância grande e dificultosa. Mesmo com grandes doutrinadores contribuindo para a elucidação das palavras, a brumosidade interpretativa impera sobre os ares instáveis da democracia.

O âmago da problemática da interpretação no Direito se dá precipuamente, na distinção e caracterização dos princípios e regras. A dúvida central é se a norma é correta precedentemente ao discurso do aplicador ou se, torna-se correta com a elasticidade subjetiva que paira sobre a incerteza normativa, desde sua criação à sua aplicação. Afinal, uma norma é correta quando eclode, regulando a sociedade prévia-hipoteticamente (e assim torna-se hermética quanto à evolução circunstancial da sociedade), ou quando é reconstruída para fazer prevalecer-se casuisticamente sobre outra não suficiente ao preenchimento cognitivo do intérprete.

Ronald Dworkin, jurista de Harvard propõe o silogismo do conflito entre princípios e regras com o fito de dar fim ao desentendimento procedimental do discurso do juiz. Assim, Dworkin diz que princípios e regras são espécies normativas, sendo que um princípio pode ter força de regra e vice-versa quando conveniente às circunstâncias do caso. Num conflito entre princípios, a solução é valorativa-axiológica, sendo uma ideia de aplicabilidade - ‘’mais ou menos’’ – enquanto as regras estão numa esfera de - ‘’tudo ou nada’’ – ou seja, uma das duas deve ser excluída do caso sob apreciação. [1]

Robert Alexy, jurista Alemão, não foge da ideologia de Dworkin, apenas minuciando a ideia dos princípios como apanágios da democracia e lhes dá a peculiar característica de base jurisdicional, como diretivos finalísticos de escopo social.

Humberto Ávila critica os métodos, tanto do americano quanto do alemão, na distinção entre princípios e regras, sendo que o método tudo ou nada para as regras e mais ou menos para os princípios são coisas no mínimo parecidas, visto que, no problema dos princípios, com o caso sob análise o princípio mais razoável para as circunstâncias vai, se sobrepor sobre o outro, menos adequado para a tutela dos Direitos fundamentais da parte favorecida, não passando de um sopesamento de razões. Caímos no tudo ou nada das regras.   

Muitos são os juristas que definem os princípios como as vigas mestras do ordenamento, sendo eles a tônica do positivismo e donde deve se desvencilhar as corretas interpretações. Claramente, os princípios derivados de um Direito Natural do homem, aquele transcendente às normas positivadas e de relevada importância para a criação das mesmas em seus escopos, vêm a ter essa característica de extrema importância quando passam a ganhar relevância publicística, ou seja, aquela Constitucional. Os princípios quando Constitucionalizados, passam a ser normas de eficácia plena e aplicabilidade imediata, porém nem sempre é assim que os intérpretes os veem, tanto administradores, quanto juristas no momento de reconstrução-aplicação normativa. Aqui se vê o problema secular e Hercúleo da interpretação, encarado magistralmente, de Wittgenstein à Habbermas, ambos alemães, cada qual em seu tempo deram apodíticas contribuições para a hermenêutica jurídica, o primeiro sob um prisma filosófico transcendente ‘’Jogos de Linguagem’’, o segundo sob um prisma tecnicista, ‘’Ética do Discurso’’. Porém a dúvida ainda é clara quanto à correta interpretação, precipuamente nos denominados hard cases, de modo que, as circunstâncias inexoráveis à facilitação hermenêutica do caso, obstaculizam a ética aplicativa e deixam um halo de incertezas sequioso para o ludíbrio societário. O próprio Wittgenstein, proclamava a tamanha subjetividade que é a interpretação em si mesma, contudo a reconstrução normativa feita pelo jurista não é total e nem pura, visto que, a norma criada pelo legislador tem em seu âmago uma verdade transcendente, aquela determinada e de conhecimento generalizado, Wittgenstein refere-se aos ‘’jogos de linguagem’’: há sentidos que preexistem ao processo particular de interpretação, na medida em que resultam de estereótipos de conteúdos já existentes na comunicação linguística geral[2]. Assim o processo legislativo passa por uma interpretação pluralmente ideológica, de modo que, uma bagagem legiferante é advinda de diversos prismas ideológicos sobre uma hipótese, porém essa pluri-construção não olvida o núcleo real citado por Wittgenstein. Sendo assim, o exegeta reconstrói a norma, no sentido de aplicá-la da maneira que lhe convier, - por isso não é pura - avaliando, uma antes determinada regra e transformando-a num princípio ou vice-versa dando-lhes sentido diverso daquele anteposto pelo legislador no momento da legislatura, momento este totalmente diverso do momento aplicativo. Destarte o aplicador tem de adequar de maneira teleológica às duas realidades distintas, o escopo democrático Constitucional.

Reputando, o supra-mencionado problema com a aplicabilidade imediata dos princípios, vemos a administração omissa quanto às políticas públicas de efetividade Constitucional. O Judiciário atuante é consectário da problemática desarmoniosa, primeiramente entre os poderes que não agem a favor da Constituição, causando reflexos em uma crise societária, atrás de efetividades fundamentais. Deve haver uma contribuição democrática de diálogo e consenso entre os entes da federação e seus respectivos poderes, em busca do escopo gradativamente específico e minucioso, que é a democracia para todos. Não olvidando da questão dimensional do Direito, relevo a importância de criticar, aqueles que dizem ser necessário atingir os Direitos da 2º dimensão, a denominada utopia da igualdade social, que desde a Constituição de Weimar (1.919) vêm lutando para se cristalizar nas instituições democráticas do mundo, para que só depois possamos atingir a Democracia - Direitos de 5º dimensão -, visto que, sem Democracia, nem os Direitos da 1º dimensão com a Revolução Francesa teriam se erguido perante o absolutismo monárquico.

A democracia, deprecante por um consenso entre diálogo e interpretação, desde os entes abstratos do Estado, às pessoas naturais deve existir, para que o corolário clássico - democracia pura - não fique empedernido no tempo.

Conclusão: A interpretação não foge da observação filosófica, tendo necessária ligação com esse prisma. É um desafio de importância humanitária que se evidenciou com a história. Se encontrássemos ou cognitivamente tivéssemos a realidade transcendente da verdade das palavras, não haveria qualquer desentendimento e talvez o Direito não tivesse necessidade de existência. Em se tratando de coisa impossível para o atual estágio da humanidade, fica posto o desafio linguístico.

Bibliografia:

Bonavides, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 25º edição;

Ávila, Humberto. Teoria dos Princípios, 10º edição;

Notas:


[1] Humberto Ávila, Teoria dos Princípios, 10º edição pp. 36 e 37. [2] Humberto Ávila, ob. Cit., p. 32

 

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