Da construção social da criminalidade à reprodução da violência estrutural: os conflitos agrários no jornal


PoreGov- Postado em 04 março 2011

Autores: 
BUDÓ, Marília Denardin

Os meios de comunicação de massa e as agências do sistema penal têm em
comum a característica de fazerem parte do controle social global. Suas relações,
porém, se estreitam quando se percebe os apelos que o crime carrega para o
sensacionalismo do jornal e o interesse do sistema penal pela legitimação discursiva
de seus atos. Essa dissertação de mestrado tem por objetivo investigar a forma
como o jornal auxilia, em conjunto com as demais instâncias de controle social, na
construção social da criminalidade. O trabalho tem por teoria de base o paradigma
da reação social, do qual partem a Teoria do etiquetamento e a Criminologia crítica,
possibilitando uma perspectiva construcionista sobre a criminalidade, bem como
uma visão materialista do desvio, a partir do método dialético. Como delimitação do
objeto de estudo, busca analisar a construção social dos conflitos agrários. A
dissertação divide-se em dois capítulos. O primeiro analisa a interação entre controle
formal e informal na construção social da realidade, com ênfase no jornalismo. O
segundo transmite a teoria do primeiro capítulo para a especificidade dos conflitos
agrários, buscando compreender de que forma sistema penal e jornalismo
constroem a imagem dos mesmos, tendo como principal foco as ocupações de
terras pelo MST. Esta seção traz, ainda, a análise de discurso crítica de edições do
jornal Zero Hora acerca da questão agrária. Tendo em vista a representação
excessiva das fontes oficiais nos jornais, nota-se que os mesmos reproduzem
cotidianamente o discurso do sistema penal, tanto nas notícias sobre crimes
comuns, quanto nas notícias sobre ?desordens? provocadas por manifestações dos
movimentos sociais de luta pela terra. Apesar da deslegitimação teórica e fática do
sistema penal, que demonstra a sua característica de reproduzir as desigualdades e
opressões, ao operar de forma seletiva e estigmatizante segundo o status social do
desviante, seus discursos são reproduzidos nos jornais. Sendo assim, controle
social informal e formal interagem na construção e social da criminalidade. Além
disso, a relegitimação do sistema penal operada por movimentos eficientistas de
política criminal encontra amparo no jornalismo, em função da relação com o
sensacionalismo e incitação ao aumento da repressão. Aplicada ao caso dos
conflitos agrários, a análise permite concluir que, ao despolitizar e resumir a
violência no campo à violência individual, e, os conflitos, aos atos dos sem terra, a
partir da sobrerepresentação dos depoimentos da polícia, do judiciário e dos
ruralistas, oculta-se a violência estrutural originada da concentração das terras e da
exclusão social. Essa redução permite também a delimitação de um inimigo para o
Estado e para a sociedade, buscando criminalizar as suas ações, despolitizar os
seus argumentos e ocultar suas reais propostas. Dessa maneira, opera-se a
reprodução dessa violência estrutural provocada pela desigualdade, concentração
de terras e exclusão social, transfigurando, também, os conceitos de cidadania e
democracia.

AnexoTamanho
33914-44590-1-PB.pdf1.27 MB