Da possibilidade e requisitos para que seja protestada obrigação acessória de contrato principal, qual seja, por exemplo, Cláusula de Fiança ou Cláusula Penal


PorJeison- Postado em 03 dezembro 2012

Autores: 
ALMEIDA, Ramatis Vozniak de.

1. INTRODUÇÃO

 

A cláusula penal é um pacto acessório ao contrato ou a outro ato jurídico, efetuado na mesma declaração ou declaração à parte, por meio do qual se estipula uma pena, em dinheiro ou outra utilidade, a ser cumprida pelo devedor ou por terceiro, cuja finalidade precípua é garantir, alternativa ou cumulativamente, conforme o caso, em benefício do credor ou de outrem, o fiel cumprimento da obrigação principal, bem assim, ordinariamente, constituir-se na pré-avaliação das perdas e danos e em punição do devedor inadimplente. Trata-se de verdadeira multa.[1]

 

No ensinamento de Beviláqua, "não se confunde esta pena convencional com as repressões impostas pelo direito criminal, as quais cabe somente ao poder público aplicar em nossos dias. A penal convencional é puramente econômica, devendo consistir no pagamento de uma soma ou execução de outra qualquer prestação, das que podem ser objeto de obrigações".[2]

 

Já, a cláusula de fiança vinculada ao contrato, geralmente nas modalidades de fiador pessoa física ou de seguro fiança, existe como forma de garantia frente à eventual inadimplência do inquilino, comumente mais utilizada nos contratos dos mercados de locação de imóveis.   

 

2. DESENVOLVIMENTO

 

  Quanto à cláusula penal, portanto, o legislador não previu forma especial. Contudo, ela é uma obrigação acessória e, assim, a sua forma deve seguir a da obrigação principal. Desse caráter de acessoriedade, decorrem duas outras conseqüências: a nulidade da cláusula penal não acarreta a da obrigação principal; mas, de outro lado, a nulidade desta implica a da cláusula penal, consoante o disposto no art. 922 do Código.[3]

 

Além disso, resolvida a obrigação sem culpa do devedor, a impossibilidade de adimplemento da obrigação não lhe pode ser imputada, resolvendo-se também a cláusula penal, de acordo com o art. 923 do Código.[4]

 

Os seguintes artigos do Código Civil brasileiro trazem os diferentes tratamentos devidos a cada uma das modalidades da figura, in verbis:

 

Art. 918. Quando se estipular a cláusula penal para o caso de total inadimplemento da obrigação, esta converter-se-á em alternativa a benefício do credor.

 

Art. 919. Quando se estipular a cláusula penal para o caso de mora, ou em segurança de outra cláusula determinada, terá o credor o arbítrio de exigir a satisfação da pena cominada, juntamente com o desempenho da obrigação principal.[5]

 

Existe limitação à autonomia da vontade no que se encaixa o art. 920 do Código Civil, quando dispõe: "O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal".[6]

 

Nesse quadro de limitações à autonomia da vontade é que se encaixa o art. 920 do Código Civil, quando dispõe: "O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal".[7]

 

Porém, o próprio autor do projeto do Código, Beviláqua, observa em seus comentários que: "O limite imposto à pena por este artigo não se justifica. Nasceu da prevenção contra a usura, e é uma restrição à liberdade das convenções, que mais perturba do que tutela os legítimos interesses individuais".[8]

 

Por outro lado, parece que a restrição do art. 920, na verdade, acompanha a tendência legislativa de proteção pelo Estado dos particulares em suas relações jurídicas, com normas de ordem pública hábeis a mitigar as diferenças entre os indivíduos, buscando colocar seus interesses em equilíbrio. Exemplos dessa intervenção são a Lei da Usura (Decreto nº 22.626/33), que, em pleno Estado Novo, veio proibir a cobrança de juros acima do que suas normas dispunham, e, primordialmente, o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), o qual impõe normas que, elevadas à ordem pública, derroga a liberdade contratual nas relações de consumo, com vistas à proteção dos interesses privados da figura definida na Lei como consumidor.[9]

 

Acerca de protesto de documentos representativos de dívidas, SÍLVIO DE SALVO VENOSA afirma que:

 

"Em matéria cambial, o protesto é prova oficial e insubstituível da falta ou recusa, quer do aceite, quer do pagamento, [...]. Segundo a doutrina tradicional, o protesto é um ato formal com finalidade essencialmente probatória, uma vez que evidencia que o devedor não cumpriu a obrigação constante do título. Trata-se de ato jurídico em sentido estrito. O efeito probante do ato decorre exclusivamente da lei.

 

 Nesse diapasão, há de se levar em conta o novo protesto com finalidade especial. Essa modalidade de protesto é destinada a títulos e documento que a princípio não eram protestáveis, mas cujo protesto serve para atingir uma finalidade ou completar o sentido das obrigações no universo negocial. Em resumo, permitindo o legislador que outros documentos comprobatórios de obrigações e débitos em aberto sejam protestados, busca-se, por meio do ato jurídico do protesto, o aperfeiçoamento do princípio pacta sunt servanda. Nessa modalidade de protesto se incluem, entre outros, sentença com trânsito em julgado, contratos e outros débitos para fundamentar pedido de falência contra devedor comerciante (art. 10 da Lei de Falências)."(VENOSA, Sílvio de Salvo. O Protesto de Documentos de Dívida, in Novo Código Civil Interfaces no Ordenamento Jurídico Brasileiro, Coordenadora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, 1. ed. – Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2004, ps. 124/125.)

 

Vale dizer que, qualquer documento que represente uma dívida e que esteja apto a uma ação judicial de cobrança (execução judicial) poderá ser objeto de protesto.[10]

 

SÍLVIO DE S. VENOSA expõe que:

 

"[...] Desse modo, embora haja quem à primeira vista possa sufragar a opinião mais extensiva, o dispositivo do artigo 1º deve ser interpretado restritivamente no sentido de que o protesto é utilizável somente para os títulos cambiários e para os demais títulos executivos judiciais e extrajudiciais, que estão elencados nos arts. 584 e 585 do Código de Processo Civil. Desse modo, doravante, devem ser admitidos a protesto todo o rol elencado nesses dispositivos, entre outros, [...], crédito decorrente de aluguel ou renda de imóvel, [...], desde que comprovado por contrato escrito. Desse modo, por exemplo, o débito resultante da locação de imóvel, comprovado por contrato escrito, pode ser objeto de protesto, tanto quanto ao inquilino como quanto ao fiador, pois a fiança é modalidade de caução e se insere entre os títulos executivos extrajudiciais. [...]" (O Protesto de Documentos de Dívida, in Novo Código Civil Interfaces no Ordenamento Jurídico Brasileiro, Coordenadora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, 1. ed. – Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2004, p. 125.)[11]

 

Dessa forma é fácil e lógico perceber que cláusulas que acompanhem e constituam os documentos/contratos representativos de dívidas também sejam protestáveis, quer sejam cláusulas penais ou de fiança, desde que coadunadas com a razoabilidade legal, doutrinária e jurisprudencial que confirmem sua adequada exigibilidade em termos de valores, que se destinem a cumprir sua função essencial, e não se tornem meio de excessiva onerosidade, enfim, que não se tornem instrumentos de desvirtuação.

 

A doutrina se perfilha tanto com o entendimento do legislador reformista do Código de Processo Civil, no que pertine aos títulos executivos, quanto ao legislador elaborador da Lei 9492/2004, que admite o protesto do contrato de locação, quando houver dívida oriunda de descumprimento de cláusula contratual.[12]

 

3. CONCLUSÃO

 

O Código Civil de 1916, anterior ao atual, previa que “o acessório segue o principal”, como se costuma dizer no jargão jurídico, regra aceitável e razoável inclusive para a atualidade. Cabe, portanto, o protesto de Cláusula de Fiança ou de Cláusula Penal, pois segundo o art. 92 do novo Código Civil o acessório pressupõe a existência do principal.

 

Portanto, se o devedor estiver em mora certa, exigível e líquida, poderá protestar a dívida toda mais o acessório, e este pode ser a Cláusula de Fiança ou a Cláusula Penal, desde que atendidos os ditames legais, doutrinários e jurisprudenciais que norteiam a razoabilidade e adequabilidade na estipulação das cláusulas e dos valores que esta gerem, para que não se torne uma cobrança abusiva, exorbitante, bem como eventuais normas corrreicionais dos Tribunais de Justiça, contanto que estejam em seu devido campo de atribuições. Entretanto, esse entendimento ainda não se encontra pacificado.

 

4. REFERÊNCIAS

 

ALVES, M. A.;PROTESTO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO POR DESCUMPRIMENTO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. Disponível em: http://www.meuadvogado.com.br/entenda/protesto-contrato-locacao-clausula.... Acessado em: 20/07/2012.

 

GRINOVER, A.; BENJAMIN, A. H. de V.; FINK, D. R. et al. CÓDIGO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. 6. ed. São Paulo: Forense Universitária, 1999.

 

 

 

Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.40931&seo=1>