Direito à Negociação Coletiva como Instrumento da Efetividade de Direitos Fundamentais


PorJeison- Postado em 18 março 2013

Autores: 
SOARES, Aneliza Oscar Cunha.

 

1-      INTRODUÇÃO

 

O presente estudo visa analisar a negociação coletiva como instrumento da efetividade dos direitos fundamentais dos trabalhadores, trazendo a baile posições doutrinaria nacional o direito comparado na America Latina bem como o posicionamento da OIT  frente a problemática.

 

2-      NEGOCIAÇÃO COLETIVA

 

Não há uniformidade acerca do emprego da expressão “negociação coletiva” em nosso ordenamento jurídico, seja no plano constitucional ou infraconstitucional, o que se nota é que o termo “negociação coletiva” aparece ora como sinônimo de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, isto é, ora como fonte normativa autônoma, ora como procedimento prévio de uma fonte normativa o que pode ser autônoma ou heterônoma.

 

A convenção 154 da OIT ensina que a negociação coletiva reúne todas as negociações que tenham lugar entre, de uma parte, um empregador, um grupo de empregadores ou uma organização ou várias organizações de empregadores, e de outra parte, organizações de trabalhadores, cujo objetivo é fixar, regular e disciplinar as condições de trabalho e emprego.

 

Para Sergio Pinto Martins[1]a negociação coletiva é uma forma de ajuste de interesse entre as partes, que acertam os diferentes entendimentos existentes, visando encontrar uma solução capaz de compor suas posições . Envolve a negociação coletiva um processo que objetiva a realização da convenção ou do acordo coletivo. Qualifica-se assim, pelo resultado”.

 

Nesta mesma linha, Enoque Ribeiro dos Santos[2] pondera que a negociação coletiva é o “processo dialético por meio do qual os trabalhadores e as empresas, ou seus representantes, debatem uma agenda de direitos e obrigações, de forma democrática e transparente, na busca de um acordo que possibilite o alcance de uma convivência pacífica, em que impere o equilíbrio, a boa-fé e a solidariedade humana”.

 

Para José Claudio Monteiro de Brito Filho[3] a negociação coletiva “corresponde a entendimento entre empregados e empregadores visando à harmonização de interesses antagônicos com a finalidade de estabelecer normas e condições de trabalho”.

 

O art. 2º da Convenção n. 154 da Organização Internacional do Trabalho-OIT, preceitua o que é a negociação coletiva, o que nos remete a um estimulo ao dialogo social, a saber: “comprende todas las negociaciones que tienen lugar entre um empleador, un grupo de empleadores o una organización o varias organizaciones de empleadores, por una parte, y una organización o varias organizaciones de trabajadores, por otra, con el fin de: i) fijar las condiciones de trabajo y empleo, o ii) regular las relaciones entre empleadores y trabajadores, o iii) regular las relaciones entre empleadores o sus organizaciones y una organización o varias organizaciones de trabajadores, o lograr todos estos fines a la vez”.

 

Assim entendemos que a negociação coletiva é o procedimento prévio, fruto do princípio da autonomia privada coletiva, que tem por objeto a criação de uma fonte formal —autônoma ou heterônoma — que solucionará o conflito coletivo de trabalho. Caracteriza-se, pois, como procedimento genérico e preliminar da autocomposição ou da heterocomposição. É a “mesa-redonda”, a “rodada de entendimentos”, o “protocolo de intenções” ou qualquer outro meio que irá culminar, no nosso sistema, em um acordo coletivo, uma convenção coletiva, uma sentença arbitral ou uma sentença normativa. Reconhecemos que o nosso conceito é aplicável especialmente no nosso ordenamento jurídico, pois a negociação coletiva é procedimento prévio obrigatório tanto para a celebração de convenção ou acordo coletivo quanto para o ajuizamento de dissídio coletivo.

 

3-       NEGOCIAÇÃO POR EMPRESA

 

A negociação coletiva é parte integrante fundamental do direito coletivo e esta calcada em princípios básicos, tal como a ética que embasa o processo negocial. Consistem no princípio da inescusabilidade negocial, ou seja, a negociação coletiva não pode ser rejeitada no primeiro aceno; princípio da boa fé, princípio geral do direito, direito a formação, por meio do qual os interlocutores conhecem a realidade das matérias que serão debatidas, princípio da razoabilidade - as partes devem negociar de forma moderada – e o princípio da paz social, representando pela trégua assumida pelo atores sociais implicitantes[4].

 

A negociação coletiva pode ser realizada em diferentes âmbitos ou níveis, de acordo com o sistema jurídico e grau de liberdade sindical que exerça determinado país. Assim ela pode ficar restrita ao âmbito de uma ou mais empresas singularmente consideradas, mas é possível ampliar-se para o âmbito das categorias profissionais e econômicas. Em países que adotam a ampla liberdade sindical, é possível que a negociação coletiva seja generalizada a ponto de alcançar um âmbito supracategorial, por setor ou ramo de atividade econômica.

 

No âmbito da empresa, a negociação pode ser restringida de modo a abranger apenas determinados estabelecimentos, como filiais, agências, setores ou departamentos, tomando por base as condições específicas de trabalho unidades técnicas de produção.

 

A Recomendação n. 136 da OIT preconiza a possibilidade de negociação coletiva em três níveis, ou seja, de acordo com os graus da organização sindical, a saber: sindicatos, federações e confederações. Lamentavelmente, a Constituição brasileira de 1988, acabou limitando a liberdade sindical e, por via de conseqüência a negociação coletiva. Com efeito, ao prescrever o regime da unicidade sindical, a Carta Magna de 1988 só permite dois âmbitos de negociação: no âmbito das categorias e no âmbito da empresa.

 

No âmbito das categorias, porquanto na CCT - Convenção Coletiva de Trabalho as suas cláusulas e condições alcançam apenas aos integrantes da categoria econômica e profissional, no entanto no âmbito da empresa, temos o ACT - Acordo Coletivo de Trabalho cujas cláusulas e condições são aplicáveis restritivamente aos trabalhadores das empresas que dele participaram.

 

Além disso, a negociação coletiva em nosso ordenamento jurídico acaba sendo, na prática, monopólio sindical, seja em função da regra expressa no inciso VI do art. 8º da CF, seja porque as federações e confederações somente comparecem e participam das negociações coletivas quando não existirem sindicatos em determinada base territorial ou quando estes se recusarem a assumir a direção negocial. É o que se infere dos arts. 611, §§ 1º e 2º, 613, I, 614 e 617 da CLT.

 

No entanto, há que mencionar que o artigo 611 § 1[5] autoriza a negociação em o âmbito da empresa, e neste caso haverá a presença do sindicato do trabalhador e o empregador, (este sem a participação de seu sindicato).

 

Carlos Henrique Bezerra Leite[6] questiona sobre a recepção do § 1º do art. 613 da CLT pela Carta Magna, tendo em vista a literalidade do seu art. 8º, VI, que declara ser obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas. Sobre a reflexão chega o referido doutrinador que “tanto a CCT quanto o ACT estão previstos no art. 7º, inciso XXVI, da CF, na categoria de direitos fundamentais dos trabalhadores. Mesmo porque o próprio art. 7º, incisos VI e XIII, prevê o acordo coletivo, ao lado da convenção coletiva, como instrumento normativo de auto-composição dos conflitos trabalhistas. Vê-se, pois, que não há qualquer incompatibilidade do ACT com a Carta democrática de 1988.

 

Surge com outra indagação, será válido o acordo coletivo sem a participação do sindicato?

 

Neste sentido preceitua o art. 617 e seus §§ 1º e 2º da CLT, in verbis:

 

“Art. 617 — Os empregados de uma ou mais empresas que decidirem celebrar Acordo Coletivo de Trabalho com as respectivas empresas darão ciência de sua resolução, por escrito, ao Sindicato representativo da categoria profissional, que terá o prazo de 8 (oito) dias para assumir a direção dos entendimentos entre os interessados, devendo igual procedimento ser observado pelas empresas interessadas com relação ao Sindicato da respectiva categoria econômica.

 

§ 1º — Expirado o prazo de 8 (oito) dias sem que o Sindicato tenha se desincumbido do encargo recebido, poderão os interessados dar conhecimento do fato à Federação a que estiver vinculado o Sindicato e, em falta dessa, à correspondente Confederação, para que, no mesmo prazo, assuma a direção dos entendimentos. Esgotado esse prazo, poderão os interessados prosseguir diretamente na negociação coletiva até final.

 

§ 2º — Para o fim de deliberar sobre o Acordo, a entidade sindical convocará Assembléia Geral dos diretamente interessados, sindicalizados ou não, nos termos do art. 612.”

 

Diante do todo mencionado temos que o acordo por empresa - acordo coletivo é tido como direito fundamental dos trabalhadores. Ademais a própria Constituição, em seu art. 11, prevê a possibilidade de eleição de um representante dos empregados, nas empresas com mais de duzentos trabalhadores, com a finalidade de promover o entendimento direto com os empregadores. Na hipótese prevista na CLT, a situação é mais abrangente, pois pressupõe a formação de uma “comissão de trabalhadores interessados”.

 

Mister se faz mencionar que em nossa legislação, o fenômeno da flexibilização só é possível nos seguintes casos: Redução de salário (art. 7º, VI, CF), Compensação de jornada (art. 7º, XIII, CF; CLT 59, § 2º), Livre negociação de jornada para o trabalho em regime de turno ininterrupto de revezamento (art. 7º, XIV, CF), Trabalho em tempo parcial (art. 58-A, CLT), suspensão do contrato de trabalho para cursos profissionalizantes (art. 476-A, CLT) e contrato por prazo determinado (Lei n. 9.601/98).

 

3         REQUISITOS DE VALIDADE

 

A validade das negociações por empresa. – acordo coletivo - terá validade conforme os ditames do artigo 613 da CLT.  Deverá ser celebrado por escrito, sem emendas nem rasuras, em tantas vias quantos forem os Sindicatos convenentes, além de uma destinada a registro (CLT, art. 613, parágrafo único). Tais instrumentos caracterizam-se como contratos bilaterais e solenes.

 

Também dependem da manifestação dos associados do sindicato a serem atingidos pela norma coletiva, mediante Assembléia geral, conforme dispõe o art. 612 da CLT, que exige quorum de instalação e votação para aprovação das propostas, regra esta que é contestada por parte da doutrina, que a considera incompatível com o art. 8º, I da CF, ao tratar da liberdade de administração e atuação do sindicato. O TST (SDC, OJ n. 13) entendia estar em vigor o quorum exigido pelo art. 612. Esta orientação jurisprudencial, todavia, foi cancelada pela SDC, de modo que, ao que nos parece, não houve recepção do art. 612 da CLT pelo art. 8º, I, da CF.

 

O art. 614 da CLT determina a obrigatoriedade do registro e arquivo da ACT junto ao Ministério do Trabalho, o qual tem o poder de recusar a homologação do registro. No entanto tal recusa, mostra-se incompatível com os princípios da não intervenção e da não interferência estatal na organização sindical (CF, art. 8º, I).

 

Dessa forma, como bem observa Valentin Carrion[7].

 

“A autoridade não pode recusar-se a receber o instrumento; a simples entrega no protocolo é suficiente; vedada a apreciação do seu mérito e dispensada a publicação no Diário Oficial; a incompatibilidade de suas cláusulas com a lei enseja apenas comunicação à chefia de fiscalização, que denunciará à Procuradoria do Trabalho, quando for o caso”

 

Assim, como sabemos o papel da autoridade administrativa se limita à verificação dos aspectos formais de validade da negociação coletiva e dos instrumentos normativos dela decorrentes. A jurisprudência (TST/SDC OJ n. 34)[8] reconhece a necessidade do registro do instrumento negociado normativo, porém como um ato meramente formal por parte do Ministério do Trabalho, o qual estará vinculado a registrar, sem emitir qualquer juízo de mérito.

 

Desta forma, somente quando a autoridade administrativa do Ministério do Trabalho e Emprego verificar que o instrumento normativo depositado apresenta indícios de irregularidade quanto à legitimidade ou representatividade das partes convenentes ou acordantes ou quanto a conteúdo das cláusulas. Se observada alguma irregularidade deverá o Ministério Público do Trabalho atuar, pois a este incumbe a função de defender o ordenamento jurídico, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis dos trabalhadores, bem como de promover ação anulatória de cláusula de CCT ou ACT que viole as liberdades individuais ou coletivas ou os direitos indisponíveis dos trabalhadores (LC n. 75/1993, art. 83, IV).

 

O termo inicial de vigência de um acordo ocorre no terceiro dia após o depósito no Ministério do Trabalho e Emprego (CLT, art. 614, § 1º). Há quem sustente a incompatibilidade entre o art. 8º, I da CF e o § 1º do art. 614 da CLT. O TST, no entanto, considera em vigor norma consolidada (SDC OJ n. 34).

 

No que concerne à duração a SDI-1 do TST editou a OJ n. 322, in verbis:

 

“Acordo coletivo de trabalho. Cláusula de termo aditivo prorrogando o acordo para prazo indeterminado. Inválida. (DJ 9.12.03). Nos termos do art. 614, § 3º, da CLT, é de 2 anos o prazo máximo de vigência dos acordos e das convenções coletivas. Assim sendo, é inválida, naquilo que ultrapassa o prazo total de 2 anos, a cláusula de termo aditivo que prorroga a vigência do instrumento coletivo originário por prazo indeterminado.”

 

Quanto à publicidade dos instrumentos coletivos, o art. 614, § 2º, da CLT determina que cópias autênticas das Convenções e dos Acordos deverão ser afixadas de modo visível, pelos Sindicatos convenentes, nas respectivas sedes e nos estabelecimentos das empresas compreendidas no seu campo de aplicação, dentro de 5 (cinco) dias da data do depósito previsto neste artigo.

 

5        LITERATURA ESTRANGEIRA[9]

 

Argentina a negociação coletiva é parte central do sistema de relações trabalhistas, ocorre por setor de atividade. Os sindicatos são organizados pelo ramo de atividades e há sindicatos ou associações empresariais os quais são os mais atuantes. A partir da década de 1990, houve uma tendência a descentralização da negociação no âmbito da empresa, por iniciativa do setor empresarial, no entanto as maiorias dos sindicatos continuam defendendo a negociação coletiva centralizada.

 

O que se nota é um sistema semelhante a do Brasil, ou seja, sindicatos únicos, organizados por base territorial e por setores de atividade, e negociação coletiva realizada predominantemente nesse âmbito. Em 1967, no entanto, o Decreto-Lei nº 229 passa a reconhecer outro instrumento, o “acordo coletivo”, que é produto da negociação realizada no âmbito da empresa ou de grupos de empresas. A partir desse ano, o âmbito da negociação deixa de ser exclusivamente a categoria econômica em seu conjunto e o seu alcance pode se limitar aos trabalhadores das empresas envolvidas.

 

No Paraguai, é predominante a negociação por empresa. Ao sindicato cabe promover ação coletiva e negociar convênio sobre as condições de trabalho.Ao Estado cabe favorecer as soluções conciliatórias, tendo tal arbitragem caráter optativo. No país, funcionam instâncias de conciliação no âmbito do Estado, porém os interessados podem recorrer a instâncias de entendimento privado. Os atores sociais têm proposto a criação de mecanismos voluntários e tripartites de conciliação e arbitragem dos conflitos coletivos

 

No Chile, a legislação trabalhista indica quais os objetos da negociação coletiva tais como as remunerações e as condições de trabalho. Mas não são todas as empresas ou todos os trabalhadores que podem negociar coletivamente. Os sindicatos estão organizados no âmbito da empresa, assim como a unidade de negociação. São objetos da negociação somente as matérias que “não interferem nas faculdades do empregador de organizar, dirigir e administrar a empresa”. Esse tipo de sistema dificulta a ampliação da cobertura dos acordos. 

 

No Uruguai, a negociação coletiva não está regulamentada de maneira sistemática, fundamentando-se no direito de sindicalização previsto pela Constituição. O regime estabelecido é de ampla autonomia das partes. Os sujeitos negociadores são, pela parte trabalhadora, um sindicato ou – em caso de inexistência – delegados eleitos pelos funcionários. Por outro lado o empregador pode ser um empregador individual, um grupo de empregadores ou uma organização patronal. Atualmente, predominam os convênios de empresa sobre os setoriais, invertendo a tendência histórica que era similar à da Argentina e do Brasil.

 

No que tange ao conteúdo da negociação, nota-se uma tendência à piora das condições de trabalho, tais como rebaixamento salarial, reajustes esporádicos, perda de benefícios, redução do tempo de trabalho com rebaixamento salarial, flexibilidade no gozo de descansos. Além disso, são escassas disposições sobre saúde, segurança e higiene; existem poucas cláusulas sobre qualificação e treinamento; há com freqüência acordos multilaterais (assinados individualmente pelos trabalhadores) que não constituem convênios coletivose restrições à liberdade sindical. Por último, há o estabelecimento de causas de caducidade do convênio ou de determinados benefícios.

 

Venezuela, a negociação pode ser por empresa, por categoria profissional ou por setor de atividade, com predominância da negociação por empresa. Como a legislação foi desenvolvida com essa perspectiva, dificultou o desenvolvimento de outras formas de organização, já que, por lei, exige-se que as decisões sejam tomadas pela maioria dos filiados. Além disso, a negociação por ramo tem uma normativa especial que obriga o seu desenvolvimento ante a autoridade administrativa do trabalho, enquanto a negociação por empresa pode se desenvolver sem presença estatal. Mas existem vários convênios coletivos por ramo de atividade e por categoria profissional que, apesar de não contar com uma regulação especial, não encontram grandes dificuldades para serem celebrados.

 

6        AUTONOMIA DAS PARTES NA NEGOCIAÇÃO COLETIVA

 

Brito Filho indica que em estudo, a Comissão em Peritos em Aplicação de Convenções e Recomendações (OIT), afirma que a negociação coletiva voluntária é um dos aspectos mais importantes das relações laborais.

 

O Processo de dialogo - A negociação - impõe a prática de diversos atos, que são desenvolvidos de acordo com regras fixadas pelas próprias partes ou pelo Estado, e que devem ser, genericamente denominadas em seu conjunto de procedimento.

 

Sobre a questão, é importante observar que o Estado não deve intervir no direito a negociação, não lhe compete impor-lhe restrições.

 

Isso não implica dizer que o Estado não possa, regular a negociação coletiva reconhecendo, por exemplo, quais os agentes que podem, em nome das partes, negociar para determinados fins ou em que condições o Estado reconhece a negociação como válida. O é vedado é, por meio de restrições, dificultarem o processo negocial, como ocorre, por exemplo, no Brasil, onde não se dá amplitude à negociação ao se restringir esses mesmos agentes ao sindicato e, na falta destes, às federações e confederações, deixando de fora as centrais sindicais e as comissões de empresas.

 

Quanto à existência ou não de regulamentação estatal, a negociação pode ser livre ou desregulamentada, na hipótese de as próprias partes, baseadas no direito de negociação, estabelecer as regras, ou regulamentado, quando o Estado impõe, pela lei, as regras para negociação.  Na primeira hipótese temos o caso brasileiro, considerando que não existem regras impostas pelo Estado a serem seguidas nas negociações coletivas. Não que a negociação seja processada sem regras, o que só acontece em raros casos; apenas são as próprias partes que estabelecem, entre e para si mesmas, as regras que serão seguidas, o que pode ocorrer verbalmente ou por escrito.

 

Como exceção à desregulamentação da negociação, no Brasil, porém, pode ser citado o caso do Estado do Pará que, quando negocia com seus servidores, estes representados pelos seus sindicatos, fá-lo com base em normas previstas na Lei Estadual n. 5839, de 23 de março de 1994 que, neste caso, vieram para solucionar dois problemas comuns na negociação na Administração Pública, que são; 1) a definição do interlocutor, ou seja, quem pode, na administração, falar por ela, em cada caso, e 2) os limites de atuação de cada interlocutor, no tocante aos poderes.

 

Em sentido oposto os Estados Unidos da América e Espanha, havendo, em relação ao primeiro, regras que devem ser seguidas na negociação, como se verifica com Benjami. M. Shieber, que afirma estarem elas, por exemplo, na seção 8-d, da lei NRLA, que dispõe sobre organização sindical e solução de conflitos trabalhistas, sendo estas regras, genericamente, definidas como requisitos processuais do dever de negociar de boa fé.

 

Na Espanha, como dispõe Flávio Antonello Filho, o art.89.2, do Estatuto dos Trabalhadores (lei n. 8,de 10 de março de 1980), concede prazo para a resposta da parte provocada a negociar coletivamente (30 dias), o que impõe que a negociação, mesmo que minimamente é regulamentada.

 

a.      AUTONOMIA PRIVADA COLETIVA

 

Segundo Pedro Paulo Teixeira Manus, a autonomia privada coletiva, no âmbito do direito coletivo do trabalho, é o poder das entidades sindicais de auto-organização e auto-regulamentação dos conflitos coletivos do trabalho, produzindo normas que regulam as relações atinentes à vida sindical, às relações individuais e coletivas de trabalho entre trabalhadores e empregadores.

 

Amauri Mascaro, citado por Manus, identifica duas concepções de autonomia coletiva dos particulares, a qual define como concepção restrita e concepção ampla.

 

a) Concepção restrita: significa o poder conferido aos representantes de organização sindicais profissionais e patronais de criarem regulamentação às relações individuais de trabalho, por meio do procedimento da negociação coletiva de trabalho, expressando-se esta faculdade pelas convenções e acordos coletivos de trabalho. Como resultado dessa atividade cria-se um ordenamento jurídico não estatal, mas contratual.

 

b) Concepção ampla: alcança não só o poder de elaboração da norma coletiva, mas também inclui a liberdade sindical e a autotutela dos trabalhadores. Neste sentido, identifica o autor uma tríplice dimensão, consistente na faculdade de instituir normas regulamentadoras das relações entre empregado e empregador, que é o poder normativo, na liberdade de constituir, de organizar entidades sindicais e de nelas ingressar ou sair sem autorização nem interferência do Estado, e afinal, na prática de atos de autodefesa de seus interesses, como a greve e outros atos coletivos.

 

Pedro Paulo Teixeira Manus indica que o fundamento da autonomia coletiva é de ordem jurídica constitucional, pois reconhece a existência da estrutura sindical e da atividade sindical Ademais menciona que não há como negar a necessidade, no regime democrático, de autorização constitucional para a atuação individual ou dos grupos sociais, sob pena de colocar em risco o estado de direito. A garantia do respeito aos direitos individuais, coletivos e difusos reside no respeito ao sistema jurídico e, portanto, às normas constitucionais.

 

BIBLIOGRAFIA

 

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LEITE, CARLOS HERIQUE BESERRA,A Negociação Coletiva no Direito do Trabalho. Ltr 70-07/793.

 

MONTEIRO, BARROS ALICE, Curso de Direito do Trabalho, Ltr, 4 ed., São Paulo, 2008.

 

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NASCIMENTO, AMAURI MASCARO, Compendio de Direito Sindical, 5ed. Ltr, 2008.

 

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http://www.oitbrasil.org.br/prgatv/prg_esp/genero/seminariofinal/caderno1.pdf, acessado em 23/08/2010. 

 

Notas:

[1] Martins , Sergio Pinto, Direito do Trabalho, Atlas, 24 ed. São Paulo, p. 773.

[2] Santos, Enoque Ribeiro de, Direitos Humanos na negociação coletiva. LTR, São Paulo, 2004, p. 90.

[3] Brito Filho, José Claudio Monteiro de. Direito Sindical: analise de modelo brasileiro de relações coletivas de trabalho a luz do direito comparado e da doutrina da OIT: proposta de inserção da comissão de empresa. Ltr. São Paulo: 2000, p. 176.

[4] Teixeira Filho, João de Lima, Principios da negociação coletiva, :In: Silvestre, Rita Maria; Nascimento, Amauri Mascaro (coords) Os novos paradigmas do direito do trabalho: homenagem a Valentim Carrion. São Paulo: Saraiva, 2001. P.123-128.

[5] Art. 61, §1 da CLT: É facultado aos sindicatos representativos de categorias profissionais celebrar acordos coletivos com uma ou mais empresas da correspondente categoria econômica, que estipulem condições de trabalho, aplicáveis no âmbito da empresa ou das empresas acordantes às respectivas relações de trabalho.

[6] Leite, Carlos Henrique Bezerra. A Negociação Coletiva no Direito do Trabalho. Ltr 70-07/793.

[7] Carrion, Valentim, Comentários a Consolidação das leis do Trabalho, Ed. Em CD –ROM, São Paulo, Sarava, 1996.

[8]OJ-SDC-34 ACORDO EXTRAJUDICIAL. HOMOLOGAÇÃO. JUSTIÇA DO TRABALHO. PRESCINDIBILIDADE.Inserida em 07.12.1998: É desnecessária a homologação, por Tribunal Trabalhista, do acordo extrajudicialmente celebrado, sendo suficiente, para que surta efeitos, sua formalização perante o Ministério do Trabalho (art. 614 da CLT e art. 7º, inciso XXVI , da Constituição Federal).