Do necessário cuidado empresarial ao se trabalhar com contratos de adesão


Portiagomodena- Postado em 06 maio 2019

Autores: 
Enrico Pizão Said

O âmbito empresarial valoriza a velocidade. Esta é uma máxima carregada desde o famoso dito popular “tempo é dinheiro”.

Obviamente, sabe-se que as empresas apreciam inúmeros outros valores na sua rotina e tarefas, sejam estas relacionadas à produção ou ao comércio. Velocidade no processo, contudo, nunca deixou de ser qualidade reconhecida e buscada no dia-a-dia.

Dentro do cotidiano jurídico empresarial, a agilidade nos procedimentos vem sendo medida necessária para cumprir com a demanda do cliente. Assim, ainda que todos os profissionais prezem pela qualidade no serviço, a padronização dos processos é adotada como ideia de celeridade e maximização dos ganhos, especialmente em modelos de negócio que funcionam através de quantidade.

Dentro de tal padronização, estão os contratos de adesão. Estes são conduta de praxe na elaboração de documentos empresariais de modo geral. Em suma, são aqueles contratos que, tratando de uma mesma atividade negocial corriqueira, já guardam cláusulas pré-estabelecidas por uma das partes, aguardando apenas a assinatura do contratante. São exemplos os contratos de abertura de conta corrente, contratos de telefonia, internet, prestação de serviços e outros.

Bem se sabe dos cuidados que as empresas devem tomar quando utilizam este tipo de contrato para lidar com pessoas físicas (e até jurídicas) que se enquadrem como consumidores. O Código de Defesa do Consumidor traz inúmeras disposições limitando o poder do instrumento contratual, com base na vulnerabilidade do contratante e na deficiência técnica e informacional dos consumidores.

Pois bem, a questão acima relatada merece atenção e já é de conhecimento geral dos empresários. Entretanto, assunto que merece bastante consideração é a análise do contrato de adesão enquanto contrato interempresarial (entre empresas). Nestes casos, ao contrário do que se imagina, o instrumento contratual também estará limitado a uma autonomia menor que contratos regulares.

É claro, no Direito moderno contratos de todas as espécies são analisados sob uma ótica social, reduzindo o poder da também máxima popular “o contrato faz lei entre as partes”. Ou seja, no cenário atual, os instrumentos contratuais não podem carregar ilegalidades e cláusulas que representem má-fé ou vantagem excessiva para uma das partes.

Mas o critério de avaliação é mais rigoroso para os contratos de adesão, mesmo que estes tenham sido firmados entre empresas, fora da proteção do Código de Defesa do Consumidor. Conforme os Tribunais vêm desbravando o Código Civil de 2002, o artigo 424 ganha força e interpretação mais extensa. Esta norma assim fala: “Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio.”

Mas o que isso significa? Em síntese, que as empresas devem ter cautela ao realizar seus negócios através de contratos de adesão. Os Juízes brasileiros, dia após dia, vêm considerando que neste tipo de contratação são nulas ou anuláveis as cláusulas que “limitam direitos” e desequilibrem o poder entre as contratantes.

Exemplo importante do assunto se dá nas chamadas cláusulas de não indenizar. Estas são aquelas que, de modo geral, afirmam que uma das partes, independentemente de ter tido ou não culpa, não se responsabilizará pelos danos sofridos pela outra, durante a extensão do negócio.

Ora, em um contrato “regular”, negociado e elaborado de modo bilateral, é plenamente lícito que uma das partes se decline de indenizar a outra por danos ocorridos na vigência do contrato.

Contudo, considere que, a título de exemplo, a margem de lucro da empresa A, derivada do modelo de negócio contratado com B, já é provisionada de forma a cobrir danos e similares. Para B, por outro lado, o contrato só lhe é benéfico caso A se sujeite a garantir os prejuízos, mesmo que estes aconteçam por sua responsabilidade. No imaginário comum, este seria uma espécie de negócio válido e benéfico para os contratantes.

Apesar disso, no panorama atual, mesmo que na análise econômica do caso a cláusula de não indenizar seja necessária e condição imprescindível para a assinatura do contrato, na hipótese de este ter sido pré-redigido e determinado unilateralmente, sua validade estará em voga perante o Poder Judiciário.

Assim, nos termos do exemplo, tem-se que, havendo dano, eventual medida legal de A, que já tinha em sua margem de lucro os recursos necessários para suprir o sinistro, poderá acarretar ordem judicial para que seja indenizada por B, colocando em risco o modelo de negócio e a própria existência da empresa.

Há se fazer o necessário parênteses: aqui não se procura atacar desenfreadamente os limites legais dados ao contrato de adesão, considerado que estes são, sim, casualmente utilizados para obter vantagem indevida e ceifar consumidores e empresas de seus direitos.

O que se busca alertar, contudo, é: as empresas de boa-fé devem se resguardar quando negociam através deste tipo de contrato, principalmente quando se colocam na situação de contratadas. Neste caso, a velocidade na elaboração do documento e no fechamento da avença pode ser fatal. Acaso o modelo de negócio dependa da contratação interempresarial por adesão, é necessário o conhecimento prévio dos riscos e um corpo jurídico de apoio competente.

Tempo é Dinheiro, sim. Especialmente quando o tempo é dedicado à prevenção e contenção de riscos jurídicos e financeiros.