Dor e sofrimento: origem cultural


PorAnônimo- Postado em 29 maio 2010

Parece ser consenso que a realidade não existe e sim o “multiverso” - tantos universos quantas pessoas. Cada pessoa tem em seu universo sua própria dor e sofrimento. Eis então a pergunta que se lança “O que acontece que ao longo da vida humana há tanta dor e sofrimento? ". Uma possível resposta é que cada pessoa mostra uma dimensão de seu presente, dissociada do passado, gerando uma “matriz-relacional” onde estão inseridos sua dor e sofrimento, de modo consciente ou inconsciente, arraigado nas dimensões de sua vida.

O caminho de saída é o ato reflexivo-relacional-operacional. Neste ato a pessoa torna-se aberta a escutar, a escutar-se, percebe sua dor existencial, e aceita o convite reflexivo de quem a escuta, em busca de um caminho que a liberte. “Toda dor e todo sofrimento pelos quais se pede ajuda são de origem cultural na cultura patriarcal-matriarcal que vive a maior parte da humanidade atualmente” (MATURA e DAVILA, 2009).

A trama das relações do viver biológico é denominada matriz biológico-cultural da existência humana. Consiste no conjunto das relações desde quando surgem, passando pela realização e conservação do humano. Inclui os mundos em que cada um vive com as distintas dimensões do viver cultural.

No viver cotidiano ocidental, o dualismo é a base do pensar analítico. Sugere a dúvida: “Qual será o caminho correto ? Será bom ou mau?”. Para responder é preciso saber olhar, observar, distinguir, sem perder a visão da totalidade, nem o sentido da unidade do humano. Sendo o humano o viver gerador de tudo, pode-se dizer que o cultural é biológico na medida em que ocorre a realização do viver e conviver. Por outro lado, o biológico é cultural quando acontece o conviver que guia o viver. Assim, é preciso visualizar os componentes, suas relações e a totalidade, integrando os três olhares que constituem o “saber olhar”. Este saber fundamenta em cada um a unicidade da existência como gerador dos mundos que pode aprisionar ao sofrimento ou exaltar o bem-estar.

Deste modo, o viver está associado a cultura e não existe amar na cultura patriarcal-matriarcal. Neste tipo de cultura o amor é tratado com adjetivos e outras noções, conceitos e emoções, tal como, amor solidário, compassivo, generoso, bondoso, verdadeiro,dentre outros. O viver da cultura do amar preconiza o Homo sapiens-amans amans que conserva o viver biológico com legitimidade – “o modo de conviver que nos dá origem”. Assim, amplia o olhar do amar, um olhar amoroso que surge nas relações humanas, na convivência permitindo a escolha livre da permanência ou não no ambiente cultural.

MATURANA ROMESÍN, H; DAVILA YANEZ, X., Matriz biológico-cultural da existência humana e conversar liberador. In: Habitar humano em seis ensaios de biologia-cultural, São Paulo, Palas-Athena, 2009, p. 209-218.