História natural da linguagem


Porgeovana- Postado em 09 abril 2011

 

História natural da linguagem humana ( A árvore do conhecimento- Maturana)

Por um longo período existiu o dogma que afirmava a linguagem ser uma exclusividade humana, atualmente esta ideia é abrandada.Experiências e estudos com primatas e golfinhos demonstraram a existência de linguagens neste grupos. Algumas experiências com primatas superiores demonstraram uma ampla capacidade de aprender e interagir conosco. Nos anos 30 um casal criou um chipanzé com o filho - não conseguiu ensiná-lo a falar - pois os chimpanzés não têm estrutura para produzir as modulações vocais necessárias a fala.

Outro casal ,os Gardner, direcionaram o aprendizado para a capacidade gestual e não vocal. Utilizaram o Ameslan (idioma gestual mais rico e mais amplo internacionamente usado pelos surdos-mudos) e o chipanzé Washoe aprendeu e dominou o idioma, conseguiu  falar" . Washoe tinha um ano em 1966 e com 5 anos já aprendera um repertório de cerca de duzentos gestos.  Depois de 15 anos conseguiu combinar seu repertório e criar novos gestos de acordo com o contexto. Mas a pergunta principal é :Refletia sobre suas ações??

Usam a reflexibilidade para distinguir elementos do domínio linguístico como se fossem objetos? Ou seja, se apropriam da linguagem de forma ampla?

Outro experimento comparou a habilidade de 3 chipanzés para aprender uma linguagem, Lana usou o computador para aprender, (veja o vídeo clicando no link) os outros dois machos não, pois estes aprenderam em interação constante com os objetos e com outros animais. Os resultados foram surpreendentes, Lana possuia uma capacidade muito inferior, seu domínio linguístico era limitado. A linguagem é ação. O domínio linguístico mais rico , com interação e exploração , com convivência e interação com outros animais fez diferença fundamental em suas ontogenias, comparadas com Lana.

A compreensão da história linguística do homem pode ser percebida nesses experimentos.  Geneticamente somos 98% semelhantes. Diferença histórica entre hominídeos e antropóides deve ter envolvido diferenças estruturais no sistema nervoso associadas a diferenças comportamentais.

A história social e linguistica não deixa fósseis ,mas provavelmente as condições que propiciaram a linguagem humana estão relacionadas a partilha do alimento. Coordenação comportamental ontogênica permitiu tornar o grupo coeso apesar de períodos de afastamento.

A linhagem de hominídeos tem mais de 15 milhões de anos. Só após 3 milhões de anos se consolidaram os traços estruturais atuais: andar bípede e ereto, aumento da capacidade craniana, conformação dental que permite ser onívoro, passagem de ciclos estrais de fertilidade para o ciclo menstrual, sexualidade contínua e face a face. Tudo isso ocorreu de forma e ritmo distinto ao longo de milhões de anos. Em algum momento o enriquecimento do domínio linguístico associado a sociabilidade recorrente levou á produção da linguagem. As principais condições que influenciaram o processo, segundo Maturana, são a atitude transportadora (o carregar o alimento, o cuidar, a intimidade), a conformação social do grupo, e a sexualidade permanente e cumplicidade na criação dos filhos. Portanto, a cooperação e coordenação comportamental  constituiram o âmbito linguístico. A conservação de um âmbito linguístico  teria levado a deriva estrutural dos hominídeos = aumento da capacidade de fazer distinções dentro do âmbito linguístico continuamente  - até a reflexão que deu origem a linguagem.  A reflexão, capacidade de se auto descrever, de descrever como se sente, são características não observadas concretamente na linguagem identificada em outros animais.

História da deriva estrutural dos hominídeos levou ao surgimento da linguagem, com essa herança operamos até hoje numa deriva estrutural que conserva a socialização e a conduta linguística. A trfolaxe humana é a linguagem, conclui Maturana.

Entrevista a Willi Bolle na Revista da FAPESP  faz  uma reflexão sobre o surgimento da linguagem a partir da análise do livro Grande Sertão Veredas de Guimarãoes Rosa, em que Bolle afirma: O sertão é dentro da gente (Riobaldo em Grande Sertão Veredas). É uma paisagem mental. É o pensamento sobre o Brasil. O sertão é aquela região selvagem onde se formam as nossas idéias. Onde nasce a linguagem. A experiência mais radical que Rosa fez nesse sentido está no conto Meu Tio O Iauaretê, onde se assiste ao nascimento da linguagem a partir do seu estado selvagem. Selvagem, no sentido de que ali acontece a criação. O pensamento que se está se buscando. É isso que Guimarães Rosa mostra. Essas regiões arcaicas do pensamento e da linguagem podem ser pesquisadas por meio das mais avançadas tecnologias. Com a informática, a inteligência artificial e os espaços virtuais.

 

http://revistapesquisa.fapesp.br/?art=1555&bd=1&pg=3&lg=