A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA VIDEOCONFERÊNCIA FRENTE AO DIREITO À AMPLA DEFESA


PorJuliana de Oliveira- Postado em 23 fevereiro 2012

Localização

Brasil
26° 50' 19.5936" S, 52° 59' 8.4732" W

A palavra "evolução" acompanha todos os meios existentes na sociedade mundial. Inclusive o Direito, como ciência jurídica, apresenta-se em constante evolução, devendo se adaptar, inclusive, as mudanças que a própria sociedade encara de tempos em tempos. Por este motivo é que a legislação sofre alteração em alguns períodos. Assim, todo avanço tecnológico deve ser aplicado nos procedimentos da Justiça, desde que não firam os primados constitucionais.

Neste contexto, surge a idéia de realização de audiências e interrogatórios no judiciário através de videoconferência.

Vale destacar que de acordo com Carneiro (1998), avideoconferência consiste em uma discussão em grupo ou pessoa-a-pessoa na qual os participantes estão em locais diferentes, mas podem ver e ouvir uns aos outros como se estivessem reunidos em um único local; ainda os sistemas interpessoais de videoconferência possibilitam a comunicação em tempo real entre grupos de pessoas, independente de suas localizações geográficas, em áudio e vídeo simultaneamente.

No mundo jurídico, segundo palavras de Moreira (2009, p. 31):

Um sistema de videoconferência é descrito como sendo uma forma de comunicação interativa que permite que duas ou mais pessoas, em locais diferentes, possam se encontrar face a face através da comunicação visual e áudio em tempo real. No processo penal, significa dizer que o réu poderá ser interrogado na própria instituição prisional, sem que haja deslocamento do mesmo até o juízo competente e também o deslocamento do magistrado até o presídio.

Nesta era de constante evolução no mundo jurídico, o Presidente da República sancionou a lei 11.900/2009, que modificou a legislação para admitir a realização de interrogatório do preso dentro do estabelecimento prisional, sem a presença física do juiz, por meio de um sistema audiovisual e em tempo real. As principais justificativas para a criação da lei, conforme seu preâmbulo, são a preservação da segurança pública e a possibilidade de evitar a fuga dos presos com o deslocamento entre presídios e fóruns.

Todavia, a lei não traz somente avanços ao procedimento judicial, traz também uma série de retrocessos aos direitos do preso. Há repulsas da doutrina majoritária, pois afirmam que a lei fere os princípios constitucionais do devido processo legal, que engloba o contraditório e a ampla defesa.  Ademais, de acordo com posicionamento de Tavares (2009), a lei fere também o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, dos quais o Brasil é signatário, que prevêem o direito de o réu ser conduzido à presença física do juiz natural.

Além disso, Tavares (2009) afirma ainda que o sistema punitivo no Brasil é demasiadamente falho, essa mudança poderá acirrar as polaridades sociais no âmbito do processo e os erros judiciários já existentes. Ainda, podemos destacar que o interrogatório é a grande oportunidade que tem o magistrado para formar o juízo a respeito do acusado, ou seja, a sua convicção.

Ainda cumpre-nos salientar que o interrogatório do preso tem natureza híbrida, ora como meio de prova, ora como meio de defesa, conforme palavras de Mirabete (1997, p. 53), “mesmo quando o acusado se defende no interrogatório, não deixa de apresentar ao julgador elementos que podem ser utilizados na apuração da verdade”.

Nesse sentido, se manifestaram os conselheiros do Conselho de Política Criminal e Penitenciária “Substituir o interrogatório, o encontro de pessoa a pessoa, por um encontro tela a tela, pode ser um progresso em termos tecnológicos, mas é um retrocesso em termos humanitários”[1].

Desta forma, fácil concluir que tal diploma legal mostra-se carecedor de constitucionalidade, ainda que o interrogatório via videoconferência tenha surgido de forma legal, por meio do procedimento legislativo correto, os princípios constitucionais de defesa dos direitos do homem foram assustadoramente mitigados.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARNEIRO. Mara Lúcia Fernandes. Videoconferência: ambiente para educação à distância. PGI/UFRGS – PROCERGS: Workshop informática na educação. Disponível em: http://penta.ufrgs.br/pgie/workshop/mara.htm. Acesso em 13.02.2012. 

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo Penal. São Paulo: Atlas, 1997.

MOREIRA, Bruno Coelho. A inconstitucionalidade da lei 11.900/09: interrogatório por videoconferência: economia e celeridade x ampla defesa.Centro Universitário de Brasília. Disponível em: http://repositorio.uniceub.br/bitstream/123456789/738/1/20502466.pdf. Acesso em 17.02.2012

TAVARES, Kátia. Interrogatório do réu por videoconferência fere direitos fundamentais. Revista Visão Jurídica. Disponível em: http://revistavisaojuridica.uol.com.br/advogados-leis jurisprudencia/32/artigo 12 3737-1.asp. Acesso em 13.02.2012.



[1]Citado por FIOREZE, Juliana. Videoconferência no Processo Penal Brasileiro: Interrogatório on-line. Curitiba. Juruá Editora. 200, p. 126