A Lei n. 11.672/2008, que trata dos “recursos especiais repetitivos”, assemelha-se à repercussão geral do Recurso Extraordinário? A referida lei altera as hipóteses de cabimento dos recursos especiais?


Porwilliammoura- Postado em 27 março 2012

Autores: 
SOUZA JÚNIOR, Luiz Lopes de

A Lei n. 11.672/2008, que trata dos “recursos especiais repetitivos”, assemelha-se à repercussão geral do Recurso Extraordinário? A referida lei altera as hipóteses de cabimento dos recursos especiais?

 

 

Autor: Luiz Lopes de Souza Júnior

Advogado, Pós-graduando em Direito Público, Pós-graduando em Direito do Estado.

 

1- REPERCUSSÃO GERAL (art. 102, § 3º, CF)

É mais fácil haver repercussão geral do que não haver, pois o quorum para rejeitar será muito maior: de 08 ministros contra a repercussão geral. O destaque da existência da repercussão geral é o fato de ser uma preliminar formal do recurso. O processualista atual odeia formalismo, tolerando a forma. O STF já se pronunciou no sentido de que há a necessidade de comprovação formal da repercussão geral.

 

Repercussão geral, no art. 543-A, temos a definição do que é esse instituto: “será considerada a existência ou não, de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapasse os interesses subjetivos da causa”. O recurso extraordinário resolve tese, ou seja, qual é o direito aplicável a tal espécie. O § 3º do art. 543-A do CPC, cria a repercussão geral presumida. O recurso extraordinário é apresentado perante o tribunal que proferiu a sentença, sendo que a análise compete privativamente ao STF.

 

O recurso extraordinário, ao chegar no Supremo, analisa-se a questão formal e substancial da repercussão geral (se oferece ou não a repercussão geral). Para essas respostas há uma tramitação interna no STF. Primeiro eles fazem uma triagem nesses processos, analisando se houve a indicação formal, e em caso positivo será distribuído (tudo feito de forma eletrônica). Os demais ministros se manifestam sobre a existência ou não da repercussão geral. Se um ministro se silencia, deve-se entender esse silencio como: na dúvida, há repercussão geral.

 

A grande vantagem dessa discussão virtual da existência ou não de repercussão geral, é a objetividade, celeridade, e até mesmo a economia de papel. O grande problema é que, a partir do momento que se ganha velocidade e eficiência, o cidadão comum é afastado da possibilidade de participar dessas decisões. Nos casos que tem repercussão geral, até é aceitável, mas o que dizer nos casos em que não for considerado como um caso de repercussão geral?

 

O § 6º do art. 543-A, CPC, permite a participação de amicus curiae, o que é fundamental. Não adianta traduzir essa expressão latina, para o vernáculo como amigo da corte, amigo do juiz, pelo fato que o direito brasileiro não tem um instituto discipline inteiramente esse fato (podendo ser entendido até como “amigo” para declarar a suspeição do juiz). O nosso direito prevê a assistência e a intervenção de terceiros. Hoje, o que está acontecendo com o amicus curiae é que as pessoas têm dito muito essa expressão, sem saber do que se trata. Ao que tudo indica, essa expressão veio do direito Inglês. É um terceiro desinteressado que não tem interesse na causa e sim na tese. O amicus curiae é uma forma de intervenção de terceiros.

 

O artigo 543-B cuida da Repercussão geral “por amostragem”, expressão utilizada por Fredie Didier Jr[1]. Quando se alega uma violação à CF, é muito difícil que aquela alegação seja única. Então é muito freqüente que a repercussão geral passe por esse art. 543-B e parágrafos, o qual fundamenta o que fazer na existência de casos repetitivos, disciplinando a “escolha” de um caso que servirá de paradigma para o julgamento dos outros, ficando sobrestados até o julgamento daquele. Os §§ 2º, 3º, 4º falam dos efeitos da decisão dos casos escolhidos para o julgamento em relação aos casos que ficaram sobrestados. Pela lei, VINCULA os demais, porque a lógica do art. 543-B é julgar um grupo menor em nome de um grupo maior.

 

O art. 543-C, introduzido pela lei 11.672/2008, fala do recurso repetitivo. O professor Cássio Scarpinella Bueno[2], afirma que cada vez mais, o art. 543-C e seus parágrafos, é muito melhor redigido e pensado do que o art. 543-B. A idéia é a mesma, também perante o STJ nos recursos especiais há muita repercussão de matérias. Daí se pergunta: é possível tornar o julgamento desses recursos mais céleres através da repercussão geral? SIM. É uma autorização para que os tribunais regionais selecionem os recursos representativos de uma determinada tese, e esse seleto grupo será julgado em nome dos demais recursos que tratam da mesma matéria. O problema é saber como fazer essa escolha.

 

A própria lei 11.672/08 prevê no §4º, a intervenção do amicus curiae, a manifestação do MP (§ 5º), e sem prejuízo dessas intervenções o § 3º permite que o relator peça informações aos tribunais regionais sobre o andamento das causas. No momento dessa escolha do “processo líder” o que importa é selecionar adequadamente para bem julgar, julgar rápido o recurso repetitivo é o complicador, para poder consolidar. A insegurança jurídica pode ser gerada até mesmo pelo fato de que as partes dos processos que ficaram sobrestados começarão a entender que não tiveram “o seu dia perante a Justiça”, isto é, ficarão com o pensamento de que não foi julgado a contento o seu caso, uma vez que a decisão veio através do julgamento de outros casos semelhantes por uma espécie de amostragem.

 

Quando falamos que o STF e o STJ são tribunais Superiores, significa que eles não podem ser pensados como tribunais de terceira instância, e sim de sobreposição, pois a atuação deles é muito diferente da atuação dos tribunais de primeiras e segundas instâncias. O art. 102, CF coloca inúmeras hipóteses de atuação originária do STF. A mesma questão, acontece com o STJ no art. 105, da CF, com suas competências ordinárias.

 

Com a prática, criou-se o recurso especial repetitivo. Antes da CF/88 acontecia a argüição de relevância. Hoje fala-se em Repercussão geral, podendo ser entendida como filtros do recurso extraordinário, no sentido de permitir privativamente ao STF separar (distinguir), escolhendo os recursos que serão julgados e os que não serão julgados. É um mecanismo que permite ao STF escolher quais os recursos ele consegue julgar. Antes da Emenda Constitucional 45, discutia-se se isso era constitucional, mas após a EC 45/04, com a introdução do § 3º no art. 102 da CF, considera-se que seja constitucional.

 

O Ministro Gilmar Mendes em suas obras incentiva a objetivação do recurso extraordinário, passando a pensá-lo de forma macroscópica, o que para ele é mais condizente com a função do STF nos tempos modernos, chegando a dizer que o recurso ordinário assumiria o papel de defesa da ordem constitucional objetiva. Uma saída para isso é acreditar nas AÇÕES COLETIVAS.

 

É possível recurso extraordinário em recurso especial, desde que surja uma questão constitucional que tenha aparecido no recurso especial do STJ. Essa questão não pode ter sido discutida nas instâncias ordinárias. O recurso extraordinário tem se transformado em meio de controle de constitucionalidade, está sendo julgado abstratamente. Serve para vincular até mesmo o próprio STF. Revela semelhança com a ADI (ação direta de inconstitucionalidade), que tem causa de pedir aberta. A súmula vinculante, criada pela EC 45/04, vem do recurso extraordinário.

 

O regimento interno do Supremo (que tem força de lei) regulamentou como se processa um recurso extraordinário interposto nos juizados. Diz que o relator pode de ofício, dar liminar, exatamente como na ADI. Admiti-se também amicus curiae em recursos extraordinários.

 

 

2- A LEI 11.672/2008 QUE TRATA DOS “RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS”

 

Entrou em vigor no dia 08/08/2008, a Lei nº 11.672/2008, que estabelece os procedimentos relativos ao julgamento de recursos especiais repetitivos no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A norma dispõe que, quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, cabe ao presidente do Tribunal de origem admitir um ou mais recursos representativos da controvérsia e encaminhá-los ao STJ. Os demais ficam suspensos até o pronunciamento definitivo do Tribunal. Mas, se os outros recursos especiais não se suspenderem, o relator no STJ, ao identificar que sobre a controvérsia já existe jurisprudência dominante ou que determinada matéria já está afeta ao colegiado, terá a faculdade de determinar a suspensão, nos Tribunais de segunda instância, dos recursos onde a controvérsia foi estabelecida. A Resolução n. 8 do STJ, estabelece que “o agrupamento de recursos repetitivos levará em consideração apenas a questão central discutida, sempre que o exame desta possa tornar prejudicada a análise de outras questões argüidas no mesmo recurso”[3]. O relator poderá pedir informações, as quais serão prestadas em 15 dias aos Tribunais Federais ou Estaduais a respeito da controvérsia. O relator, conforme o regimento interno do STJ e considerando a relevância da matéria, pode admitir manifestação de órgãos ou entidades, e pessoas com interesse na controvérsia. Após receber as informações e, após a manifestação de terceiros, se for o caso, o Ministério Público terá vista pelo prazo de 15 dias. Passado o prazo para o MP, e remetida cópia do relatório aos demais Ministros, será o processo incluído na pauta da seção ou na Corte Especial, onde deve ser julgado com preferência sobre os demais processos, ressalvados os que envolverem réu preso e os pedidos de habeas corpus. Ocorrendo a decisão definitiva, o acórdão será publicado e os recursos especiais sobrestados na origem: a) terão seguimento denegado na hipótese de o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça; ou b) serão novamente examinados pelo Tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça.

 

A Lei 11.672/08 que acrescentou o art. 543-C à Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (CPC), estabelecendo o procedimento para o julgamento dos recursos repetitivos no âmbito do STJ. O recurso especial é cabível para reformar decisões proferidas em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais, pelos Tribunais Estaduais, do Distrito Federal e dos Territórios. Os requisitos para admissibilidade do recurso são: a) a afronta a uma das hipóteses contidas na CF, art. 105, III, ‘a’, ‘b’, ‘c’; b) cabimento; c) tempestividade de 15 dias; d) pagamento do preparo; e) regularidade formal; e f) interesse na reforma e legitimidade.

 

 

3- CONCLUSÃO: O disposto na Lei n. 11.672/2008, que trata dos “recursos especiais repetitivos”, assemelha-se à repercussão geral do Recurso Extraordinário? A referida lei altera as hipóteses de cabimento dos recursos especiais?

 

O art. 543-C disciplina tão-somente o “processamento” dos recursos dirigidos ao STJ, enquanto as regras do art. 543-B dizem respeito à “admissibilidade” dos recursos extraordinários (STF), considerando-se a repercussão geral da questão constitucional através deles veiculada. Esses institutos muito se assemelham, pelos seguintes argumentos:

 

·Com o julgamento por amostragem de recursos extraordinários no STFe dos recursos repetitivos no âmbito do STJ, busca-se com esses “institutos”, reduzir o número de processos, a fim de buscar celeridade e qualidade nos julgamentos. Em outras palavras são previsões no sentido de desafogar as altas Cortes, aproximando a prestação jurisdicional emanada das instâncias especial e extraordinária, da garantia fundamental de duração razoável do processo e do princípio da eficiência da administração pública, descritos na Constituição Federal.

·Além disso, o procedimento a ser adotado quanto aos recursos especiais repetitivos, ditados pelo art. 543-C, § 1º, CPC, é semelhante com o procedimento relacionado aos recursos extraordinários repetitivos, como se vê do art. 543-B, § 1º, CPC, restando a diferença no caso do recurso extraordinário onde haverá prévio julgamento quanto à repercussão geral, que se for negada, ensejará automática não-admissão dos recursos sobrestados (§º 2º). OBS: Quanto aos recursos extraordinários, podemos afirmar que havendo múltiplos recursos, há controvérsia jurídica importante, e em tal hipótese será possível presumir a existência de repercussão geral, configurada pela presença de questão jurídica relevante (art. 543-A, § 1º, CPC), o que dispensaria o prévio julgamento desta questão, a exemplo do que é previsto para hipótese da decisão recorrida ser contrária à súmula ou jurisprudência dominante do STF (§ 3º, do art. 543-A).

 

Podemos citar também algumas distinções: A Lei 11.672/2008 trata dos procedimentos relativos à admissibilidade e julgamento de recursos especiais repetitivos, fundados em idêntica questão de direito (art. 543-C, CPC), e tem por objeto evitar múltiplos julgamentos pelo STJ envolvendo uma mesma questão de direito. Diferentemente da repercussão geral, instituto com assento constitucional (art. 102, § 3º, CF); trata-se, em essência, de delimitador de competência, além, de configurar pressuposto de admissibilidade recursal (art. 543-A, § 2º, CPC), tendo por objeto firmar o STF como Corte Constitucional e não instância recursal, incidindo indistintamente na hipótese de recurso extraordinário solitário e nos casos de recursos múltiplos.

 

Concluímos nosso estudo afirmando que a Lei 11.672/2008 não altera as hipóteses de cabimento nem os pressupostos de admissibilidade dos recursos especiais, pois O art. 543-C e seus parágrafos estabelecem regras sobre o procedimento do recurso especial. Nada dizem sobre a sua admissibilidade. Assim, não há problema no art. 2º da Lei Federal 11.672/2008, que determina a aplicação imediata da nova lei, mesmo aos recursos já interpostos por ocasião do início de sua vigência.

 

É de suma importância enfatizar, que o procedimento dos recursos repetitivos introduzido pela Lei n. 11.672/2008, contém o mesmo escopo da repercussão geral (pressuposto recursal específico do Recurso Extraordinário, introduzido no ordenamento jurídico pátrio pela EC n. 45/04, com o acréscimo do § 3º ao artigo 102 da Carta Magna), em razão de ponderar o ingresso de determinadas matérias a serem examinadas pelo STJ, prestigiando, destarte, as decisões já proferidas pelos tribunais de segundo grau, e, abduzindo o tribunal de última instância (STJ) de atuação anômala[4].

 

 

 

 

BIBLIOGRAFIA

 

BARROS, Humberto Gomes de. Carta de Alforria Lei 11.782/08 vai resgatar o STJ da inviabilidade. Disponível em http://www.conjur.com.br/static/text/66352,1

 

BERMUDES, Sérgio. A reforma do judiciário pela emenda constitucional n. 45. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

 

DIDIER JÚNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro. Curso de direito processual civil. Vol. 3, Salvador: JusPodivm, 2006.

 

DIDIER JÚNIOR, Fredie. Sítio: www.frediedidier.com.br. Editorial 43 e 39.

 

FUDOLI, Rodrigo de Abreu. A Lei sobre os recursos especiais repetitivos (Lei 11.782/08). Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7192. Acesso em 01.08.08.

 

LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. São Paulo: Método, 2007.

 

MONTENEGRO, Misael Filho. Como se preparar para o Exame de Ordem 1ª fase. Processo Civil. São Paulo: Método, 2007.

 

RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Da necessidade de demonstração da repercussão geral das questões constitucionais discutidas no recurso extraordinário (art. 102, § 3o, da CF/88). Revista Dialética de Direito Processual. 32:9-20. São Paulo: Dialética, novembro-2005, pp. 15-17.

 

Material da 3ª aula da disciplina Direito Constitucional Aplicado, ministrada no curso de pós-graduação lato sensu televirtual em Direito Público – Anhanguera-UNIDERP|REDE LFG.

 

http://jurisprudenciaemrevista.wordpress.com/2008/08/08/hoje-entra-em-vi...

 

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 105, III, ‘a’, ‘b’, ‘c’.

 

Código de Processo Civil, art. 541 e ss.

 

Regulamento Interno do Superior Tribunal de Justiça, arts. 255, 256 e 257.

 

Lei n. 8.038/90, arts. 26 até 29.



 

[1]DIDIER JÚNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro. Curso de direito processual civil. Vol. 3, Salvador: JusPodivm, 2006.

 

[2] Cássio Scarpinella Bueno: Livre-docente, Doutor e Mestre pela PUC/SP. Professor em Processo Civil dos cursos de Graduação, Especialização, Mestrado e Doutorado da PUC/SP. Membro do IBDP e do Instituto Ibero-americano de Direito Processual. Advogado. Afirmação feita na 3ª aula de pós-graduação da disciplina Direito Constitucional Aplicado, ministrada no curso de pós-graduação lato sensu televirtual em Direito Público – Anhanguera-UNIDERP|REDE LFG.

[4] Erige-se em questão indubitável, a propósito o escólio do brilhante Professor LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. São Paulo: Método, 2007, p. 528: "A técnica funciona como verdadeiro "filtro constitucional", permitindo que o STF não julgue processos destituídos de repercussão geral e na linha de se limitar o acesso aos tribunais superiores".