Mais que um direito, uma obrigação – sursis processual


Pormathiasfoletto- Postado em 18 fevereiro 2013

Autores: 
GONZAGA, Vilton Pires

 

 

A normatização penal oferece aplicações diversas não tão exaladas, ou até mesmo cultivadas, muitas das vezes por descuidos ou até mesmo expertise do Estado punitivo.

O Sursis Processual é uma dessas ferramentas que quando demonstrada nos bancos estudantis é aplicada de forma simplória e longínqua, não se dando a real importância que merece, uma vez que se trata de afligir um dos maiores bens da humanidade, resguardado pela nossa Constituição, a liberdade.

Quando se fala em suspensão condicional do processo, tem-se a certeza de estar se tratando de um instituto de natureza híbrida, de direito penal e processual penal, que surgiu no ordenamento jurídico tupiniquim em 1995, especificamente na lei que criou os Juizados Especiais Cíveis e Criminais (9.099).

Designadamente no art. 89 da supracitada lei é que está instituído tal instituto, devendo se observar que apesar de exposto em lei que trata de juizado especial, tal alcança crimes não sujeitos a esta norma, tudo com arcabouço expresso no preceptivo legal.

Como quase todos os benefícios penais, os pacientes que se beneficiam deste instituto deve cumprir alguns requisitos normativos, os quais se podem elencar num patamar taxativo.

O primeiro quesito a ser observado é a não submissão do crime imputado ao paciente à justiça militar, assim como disposto no art. 90-A. No segundo, a observação tange ao quantitativo mínimo da pena que deve ser igual ou inferior a 1 (um) ano.

Observa-se também que o paciente não pode estar sendo processado pela prática de outro incidente criminal, nem como, pode ter sido condenado por qualquer delinquência criminosa.

Por último e não menos importante, depreende-se do Codec Penal, nomeadamente em seu art. 77, os requisitos autorizativos para a devida suspensão condicional da pena.

Dentre os quesitos destacados acima o “não estar sendo processado”, sempre quando da leitura, traz na mente o celebre brocado do “trânsito em julgado”. Não que tal pensamento esteja errado, no entanto, a jurisprudência e a doutrina aferiram que tal exigência não fere o art. art. 5º, LVII, da Constituição, pois, a inserção de tal na norma reguladora, trata-se tão somente de política legislativa, e nada mais.

Quando se fala de condenação criminosa anterior, deve ser observado o prazo de 5 (cinco) anos entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior, tudo resguardo pela doutrina majoritária, observando as especificidades do período de prova da suspensão condicional da pena ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação, é claro.

Cumprindo-se todas as formalidades deveria o Ministério Público (MP), de pronto, optar pela proposta do Sursis Processual. No entanto, importante ressaltar que o não oferecimento de tal, de imediato, não implica em recusa do MP, apesar de que em certos casos, mesmo cumprindo todas as formalidades, o MP tem invocando justificativas improcedentes para o não oferecimento.

No entanto, a defesa deve sempre estar atenta a tais fatos, pois, a demora em uma devida ventilação de tal, pode leva-la a preclusão, pois, com a ausência de oferecimento do sursis processual tal deve ser arguida tão logo, competindo à defesa, em face da inércia do órgão acusador em oferecer a proposta, provocar a discussão sobre a possibilidade da suspensão condicional do processo.

PENAL E PROCESSO PENAL. ESTELIONATO. AUSÊNCIA DA ANÁLISE DAS TESES DEFENSIVAS NA SENTENÇA E AUSÊNSIA DE PROPOSTA DE SURSIS PROCESUAL. PRELIMINARES REJEITADAS. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. NÃO PROVIMENTO.

1- O juiz a quo não está obrigado a analisar de forma exaustiva todas as alegações defensivas. Não há que se confundir ausência de fundamentação com fundamentação sucinta.

2- Eventual possibilidade de oferecimento de sursis processual deve ser aventada antes de proferida a sentença, sob pena de preclusão.

3- Conjunto probatório que, na espécie, evidencia autoria e materialidade do delito.

4- Apelo não provido.

(Acórdão n.630156, 20070111509052APR, Relator: MARIO MACHADO, Revisor: GEORGE LOPES LEITE, 1ª Turma Criminal, Publicado no DJE: 31/10/2012. Pág.: 251)

PENAL. ESTELIONATO. EMISSÃO DE CHEQUES SEM PROVISÃO DE FUNDOS. ALEGADA AUSÊNCIA DE DOLO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. NÃO CONFIGURAÇÃO. PEDIDO DE REMESSA DOS AUTOS AO MP PARA PROPOSTA DE SURSIS PROCESSUAL. IMPOSSIBILIDADE. PENA-BASE EXACERBADA. REDIMENSIONAMENTO. APELO PARCIALMENTE PROVIDO.

1. Não vinga o pleito absolutório por atipicidade da conduta quanto ao crime do art. 171, §2º, VI, do CP, quando fica comprovado que o acusado havia emitido cheques, posteriormente devolvidos sem provisão de fundos, cujo termo futuro alegado pelo acusado não restou comprovado nos autos.

2. O benefício do sursis processual tem momento oportuno para ser proposto, qual seja, o oferecimento da denúncia, não havendo que se falar em suspensão do processo após a prolação da sentença (Precedente do TJDFT).

3. Verificando-se exacerbada a pena aplicada ao réu, dá-se provimento parcial para reduzi-la.

4. Apelo parcialmente provido.

 (Acórdão n.643110, 20090111461677APR, Relator: JESUINO RISSATO, Revisor: HUMBERTO ADJUTO ULHOA, 3ª Turma Criminal, Publicado no DJE: 19/12/2012. Pág.: 251) (grifa-se)

O que se trata aqui, como a máxima vênia, é a naturalidade da inafastabilidade da jurisdição, não podendo durar mote que não possa ser contemplado pelo Poder Judiciário, principalmente nesta matéria.

Então pode o Juiz encaminhar os autos para o Procurador-Geral de Justiça para o oferecimento de tal, respaldado na aplicação analógica do art. 28 do Código Processual Penal?!

Fazer assim estará agindo o D. Magistrado em caminho reverso ao disposto no artigo referido, pois, em um pugna-se pela persecução e doutro pela suspensão, ainda mais, que a aplicação analógica exige-se a semelhança entre a hipótese, o que no exposto não há.

O que hora defende-se é que o amparo de tal direito pelo Magistrado é dever, e tal está amparado no verbete nº. 53 da consolidação dos enunciados jurídicos e administrativos criminais em vigor, que resultou dos encontros de juízes de Juizados Especiais Criminais e Turmas Recursais do Estado do Rio de Janeiro, que relata que “o Juiz pode apresentar proposta de suspensão condicional do processo se discordar da fundamentação do Ministério Público para recusá-la”, assim resguardando direitos inadiáveis.

O enunciado a cada dia tem sido reforçado por inúmeras decisões que levam a firmar que o Sursis Processual é um direito subjetivo do paciente, que pode ensejar até a nulidade do procedimento se não lhe for dada conveniência para gozá-lo, e assim, deve o juiz proceder ao oferecimento dessa oportunidade ao paciente, claro que na hipótese de recusa injustificada ou improcedente por parte do MP.

APELAÇÃO CRIMINAL. PROPOSTA DE SURSIS PROCESSUAL DO MP. ACEITAÇÃO PELA DEFESA. FALTA DE MANIFESTAÇÃO DO JUÍZO A QUO. DIREITO SUBJETIVO DO RÉU. SENTENÇA ANULADA.

É posicionamento sedimentado de que o oferecimento da suspensão condicional do processo é um direito público subjetivo do acusado, devendo o Juiz sentenciante se manifestar a respeito da proposta feita pelo Ministério Público e aceita pelo o réu, quando este preenche os requisitos do artigo 89 da Lei 9.099/1995, sob pena de falta de fundamentação e conseqüente nulidade da sentença.

Apelação provida. Sentença cassada.

(Acórdão n.581381, 20100310234398APR, Relator: SOUZA E AVILA, Revisor: ROBERVAL CASEMIRO BELINATI, 2ª Turma Criminal, Publicado no DJE: 25/04/2012. Pág.: 143) (grifa-se)

Assim, deve sempre a defesa ficar atenta aos tramites processuais, como também a todos os institutos atinentes a defesa do paciente, principalmente quando preenchidos todos os requisitos.

 

Disponível em: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/7780/Mais-que-um-direito-uma...