A mente corporea - Circularidade na mente do cientista reflexivo


Porjuliano- Postado em 05 maio 2011

(A mente corpórea – Parte 1) por Juliano Tonizetti Brignoli Em sua obra, Francisco Varela reporta-se a uma abordagem em torno do pensamento fenomenológico ao discorrer sobre o que denomina: “Uma condição a priori”. O autor nos convida a uma reflexão sobre as origens da cognição e descreve que, cientistas com tendência fenomenológica em seu pensamento afirmam que nós não projetamos nosso mundo, mas nos encontramos com ele, logo, sob esta ótica, o mundo não é feito, mas é encontrado. A nossa própria estrutura permite refletirmos sobre as coisas do mundo. Estas argumentações enquadram-se muito bem com as suposições de Varela, visto que o pesquisador apresenta suas interpretações sempre alicerçado por um embasamento em suas crenças científicas prospectadas pelos estudos a partir da biologia. Isso parece nos remeter mais uma vez ao entendimento sobre o que o autor discorre em outras obras sobre os Acoplamentos Estruturais. É oportuno pensar que a cognição humana também é influenciada por experimentações e ambientações que modificam sua estrutura. Para tentar exemplificar, referenciamos Maturnana & Varela em “A Árvore do Conhecimento”, quando o autor evidencia “As surpresas do olho” e nossas interpretações dadas pelas nossas estruturas (fenômenos biológicos). Para uma rápida contextualização em torno do pensamento fenomenológico mencionado no início da obra de Varela, identificamos que este está estritamente ligado ao nome de seu fundador, Edmund Husserl (1859-1938). Naquele período da evolução do pensamento filosófico Husserl acompanhava as idéias de Marx, de Nietzsche e de Freud em torno das concepções positivistas na cultura alemã. Estes estavam atentos ao desenvolvimento das ciências positivas, da matéria e também das ciências sociais e submeteram crítica ao dogmatismo positivista na concepção do conhecimento e da confiança religiosa que os positivistas nutriam pela ciência. A fenomenologia critica o positivismo em seu aspecto de apriorismo idealista. Conforme Antiseri (2003, p.554) a palavra de ordem da fenomenologia é a do “retorno às próprias coisas”. Antiseri (2003) discorre em torno da visão de Max Scheler sobre a fenomenologia e afirma que seu interesse sobre tal pensamento era “a aversão sobre as construções abstratas e a capacidade de captar intuitivamente a verdade da essência”. Trivinos (1992) descreve o método fenomenológico como sendo aquele que parte da idéia da necessidade de ter um conhecimento indubitável ou possível, ainda que, de início, não nos é permitido conhecimento algum como conhecimento. Husserl estabelece a idéia da Redução Fenomenológica para determinar a possibilidade do conhecimento, sendo o segundo passo do método fenomenológico. O primeiro passo, é a denominada epoché, esta conforme descrito por Antiseri (2003), “trata de colocar entre parênteses as nossas persuasões filosóficas, os resultados das ciências e as convicções engastadas naquela nossa atitude natural que nos impõe a crença na existência de um mundo de coisas”. Nas palavras do autor é notório saber que é preciso suspender o nosso juízo sobre algo que se esteja investigando, assim, poderíamos afirmar que, numa abordagem fenomenológica, o investigador deve ficar na neutralidade dos fatos. Varela, ao descrever sobre a mente do cientista reflexivo apresenta o conceito de Circularidade, onde na reflexão, encontramos um mundo que aparenta estar ali antes da reflexão começar, mas este mundo não está separado de nós. Sobre este círculo, novamente, uma análise em conformidade com o que afirma Maturana & Varela: A consciência de que o fenômeno do conhecer não pode ser equiparado à existência de fatos ou “objetos lá fora”, que podemos captar e armazenar na cabeça. A experiência de qualquer “coisa lá fora” é validada de modo especial pela estrutura, que torna possível “a coisa” que surge na descrição. O autor refere-se ao pensamento de Merleau-Ponty (filósofo francês) e enfatiza que o reconhecimento deste círculo abriu um espaço entre o eu e o mundo, entre o interior e o exterior. Atribui o nome de entre-deux como sendo uma via intermediária entre o eu e o mundo. Merleau-Ponty supõe esta última afirmativa na sua obra “Fenomenologia da Percepção”. Ele escreve em seu livro: “o mundo é inseparável do sujeito, mas de um sujeito que se limita a ser um projeto do mundo, e o sujeito é inseparável do mundo, mas de um mundo que é projetado pelo próprio sujeito”. Este argumento ilustra muito bem a Circularidade mencionada por Varela. De certa forma estas proposições também são apresentadas por Gödel quando em seus estudos decorrentes de investigações sobre a Lógica apresenta, matematicamente, o Teorema da indecidibilidade, denotando por proposições lógicas a existência desta Circularidade em torno da interpretação sobre as supostas verdades do mundo. Varela também descreve sobre a “Experimentação e Análise Experiencial” e diz que em ciência, a forma mais ligada ao pragmatismo é o método experimental. Exemplifica assim: se quisermos saber quantos dentes um cavalo tem, contamos os dentes. As hipóteses mais elaboradas são reduzidas a observações por meio de inferências dedutivas. O autor apresenta uma versão sobre a meditação de atenção/consciencialização e indaga: é uma espécie de experimentação acerca da natureza e comportamento da mente? É um tipo de experimentação corpórea e ilimitada? Diz que o objetivo é estar ciente da mente enquanto esta segue o seu curso e mantem-se em alerta e em observação. Ele refere-se a doutrina budista, na qual, as observações é que fazem a mente ser naturalmente observante. Estas doutrinas defendem algumas asserções, como, a ausência do “eu”, o surgimento co-dependente da experiência. Ao descrever o conceito e a utilização da introspecção, o autor afirma ser uma forma de pensar sobre a relação entre o conhecimento adquirido através da meditação e a atividade. Em termos práticos, em laboratório, cada paciente olha para a sua própria experiência, como um observador externo. Importante observação de Varela é deixar evidente que a doutrina budista, a fenomenologia ocidental e a ciência são todas herdeiras de numerosas disputas doutrinárias e reinvidicações conflituosas sobre a corporalidade humana e que a uma destas doutrinas usa métodos de outra. Como essência de sua descrição ele propõe: a meditação de atenção/consciencialização pode fornecer uma ponte natural entre a ciência cognitiva e a experiência humana. Referências ANTISERI, Dario. História da Filosofia: do romantismo até nossos dias. São Paulo. 6a. ed. v. 3. ed. Paulus, 2003. TRIVINOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1992, p. 15-29. MATURNA, Humberto & VARELA, Francisco. A Árvore do Conhecimento. Ed. Psy II, 1995.