A nova Súmula 425 do TST. Ensaio para o fim do jus postulandi?


Porrayanesantos- Postado em 28 maio 2013

Autores: 
DIAS, Hugo Raphael da Costa

 

1 INTRODUÇÃO

 

            Nos dias atuais, cresce assustadoramente o número de processos trabalhistas, fato que sobrecarrega tanto o trabalho de magistrados quanto de servidores públicos. Um dos motivos desse aumento está relacionado com um dos princípios consagrados do direito do trabalho: o jus postulandi.

 

            Ocorre que o trabalhador desinformado vem postulando pedido por pedido, ou seja, numa reclamação requer apenas verbas rescisórias, em outra, horas extras ou outras parcelas. Isso conseqüentemente vai gerando o chamado efeito bola de neve, tumultuando a pauta dos juízes e enchendo as mesas dos servidores de processos para cumprirem expediente. Tal fato não ocorreria se o empregado estivesse assistido por um advogado, que normalmente reuniria numa única reclamação todos os pedidos.

 

            Recentemente, o Colendo Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula 425, que estabelece os casos em que cabe o jus postulandi. Fato interessante é que a partir dessa súmula ficou expresso que os recursos de competência daquele tribunal não estão abrangidos pelo jus postulandi. Assim, o objetivo deste trabalho é tentar demonstrar os benefícios que poderão surgir com a limitação do exercício desse princípio consagrado ao trabalhador.

 

2 CONCEITO DE JUS POSTULANDI

 

            O art. 791 da CLT assim dispõe: “Os empregados e os empregadores poderão reclamar pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final”.

 

            A expressão “até o final” era interpretada por grandes doutrinadores como até o Tribunal Superior do Trabalho. Assim dissertou o professor Renato Saraiva:

 

“Logo, em função do jus postulandi, reclamante e reclamado poderão atuar sem a presença de advogados em todas as instâncias trabalhistas, mesmo nos Tribunais Regionais e no Tribunal Superior do Trabalho ”

 

            Por sua vez, o art. 839, a, do mesmo diploma reza: “A reclamação poderá ser apresentada: a) pelos empregados e empregadores, pessoalmente, ou por seus representantes, e pelos sindicatos de classe”.

 

            À luz destes dispositivos, pode-se concluir que jus postulandi é a capacidade das partes de postularem, sem a presença de advogado, perante às instâncias judiciárias, e no caso da Justiça do Trabalho, somente podem os empregados e empregadores.

 

            Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, ganhou força o entendimento de que  o art. 791 da CLT não estaria mais em vigor, devido a incompatibilidade com o art. 133 que prevê a indispensabilidade do advogado à administração da Justiça.

 

            Porém, em 06/10/1994, julgando a ADI nº 1.127-8, O STF concedeu liminar no sentido de que a atuação de advogado não é imprescindível na Justiça do Trabalho, bem como nos Juizados Especiais e na Justiça de Paz.

 

3 NOVA ORIENTAÇÃO COM A SÚMULA 425 DO TST

 

            Em 30 de abril de 2010, o TST divulga a Súmula 425: “O jus postulandi das partes, estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às Varas do Trabalho e aos Tribunais Regionais do Trabalho, não alcançando a ação rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos de competência do Tribunal Superior do Trabalho.”

 

            Ora, o TST suprimiu a aplicação do jus postulandi em sua área de atuação. Se assim o fez, poderia ter estendido essa supressão para os Tribunais Regionais, ou até mesmo extinguindo o instituto, pois é inegável que, hodiernamente, a jurisprudência possui força normativa.

 

            Sobre a força normativa da jurisprudência Maurício Godinho Delgado esplana:

 

“(...) a segunda corrente, mais moderna, ponderando qu a jurisprudência tem um indissimulável papel jurígeno (Criador do Direito). Em certos ramos – como o Direito do Trabalho – esse papel seria até mesmo determinante à compreensão da própria estrutura e dinâmica do conjunto do ramo jurídico enfocado.

 

(…) Essas diretrizes jurisprudenciais – e dezenas de outras - , embora não filiadas ao princípio estrito da reserva legal (se interpretando rigidamente esse princípio, é claro), têm inquestionável força jurídica (e jurígena)”

 

            Nos casos em que Juízo reconhece a prescrição de ofício, extinguindo a reclamação trabalhista com resolução do mérito, o reclamante leigo não teria condições técnicas de recorrer de tal decisão e tentar modificar o julgado.

 

            Foi o que ocorreu no Juízo da 4ª Vara do Trabalho de Macapá:

 

“A Lei nº 11.280 de 16 de fevereiro de 2006 trouxe alterações no Código de Processo Civil e deu nova redação ao artigo 219, § 5º, para autorizar o juiz a pronunciar de ofício a prescrição, revogando expressamente o artigo 194 do Código Civil de cunho eminentemente patrimonialista.

 

Entendo que o referido dispositivo aplica-se perfeitamente ao processo do trabalho, pelo permissivo do artigo 769 da CLT, haja vista que a matéria é omissa na legislação celetista e há compatibilidade entre os institutos. Além disso, a prescrição de ofício teve seu fundamento maior na celeridade dos processos em geral, e inegável nascedouro na jurisprudência trabalhista conforme Súmula nº 153 do Colendo Tribunal Superior do Trabalho, ainda em vigor, que permite a argüição da matéria prescricional em Primeiro ou Segundo graus na instância ordinária, isto é, no processo de conhecimento: “PRESCRIÇÃO. Não se conhece de prescrição não argüida na instância ordinária (ex-Prejulgado nº 27)”; assim, nada impede que, depois da decretação de ofício pelo órgão de Primeiro Grau ocorra a argüição voluntária da parte interessada ao E. Tribunal Regional suprindo a omissão.” (Processo 01033-2009-205-08-00-1)

 

            Não é somente no casos de recursos em que o reclamante leigo entra numa situação de dificuldade, mas também nos casos de contra-razões de recurso. O jurista Leonardo Tadeu, tratando do tema, assim discorreu:

 

“Nos salta aos olhos as seguintes perguntas:  Como um leigo, desprovido de toda a técnica jurídica, que anos a fio é estudada e debatida em uma faculdade; poderá redigir uma petição inicial obedecendo aos requisitos do art.282 do CPC?

 

Como poderá contra- arrazoar um recurso, obedecendo aos prazos processuais rigorosamente impostos pela lei e ainda enfrentar todo o ritual da instrução probatória sem estar amparado por um profissional competente e atento a todas as armadilhas processuais?  Ressalta-se que em segundo grau, o reclamante ou reclamado, necessariamente, deverá por imposição legal constituir um advogado, se tiver a intenção de recorrer. Nos salta os olhos, então, um outro questionamento, se o instituto do Jus postulandi é tão eficaz, qual será o motivo de nossos legisladores exigir a habilitação de um advogado no segundo grau? Será que é devido a grande complexidade e a exigência de uma técnica mais apurada, que a esfera recursal exige? Temo que sim.”

 

                        Já  a cearense, Antônia Katiúscia Nogueira Lima, com polidez, assim se posicionou:

 

“Acreditamos, contudo, por motivos sólidos, que o instituto do jus postulandi, na área em comentário, somente deveria ser conferida a quem de direito: aos profissionais advogados legalmente habilitados.

 

Tal compreensão ocorre, entre outros motivos, pelo fato de não conseguirmos visualizar que um leigo demande, com êxito, junto aos órgãos do Judiciário, essencialmente quando se trata das esferas recursais.

 

Cremos que o instituto do jus postulandi dado à parte na seara laboral deveria ser extinto, pois entendemos ter sido revogado pela CF/88 e, mais ainda, entendemos ter sido pertencente à época em que a Justiça do Trabalho não era ramo do Poder Judiciário, o que não é mais o caso.

 

Para a atuação na área trabalhista, agora ramo integrante do Poder Judiciário, faz-se necessário conhecimento técnico-profissional para que se façam valer os direitos dos trabalhadores, a fim de ser aplicada a justiça no caso concreto.

 

Sabemos que o leigo não detém conhecimento jurídico para atuar perante os órgãos do judiciário, ocorrendo que, na Justiça do Trabalho, estamos tratando de um crédito substancial, qual seja, o crédito alimentar, ocorrendo ainda que nesta área há, reconhecidamente, uma relação entre desiguais, entre fraco e forte, quais sejam: empregado e empregador.

 

Assim sendo, entendemos fazer-se fundamentalmente necessária a presença do advogado.”

 

            A rigor, o referido instituto foi criado na “Era Vargas”, com o objetivo de incentivar os trabalhadores à sindicalização. Entendo que, hodiernamente, devemos utilizar o método de interpretação histórico, ou seja, buscar o contexto histórico em que a norma foi produzida. Logo, as condições sociais da década de 30 são totalmente diferentes da atualidade, o que implicaria em desnecessidade do jus postulandi (uma vez que existe a Defensoria Pública).

 

            Dessa forma, não haveria violação do direito ao acesso à Justiça (art. 5º, XXXV, CF), pois o reclamante poderia constituir um advogado particular ou por meio da Defensoria Pública.

 

            Então por que não extinguir o jus postulandi? Por que o STF já se manifestou? A Corte Superior firmou Jurisprudência em 1994, todavia, recentemente, há nova composição naquela corte, não seria o caso de se fazer uma revisão?

 

            A Súmula 425 dar sinais para esse entendimento, meio que tímido, porquanto suprimiu de vez a idéia de aplicação do jus postulandi na esfera do Tribunal Superior do Trabalho.

 

            Com efeito, assinala Patrick Maia Merísio:

 

“O acesso à Justiça não é princípio que se restrinja ao fenômeno jurídico. Ele tem uma fundamentação muito mais ampla, não merecendo esta redução, e deve ser compreendido como acesso a uma ordem jurídica justa (...)”

 

            Nesse sentido, para um reclamante usufruir de uma ordem jurídica justa, deveria sim está representado por um advogado, pessoa capacitada para atuar na área do direito, o qual assegurará de uma forma mais sólida os direitos daquele.

 

            Por fim, grandes benefícios poderiam surgir com a extinção do instituto do jus postulandi: 1- reduziria o número de processos nas Varas do Trabalho e nos Tribunais Regionais; 2- o magistrado teria mais tempo e tranqüilidade ao prolatar uma sentença diminuindo o número de embargos de declaração; 3- o empregado seria representado por um profissional preparado para postulação da causa, seja na audiência ou em caso de eventual recurso; 4- evitaria a intimidação dos empregados perante o empregador acompanhado de seu advogado.

 

4. CONCLUSÃO

 

            A indispensabilidade do advogado à administração da Justiça está consagrada de forma expressa na Constituição Federal (art. 133, CF). Logo, a melhor interpretação seria no sentido de que o jus postulandi, na área trabalhista, teria sido extinto em 1988.

 

            Mesmo tendo o STF decidiu pela constitucionalidade dos artigos 791 e 839, “a”, da CLT, em 1994, entendo que tais preceitos são inconstitucionais, e como houve alteração na composição daquela corte, deveria haver uma revisão da jurisprudência.

 

            Pelo exposto, o fim do jus postulandi está ligado diretamente a uma razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, CF), uma vez que reduziria a quantidade de processos iniciados por má técnica, além de propiciar uma melhor forma de trabalho aos magistrados e servidores.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

DELGADO, Maurício Godinho. “Curso de Direito do Trabalho”. São Paulo: LTR, 2009

 

MERÍSIO, Patrick Maia. “Noções Gerais de Direito e Formação Humanística”. São Paulo: Campus, 2010

 

LIMA, Antônia. “Considerações Acerca do Jus Postulandi: Enfoque na Seara Trabalhista”. Fonte:http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/5202/Consideracoes_Acerca_do_Jus_Postulandi_Enfoque_na_Seara_Trabalhista. Acesso: 26/10/2011.

 

SARAIVA, Renato. “Curso de Direito Processual do Trabalho”. São Paulo: Método, 2007.

 

TADEU, Leonardo. “JUS POSTULANDI NA JUSTIÇA DO TRABALHO - DIREITO OU AMEAÇA?”. Fonte: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=322  Acesso: 26/10/2011.

 

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