As novas fronteiras dos contratos empresariais


Portiagomodena- Postado em 10 junho 2019

Autores: 
Alexandre Vendramini

1.  INTRODUÇÃO

"What we need to do is always lean into the future; when the world changes around you and when it changes against you – what used to be a tail wind is now a head wind – you have to lean into that and figure out what to do because complaining isn't a strategy."

Jeff Bezos (Amazon Founder and CEO)

Os avanços tecnológicos percebidos e aferidos durante o Século XXI (principalmente) criaram fronteiras nas relações pessoais e culturais percebidas anteriormente. O fenômeno da globalização se disseminou entre as nações, cidades, estados e, em razão disso, os trâmites burocráticos, a comunicação, os encontros, conversas, tudo que envolve as relações pessoais passaram a se transforar.

Atualmente, cada pessoa está a um clique do que desejar. Você pode comprar um avião, chamar um motorista, adquirir uma televisão, adquirir uma passagem aérea, contratar a prestação de um serviço, entre tantos outro inimagináveis serviços e produtos que estão à sua disposição.

Não somente isso, mas vemos, em algumas situações que a internet vem, muitas vezes, mudando a forma como se faz negócio no mundo. Um dos principais serviços que surgiram recentemente foram os serviços de streaming por meio dos quais seus operadores oferecem conteúdos antigamente havidos apenas pela TV e pelo aluguel, ao vivo por meio de apps e seus websites. O resultado disso? Em um curto período de tempo, uma das maiores redes de locadoras mundiais, a Blockbuster, desapareceu das ruas ao redor do mundo.

Para tanto, o intuito desta pesquisa é demonstrar como as novas relações interferem na relação jurídica impactando os diversos tipos de atividades empresariais que passam a ser exercidas por meio da celebração de contratos eletrônicos, os quais, neste âmbito, caracterizam-se (vulgarmente) como e-commerce.

Tendo o acima exposto, a ideia geral é demonstrar como estão se formando estas "novas fronteiras" das relações de fornecimento entre os empresários e sua adaptação ao novo modelo de negócio que vem se formando, passando pela conceituação (i) dos contratos em geral, (ii) dos contratos comerciais, (iii) dos contratos eletrônicos, (iv) de e-commerce e, finalmente, chegando (v) a distinção entre os contratos comerciais para consumo e para fornecimento.


2.  CONTRATOS: NOÇÕES GERAIS

2.1.  CONCEITO DE CONTRATOS

É mister, antes de dar início a qualquer discussão acerca dos contratos eletrônicos, que se entenda o conceito jurídico do que é um contrato. A definição de contrato passou por longa evolução ao longo dos séculos, desde o direito romano, passando pelo Common Law americano e inglês, pelo direito italiano e por sua própria evolução dentro do direito brasileiro. Para tanto, vale repassarmos pela conceituação dos contratos formulados por alguns dos maiores civilistas brasileiros.

Na visão de Orlando Gomes, reconhecido por sua obra acerca do direito das obrigações, "Contrato é uma espécie de negócio jurídico que se distingue, na formação, por exigir a presença de pelo menos, duas partes. Contrato é, portanto, negócio jurídico bilateral ou plurilateral."

Caio Mário da Silva Pereira, desenvolve um pouco além a definição, de forma que "Contrato é um acordo de vontades, na conformidade da lei, e com a finalidade de adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos."

O professor Sílvio de Salvo Venosa tem a visão de que o contrato ocorre "quando o ser humano usa de sua manifestação de vontade com a intenção precípua de gerar efeitos jurídicos, a expressão dessa vontade constitui-se num negócio jurídico."

Outra obra que conta com uma importante conceituação é a de Arnaldo Rizzardo, na qual o mesmo estabelece que o conceito de contrato englobaria a aplicação de três ideias, quais sejam:

"I – Em primeiro lugar, a ideia de um superconceito, aplicável em todos os corpos jurídicos, e, por conseguinte, tanto ao direito privado como a direito público, e inclusive ao direito internacional. Neste ponto de vista, citam-se os tratados internacionais, os acordos entre as nações, o contrato celebrado pelo Estado com os concessionários de obras ou serviços públicos e os contratos administrativos.

II – Num sentido mais limitado, adstrito à órbita do direito privado, serve para designar todos os negócios jurídicos bilaterais de direito privado. Compreende tanto os negócios jurídicos de direito patrimonial, como a compra e venda, o arrendamento, etc., quanto aqueles cujo objeto seja uma questão de direito pessoal, como o matrimônio, a adoção e os contratos sucessórios.

III -  No sentido mais restrito, abrange só aqueles fenômenos que pode ser submetidos a um regime jurídico de caráter unitário."

O professor Luiz Gonzaga Modesto de Paula, em sua Apostila de Direito Comercial – Contratos Comerciais, vai mais além e consolida os entendimentos acima referidos:

"Contrato é o acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinado a estabelecer uma regulamentação de interesses entre as partes, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial."

Em nosso entendimento, o contrato é o negócio jurídico formulado entre duas ou mais partes, que tenha por finalidade a aquisição, guarda, transferência, modificação ou extinção de direitos.

2.2.  CONTRATOS COMERCIAIS

Definida a conceituação do que seria um contrato, vale passarmos adiante, uma vez que existe uma diferença fundamental entre os contratos em geral e os contratos comerciais. A principal diferença é que, no caso dos contratos comerciais, a finalidade é o lucro.

O professor Fábio Ulhôa, em seu Projeto de Lei n.º 1.572/2011, por meio do qual tenta instituir o "novo código comercial" no ordenamento jurídico brasileiro, propôs a definição do que seriam os contratos comerciais, conforme abaixo:

"Art. 297. É empresarial o contrato quando forem empresários os contratantes e a função econômica do negócio jurídico estiver relacionada à exploração de atividade empresarial.

Parágrafo único. Não descaracteriza o contrato como empresarial a participação de co-obrigados não empresários."

Por meio da definição do professor Fábio Ulhôa, podemos entender que, não apenas o aferimento de lucro, caracterizaria o que seriam os contratos comerciais. O principal ponto teria relação com a atividade objeto do contrato, a qual deveria ter natureza empresarial.

Neste sentido, o código civil vem, por meio de seu artigo 966, definir o que caracterizaria o empresário e, consequentemente, o que poderia vir a ser considerada uma atividade empresária:

"Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.

Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa."

Portanto, tendo-se o acima exposto, podemos caracterizar os contratos comerciais como o negócio jurídico, bilateral ou plurilateral, avençado mediante um acordo de vontades, que tenha por finalidade a aquisição, guarda, transferência, modificação ou extinção de direitos, por meio do aferimento de lucro no exercício de uma atividade empresarial.


3.  OS CONTRATOS ELETRÔNICOS

3.1.  CONCEITO DE E-COMMERCE

O e-commerce, ou comércio eletrônico, conforme mencionado anteriormente, vem ganhando cada vez mais espaço na realidade jurídica e empresarial brasileira e mundial. Amazon, Netshoes, Ali Express, Spotify, Netflix, entre diversas empresas que hoje são líderes do mercado, tem como grande diferencial, serem empresas que surgiram e/ou passaram a se desenvolver no âmbito eletrônico com grande destaque. O principal exemplo é a Amazon, que hoje é uma das empresas mais bem avaliadas na bolsa de valores de Nova Iorque.

Entretanto, é necessário que se tenha uma conceituação do que seria o e-commerce, antes que adentremos o âmbito das relações jurídicas proporcionadas por eles. Principalmente, com relação a diferenciação que se dá entre os contratos B2C (Business-to-Consumer) e B2B (Business-to-Business).

O e-commerce é uma modalidade de comércio que realiza suas transações financeiras por meio de dispositivos e plataformas eletrônicas, como computadores e celulares, mediante websites, softwares ou outros meios eletrônicos.

3.2. CONCEITO DE CONTRATOS ELETRÔNICOS E O E-COMMERCE

Podemos definir os contratos eletrônicos, ou seja, aqueles que poderão vir a ser categorizados como contratos Business-to-Business ou como contratos Business-to-Consumers como o encontro da oferta de bens ou serviços (assim definindo-se que tratam-se de contratos empresariais, nos termos do Código Civil), que se forma através de uma rede internacional de telecomunicações (seja por meio de um website, software, aplicativo ou outro meio eletrônico disponível) e de uma aceitação suscetível de manifestar-se por meio da interatividade (realizando-se, ainda, seu pagamento, por meio de qualquer meio eletrônico disponível).

Adicionalmente, apesar dos avanços tecnológicos se darem de forma exponencial, a legislação específica acerca dos contratos eletrônicos não acompanha seu desenvolvimento, sendo extremamente rasa e rara, apesar dos projetos de lei que existem e/ou tramitaram no congresso.

Vale a ressalva de que não são todos os contratos eletrônicos celebrados que irão adentrar o âmbito do e-commerce. Entretanto, para fins da referida análise, a não menção às demais modalidades de contratos eletrônicos se faz necessária, de forma a que se feche o escopo do trabalho.

3.3. CONTRATOS BUSINESS-TO-CONSUMERS

Os contratos B2C, ou mais comumente conhecidos, como contratos Business-to-Consumers é o meio cada vez mais difundido de celebração de contratos eletrônicos. Ele é representado pela espécie de negócio por diversas multinacionais para a disseminação de seus produtos. É o modelo de negócio do qual a Amazon foi a principal disseminadora no planeta.

3.4. CONTRATOS BUSINESS-TO-BUSINESS

Chegamos, então, ao principal ponto em nosso trabalho. Os contratos B2B são contratos que tem como objeto não uma relação de consumo, mas sim o fornecimento entre fornecedor e um terceiro que não seja o seu destinatário final. Isto quer dizer que, diferentemente dos contratos B2C, nos quais o adquirente dos bens ou serviços eram seus destinatários finais, os contratos B2B tem como objetivo o fornecimento de um determinado produto e/ou serviço à um terceiro, que não seja o seu destinatário final.

Poderíamos, portanto, definir que os contratos B2B caracterizam-se pela avença de vontade, mediante meio eletrônico, na qual dois empresários (sociedades empresárias ou não) e/ou terceiros não empresários que tenham como fim o exercício de determinada atividade empresária, acordam o fornecimento de um produto e/ou serviço do qual o receptor não seja o destinatário final.

Suponha-se a seguinte situação. A Votorantim Cimentos por meio de seu website oferta pacotes de cimento para construção, com pronta entrega em até 5 (cinco) dias úteis. A construtora Rio do Sol S.A., adquirente de um projeto de construção de um prédio, adentra o website da Votorantim Cimentos e adquire pacotes de cimento para construção, tendo em vista que se trata de matéria prima necessária para a construção do prédio. A avença de vontade entra as partes caracteriza o contrato eletrônico, no âmbito de um contrato B2B, uma vez que se trata de atividade empresária e o produto não se destina ao seu destinatário final.


4.  CONCLUSÃO

Tendo em vista o acima exposto, podemos compreender como as relações jurídicas vêm se transformando mediante os avanços tecnológicos que se apresentam a cada ano. Com tais avanços tecnológicos, as relações contratuais (assim como as relações pessoais se transformaram), a forma de se fazer negócio será modificada e todos temos de nos adaptar a esta realidade.

Portanto, é de suma importância que se compreenda a facilidade de que se dota as relações entre as empresas mediante as relações contratuais B2B. Você não necessitaria mais de uma relação de confiança, mensal, você abre um leque de opções para desverticalizar sua atividade, trazer independência de recursos e/ou serviços essenciais que estariam livres da dependência de um mero fornecedor, uma vez que outro poderia ser encontrado de forma convincente por meio eletrônico.

Desta forma, acreditamos que o e-commerce, os contratos B2B, assim como os contratos B2C, tendem a estabelecer novas fronteiras, tendem a evoluir o que são as relações de consumo e de fornecimento de produtos e serviços. São eles que representam o futuro da atividade empresária no mundo.


5.  BIBLIOGRAFIA

Contratos / Arnaldo Rizzardo. – 15. Ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2015.

Curso de direito comercial, volume 1 : Direito de empresa / Fábio Ulhôa Coelho. – 20. Ed rev., atual e ampl. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2016.

Direito Civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos / Silvio de Salvo Venosa – 16. Ed. rev. E atual. – São Paulo : Atlas 2016. (Coleção direito civil: v. 2)

Direito comercial: Teoria geral / Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa – 4. Ed. rev. Atual e ampl. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2014. – (Direito comercial ; v. 1)

Direito do Comércio Eletrônico / Maria Eugênia Filkenstein. 2. Ed. – Rio de Janeiro : Campus Elsevier, 2011.

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=508884, acessado em 20.9.2018, às 9:21.

http://www.modestodepaula.com.br/downloads/Apostila%20Contratos%20Empresariais.pdf – acessado em 20.9.2018, às 21:58.

https://www.brainyquote.com/authors/jeff_bezos, acessado em 20.9.2018, às 22:26.

Instituições de direito civil / Atual. Caitlin Mulholland. – 20. Ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2016.

Manual de Direito Comercial e de Empresa volume 1: teoria geral da empresa e direito societário / Ricardo Negrão – 12. Ed. – São Paulo, Saraiva, 2015.