O Estado e o Poder de Tributar


Porbarbara_montibeller- Postado em 20 junho 2012

Autores: 
CORREIA, Kelen.

INTRODUÇÃO

O presente estudo objetiva conhecer algumas das peculiaridades do Sistema Tributário Nacional além de questões refrentes à sua formação como Estado e necessidade de se tributar para manter a ordem e paz social.

A pesquisa utiliza obras de respeitados doutrinadores do Direito Tributário, bem como artigos de especialistas, a legislação vigente, sites jurídicos e de instituições ligadas ao tema.

Acredito na utilidade desse estudo ao tratar de várias questões pertinentes e importantes quanto às questões que dão base à tributação nacional.    

O ESTADO E SUA FORMAÇÃO

No princípio, o homem vivia isolado ou reunido em famílias. Ao surgir a necessidade de, o ser humano, se socializar, este começou a reunir-se em tribos.

Assim assevera Marco Tulio Cícero, em sua obra “In República”:

“A primeira causa da agregação de uns homens a outros é menos a sua debilidade do que um certo instinto de sociabilidade em todos inatos; a espécie humana não nasceu para o isolamento e para a vida errante, mas com uma disposição que, mesmo na abundancia de todos os bens, o leva a procurar o apoio comum”. (51 a.C., p. 15)

Tornou-se natural ao homem socializar-se a outros em razão de necessidades recíprocas. Outrossim, pela possibilidade de cooperação entre si e o benefício da troca de conhecimentos, experiências e produções.

Em certo momento histórico, em que as pessoas passaram a se relacionar, começou a existir a divisão entre as atividades, e, consequentemente, o surgimento de lideres ou diretores de grupo. Assim ensina Mariano Junior:

“O homem, pela sua cultura, prepara modos de convivência, transforma relações sociais, por necessidade cria outros tipos de relações; e no decorrer do tempo, em consequência a todas as dificuldades que seu grupo enfrenta, criam-se reuniões de relações sociais, as instituições desse povo”. (2008, p. 17)

Deste modo, esse grupo humano se torna um povo. Vê-se claramente que, essa união dos indivíduos em sociedade que da base à formação do Estado. Hugo de Brito Machado assevera ter sido importante o surgimento do Estado, com o escopo de estabelecer regras de conduta[1].

“A organização jurídica do poder é destinada a proporcionar, em determinado território, ordem, paz social, segurança e desenvolvimento a um povo nele fixado” (GUSMÃO, 1997, p. 335).

TRIBUTAÇÃO: NECESSIDADE DO ESTADO

Ocorre o fenômeno da tributação para que, o Estado, ao desenvolver atividade financeira, atenda às necessidades de toda a coletividade.

O art. 173 da Constituição Federal faz referencia à regra de liberdade de iniciativa, vedando ao Estado exercer exploração direta de atividade econômica, a qual somente é permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo.

Hugo de Britto Machado aponta:

“Diz-se que o Estado exercita apenas atividade financeira, como tal entendimento o conjunto de atos que o Estado pratica na obtenção, na gestão e na aplicação dos recursos financeiros de que necessita para atingir os seus fins”. (2007, p. 56)

Tomando por base que, o Estado não pode intervir na Economia (ressalvado o art. 173 da CRFB/88), este se utiliza da Tributação para atender determinadas finalidades sociais. Tributar é a única forma de impedir a estatização da economia e permitir a existência de uma economia capitalista. Hugo de Britto Machado transmite que a carga tributária não poderá ser demasiadamente elevada, o que desestimularia a iniciativa privada. Pontua que:

“No exercício da sua soberania, o Estado exige que os indivíduos lhe forneçam os recursos de que necessita. Institui o tributo. O Poder de Tributar nada mais é que um aspecto da soberania estatal, ou uma parcela desta. [...] é relação jurídica, embora o seu fundamento seja a soberania do Estado. Sua origem remota foi a imposição do vencedor sobre o vencido. Uma relação de escravidão, portanto”. (2007, p. 59).

Hugo de Britto Machado rechaça entender-se a relação tributária com relação de poder. Pontifica que grande parte da doutrina defende que os contribuintes consentem com a instituição dos tributos, através de seus representantes no Parlamento.

O pagamento de tributos, conforme ensina Gabriel Ivo, trata-se de dever fundamental tendo em vista que se constitui em forma de contribuir com o gasto público[2].

A tributação permite que o Estado realize suas atividades essenciais, dando cumprimento a todos os direitos e garantias fundamentais previstos na Carta Magna.

DIREITOS FUNDAMENTAIS NO SISTEMA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO

Para que os direitos dos cidadãos sejam respeitados na ceara tributária, o sistema tributário nacional deve estar de acordo com as previsões Constitucionais.

Com a nossa Constituição Rígida, lei fundamental do Estado, qualquer norma para se validar deve estar respeitando seus mandamentos. Os comandos advindos das normas da Carta Magna são obrigatórios não só para as pessoas físicas e jurídicas, mas também para o próprio Estado. A não observância da Constituição frente à criação de uma norma inferior considerar-se-á inconstitucional[3].  

Analisando a Constituição, em seu preâmbulo encontramos os valores supremos da preservação dos direitos sociais e individuais, da liberdade, da segurança, do bem estar, do desenvolvimento, da igualdade e da justiça, estabelecendo assim os direitos fundamentais, direitos estes dos quais são definidos os princípios estruturantes, tanto os princípios materiais quanto os formais. Os princípios materiais são encontrados tanto na Constituição Federal, referindo-se aos valores supremos da dignidade humana, vida, liberdade, segurança e propriedade, quanto no Sistema Tributário Nacional, demonstrado pela exigência da igualdade na tributação e na vedação de instituição de tributo com efeito confiscatório. Os princípios formais determinam a forma e o procedimento para o Estado instituir normas. Existem princípios que atuam sobre o conteúdo normativo de outras normas, o que nos faz entender que a CF e seus princípios constituem uma relação de dependência face às outras normas.

Esta relação demonstra-se ao analisarmos que o princípio democrático depende da legalidade e da reserva legal, enquanto que o significado dessas duas normas também é limitado pelo princípio democrático. Isto também acontece com normas relacionadas à instituição de tributos em que a regra da legalidade, da irretroatividade e da anterioridade devem ser interpretadas de maneira que o seu significado corresponda à função estruturante do princípio do Estado Democrático de Direito[4].

A Constituição Federal, ao contrário da Constituição de outros países, tratou de forma pormenorizada a matéria tributária, deixando pouca liberdade aos Poderes Públicos, pois mensurou o exercício da competência delimitando quem pode tributar e quais os tributos que podem ser criados. Outrossim, tratou dos limites na criação dos tributos e das garantias dos contribuintes como precaução para o uso indevido da competência tributária, desenvolvendo um sistema normativo que tem como objetivo a proteção do contribuinte, também denominado Estatuto do Contribuinte, que possui como fundamentos o direito de propriedade e o direito de liberdade. A preocupação aqui é alcançar uma sociedade livre, justa e solidária, e para isso é indispensável a cobrança de tributos[5].

De acordo com Ricardo Lobo Torres (2007, p. 16):

“E nesta busca por uma sociedade livre, justa e solidária, a Constituição Brasileira regula minuciosamente a matéria financeira, pois seu texto apresenta a criação do sistema tributário nacional, determina os limites ao poder de tributar, apresenta os princípios básicos, executa a partilha dos tributos e da arrecadação tributária e ainda disciplina a fiscalização e execução do orçamento público”.

No Brasil, a matéria tributária é amplamente tratada pela Constituição Federal, o que resulta num Sistema Tributário com elevada rigidez, além da grande influencia dos princípios constitucionais direcionados as normas tributárias, os chamados princípios constitucionais tributários[6].

Conforme destaca Roque Antônio Carrazza (2006, p. 408):

“Deveras, todo o Capítulo I do Título II da Constituição Brasileira delimita o exercício das competências tributárias das pessoas políticas, impedindo-as de ingressarem nas áreas reservadas aos direitos ‘à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade’ dos contribuintes”.

LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL AO PODER DE TRIBUTAR

Os limites aos poderes do Estado através dos direitos fundamentais são denominados de Estatuto do Contribuinte, tendo como função impedir que haja o desrespeito aos direitos dos contribuintes no momento da arrecadação de tributos, mesmo sendo esta a forma como o Estado obterá recursos para realização dos fins determinados na própria Constituição federal[7].

Referindo-se à limitação constitucional ao poder de tributar, Aliomar Baleeiro (1999, p. 14) destaca que:

“[...] a maioria das imunidades e princípios que asseguram a limitação ao poder de tributar representa especificações dos direitos e garantias individuais como a legalidade, irretroatividade, igualdade, generalidade, capacidade econômica de contribuir, ou ainda, dos princípios estruturais da imunidade recíproca dos entes públicos estatais”. 

Ao partilhar o poder tributário entre as pessoas estatais integrantes da Federação, a Constituição Federal o fez através da atribuição ou denegação. Já a imunidade representa regra de exceção, sendo entendida analisando-se com outra que concede o poder de tributar com limitação na extensão.

Aliomar Baleeiro (1999, p. 15) destaca ainda que:

“A atribuição do poder tributário subtraída às imunidades resulta na norma de competência. A imunidade pode também ser resultado de um princípio fundamental, como por exemplo, o princípio federativo que concede imunidade recíproca. Apesar de existirem imunidades concedidas por princípios e diretrizes, nem todo princípio jurídico leva a uma imunidade”.

O que encontramos aqui são princípios jurídicos que limitam o poder de tributar, condicionando o exercício da competência à observância de alguns requisitos ou critérios, ou seja, limitando o campo de incidência da norma atributiva de poder[8].

Alcançar a justiça é um dos valores fundamentais da humanidade juntamente com o valor da segurança jurídica. “A segurança jurídica é o valor basilar do sistema jurídico, porque representa o sentimento humano inicial e permanente em prol da proteção física e patrimonial, que justifica a criação e manutenção do Estado” (WEISS, 2006, p. 13). Com relação à justiça, entende-se esta como uma intenção permanente de todos os homens, apesar das controvérsias de como alcançá-la, a sociedade moderna acredita que será alcançada quando as normas editadas espelharem os desejos da coletividade[9].

CONCLUSÃO

Em nossos estudos verificamos que, com a formação do Estado, houve a necessidade da tributação para que, como previsto na Constituição Federal, todos os Direitos Fundamentais ali garantidos fossem efetivos. Não obstante, o Estado ao tributar, sua intenção é atender determinadas finalidades sociais essenciais à vida e ao bem comum.

Para que o cidadão sinta-se respeitado frente à incidência da tributação, esta deve ser feita de acordo com todos os ditames constitucionais, ou seja, obedecendo aos princípios fundamentais estruturantes, que servem de base ao poder e limitação de tributar.

A Constituição Federal, ao abarcar e expressar um Estado Democrático de Direito, resguarda ao cidadão, por meio de seus representantes Parlamentares, sua vontade na edição de normas e instituição de impostos, buscando, consequentemente, a satisfação da coletividade.

REFERÊNCIAS

ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006.

BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. 7 ed. rev. e compl. Rio de Janeiro: Forense, 1999.

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 22 ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

FISCHER, Octavio Campos. A Escola Glorificadora da Finalidade: Contribuições e Reforma Tributária. In: Revista de Direito Tributário. São Paulo: APET, 2007.

IVO, Gabriel. O Princípio da Tipologia Tributária e o dever fundamental de pagar tributos. In. Direitos Fundamentais na Constituição de 1988 – Estudos Comemorativos aos seus vinte anos. Coordenador: Rosmar Antonni Rodrigues Cavalcanti de Alencar. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2008.

MACHADO, Hugo de Britto. Curso de Direito Tributário. 28 ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

WEISS, Fernando Lemme. Princípios Tributários e Financeiros. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2006.

https://www.metodista.br/revistas/revistasmetodista/index.php/RFD/articl.... Acesso em 13.05.2012 às 22:13.

http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.31723&seo=1. Acesso em 03.06.2011 às 19:59.

http://www.asscontas.org.br/asscontas/det_agenda.php?id=92. Acesso em 03.06.2011 às 20:10.

http://jus.uol.com.br/revista/texto/8784/limites-ao-poder-de-tributar. Acesso em 29.05.2012 às 20:31


[1] MACHADO, Hugo de Britto. Curso de Direito Tributário. 28 ed. São Paulo: Malheiros. 2007, p. 56.

[2] IVO Gabriel. O Princípio da Tipologia Tributária e o dever fundamental de pagar tributos. In: Direitos Fundamentais na Constituição de 1988 – Estudos Comemorativos aos seus Vinte Anos. Coordenador: Rosmar Antonni Rodrigues Cavalcanti de Alencar. Porto Alegre: Nuria Fabris. 2008, p. 41.

[3] CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 22 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 34.

[4] ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. 61 e 62 pp.

[5] FISCHER, Octavio Campos. A Escola Glorificadora da Finalidade: Contribuições & Reforma Tributária. In: Revista de Direito Tributário da APET, São Paulo. 102 e 103 pp.

[6] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. 142 e 143 pp. 

[7] CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 22 ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 410.

[8] BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. 7 ed. rev. e compl. Rio de Janeiro: Forense, 1999. P. 15.

[9] WEISS, Fernando Lemme. Princípios Tributários e Financeiros. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2006. p. 14.