O ISSQN sobre operações de arrendamento mercantil (leasing)


Porwilliammoura- Postado em 13 setembro 2012

Autores: 
BORTOLOTTO, Luiz Ricardo

 

O ISSQN sobre operações de arrendamento mercantil (leasing)

 

1. INTRODUÇÃO

           

O ISSQN, imposto sobre serviços de qualquer natureza, é tributo dos mais relevantes para os Municípios brasileiros, disputando posição de mais importante fonte de receitas com o IPTU (imposto sobre a propriedade territorial urbana). Está previsto na Constituição da República, art. 156, III[1]. Veio em substituição ao IIP (imposto sobre indústrias e profissões), com a reforma tributária implementada pela EC nº. 18/65. Assim, ressalvados os serviços constitucionalmente colocados sobre o campo de incidência do ICMS (comunicação e transporte interestadual e intermunicipal), qualquer serviço pode ser tributado pelos Municípios, desde que definidos em lei complementar.

            A prestação de serviços é disciplinada pelo Código Civil, de forma que a lei tributária não pode alterar sua definição, conteúdo e alcance, conforme o Código Tributário Nacional, art. 110[2]. Assim, a partir dos artigos 593 e 594 do CPC, define-se prestação de serviços como: toda espécie de serviço ou trabalho lícito, material ou imaterial, que não esteja sujeita à legislação trabalhista ou norma especial, podendo ser contratada mediante retribuição. "Segundo esta concepção civilista a prestação de serviços define-se como obrigação de fazer, sendo este o entendimento do STF, ao declarar como ilegítima a tributação de bens móveis (RE 116.121). É que na edição da LC 116/2003 o legislador tentou colocar a locação de bens móveis no rol dos serviços tributáveis, opção vetada pelo Presidente da República em decisão uníssona com o STF. Nesta esteira o próprio STF decidiu ser constitucional a incidência de ISSQN sobre operações de "leasing" financeiro, serviço expressamente previsto na referida lista anexa (item 15.09), no julgamento do RE 547.245/SC."[3]

            Assim, com a definição de prestação de serviços, parte-se para delinear a hipótese de incidência do ISSQN. Vittorio Cassone, com propriedade, define-a como "descrição que a lei faz de um fato tributário que, quando ocorrer, fará nascer a obrigação tributária (obrigação de o sujeito passivo ter de pagar ao sujeito ativo o tributo correspondente)"[4]. O fato imponível do tributo, deste modo, "é a materialização da hipótese de incidência, representando o momento concreto de sua realização, que se opõe à abstração do paradigma legal que o antecede."[5]. Para o caso concreto, portanto, o fato gerador é a "prestação, por empresa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviços constantes da Lista anexa à LC 116/2003, que enumera, aproximadamente, 230 serviços, divididos em 40 itens. Destarte, não está compreendida no fato gerador do ISS:

a)    a prestação de serviços a si próprio;

b)    a prestação de serviços decorrentes de vínculo empregatício;

c)    a prestação de serviço por prestadores de trabalho avulso e por sócios ou administradores de sociedade;

d)    a prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (campo de incidência do ICMS – art. 155, II, CR);

e)    a prestação de serviços para o exterior (isenção heterônoma para o ISS, prevista no art. 156. § 3º, II, da CR e art. 2º, I, da LC 116/2003);

f)     a prestação de serviço pelo próprio Poder Público (imunidade - art. 150, VI, "a", da CR)."[6]  

Ainda, nas lições de SABBAG, a respeito do sujeito passivo do ISSQN:

"O sujeito passivo é o prestador do serviço, empresa ou profissional autônomo. Exemplos: médico, dentista, contador, advogado, ou seja, todos os vendedores de bens imateriais, com ou sem estabelecimento fixo. Assim, por exclusão, não serão considerados contribuintes:

a)    Os que prestam serviços em relação de emprego;

b)    Os trabalhadores avulsos (estivadores, conferentes);

c)    Os diretores e membros de Conselhos Consultivos ou Fiscal de Sociedades."[7]

Como nota final, destaca-se o fato do legislador ter definido limite mínimo para a alíquota, com vistas a prevenir a ocorrência da chamada "guerra fiscal" entre os Municípios. O mandamento está nas ADCT, art. 88, o qual determina que deverá ser respeitada a alíquota mínima de 2%. De outro giro, a alíquota máxima de 5% está prevista na LC 116/2003, art. 8°. Os Municípios tem, deste modo, autonomia para fixar as alíquotas dentro deste estreito corredor, por meio de lei, obedecendo à anterioridade nonagesimal.

           

            A base de cálculo é o preço do serviço (valor bruto), conforme o art. 7º da LC 116/2003. Assim, os serviços gratuitos não podem ser onerados pelo tributo. Caso não seja possível auferir o montante a ser tributado, pelo faturamento, a base de cálculo será calculada pela modalidade ´fixa´, ou seja, a Autoridade Fazendária lançará o tributo, periodicamente, por um valor fixo, sendo impróprio neste caso, falar-se em alíquota ou base de cálculo. Parte considerável da doutrina, Roque Antonio Carraza inclusive, considera esta modalidade de lançamento inconstitucional, já que não leva em conta as condições pessoais do contribuinte, assim como quis a Constituição da República, ao erigir o Princípio da capacidade contributiva, em seu artigo 145, § 1º[8].           

           

2. OBRIGAÇÃO DE FAZER VERSUS OBRIGAÇÃO DE DAR

           

            Extrai-se do Dicionário Jurídico Brasileiro, a definição, lato sensu, de obrigação, trata-se de:

"vínculo pelo qual alguém deve fazer ou deixar de fazer algo, que pode ser reduzido a um valor de natureza econômica; Clóvis Beviláqua nos fornece o seu conceito: "É a relação transitória de direito, que nos constrange a dar, fazer ou não fazer alguma coisa economicamente apreciável, em proveito de alguém, que por ato nosso ou de alguém conosco juridicamente relacionado, ou em virtude da lei, adquiriu o direito de exigir de nós essa ação ou omissão"; a definição de Cunha Gonçalves é a seguinte: "Obrigação é o vínculo jurídico pelo qual alguém se sujeita para com outrem a dar, a fazer ou não fazer."[9]

Para o necessário entendimento do fato imponível do ISSQN, é necessário burilar, ainda mais, o conceito de obrigação civil. Busca-se subsídios nas lições de DINIZ, para apurar o conceito e as diferenças entre as espécies obrigacionais de dar e de fazer:

"A obrigação de fazer é a que vincula o devedor à prestação de um serviço ou ato positivo, material ou imaterial, seu ou de terceiro, em benefício do credor ou de terceira pessoa. Essa relação obrigacional tem por objeto qualquer comportamento humano, lícito e possível, do devedor ou de outra pessoa à custa daquele, seja a prestação de trabalho físico ou material (p. ex., o de podar as roseiras de um jardim, o de construir uma ponte etc.), seja a realização de serviço intelectual, artístico ou científico (p. ex., o de compor uma música, o de escrever um livro etc.), seja ele, ainda, a prática de certo ato ou negócio jurídico, que não configura execução de qualquer trabalho (p. ex., o de locar um imóvel, o de renunciar a certa herança, o de prometer determinada recompensa, o de se sujeitar ao juízo arbitral, o de votar numa assembléia, o de reforçar uma garantia etc.).

Tanto a obrigação de dar como a de fazer constituem obrigações positivas, que muitas vezes se mesclam. Na compra e venda, p. ex., o vendedor tem obrigação de entregar a coisa vendida (dar) e de responder pela evicção e vícios redibitórios (fazer); na promessa de venda de coisa alheia, o promitente deve obter a aquisição da coisa (fazer), antes de efetuar a sua entrega ao comprador (dar); na empreitada (CC, art. 610), o empreiteiro se compromete a contribuir para determinada obra com a mão-de-obra (fazer) e os materiais necessários (dar) (RT, 402:221, 131:251; RF, 92:94).

Por essas razões urge estabelecer critérios diferenciadores, que possibilitem separar uma relação obrigacional de outra, desprezando-se, no caso em que essas obrigações se misturam, o ponto de vista unificador e a idéia de se considerar uma delas principal e a outra acessória, visto que nenhum daqueles atos em que cada uma se desdobra pode ser tido como acessório, reconhecendo-se, então, a existência de duas obrigações distintas, cada qual com seus caracteres próprios e sua individualidade."[10] (grifou-se)

            De sorte que, como critério definidor de fato imponível, segundo a professora Maria Helena DINIZ, pode-se concluir que:

"A prestação, na obrigação de dar, consiste na entrega de um objeto, sem que se tenha de fazê-lo previamente, e, na de fazer, na realização de um ato ou confecção de uma coisa, para depois entregá-la ao credor. Logo, na de dar, a prestação consiste na entrega de um bem prometido, para transferir seu domínio, conceder seu uso ou restituí-lo ao seu dono, e, na de fazer, o objeto da prestação é um ato do devedor com proveito patrimonial para o credor ou terceiro." [11]     

Foi com este espeque que o legislador definiu a hipótese de incidência do ISSQN. Quis ele que o fato imponível fosse preponderantemente obrigação de fazer, ainda que houvesse fornecimento de mercadorias conjuntamente. É neste sentido a decisão do STJ, na edição da Súmula 156[12]. Confirma-se, pelo excerto da jurisprudência acima indicada, que existem obrigações de fazer puras, sem fornecimento de mercadorias, e as obrigações de fazer mistas, nas quais o prestador utiliza-se de elementos externos à obrigação da prestação positiva de prestar o serviço, como no exemplo da contratação de serviços gráficos personalizados. Ou seja, naquelas situações em que prevalece a obrigação de fazer incide o ISSQN, ainda que haja o fornecimento de mercadorias, de modo subjacente.

            Neste mesmo sentido, por exclusão, a jurisprudência define a hipótese de incidência de ICMS, quando da obrigação principal, resultar preponderante o fornecimento de mercadorias em detrimento da prestação do serviço, conforme se depreende do enunciado da Súmula 163, do STJ[13]. Perceba-se, desde logo, que o nó górdio da questão centra-se na apuração do que prepondera na operação, serviço ou mercadoria. Caso prevaleça a obrigação de fazer (serviços), deverá incidir ISSQN; ao contrário caso prevaleça o valor das mercadorias (dar), deverá incidir o ICMS. A inteligência das decisões dos Tribunais superiores sobre a matéria passa, necessariamente, pela correta interpretação desses institutos, ainda quando ambos estejam presentes em contratos complexos de arrendamento mercantil.

3. A NATUREZA DAS OPERAÇÕES DE LEASING

            O leasing, também denominado arrendamento mercantil, é firmado, na prática, sob duas modalidades, operacional ou financeiro. No primeiro caso é o contrato pelo qual uma empresa, ou uma distribuidora, contrata a locação de um determinado bem, cedendo o direito de uso, comprometendo-se a fornecer a manutenção e a assistência técnica (eventualmente necessárias), recebendo, em contrapartida, um montante que engloba o valor correspondente ao direito de uso (equivalente à locação), à manutenção e à margem de lucro. Como exemplo pode-se citar a locação de copiadoras. Caso o arrendatário queira, poderá optar pela aquisição do bem, pelo valor de mercado, ao final do contrato.       

            O leasing financeiro, segundo WALD:

"É o contrato segundo o qual uma empresa "desejando utilizar determinado equipamento, ou um certo imóvel, consegue que uma instituição financeira adquira o referido bem, alugando-o ao interessado por prazo certo, admitindo-se que, terminado o prazo locativo, o locatário possa optar entre a devolução do bem, a renovação da locação, ou a compra pelo preço residual fixado no momento inicial do contrato"[14]      

Em ambas modalidades é facultado ao arrendatário, ao final do contrato, optar pela devolução do bem. No leasing financeiro, entretanto, é clara a intenção final de aquisição do bem pelo arrendatário, se assim não fosse a instituição financeira não faria a aquisição de tal bem. Deste modo, para ALEXANDRE, é "correto afirmar que na modalidade operacional predomina a locação e na modalidade financeira predomina o financiamento."[15] A mais importante observação, contudo, é a de que não ocorre a circulação jurídica da mercadoria, não desencadeando o fato imponível para tributação por via do ICMS. É esta a inteligência do art. 3º, VIII, da Lei Complementar 87/1996[16].

            A não incidência do ICMS refere-se exclusivamente àquelas operações em que não haja a efetiva circulação da mercadoria, ou seja, nas operações de leasing propriamente ditas: o leasing financeiro, visto que o arrendatário indica o bem a ser adquirido pela arrendadora.

            Há outra peculiaridade, atinente às operações de leasing internacional, para as quais incide, por força da alínea "a" do inciso IX do § 2º do artigo 155[17] da Constituição da República, ICMS nas operações de entrada das mercadorias arrendadas, "qualquer que seja sua finalidade". Foi neste sentido o entendimento do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 206.069/SP, de relatoria da ministra Ellen Gracie (DJ 13.09.2005):

"EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. ICMS. ARRENDAMENTO MERCANTIL – LEASING. 1. De acordo com a Constituição de 1988, incide ICMS sobre a entrada de mercadoria importada do exterior. Desnecessária, portanto, a verificação da natureza jurídica do negócio internacional do qual decorre a importação, o qual não se encontra ao alcance do Fisco nacional. 2. O disposto no art. 3

 º, inciso VIII, da Lei Complementar 87/1996 aplica-se exclusivamente às operações internas de leasing. 3. Recurso extraordinário conhecido e provido."

            Assim, a partir do julgado acima, estabeleceram-se as diferenças entre as operações internas e externas de leasing. Desde que haja o ingresso de mercadoria com ânimo de transferência jurídica do bem, incidirá ICMS. Ocorre que, em outro julgamento, do RE 461.968, com fundamentação do ministro Eros Grau, o STF, em discussão acerca do arrendamento mercantil de aeronaves e peças e equipamentos para a manutenção destas, decidiu pela não incidência do ICMS, precisamente por não haver o ânimo de aquisição destes bens pelo arrendatário e, consequentemente, não ocorrer circulação jurídica dos referidos bens.

Transcreve-se a lapidar passagem:

"Por mais estranho que possa parecer, aqui é a normalidade que aparenta ser peculiar. Pois de arrendamento mesmo se trata nesses casos. Vale dizer: ainda que se fale em leasing, as arrendadoras [= indústria aeronáutica direta ou indiretamente] permanecem, ao final do termo do contrato, proprietárias dos bens transferidos temporariamente ao uso das companhias de navegação aérea. Esse é um fato notório. Quando aeronaves e/ou peças ou equipamentos que as componham são importadas em regime de leasing não se prevê a sua posterior transferência ao domínio do arrendatário."[18]  

            Na situação submetida ao STF não havia opção de compra antecipadamente feita, existia simplesmente leasing, pois a aquisição de tais mercadorias não era economicamente viável às companhias aéreas. No primeiro caso havia a incorporação do bem ao ativo fixo da arrendatária, enquanto no segundo caso tal opção era economicamente inviável.

            Além das modalidades já elencadas acima, no julgamento do RE 547.245/SC, o STF traz outra modalidade de arrendamento mercantil: o lease-back. Nessa modalidade a própria arrendatária vende um bem que lhe pertence à arrendadora e, em seguida, toma-o de volta, em arrendamento mercantil.

                       

"O caso é que, não raro, uma empresa, pretendendo expandir-se, não dispõe de capital suficiente para tal ou, aquele que tem em mãos representa pouco ou é indispensável às suas atividades, de modo que não pode ser imobilizado. Nestes casos, a empresa desafeta um bem que lhe pertence e o aliena à uma empresa de arrendamento mercantil, dela recebendo o pagamento, muitas vezes à vista, promovendo, assim, um acréscimo em seu capital. E, como a empresa precisa utilizar aquele bem em sua atividade, à alienação segue-se o arrendamento do mesmo bem, através do contrato de leasing onde a vendedora figura como arrendatária. O bem nem mesmo chega a sair da posse da arrendatária. No mais, a operação reveste-se todos os caracteres existentes no contrato de leasing financeiro."[19]

            O lease-back está previsto na Lei 6.099/74, art. 9º, com alterações introduzidas pela Lei 7.132/83. Sobre ele dispõe a Resolução BACEN nº 2.309/96, art. 23:

     "Art. 23 – As operações de arrendamento mercantil contratadas com o próprio vendedor do bem ou com pessoas a ele coligadas ou interdependentes somente podem ser contratadas na modalidade de arrendamento mercantil financeiro, aplicando-se a elas as mesmas condições fixadas neste regulamento."

            É outra modalidade de ajuste no qual, segundo o STF, prepondera o caráter distintivo de financiamento, pois no núcleo do contrato há de maneira subjacente, prestação de serviço. Neste sentido, com bastante clareza, discorreu o ministro Carlos Britto, na fundamentação do seu voto:

"Entendo que disponibilizar crédito para obtenção de um bem destinado a uso não é senão um ato de intermediar, ou seja, fazer uma intermediação, obrigação de fazer, portanto. Aliás, na linguagem coloquial, nunca se diz dar um empréstimo, mas sim fazer um empréstimo. O leasing é um contrato reconhecidamente híbrido, não se confunde com locação de bens móveis, implica prestação de serviços, consistente na obtenção de um bem e, simultaneamente, na administração de um financiamento, Quer dizer, é serviço, portanto, sem nenhuma dúvida. Aliás, o próprio nome imposto sobre serviços de qualquer natureza já revela o propósito mais abrangente possível da Constituição nas obrigações de fazer – serviços de qualquer natureza – e não há dúvida de que a obtenção de financiamento para a compra de um bem, por exemplo, um automóvel, implica disponibilizar um crédito, que é fazer um crédito, portanto, a obrigação de fazer."[20]

            Nesta batida, o ministro Cesar Peluso, a exemplo de Ayres Britto, igualmente enriqueceu o debate, no julgamento do Recurso Extraordinário 547.245/SC, quando a partir de uma perspectiva moderno , rebateu as teses que criam dificuldades teóricas para enquadrar o arrendamento mercantil como sujeito à imposição de tributação pelo ISSQN, para quem  o intérprete terá que:

 "interpretar não apenas a complexidade da economia do mundo atual, mas sobretudo os instrumentos, institutos e figuras jurídicos com que o ordenamento regula tais atividades complexas com a aplicação de concepções adequadas a certa simplicidade do mundo do império romano, em que certo número de contratos típicos apresentavam obrigações explicáveis com base na distinção escolástica entre obrigação de dar, fazer e não fazer."[21]

           

            Conclui, com bastante acerto, dando provimento às razões do Fisco:

"o mundo moderno é extremamente mais complexo para poder ser explicado à luz da economia do mundo romano, ou à luz dos institutos que ali os regiam. O contrato é complexo, envolve uma série de atos que pode, de algum modo, ser reduzida à produção individualizada de uma só atividade. E isso, evidentemente, só pode corresponder, hoje, ao sentido da prestação de serviços, e não ao de doação ou de outra coisa similar."

            O voto dissonante ao entendimento majoritário do STF, foi do ministro Marco Aurélio Mello, para quem "locação, gênero, não é serviço".[22] Valeu-se o eminente intérprete, do mandamento erigido no Código Tributário Nacional, art. 110, que prescreve que:

"Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conceito e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias."

            Limitou-se o ministro a uma interpretação literal da lei. Não é a maneira como os mais avançados judiciários, em sintonia com a velocidade que a realidade atual pede, estão decidindo. Desde o Código de Napoleão, época vetusta na qual pensava o legislador ser possível positivar todas as situações de conflitos de interesses, não predomina este método hermenêutico com tamanha propriedade. Hodiernamente, deve o intérprete buscar, teleologicamente, o sentido que o legislador quis dar à lei. Neste caso, trata-se de enfrentar um dispositivo delineado em 1966, ou seja, época cuja sociedade e estrutura econômica eram muito diferentes da atual.

[1] Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...)

III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar (...)

[2] "Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conceito e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias."

[3] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. 6 ed. São Paulo:Método, 2012. p.624.

[4] CASSONE, Vittorio in SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 3.ed., 2.tir. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 672.

[5] Idem, p. 672.

[6] Ibidem, p.991.

[7] Ibidem, p. 990.

[8] "Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:

(...)

§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte." 

[9] SANTOS, Washington Dos. Dicionário Jurídico Brasileiro. Belo Horizonte:Del Rey, 2001. p. 172.

[10] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.97.

[11] Idem.

[12] Súmula 156 – STJ – "A prestação de serviço de composição gráfica, personalizada e sob encomenda, ainda que envolva fornecimento de mercadorias, está sujeita, apenas, ao ISS".

[13] Súmula 163 – STJ – "O fornecimento de mercadorias com a simultânea prestação de serviços em bares, restaurantes e estabelecimentos similares constitui fato gerador de ICMS a incidir sobre o valor total da operação".

[14] WALD, Arnoldo in ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. 6.ed. São Paulo: Método, 2012. p.591.

[15] Idem

[16] "Art. 3º. O imposto incide sobre

(...)

VIII – operações de arrendamento mercantil, não compreendida a venda do bem arrendado ao arrendatário."

[17] "Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

(...)

IX – incidirá também:

a)     Sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado que estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço."

[18] RE 461.968/SP, Rel. Min. Eros Grau, (DJ 24.08.2007)

[19] LIMA, Luiz Adriano. O Contrato de Leasing – The leasing contract. Revista da USF, v. 16, p. 163. Março-Abril de 2002.

[20] STF - RE 547.245/SC. Tribunal Pleno. Rel. Min. Eros Grau, (DJ 02.12.2009).p. 892.

[21] Ibidem, p. 893.

[22] Ibidem, p. 894.