Parâmetros a serem observados na ponderação quando em tela os direitos fundamentais à publicidade e à informação


Porrayanesantos- Postado em 07 maio 2013

Autores: 
SILVEIRA, Vinicius Loureiro da Mota

 

1. RESUMO.

 

A liberdade de expressão e informação deduz-se da liberdade de manifestação do pensamento. Consistindo em um valor fundamental para Estado Democrático de Direito, presume-se o interesse público na divulgação de qualquer fato verdadeiro, obtido por meios lícitos. No plano jurídico-formal, o princípio da publicidade aponta para a necessidade de que todos os atos administrativos estejam expostos ao público, que se pratiquem à luz do dia, até porque os agentes estatais não atuam para a satisfação de interesses pessoais, nem sequer da própria Administração, mas sim do interesse público.

 

Palavras-chave: Direitos Fundamentais à intimidade e à informação, Parâmetros.


 

 

2. INTRODUÇÃO.

 

Em primeiras linhas, destaque-se que os direitos fundamentais possuem o mesmo status jurídico de cláusulas pétreas (art. 60, §4º, IV, da Constituição Federal), ou seja, não há entre eles hierarquia de qualquer sorte, não sendo possível estabelecer uma regra abstrata e permanente de preferência de um sobre o outro.

 

Deste modo, afigura-se razoável estabelecer alguns parâmetros, necessários quando confrontados direitos fundamentais, mais precisamente, o direito à intimidade, de um lado, e os direitos à informação e à publicidade, do outro.

 

Para tanto, traçaremos um caminho a ser seguido pelos intérpretes do Direito, estruturando, assim, uma linha de motivação e argumentação para, com apoio na ponderação e no princípio da proporcionalidade, fixar qual direito fundamental irá prevalecer, a depender da análise das circunstâncias de cada caso concreto.

 

3. PONDERAÇÃO E PROPORCIONALIDADE.

 

3.1. Ponderação

 

Como bem apontado pelo ilustre professor Daniel Sarmento, a Constituição, em uma sociedade pluralista, acaba acolhendo normas que promovem interesses e valores divergentes, e que podem entrar em conflito na solução de casos concretos (SARMENTO, 2003).

 

Exemplo de fácil percepção, na defesa de interesses contrapostos, agasalhados por grupos políticos cujos valores acabaram, em maior ou menor medida, insertos no texto da Constituição Cidadã, é a proteção, de um lado, a propriedade privada, e, de outro, a função social que a mesma deve se ater para que, assim, possa se assegurar respeito àquele direito fundamental (CF, arts. 5°, XXII e XXIII).

 

É sob este paradigma, envolvendo casos concretos, com a colisão entre direitos de igual hierarquia, que avulta de importância uma técnica capaz de, sem estar adstrita ao talante do julgador, solucionar a querela posta ao Estado-juiz, com critérios que, mesmo com certa carga de subjetividade, são informados por outros onde subjace uma objetividade em que o jurisdicionado pode questionar e, sobretudo, fiscalizar como ocorreu o equacionamento de uma tensão, pelo intérprete responsável pela resolução da controvérsia.

 

Diante deste quadro, imperioso destacar a necessidade de uma técnica aberta, um procedimento que seja capaz de solucionar a complexidade na qual o magistrado se coloca frente a inúmeras normas, contrapostas, enunciadas de modo vago, como o são os conceitos jurídicos indeterminados, mas que, assegurando o respeito à segurança jurídica, mesmo inevitavelmente um largo espaço para valorações subjetivas possa existir, não resvale para o puro subjetivismo. Reveste-se de importância, assim, como técnica de composição dos conflitos entre interesses constitucionais antagônicos (SARMENTO, 2003, p.23), a ponderação de interesses.

 

A ponderação de interesses consiste, assim, no método necessário ao equacionamento das colisões entre princípios da Lei maior, onde se busca alcançar um ponto ótimo, em que a restrição a cada um dos bens jurídicos de estatura constitucional envolvidos seja a menor possível, na medida exata necessária à salvaguarda do bem jurídico contraposto (SARMENTO, 2003).

 

Nesta seara, a ponderação de interesses exsurge quando, pelo menos, dois princípios constitucionais estiverem em rota de colisão, em referência a um caso concreto, momento no qual caberá a um intérprete, em um primeiro plano, em consonância com o princípio da unidade da Constituição – o qual objetiva a busca de uma conciliação entre normas constitucionais aparentemente conflitantes, evitando as antinomias e colisões -, proceder à interpretação dos cânones envolvidos, para verificar se eles efetivamente se confrontam na resolução do caso, ou se, ao contrário, é possível harmonizá-los.

 

3.2 Princípio da proporcionalidade.

 

Prima facie, destacando que a noção de que os atos do Poder Público devem ser adequados e proporcionais em relação às situações a que visam atender é até intuitiva, Daniel Sarmento explica que, quando manejado com cautela e parcimônia, o princípio da proporcionalidade revela-se um excepcional instrumento para a proteção dos valores constitucionais, sobretudo daqueles não positivados no texto fundamental, em razão, principalmente, da fluidez e imprecisão de que se revestem os princípios, no qual enquadra-se a proporcionalidade, permitindo destacar, dentre as suas múltiplas funções, a de atuar como pauta procedimental de ponderação de interesses (SARMENTO, 2003, pp. 77/78).

 

Em suas intricadas relações, asseverou Suzana de Toledo Barros que o princípio da proporcionalidade tem como principal campo de atuação o dos direitos fundamentais, e, por isso, qualquer manifestação do poder público deve render-lhe obediência. (1996, p. 26).

 

Assim, pretende o princípio da proporcionalidade instituir a relação entre fim e meio, confrontando o fim e o fundamento de uma intervenção com os efeitos desta para que se torne possível um controle do excesso. (BONAVIDES, 2003, p. 393).

 

Revela-se, pois, o princípio da proporcionalidade como, dentre suas múltiplas funções, um mecanismo jurídico de salvaguarda e proteção eficaz dos direitos fundamentais, perante as múltiplas facetas do poder estatal, devendo fornecer, destarte, os critérios das limitações à liberdade individual.

 

O princípio da proporcionalidade é, pois, instrumento de interpretação a ser utilizado na ponderação de direitos em colisão, objetivando auferir aquele que, diante das circunstâncias fáticas e jurídicas do caso concreto, detém o maior peso específico, prevalecendo um sobre o outro na solução da lide.Em derredor da matéria, entende, com brilhantismo, Georg Ress que:

 

O princípio da proporcionalidade, enquanto máxima de interpretação, não representa nenhum, critério material, ou seja, substantivo, de decisão, mas serve tão-somente para estabelecer, como diretiva procedimental, o processo de busca material da decisão, aplicado obviamente à solução de justiça do caso concreto e específico. (apud BONAVIDES, 2003, p. 426).

 

Está, por assim dizer, que, na ponderação de interesses por meio do princípio da proporcionalidade, objetivar-se-á não a exclusão de algum dos direitos em colisão, mas, na medida do possível, a busca de um resultado que aufira o melhor de cada uma das normas em uma determinada situação. Neste passo, pontifica Robert Alexy que:

 

Direitos fundamentais como princípios são mandamentos de otimização. Como mandamentos de otimização, princípios são normas que ordenam que algo seja realizado, relativamente às possibilidades fáticas e jurídicas, em medida tão alta quanto possível. (2005, p. 339).

 

4. DIREITO À INFORMAÇÃO.

 

4.1. Conceito e distinções.

 

Para Fernand Terrou, a palavra informação designa “o conjunto de condições e modalidades de difusão para o público (ou colocada à disposição do público) sob formas apropriadas, de notícias ou elementos de conhecimento, idéias e opiniões” (apud SILVA, 2004, p. 244).

 

Por sua vez, Albino Franco esclarece que por informação se entende “o conhecimento de fatos, de acontecimentos, de situações de interesse geral e particular que implica, do ponto de vista jurídico, duas direções: a do direito de informar e a do direito de ser informado” (apud SILVA, 2004, p. 244).

 

Constituindo-se como um dos pilares sobre os quais está assentado o regime democrático, sendo, inclusive, uma das primeiras medidas de regimes totalitários e ditatoriais a sua restrição, a liberdade de expressão e informação está consagrada no texto constitucional brasileiro – sem nenhuma forma de censura prévia – no art. 5º, mais precisamente no inciso XIV, como direito fundamental, in verbis:

 

Art. 5º (omissis)

 

(omissis)

 

XIV – é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional.

 

Há de se ressaltar, aqui, que, como bem expôs Edilsom Pereira de Farias, a liberdade de expressão e informação deduz-se da liberdade de manifestação do pensamento. Na verdade, ambas estão sempre unidas porquanto a liberdade de manifestação do pensamento teria escasso valor sem a correspondente possibilidade de expressar-se ou difundir-se (1996, p. 128).

 

Neste vetor, o texto fundamental prevê que:

 

Art. 5º(omissis)

 

(omissis)

 

IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.

 

Por seu turno, regulando a ordem social, a Constituição estipula, ao tratar da comunicação social e da liberdade de imprensa, que:

 

Art. 220 A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observando o disposto nesta Constituição.

 

Balizando os critérios possíveis para a restrição à liberdade de informação jornalística, em especial, dispõem os §§ 1º e 2º, do art. 220, que:

 

Art. 220 (omissis)

 

§1º Nenhuma lei  conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observando o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

 

§2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

 

Destaque-se, neste ponto, que, em especial previsão, o art. 5º, inciso X, constitui um limite, tanto para a liberdade de expressão do pensamento, como para o direito à informação.

 

Pois bem. Dentro de um amplo quadro, e referindo-se a posição extremamente destacada ocupada pela liberdade de expressão no sistema constitucional brasileiro, assim pontificou Daniel Sarmento:

 

O texto constitucional chegou a ser redundante ao consagrá-la: art. 5º, inciso IV – liberdade de manifestação do pensamento -; art. 5º, inciso X – liberdade de expressão de atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença -; art. 5º, inciso XIV – direito à informação e garantia  do sigilo da fonte jornalística -; art. 220, caput – garantia da manifestação do pensamento, da criação, da expressão e informação, sob qualquer forma e veículo -; art. 220, §1º - liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social -; art. 220, §2º - proibição de qualquer censura de natureza política, artística ou ideológica. (2006, p. 250).

 

Para Vera Maria de Oliveira Lopes, constituindo-se em um direito de terceira geração – transindividual e bifronte, sendo um interesse titularizado por toda a sociedade -, o direito à informação compreende:

 

o direito a exprimir idéias e opiniões e o direito a receber informações; o direito do emissor e também o direito do receptor,e, acima de tudo, um direito autônomo em relação ao direito de expressão ou de imprensa. (apud BARROSO, 2004, p. 36).

 

Sob este prisma, podemos mensurar que, a teor da reconhecida autonomia existente tanto pela liberdade de expressão, quanto para o direito à informação, há uma íntima conexão entre estes direitos fundamentais, com elementos em comum, muito em conta devido ao amplo conceito no qual aquele é empregado, englobando a expressão de pensamentos, idéias e opiniões. Luiz Manoel Gomes Júnior, citando o ilustre professor português Marinho e Pinto, asservera que:

 

A liberdade de expressão possui um conteúdo muito mais amplo que o da liberdade de informação em seu aspecto próprio. Isso por dispensar, aquela (liberdade de expressão), o limite interno da verdade exigido pelo direito de informar. (2005, p. 96).

 

Neste diapasão, engloba a liberdade de expressão a livre expressão do pensamento por qualquer meio, seja a criação artística ou literária, que inclui o cinema, o teatro, a novela, a ficção literária, as artes plásticas, a música, até mesmo a opinião publicada em jornal ou em qualquer outro veículo (CARVALHO; apud BARROSO, 2004, p. 18).

 

Por sua vez, Luís Roberto Barroso pontifica que:

 

A doutrina brasileira distingue as liberdades de informação e de expressão, registrando que a primeira diz respeito ao direito individual de comunicar livremente fatos e ao direito difuso de ser deles informado; a liberdade de expressão, por seu turno, destina-se a tutelar o direito de externar idéias, opiniões, juízos de valor, em suma, qualquer manifestação do pensamento humano. (2004, p. 18).

 

Compreende, por assim dizer, a liberdade de expressão, a liberdade de buscar, receber e difundir informações, ou melhor, o próprio direito à informação. Com efeito, como direito subjetivo fundamental assegurado a todo cidadão, consiste a liberdade de expressão e informação:

 

na faculdade de manifestar livremente o próprio pensamento, idéias e opiniões através da palavra, escrito, imagem ou qualquer outro meio de difusão, bem como no direito de comunicar ou receber informação verdadeira, sem impedimentos nem discriminações. (FARIAS, 1996, p. 131).

 

Assegura-se, pelo direito à informação, o direito a informar, de se informar e de ser informado por qualquer meio de difusão, sem impedimentos, nem discriminações prévias, ressaltando, contudo, as restrições constitucionais, por não constituir, como qualquer outro direito fundamental, um direito absoluto, possuindo limites, tanto internos, quanto externos, devendo compatibilizar-se com os direitos fundamentais dos cidadãos afetados pelas opiniões e informações (ou mesmo outros valores e bens constitucionalmente protegidos, e.g. a segurança pública, com a publicação de segredos do Estado, por exemplo, e a saúde pública).

 

Assim, os direitos da personalidade à honra, à intimidade, à vida privada e à imagem constituem limites externos da liberdade de expressão e informação (FARIAS, 1996, pp. 136-137), dentre outros, que podemos trazer exemplificadamente à tona, como o é a proteção da infância e da adolescência (CF, art. 21, XVI).

 

Ressaltando restrições a liberdade de informação, Porfírio Barroso e María Talavera asseguraram que a “liberdade de informação se exerce através da difusão de fatos. Porém, nem todos os fatos podem ser objeto da liberdade de informação, mas somente aqueles que possuem transcendência pública: fatos noticiáveis”[1] (apud BARROSO, 2004, p. 18, tradução nossa).

 

Utilizado, até então, indistintamente, impõe-se, tecnicamente, destacar a existência de nítida distinção entre a liberdade de informação e o direito à informação. Assim, amparado no magistério do ilustre jurista Rui Stoco, veja-se:

 

O direito à informação liga-se ao conceito de cidadania. Toda pessoa tem direito à informação, segundo o conceito de liberdade plena afirmado pela CF/88, assegurando-se o conhecimento de atos, de acontecimentos, de situações de interesse geral e particular, de obter certidões, de ser comunicado da existência de processos e procedimentos contra si, de ter acesso aos registros públicos e de registros relativos a sua própria pessoa.

 

Em termos de maior especificidade, tem-se a liberdade de informação jornalística, ou seja, a informação e a notícia através dos meios de comunicação antigos e modernos, constituídos pela imprensa falada (rádio), escrita (jornais, revistas e periódicos) e televisada (canais abertos e fechados de televisão) e, ainda, através da internet ou intranet(...).

 

A informação por esses meios alcança qualquer forma de difusão de notícias, opiniões, comentários, registros e constatações. (2007, p. 154).

 

Ademais, outra expressão bastante utilizada, mas que precisa ganhar contornos próprios, é a liberdade de imprensa, liberdade esta reconhecida aos meios de comunicação em geral, em seus diversos aspectos, impressos ou não, de comunicarem fatos e idéias, envolvendo, neste ínterim, tanto a liberdade de informação, quanto à de expressão.

 

4.2. Parâmetros para a ponderação

 

A par de servirem como norteadores na tarefa de interpretação e solução de uma possível colisão de direitos fundamentais, enumeraremos um conjunto de parâmetros, elementos que devem ser considerados quando em pauta a liberdade de informação, em consonância com a enumeração trazida por Luís Roberto Barroso, em destacado artigo doutrinário (2004, pp. 25-28).

 

A)                                                        Veracidade do fato

 

O primeiro dos requisitos, e, quiçá, o mais importante, é a de ser a informação verdadeira, necessária para que esteja amparada pela proteção constitucional.

 

Sob este pálio, destaca-se que o primeiro de todos os limites à liberdade de informação é a verdade. Um tal limite estrutura-se no seguinte princípio: nem tudo o que é verdade pode ser divulgado, mas tudo o que se divulgar deve ser verdadeiro (MARINHO e PINTO; apud GOMES JÚNIOR, 2005, p. 98). É, por assim dizer, que, para o legítimo exercício do direito à informação, é necessário que este direito esteja vinculado, intricado com o respeito pela verdade.

 

Não há que se falar, outrossim, em um conceito absoluto de verdade, tendo, inclusive, que se ressaltar a completa impossibilidade de só se divulgar fatos amparados pela verdade incontestável, devido, em grande parte, a própria essência da informação jornalística, que restaria inviabilizada por estar marcada, em um mundo efêmero, dinâmico, no qual a exigência da informação está atrelada a circulação cada vez mais rápida dos fatos, por juízos de verossimilhança e probabilidade.

 

Desta feita, o que se pretende, isto sim, do requisito verdade, é a sua compreensão do ponto de vista subjetivo, ou melhor, que o informador se resguarde, tome as devidas cautelas, efetuando as diligências necessárias para apurar, de forma séria, os fatos que pretende tornar públicos. Corroborando este entendimento, confira-se:

 

O limite interno da veracidade, aplicado ao direito à informação, refere-se à verdade subjetiva e não a verdade objetiva. Vale dizer: no Estado Democrático de Direito, o que se exige do sujeito é um dever de diligência ou apreço pela verdade, no sentido de que seja contactada a fonte dos fatos noticiáveis e verificada a seriedade ou idoneidade da notícia antes de qualquer divulgação. (FARIAS, 1996, p. 132).

 

Sob este ótica, informações equivocadas, ou mesmo errôneas, podem merecer, por parte de seu autor, proteção, quando evidenciadas diligências e cuidados na averiguação dos fatos, tidos como verdadeiros, antes de sua divulgação (o mesmo ocorre quando da elaboração do texto informativo).

 

Posto isso, a responsabilidade, a punição só merece ser averiguada quando condutas negligentes - ou mesmo a presença do dolo - estiverem conectadas com a difusão da falsidade, como se pode perceber quando informações são divulgadas apenas estando baseadas em rumores ou boatos.

 

É, neste vetor, que se rechaça uma responsabilidade objetiva, merecendo atenção tão-somente a responsabilidade subjetiva, com culpa, quando da avaliação da verossimilhança ou inverossimilhança da informação, dever intrínseco de quem exerce o direito e a liberdade de informar.

 

Por oportuno, outras também são as hipóteses passíveis de responsabilização, como ocorre, dentre outras, quando um acontecimento, mesmo verdadeiro, é noticiado, mas o é através de interpretações teatrais ou factuais, dramatizado.

 

É, por estas circunstâncias, que Rui Stoco, considerando o poder ofensivo e danoso, pontifica que o excesso poderá caracterizar abuso do direito de informar, convertendo em um comportamento punível, civil ou criminalmente, o que ele denomina de ilícito por contaminação do meio, veja-se:

 

(...) Se a divulgação de informação é um direito, a fidelidade ao fato, a ausência de excessos ou de sensacionalismos é um dever. Não se admitem insinuações, interjeições, dubiedades, sensacionalismos ou dramatização ofensiva ou perniciosa sobre fatos verdadeiros. Condena-se e pune-se no âmbito civil tanto a notícia falsa, forjada e sem pertinência fática, ou seja, a notícia inexistente no plano fenomênico, como a notícia verdadeira mas travestida, desvirtuada ou divulgada com excesso e abuso (...). Este abuso pode ser identificado quando se noticia  fato (ou imagem) não verdadeiro; quando o fato, apesar de verdadeiro, é desvirtuado, deturpado, “dramatizado”, caracterizado ou satirizado, de modo a tornar-se ofensivo e danoso; nas hipóteses de calúnia, injúria e difamação; quando o fato, embora verdadeiro e divulgado corretamente e com exação, encontra vedação legal (como, por exemplo, no caso dos menores de dezoito anos (...)) ou, ainda que verdadeiro e divulgado correta e adequadamente, tem o poder de causar gravame, submeter ao ridículo, denegrir a imagem da pessoa, tornar sua vida insuportável ou arruinar sua vida privada ou profissional. (STOCO, 2007, pp. 156-157).

 

B)                                                        Licitude do meio empregado na obtenção da informação

 

Outra característica inarredável para tornar a divulgação da informação constitucionalmente permitida, e, portanto, protegida, é um corolário, mutantis mutandis, da vedação das provas obtidas por meios ilícitos, direito fundamental previsto no art. 5º, inciso LVI, da Constituição Federal. Destarte:

 

O conhecimento acerca do fato que se pretende divulgar tem de ter sido obtido por meios admitidos pelo direito. A constituição, da mesma forma que veda a utilização, em juízo,  de provas obtidas por meios ilícitos, também interdita a divulgação de notícias às quais se teve acesso mediante cometimento de um crime. Se a fonte da notícia fez, e.g., uma interceptação telefônica clandestina, invadiu domicílio, violou o segredo de justiça em um processo de família ou obteve uma informação mediante tortura ou grave ameaça, sua divulgação não será legítima. (BARROSO, 2004, pp. 25-26).

 

De outra banda, infere-se que, mesmo quando a informação é obtida por meios regulares e lícitos, não se está autorizando que a sua divulgação venha a afetar a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem dos envolvidos.

 

C)        Personalidade pública ou estritamente privada da pessoa objeto da notícia

 

As pessoas que, mesmo ocasionalmente, são caracterizadas como notórias, públicas, tendo em vista o mérito pessoal, posição social, beleza, profissão, desastres naturais, dentre outras circunstâncias que venham a despertar o interesse da sociedade na busca de informações a seu respeito, possuem um maior elastério no que toca aos seus direitos fundamentais e da personalidade, o que não significa, de todo o modo, que esta menor proteção, albergando maiores limites para a divulgação de informações, venha a suprimir o seu direito a privacidade, dentre outros.

 

D)                                                        Local do fato

 

Outra nuance a caracterizar a licitude ou não da divulgação de uma informação diz respeito notadamente ao local público ou privado do acontecimento.

 

Neste pesar, eventos ocorridos no interior do domicílio de uma pessoa, por exemplo, não podem ser caracterizados como fatos noticiáveis, quando não está presente a autorização dos envolvidos. Em contrapartida, em princípio, destaque-se que fatos ocorridos em locais públicos são classificados como noticiáveis.

 

E)                       Natureza do fato (Existência de interesse público na divulgação, em tese, da informação).

 

A depender da natureza do fato – se passível ou não de interesse público em sua divulgação -, podem ser noticiáveis certas informações.

 

Em compensação, como bem podemos perceber, hodiernamente, fatos que digam respeito estritamente à vida privada, íntima, de uma pessoa, sem qualquer conotação relevante ou mesmo razoável de um justificável interesse público na sua divulgação, não podem merecer a atenção, em respeito aos direitos fundamentais, em sua difusão.

 

Portanto, só quando em voga o evidente e incontrastável interesse público na divulgação de um fato, será lícito o direito de informação:

 

Há fatos que são notícia, independentemente dos personagens envolvidos. Acontecimentos da natureza (tremor de terra, enchente), acidentes (automobilístico, incêndio, desabamento), assim como crimes em geral, são passíveis de divulgação por seu evidente interesse jornalístico, ainda quando exponham a intimidade, a honra ou imagem de pessoas nele envolvidos. (BARROSO, 2004, pp. 26-27).

 

Outrossim, cabe destacar que, como regra geral, o interesse público na divulgação de qualquer fato verdadeiro se presume, por gravitar a sociedade aberta e pluralista em torno da informação, do conhecimento, dentro de um Estado Democrático de Direito, cabendo ao interessado na não divulgação, demonstrar a existência de um interesse privado que venha a suplantar o interesse público na livre circulação da informação.

 

F)                                   Preferência por sanções a posteriori, que não envolvam a proibição prévia da divulgação.

 

Constituindo-se como um valor fundamental para o funcionamento do Estado Democrático de Direito, e como premissa para o exercício de outros direitos fundamentais, a liberdade de expressão e informação contribui, dentro de uma sociedade aberta e pluralista, para a formação da opinião pública.

 

Neste vetor, deve-se dar preferência, em linhas gerais, por sanções a posteriori, permitindo, assim, a livre divulgação de informações. Assim, acaso constatado o uso abusivo da liberdade de expressão e informação, diversos mecanismos estão previstos no ordenamento jurídico como forma de retificar e reparar o dano causado, como o são o direito de resposta, a retratação, a responsabilização civil e penal e, em última escala, a interdição da divulgação.

 

Deste modo, se não existir reparação capaz de desfazer efetivamente o mal causado pela possível divulgação de uma informação, há de se dar preferência  por sanções a priori, com a proibição prévia da divulgação.

 

Alfim, e com o escólio do art. 20, do Código Civil de 2002, pode ser proibida, como providência inteiramente excepcional, a requerimento do interessado, a divulgação prévia de fatos sobre a pessoa, em circunstâncias capazes de lhe atingir a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, inclusive para fins jornalísticos, averbando, outrossim, a possível divulgação quando presente a autorização da pessoa envolvida, ou quando necessário à administração da justiça ou a manutenção da ordem pública.

 

Atesta, neste contexto, Luís Roberto Barroso, quanto à proibição prévia de informações, que:

 

Seu emprego só será admitido quando seja possível afastar, por motivo grave e insuperável, a presunção constitucional de interesse público que sempre acompanha a liberdade de informação e de expressão, especialmente quando atribuída aos meios de comunicação. Ou seja: ao contrário do que poderia parecer em uma primeira leitura, a divulgação de informações verdadeiras e obtidas licitamente sempre se presume necessária ao bom funcionamento da ordem pública e apenas em casos excepcionais,, que caberá ao intérprete definir diante de fatos reais inquestionáveis, é que se poderá proibi-la. (2004, p. 33).

 

5. DIREITO À PUBLICIDADE.

 

5.1. Bases Gerais.

 

Como bem afirmado pela ilustre professora Raquel Melo Urbano de Carvalho:

 

(…) Historicamente, verifica-se que, na realidade administrativa, é comum que situações sigilosas e dados guardados em segredo estejam ligados a desvios e práticas espúrias. Regimes totalitários como o nazista afastaram a publicidade, assim como inúmeras ditaduras implantadas na América Latina. Tais experiências deixam clara a importância da publicidade no Estado Democrático de Direito, porquanto essencial viabilizar que a sociedade conheça os comportamentos públicos, sejam eles comissivos, sejam eles omissivos (2009, p. 185/186).

 

Não sem razão, significando a adoção de uma nova diretriz para a vida em sociedade, com a quebra dos parâmetros outrora firmados pela Ditadura que se estabeleceu no Brasil entre os anos de 1964 a 1985, o princípio da publicidade encontra-se atualmente consagrado com inegável força normativa no art. 37, caput, da Constituição Federal/1988, em capítulo referente à Administração Pública, senão vejamos:

 

Art. 37 A administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (…).

 

É por intermédio da atividade desenvolvida pelo poder constituinte originário em estabelecer a quebra com o modo governamental anterior, que se pode observar tamanha preocupação em consagrar a publicidade em diversos dispositivos constitucionais, a saber, dentre outros:

 

Art. 5º (omissis)

 

(omissis)

 

XIV – é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;

 

(omissis)

 

XXXIII – todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;

 

XXXIV – são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:

 

a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidades ou abuso de poder;

 

b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse social;

 

(omissis)

 

LX – a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;

 

Art. 93 (omissis)

 

(omissis)

 

IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação  do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;

 

A partir da colação dos artigos supramencionados, podem ser extraídas algumas conclusões.

 

A uma, o direito de petição e as certidões consistem em instrumentos básicos para que seja reclamada a concretização da publicidade (CARVALHO, 2009, p. 186). A propósito, a expedição de certidões é direito disciplinado pela Lei federal 9.501/95.

 

A duas, como acima se pode visualizar, há uma nítida correlação entre o direito à informação e o princípio da publicidade, situação esta muito bem destacada na passagem do voto proferido pelo Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, nos autos da SS 3902/SP, relator Ministro Cezar Peluso, em julgamento realizado em 08/07/2009, vejamos:

 

O princípio da publicidade está ligado ao direito de informação dos cidadãos e ao dever de transparência do Estado, em conexão direta com o princípio democrático.

 

O princípio da publicidade pode ser considerado, inicialmente, como apreensível em duas vertentes: (1) na perspectiva do direito à informação (e de acesso à informação), como garantia de participação e controle social dos cidadãos (a partir das disposições relacionadas no art. 5º, CF/88), bem como (2) na perspectiva da atuação da Administração Pública em sentido amplo (a partir dos princípios determinados no art. 37, caput, e artigos seguintes da CF/88).

 

A Constituição Federal de 1988 é exemplar na determinação de participação cidadã e publicidade dos atos estatais. Destacam-se, por exemplo, o direito de petição e de obtenção de certidões, de garantia do habeas data, de realização de audiências públicas e da regra de publicidade de todos os julgamentos do Poder Judiciário (art. 93, IX, CF/88).

 

Nesse sentido, a Constituição abriu novas perspectivas para o exercício ampliado do controle social da atuação do Estado, com destacada contribuição da imprensa livre, de organizações não-governamentais e da atuação individualizada de cada cidadão.

 

Ao mesmo tempo, os novos processos tecnológicos oportunizaram um aumento gradativo e impressionante da informatização e compartilhamento de informações dos órgãos estatais, que passaram, em grande medida, a serem divulgados na Internet, não só como meio de concretização das determinações constitucionais de publicidade, informação e transparência, mas também como propulsão de maior eficiência administrativa no atendimento aos cidadãos e de diminuição dos custos na prestação de serviços. 

 

A três, pelo exposto, a regra no ordenamento constitucional brasileiro é a publicidade dos atos do Poder Público. Somente em situações excepcionais, devidamente autorizadas pela Constituição, ou por leis infraconstitucionais, é que se admite o sigilo.

 

Neste contexto, o art. 5º, incisos XXXIII, e LXXII, alínea “b”, ambos da Carta da República, autorizam, respectivamente, o sigilo quando imprescindível à segurança da sociedade e do Estado, ou quando solicitada, por meio de processo judicial ou administrativo, a retificação de dados, desde que, neste ultimo caso, prévia e justificadamente seja assim declarado (o sigilo) pela autoridade competente.

 

No mesmo vetor, na seara infraconstitucional, o art. 20, do Código de Processo Penal, dispõe que a autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da coletividade. O art. 155, do Código de Processo Civil, também contém disposição permissiva do sigilo, verbis:

 

Art. 155. Os atos processuais são públicos. Correm, todavia, em segredo de justiça os processos:

 

I – em que o exigir o interesse público;

 

II – que dizem respeito a casamento, filiação, separação dos cônjuges, conversão desta em divórcio, alimentos e guarda de menores.

 

Por oportuno, a publicidade se efetiva pela inserção do ato no jornal oficial, ou por edital afixado no lugar de divulgação de atos públicos, para conhecimento do público em geral e início de produção de seus efeitos. A publicação oficial é exigência da executoriedade  do ato que tenha que produzir efeitos externos. Em alguns casos, a forma de publicidade exigida é a notificação pessoal ao interessado no ato ou a quem o ato beneficia ou prejudica (SILVA, 2009, p. 670).

 

Em outros termos, a publicação, para surtir os efeitos desejados, é a do órgão oficial, que nada mais é do que o jornal, público ou privado, destinado à publicação dos atos estatais (GASPARINI, 2009, p. 12).

 

Neste aspecto, parcela doutrinária denomina a necessidade de divulgação obrigatória dos atos do poder público em órgão oficial como publicidade geral, que visa assegurar o conhecimento, por toda a sociedade, dos comportamentos públicos, consistindo em regra no Direito administrativo atual, só ressalvada quando prevista exceção disposta expressamente por lei específica.

 

A Lei federal 8.666/1993, que contém normas gerais de licitações e contratos administrativos, possui, em seu art. 6º, inciso XIII, definição precisa sobre o que vem a ser entendida como imprensa oficial:

 

Art. 6º Para os fins desta Lei, considera-se:

 

XIII – Imprensa Oficial – veículo oficial de divulgação da Administração Pública, sendo para a União o Diário Oficial da União, e, para os Estados, o Distrito Oficial e os Municípios, o que for definido nas leis respectivas;

 

Importante nota precisa ser destacada, verbis:

 

(...) a publicidade, em princípio, deve ser realizada no órgão oficial encarregado da divulgação das ações daquela entidade administrativa. Se há Diário Oficial do próprio ente público, este é o órgão competente. Se se trata de jornais particulares contratados para tal finalidade, este será o veículo da publicidade geral obrigatório. Não é raro que este regramento esteja estabelecido, de modo expresso, na legislação de cada ente federativo. (CARVALHO, 2009, p. 187). 

 

Acaso a lei não exija, como forma de publicidade, a publicação no órgão oficial, os mesmos efeitos são alcançados mediante a afixação dos atos, contratos, e outros instrumentos jurídicos em quadro de editais, colocado em local de fácil acesso na sede do órgão emanador (GASPARINI, 2009, p. 12).

 

Pertinente sobre este aspecto é a denominada publicidade restrita, que tem como objetivo assegurar que as pessoas diretamente interessadas em determinado ato administrativo tenham dele conhecimento (CARVALHO, 2009, p. 190).

 

A exemplo do que afirmado, poderíamos citar a necessidade de ciência, ao licitante inabilitado em um certame, do ato de sua inabilitação; a ciência, ao particular contratado pela Administração, de uma infração que lhe é imputada  em virtude de um descumprimento contratual; a necessidade de um servidor sofrer punição disciplinar, face o cometimento de uma infração administrativa.

 

Para a efetivação da publicidade restrita, podemos tomar de empréstimo as disposições contidas no art. 26, parágrafos 3º e 4º, da Lei federal 9.784/1999, que dispõem que a intimação pode ser efetivada por ciência no processo, por via postal com aviso de recebimento, por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência do interessado, ou, em se tratando de interessados indeterminados, desconhecidos ou com domicílio indefinido, por meio da publicação oficial.

 

(...) Denota-se, quanto à publicidade restrita, tendência no Direito Administrativo no sentido de exigir ciência pessoal de todo comportamento público potencialmente restritivo da esfera jurídica daquele que se relaciona com a Administração. (CARVALHO, 2009, p. 191).

 

5.2. Conceito.

 

Firmadas estas premissas, podemos trazer à colação definições extraídas da melhor doutrina acerca do que se entende pelo princípio da publicidade.

 

Inocêncio Mártires Coelho, ao tratar sobre o princípio em apreço, afirma:

 

No plano jurídico-formal o princípio da publicidade aponta para a necessidade de que todos os atos administrativos estejam expostos ao público, que se pratiquem à luz do dia, até porque os agentes estatais não atuam para a satisfação de interesses pessoais, nem sequer da própria Administração, que, sabidamente, é apenas um conjunto de pessoas, órgãos, entidades e funções, uma estrutura, enfim, a serviço do interesse público, que, este sim, está acima de quaisquer pessoas (BRANCO; MENDES, COELHO, 2009, p. 685).

 

Ao seu modo, o insigne e festejado mestre Celso Antônio Bandeira de Mello conceitua o princípio da publicidade como sendo:

 

(...) o dever administrativo de manter plena transparência em seus comportamentos. Não pode haver em um Estado Democrático de Direito, no qual o poder reside no povo (art. 1º, parágrafo único, da Constituição), ocultamento aos administrados dos assuntos que a todos interessam, e muito menos em relação aos sujeitos individualmente afetados por alguma medida (2009, p. 114).

 

A publicidade, sob estes termos, torna possível o efetivo controle dos atos praticados pela Administração, assegurando a transparência na gestão da coisa pública, inerente ao regime republicano e a um Estado que se intitula Democrático de Direito.

 

6. CONCLUSÃO.

 

Ao final deste artigo, faz-se necessário sintetizar as principais idéias desenvolvidas, veja-se:

 

Em uma sociedade pluralista como a brasileira, onde diversos setores encontravam-se representados no Poder Constituinte Originário, como ainda se encontram no Poder Reformador, acolhendo normas que promovem interesses e valores divergentes, inevitável a eclosão de conflitos entre as normas da Lei Fundamental.

 

É com a colisão entre direitos de igual hierarquia, como o são os direitos fundamentais, que avulta de importância uma técnica capaz de solucionar a querela posta ao Estado-juiz.

 

A ponderação consiste no método necessário ao equacionamento das colisões entre princípios da Lei Maior, onde se busca alcançar um ponto ótimo, em que a restrição a cada um dos direitos fundamentais envolvidos seja a menor possível, na medida exata à salvaguarda do direito contraposto.

 

A liberdade de expressão e informação deduz-se da liberdade de manifestação do pensamento. Por seu turno, a liberdade de expressão – como a liberdade de buscar, receber e difundir informações, manifestando livremente o próprio pensamento, idéias e opiniões através de qualquer meio de difusão – possui um conteúdo muito mais amplo que o da liberdade de informação, isto por dispensar, aquela (liberdade de expressão), o limite interno da veracidade exigido pelo direito de informar.

 

É por meio dos arts. 5º, e 220, que a nossa Constituição Federal regula, entre diversas disposições normativas, a liberdade de expressão e informação.

 

O direito à informação compreende apenas a divulgação de fatos, dados e qualidades, objetivamente apuradas, ou melhor, o direito a informar, de se informar e de ser informado por qualquer meio de difusão, desde que compatibilizados por limites, tanto internos – veracidade da informação -, quanto externos – compatibilizando-se com os outros direitos fundamentais dos cidadãos afetados pelas opiniões e informações.

 

O direito à informação consiste no conhecimento de atos, de acontecimentos, de situações de interesse geral e particular, de obter certidões, de ter acesso aos registros públicos e de registros relativos à sua própria pessoa.

 

Na tarefa de interpretação e solução de uma possível colisão de direitos fundamentais, temos, como principais parâmetros para a ponderação, quando em pauta o direito e a liberdade à informação: a necessidade da informação estar amparada pela verdade (a veracidade do fato); a licitude do meio empregado na obtenção da informação; a personalidade pública ou estritamente privada da pessoa objeto da notícia; local público ou privado do acontecimento do fato impulsionador da divulgação de uma informação; a natureza do fato, se existe ou não interesse público na divulgação, em tese, da informação.

 

Consistindo em um valor fundamental para o funcionamento de um Estado Democrático de Direito, necessário para a formação da opinião pública, como regra geral, presume-se o interesse público na divulgação de qualquer fato verdadeiro, obtido por meios lícitos, por gravitar a sociedade aberta e pluralista em torno da informação, do conhecimento. Por isso, deve-se dar preferências por sanções a posteriori, que não envolvam a proibição prévia da divulgação de uma informação. 

 

A regra no ordenamento constitucional brasileiro é a publicidade dos atos do poder público. Somente em situações excepcionais, devidamente autorizadas pela constituição, ou por leis infraconstitucionais, é que se admite o sigilo.

 

No plano jurídico-formal o princípio da publicidade aponta para a necessidade de que todos os atos administrativos estejam expostos ao público, até porque os agentes estatais não atuam para a satisfação de interesses pessoais, nem sequer da própria administração, mas a serviço do interesse público. O direito de petição e as certidões consistem em instrumentos básicos para que seja reclamada a concretização da publicidade.

 

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[1] la libertad de información se ejerce a través de la difusión de hechos. Pero no todos los hechos pueden ser objeto de la libertad de información, sino sólo aquellos que tienen transcendencia pública: hechos noticiables. (apud BARROSO, 2004, p. 18).

 

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