A pirataria que vem de fora, via alfândega


Porwilliammoura- Postado em 10 julho 2012

Autores: 
CANNIZZA, Anielle

A pirataria que vem de fora, via alfândega

 

A infração de direitos de propriedade intelectual, através da contrafação de produtos e obras, popularmente conhecida como "pirataria", não é problema novo no Brasil. Mas a abertura de nossa economia para o comércio internacional, com o avanço da globalização mundial, contexto no qual o Brasil também se inseriu, permitindo a entrada de maior quantidade de bens e serviços estrangeiros, fez com que a dificuldade na proteção de direitos de propriedade intelectual no país se tornasse um problema mais perceptível e preocupante.

 

Brasil vem lutando contra esse inimigo, de forma constante, e já avançou bastante nesse objetivo. Temos leis que enfrentam o assunto e estabelecem medidas ou diretrizes no sentido de solucionar o problema.

 

Nossa Lei de Propriedade Industrial - LPI (Lei 9.279/96), por exemplo, dispõe, em seu artigo 198, sobre a possibilidade de apreensão, pelas autoridades alfandegárias, no ato de conferência, de produtos assinalados por marcas falsificadas, alteradas ou imitadas ou que apresentem falsa indicação de procedência.

 

Notificação ao Titular

Já o Decreto n. 4.543/2002, com as modificações introduzidas pelo Decreto

n. 4.765/2003, em sua Seção III (Dos Produtos com Marca Falsificada), traça a mesma possibilidade de apreensão prevista pela LPI, mas inclui dispositivos sobre a notificação do titular dos direitos infringidos, dando ciência da apreensão e permitindo que ele tome providências na esferajudicial, dentro de determinado prazo preestabelecido, sob pena de liberação das mercadorias apreendidas.

 

O Decreto acima mencionado também contém uma Seção IV (Dos Fonogramas, dos Livros e das Obras Audiovisuais), que estendem a aplicação dos dispositivos da Seção III às obras nela especificadas.

 

Além disso, convenções internacionais como a Convenção da União de Paris, cuja última revisão foi incorporada ao nosso ordenamento jurídico pelo Decreto Presidencial n. 75.572/1975 e o Trade Related Intellectual Property Rights Agreement - TRIPS, negociado no âmbito da Organização Mundial do Comércio - OMC, e promulgado no Brasil pelo Decreto Presidencial n. 1.355/1994, traçam diretrizes a serem adotadas nacionalmente pelos respectivos membros no tratamento da matéria.

 

O TRIPS, aliás, é o único destes instrumentos que prevê medidas de fronteira para a proteção de todo tipo de propriedade intelectual, como de patentes, desenhos industriais, segredos de negócio, dentre outros, sem limitá-las à proteção de marcas e obras protegidas pelo direito autoral.

 

Por fim, as Instruções Normativas n. 52/2001, 111/1998 e 206/2002 e Portaria

n. 555/2002 da Secretaria da Receita Federal também colaboram para a formação de um contexto regulamentador da matéria. Tais normativas não tratam especificamente de medidas de repressão a infrações de propriedade intelectual, mas prevêem procedimentos a serem adotados pelas autoridades aduaneiras envolvendo o controle das mercadorias importadas sob suspeita de irregularidade e a destinação a ser dada a tais mercadorias.

 

Normas com Pouca Clareza

 

Contudo, nossas leis e normas administrativas ainda são pouco claras em relação aos direitos protegidos e aos procedimentos que devem ser efetivamente adotados pela Alfândega. As normas existentes já permitem que advogados trabalhem na sua interpretação e aplicação conjunta para fazer valer os direitos de propriedade intelectual de seus clientes. No entanto, a falta de clareza e sistematização dessas normas muitas vezes dificulta o trabalho de nossas autoridades alfandegárias, que se sentem legalmente desarmadas para tomarem, de ofício, providências mais enérgicas no combate à pirataria nas áreas de fronteira.

 

Os profissionais da área de propriedade intelectual vêm se dedicando à implementação de medidas mais efetivas contra a entrada de produtos piratas no Brasil, seja por meio de um esforço de conscientização de nossas autoridades alfandegárias, seja pelo estudo e elaboração de projetos que visem aprimorar nossa legislação sobre o assunto, inclusive com base em experiências internacionais.

 

Em recente palestra ministrada no XXIV Seminário Nacional da Propriedade Intelectual, organizado pela Associação Brasileira da Propriedade Intelectual - ABPI, que teve lugar em Brasília, de 16 a 18 de agosto do corrente ano, o Coordenador-Geral de Administração Aduaneira (Coana), Sr. Ronaldo Medina, apresentou de forma bastante positiva as medidas que já estão sendo planejadas e algumas até adotadas pela Receita Federal no sentido de aprimorar os procedimentos de fiscalização e controle das mercadorias que trafegam pela nossa aduana. A Receita Federal está se dedicando à informatização de seus bancos de dados sobre os produtos que cruzam nossas fronteiras, inclusive negociando o compartilhamento destes bancos de dados com países com os quais o Brasil se relaciona comercialmente.

 

Além disso, a Receita Federal tem projetos bastante interessantes no sentido de aprimorar nosso sistema aduaneiro com vistas a combater a pirataria, o contrabando e o descaminho de produtos. O contraste entre os valores que precisam ser investidos e o retorno previsto pela Receita Federal, seja pela arrecadação de impostos, seja pela atração de investimentos, são realmente surpreendentes e encorajadores. No entanto, toda essa iniciativa e empenho no reforço de nosso sistema de controle aduaneiro esbarra, invariavelmente, na falta de verbas direcionadas à Receita Federal pelo Poder Executivo. Faltam recursos humanos e materiais.

 

Mas melhorias podem ser alcançadas e é nesse sentido que os profissionais que militam na área de propriedade intelectual continuarão a trabalhar. Há uma comissão de estudos para repressão às infrações formada no seio da ABPI que vem estudando especificamente o assunto de medidas de fronteira para o combate à pirataria. No momento, o objetivo é criar procedimentos a serem adotados, no âmbito da própria aduana, para facilitar a identificação de mercadorias ilícitas, o contraditório entre os interessados e a efetividade do sistema de repressão às infrações na esfera administrativa.