PREVIC: suas atribuições e limitações relativas à mudança de modelo remuneratório de diretores de empresas patrocinadoras de planos de benefícios previdenciários


Porrayanesantos- Postado em 25 junho 2013

Autores: 
MARTINS, Antonio Carlos Soares

1.  O artigo presente tem a intenção de as atribuições institucionais da Superintendência Nacional de Previdência Complementar – PREVIC e suas limitações, quanto à eventual mudança de modelo remuneratório de diretores de empresas patrocinadoras de planos de benefícios previdenciários.

 

2. Em que pese eu defender o entendimento de que a PREVIC não tem competência legal para intrometer-se em assuntos relacionados à gestão de Empresa Patrocinadora de Plano de Benefícios Previdenciários, deve-se ressaltar e reafirmar as suas competências legais, voltadas a supervisionar, fiscalizar e controlar os planos de benefícios e as entidades fechadas de previdência complementar, conforme disposto nas Leis Complementares nº 108[1] e nº 109[2], ambas de 2001, e na Lei nº 12.154, de 23 de dezembro de 2009:

 

“Art. 2o  Compete à Previc:

 

I - proceder à fiscalização das atividades das entidades fechadas de previdência complementar e de suas operações;

 

...

 

IV - autorizar:

 

a) a constituição e o funcionamento das entidades fechadas de previdência complementar, bem como a aplicação dos respectivos estatutos e regulamentos de planos de benefícios;

 

...

 

V - harmonizar as atividades das entidades fechadas de previdência complementar com as normas e políticas estabelecidas para o segmento;” – grifei.

 

3. A sistemática legal adotada no art. 5º da Lei Complementar nº 109, de 2001, atribui ao Conselho Nacional de Previdência Complementar - CNPC a regulação do regime de previdência complementar, ao passo que reserva à PREVIC a responsabilidade pela fiscalização:

 

“Art. 5o A normatização, coordenação, supervisão, fiscalização e controle das atividades das entidades de previdência complementar serão realizados por órgão ou órgãos regulador efiscalizador, conforme disposto em lei, observado o disposto no inciso VI do art. 84 da Constituição Federal.” – grifei.

 

4. A PREVIC, incorporando o Estado, deve exercer a fiscalização pautada pelos preceitos insertos na Lei Complementar nº 109, de 2001, tendo sempre em vista o comando presente no art. 202 da Constituição Federal de 1988, que exige o perfeito equilíbrio entre custeio e os benefícios contratados, vejamos:

 

“Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)” – grifei.

 

5.  Para tanto, a PREVIC deve expedir instruções e estabelecer procedimentos para a aplicação das normas relativas à sua área de competência, de acordo com as diretrizes do CNPC[3], em cujas atribuições inserem-se a de fixar padrões adequados de segurança atuarial e econômico-financeira, para preservação da liquidez e solvência dos planos de benefícios.

 

6.  Desse modo, são as balizas legais e normativas que permitem que a PREVIC possa nortear a fiscalização e controle dos planos de benefícios e das entidades fechadas de previdência complementar. A propósito, noart. 3º da Lei Complementar nº 109, de 2001, encontram-se dispostos alguns valores de fundamental importância que, caso menosprezados, implicam o exercício do poder de polícia da PREVIC:

 

“Art. 3o A ação do Estado será exercida com o objetivo de:

 

...

 

III - determinar padrões mínimos de segurança econômico-financeira e atuarial, com fins específicos de preservar a liquidez, a solvência e o equilíbrio dos planos de benefícios, isoladamente, e de cada entidade de previdência complementar, no conjunto de suas atividades;

 

..

 

VI - proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios.” – grifei.

 

7. A ação fiscalizadora necessita, essencialmente, conter eventuais interesses particulares (grupo de participantes) em confronto com o interesse da coletividade de participantes e assistidos. Nesse aspecto, cumpre à PREVIC o exercíco de seu poder para limitar e disciplinar direitos, em benefício da coletividade; em última análise, em favor do interesse público.

 

8. No caso em tela, a atuação fiscalizadora da PREVIC deve voltar-se para os planos de benefícios da Entidade Fechada de Previdência Complementar – EFPC que podem ser afetados pela mudança do modelo remuneratório dos dirigentes da Empresa Patrocinadora. Nos termos do art. 7º[4] da Lei Complementar nº 109, de 2001, essesplanos de benefícios atenderão a padrões mínimos fixados pelo órgão regulador e fiscalizador, com o objetivo de assegurar transparência, solvência, liquidez e equilíbrio econômico-financeiro e atuarial.      

 

9. Contudo, como o próprio poder estatal também encontra limites, entendo que a PREVIC deve adotar os padrões mínimos do art. 7º da Lei Complementar nº 109, de 2001, para esse fim. São esses os aspectos que devem nortear a atuação estatal da PREVIC, legitimando eventuais determinações à EFPC no sentido da adequação dos planos de benefícios afetados por eventual mudança do modelo remuneratório dos dirigentes da Empresa Patrocinadora de Planos de Benefícios Previdenciários.

 

10. Em razão disso, entendo que incumbiria à PREVIC, no exercício de suas atribuições legais, determinar, se entender necessárias, as medidas a serem adotadas visando eventuais correções para a manutenção da higidez do Plano de Benefício potencialmente afetado. E é nesse sentido que entendo devam as competências da PREVIC ser exercidas, com base na avaliação das consequências da mudança do modelo remuneratório dos dirigentes da Empresa Patrocinadora de Planos de Benefícios Previdenciários em relação às regras constantes no Regulamento dos Planos de Benefícios. 

 

11. Em que pese a legitimidade de Conselho Diretor da Empresa Patrocinadora de Planos de Benefícios Previdenciários para decidir acerca das questões remuneratórias de seus dirigentes e, que, em relação a isso não cabe a interferência da PREVIC, nada obsta que a PREVIC venha a determinar a adoção de um limite remuneratório para fins de cálculo do salário de participação, para eventualmente assegurar, se necessário for, a solvência, liquidez e equilíbrio econômico-financeiro e atuarial dos planos de benefícios, protegendo os interesses dos seus participantes e assistidos. Encontramos, aí, os motivos que autorizariam a promoção de eventuais medidas em face da EFPC.

 

12. Para isso, a PREVIC deve avaliar o Regulamento do Plano de Benefício levando-se em conta todas as suas peculiaridades e tudo mais que puder afetar a higidez do Plano. Nesse sentido, vale destacar o que dispõe o art. 18 da Lei Complementar nº 109, de 2001:

 

“Art. 18. O plano de custeio, com periodicidade mínima anual, estabelecerá o nível de contribuição necessário à constituição das reservas garantidoras de benefícios, fundos, provisões e à cobertura das demais despesas, em conformidade com os critérios fixados pelo órgão regulador e fiscalizador.

 

...

 

§ 2o Observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, o cálculo das reservas técnicas atenderá às peculiaridades de cada plano de benefícios e deverá estar expresso em nota técnica atuarial, de apresentação obrigatória, incluindo as hipóteses utilizadas, que deverão guardar relação com as características da massa e da atividade desenvolvida pelo patrocinador ou instituidor.

 

§ 3o As reservas técnicas, provisões e fundos de cada plano de benefícios e os exigíveis a qualquer título deverão atender permanentemente à cobertura integral dos compromissos assumidos pelo plano de benefíciosressalvadas excepcionalidades definidas pelo órgão regulador e fiscalizador.” – grifei.

 

13. Concluída a avaliação do Regulamento, e mesmo que o Conselho Diretor da Empresa Patrocinadora de Planos de Benefícios Previdenciários, dentro da sua margem de discricionariedade, possa até entender que não é necessária a implementação de um teto remuneratório para fins de cálculo do salário de participação, a PREVIC poderá determinar à respectiva EFPC a adoção de medidas de preservação do equilíbrio atuarial do plano, bastando demonstrar tecnicamente, se for o caso, estar em risco a solvência, liquidez e equilíbrio econômico-financeiro e atuarial dos planos de benefícios. Isso justificaria o exercício do poder implícito às atribuições de fiscalização e controle legalmente conferidos à PREVIC.

 

14. Nesse caso não se aplica o disposto no art. 13 da Lei Complementar 108, de 2001[5], que disciplina as relações da EFPC com o Patrocinador. Aplica-se, sim, o art. 18 da Lei Complementar 109, de 2001 (transcrito acima), em função de uma competência atribuída à PREVIC transcendente à relação Patrocinador e EFPC e não se submete, como a EFPC, à aprovação de alterações pelo Patrocinador, pois a lei outorga-lhe poderes que vão além dessa relação, na esteira do comando constitucional (art. 202 da CF/88) que determina que a previdência complementar baseie-se na constituição de reservas que garantam o benefício contratado.

 

15. Desse modo, embora não possa interferir nas decisões da Empresa Patrocinadora de Planos de Benefícios Previdenciários, a PREVIC, pelo poder implícito às atribuições de fiscalização e controle, pode determinar que a PREVI promova adequações eventualmente necessárias do regulamento do plano de benefício. Afinal, não fosse assim, haveria uma subversão do sistema legal, fazendo com que as determinações do órgão fiscalizador e de controle tivessem de ser submetidas à aprovação do patrocinador, e tornando inócuo o seu poder fiscalizatório; não se pode esquecer, também, que a aprovação final de alterações de planos de benefícios compete à PREVIC, nos termos que dispõe o art. 17 da Lei Complementar 109, de 2001:

 

“Art. 17. As alterações processadas nos regulamentos dos planos aplicam-se a todos os participantes das entidades fechadas, a partir de sua aprovação pelo órgão regulador e fiscalizadorobservado o direito acumulado de cada participante.

 

Parágrafo único. Ao participante que tenha cumprido os requisitos para obtenção dos benefícios previstos no plano é assegurada a aplicação das disposições regulamentares vigentes na data em que se tornou elegível a um benefício de aposentadoria.” – grifei.

 

16. Desse modo, não se pode admitir que a PREVIC, ao identificar problemas que possam colocar em risco o equilíbrio atuarial do plano de benefícios e principalmente de seus participantes, tenha as suas determinações condicionadas à aprovação dos patrocinadores. Nesse ponto, inclusive, destaque-se que a atuação da PREVIC deve ser ágil, haja vista os direitos previstos no art. 17 da Lei Complementar 109, de 2001, acima transcrito. Como dito alhures, a PREVIC, incorporando parcela de poder do Estado, e nessa qualidade, deve zelar pela segurança da sociedade (por meio da competência legal[6] de zelar pelas EFPC).

 

17. Sua atuação deve estar pautada em prevenir e, excepcionalmente, remediar, a ocorrência de situações que possam atingir negativamente o equilíbrio atuarial dos planos de benefícios, acompanhando de perto a gestão das EFPC e procurando evitar surpresas indesejáveis, pois são nefastas para a vida das pessoas. No limite, inclusive, intervir[7] na EFPC. Vale relembrar o cediço brocardo: “quem pode o mais, pode o menos”. Por isso, entendo haver base constitucional e legal suficientes para que a PREVIC, apontando um risco sistêmico e um desequilíbrio entre custeio e benefícios a serem concedidos, determine as pertinentes adequações do plano de benefícios, conforme exposto até aqui.

 

Notas:

[1] “Art. 24. A fiscalização e controle dos planos de benefícios e das entidades fechadas de previdência complementar de que trata esta Lei Complementar competem ao órgão regulador e fiscalizador das entidades fechadas de previdência complementar.” – grifei. 

[2] “Art. 33. Dependerão de prévia e expressa autorização do órgão regulador e fiscalizador:

I - a constituição e o funcionamento da entidade fechada, bem como a aplicação dos respectivos estatutos, dos regulamentos dos planos de benefícios e suas alterações;” – grifei.

[3] “Art. 29. Compete ao órgão regulador, entre outras atribuições que lhe forem conferidas por lei:

 I - fixar padrões adequados de segurança atuarial e econômico-financeira, para preservação da liquidez e solvência dos planos de benefícios, isoladamente, e de cada entidade aberta, no conjunto de suas atividades;”

[4] Art. 7o Os planos de benefícios atenderão a padrões mínimos fixados pelo órgão regulador e fiscalizador, com o objetivo de assegurar transparência, solvência, liquidez e equilíbrio econômico-financeiro e atuarial.

[5] Art. 13. Ao conselho deliberativo compete a definição das seguintes matérias:

... 

II – alteração de estatuto e regulamentos dos planos de benefícios, bem como a implantação e a extinção deles e a retirada de patrocinador;

...

Parágrafo único. A definição das matérias previstas no inciso II deverá ser aprovada pelo patrocinador

[6] Lei Complementar nº 109, de 2001:

“Art. 72. Compete privativamente ao órgão regulador e fiscalizador das entidades fechadas zelar pelas sociedades civis e fundações, como definido no art. 31 desta Lei Complementar, não se aplicando a estas o disposto nos arts. 26 e 30 do Código Civil e 1.200 a 1.204 do Código de Processo Civil e demais disposições em contrário.”

[7] Lei Complementar nº 109, de 2001:

“Art. 42. O órgão regulador e fiscalizador poderá, em relação às entidades fechadas, nomear administrador especial, a expensas da entidade, com poderes próprios de intervenção e de liquidação extrajudicial, com o objetivo de sanear plano de benefícios específico, caso seja constatada na sua administração e execução alguma das hipóteses previstas nos arts. 44 e 48 desta Lei Complementar.”

 

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