Requisitos para concessão de imunidade tributária ao 3º Setor


PorJeison- Postado em 24 setembro 2012

Autores: 
BORTOLOTTO, Luiz Ricardo.

 

INTRODUÇÃO

ASSOCIAÇÃO CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS solicita concessão de imunidade tributária, fulcro no permissivo constitucional do art. 150, VI, alínea "c"[1], combinado com o Código Tributário Nacional, art. 14. Quais os requisitos legais para a Autoridade Fazendária reconhecer e conceder este benefício:

            Colaciona-se inicialmente doutrina de MACHADO acerca da matéria:

São também imunes as instituições de educação ou de assistência social, sem fins lucrativos. Aqui o constituinte restringiu, também, exageradamente, o alcance que deveria ter a regra imunizante. As instituições de educação deviam ser imunes incondicionalmente. A importância social da atividade de educação o exige. Da mesma forma que são imunes os livros, jornais e periódicos, sem qualquer perquirição a respeito de saber se quem os produz tem ou não finalidade lucrativa, e sabido, como é, que as editoras não são casas de filantropia, também a atividade de educação deveria ser imune. Se assim fosse, certamente não estaríamos presenciando a crise da escola, cujos administradores já não se podem ocupar das questões educacionais, pois são mais prementes as questões policiais, as ameaças de prisão e até as prisões consumadas, em face das intermináveis querelas com os pais de alunos em torno do valor das mensalidades escolares. Sendo a atividade educacional, como inegavelmente é, socialmente tão importante, sua prática deveria ser estimulada, até porque isto certamente atrairia um maior número de pessoas para o seu desempenho, aliviando a pressão decorrente da grande demanda e da insuficiente oferta de vagas nas escolas.

A imunidade das instituições de educação e de assistência social, todavia, é condicionada. Só existe para aquelas instituições sem fins lucrativos, conceito que também tem sido muito mal compreendido. A lei não pode acrescentar requisitos a serem atendidos. Basta que não tenham fins lucrativos. É razoável, todavia, entender-se que o não ter finalidade lucrativa pode traduzir-se no atendimento dos requisitos do art. 14 do Código Tributário Nacional, a saber:

a) não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas a qualquer título;

b) aplicarem integralmente no País os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;

c) manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.

Não ter fins lucrativos não significa, de modo nenhum, ter receitas limitadas aos custos operacionais. Elas na verdade podem e devem ter sobras financeiras, até para que possam progredir, modernizando e ampliando suas instalações. O que não podem é distribuir lucros. São obrigadas a aplicar todas as suas disponibilidades na manutenção dos seus objetivos institucionais.

prossegue:

O meio para comprovar o cumprimento dessas exigências legais é a escrituração contábil. Daí a exigência do inciso III do art. 14 do CTN, de cunho meramente instrumental.

Os requisitos estabelecidos no CTN para o gozo da imunidade em foco são todos de atendimento continuado. Se a qualquer época deixam de ser observados, a autoridade competente pode suspender a aplicação do benefício (CTN, art. 14, § 1º).

Destaque-se que a imunidade em estudo se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços, mas estes são, exclusivamente, os diretamente relacionados com os objetivos institucionais da entidade imune, previstos nos respectivos estatutos ou atos constitutivos (CTN, art. 14, § 2º). [2] (Grifou-se)

A Carta Magna é solene, desde o seu preâmbulo, ao afirmar que a busca pelo bem estar de todos os brasileiros deve ser objetivo tanto dos órgãos públicos como pelos particulares, em cooperação com aqueles:

"Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil."

"Em estrita consonância, logo adiante, no artigo 1º, os fundamentos da República refletem, de modo claro, que os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, a cidadania, o pluralismo político, a soberania e a cidadania revestirão a busca dos postulados do preâmbulo, afirmando que os objetivos da República serão os de construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação."[3]

A partir disso pode-se dividir os entes que buscam a satisfação dos anseios comuns em: públicos (geridos e financiados com dinheiro público); privados (geridos e financiados com recursos particulares) e, finalmente, aqueles entes que não são públicos, tampouco privados, os quais convencionou-se chamar de terceiro setor. Estes podem, em regime de cooperação com o poder público, prestar, entre outros, serviços de educação e assistência social em nome do Estado.

Estas atividades do terceiro setor brasileiro movimentam um respeitável volume de recursos. No exercício de 2000 o "dispêndio social das 400 maiores entidades foi de R$ 1.971.000,00 (um bilhão, novecentos e setenta e um milhões de reais). Ao todo, elas possuem 86.894 funcionários, 400.933 voluntários."[4]

Este volume de dinheiro não passa despercebido pelo Fisco, em seu mister de carrear recursos aos cofres públicos para consecução dos objetivos constitucionais de busca do bem comum, esbarrando nas limitações ao poder de tributar, as quais a própria Constituição impõe aos agentes fiscais. Se assim não fosse, grande número dos serviços prestados pelo terceiro setor poderia ser prejudicado. 

O ponto nuclear, para o deferimento do pedido de imunidade, centra-se na demonstração de que a requerente possui os requisitos que a qualificam como instituição de assistência social sem fins lucrativos. Deverá, inicialmente, demonstrar que foi constituída sob esta denominação e que assim é reconhecida, mediante apresentação de Certidão de Entidade de Ação Social, expedida pelo Conselho Nacional de Ação Social. A partir disso será entendida a situação da requerente, desde já, para fins da abrangência dos dispositivos legais retrocitados, como de assistência social, em sentido estrito.

Os referidos preceptivos constitucionais autorizam a Fazenda Pública a não tributar instituições que atendam aos "requisitos da lei", excepcionando a previsão de lei complementar para a espécie. Referindo-se apenas à "lei", sem qualificação, cogita o legislador tratar-se de lei ordinária. Neste sentido a Lei 8.742/93 (que dispõe sobre a organização da Assistência Social no âmbito da União), cumpre o desejo constitucional escrito no art. 150, VI, alínea "c", estabelecendo os requisitos para que instituições de assistência social sejam assim consideradas, ao mesmo tempo em que instituiu o SUAS (Sistema Único de Assistência Social), como órgão deliberativo do setor, vinculado ao Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Para os fins da referida lei, à luz do seu artigo 3º[5], cujos critérios distintivos definirão a requerente como entidade de Ação Social.

Parte da doutrina, entretanto, é dissonante. Paulo de Barros Carvalho, p.e., não reconhece a constitucionalidade de lei ordinária, que estabeleça requisitos para concessão do benefício da imunidade. Para ele somente lei complementar poderia fazê-lo, homenageando o art. 146, II[6], da Constituição da República. Opina o doutrinador:

"... cristalina a evidência que a lei a que se reporta o comando constitucional (art. 150, VI, "c") é a complementar, mais precisamente aquela prevista no art. 146, II, da CF. E o Código Tributário Nacional, extraindo com acerto o autêntico teor de sua competência, oferece, no art. 14, os pressupostos para o implemento do desígnio do constituinte."  

O notório descompasso entre as garantias legais e a realidade social brasileira estimulam parcerias entre o Poder Público e as entidades do terceiro setor para enfrentar os tremendos desafios que se impõe aos entes federativos. Antes, portanto, de analisar a questão sob o viés puramente tributário, há que se situar a questão sob a ótica de todo o ordenamento jurídico, buscando-se garantir os direitos sociais insculpidos em nossa Carta Magna. Essa deverá ser a bússola norteadora da atuação dos entes públicos, atentando para o fim último a que se propõe o Estado: satisfazer as necessidades dos seus administrados. Mostra-se injusto tributar aquele que auxilia o Estado, ou até mesmo o substitui, no atendimento de serviços de interesse coletivo, como o fazem a maioria das pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos, pois, o objetivo do tributo é justamente o de viabilizar a prestação de tais serviços.

[1] "Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

VI – Instituir impostos sobre:

c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;"

[2] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31 ed. Malheiros: São Paulo, 2010 p.305 e 306.

[3] DELGADO, José Augusto. Reflexões sobre o sistema tributário aplicado ao terceiro setor. Revista Fórum de Direito Tributário – RFDT, Belo Horizonte, ano 3, n.17, p. 2-4.

[4] <> Acesso em 04.06.2005.

[5] Consideram-se entidades e organizações de assistência social aquelas sem fins lucrativos que, isolada ou cumulativamente, prestam atendimento e assessoramento aos beneficiários abrangidos por esta Lei, bem como as que atuam na defesa e garantia de direitos.

[6] "Art. 146. Cabe à lei complementar:

(...)

II – regular os limitações ao poder de tributar."

 

Disponível: http://www.artigonal.com/direito-tributario-artigos/requisitos-para-conc...