Restrição Cadastral Interna: Ardil ilegal e passível de Ação por Danos Morais


Porwilliammoura- Postado em 07 março 2012

Autores: 
SILVA, José Mário Araújo da

Restrição Cadastral Interna: Ardil ilegal e passível de Ação por Danos Morais

A Constituição Federal de 1988 instituiu um parâmetro novo nas relações de consumo do Brasil: o Código de Defesa do Consumidor  que estabeleceu, ao mesmo tempo e entre inúmeras outras coisas, os direitos e obrigações do tomador de serviços financeiros e das instituições de crédito e financiamento.

(você pode baixar o Código de Defesa do Consumidor clicando aqui -> Código_Defesa_Consumidor))  

 Vejamos o que diz Constituição de 1988 (baixe clicando em Constituição_Federal_1988) , em seu artigo 5º:

 X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

 Paralelamente, no Código de Defesa do Consumidor (artigo 43) lê-se:

§ 4º - Os bancos de dados e cadastros relativos a consumidores, os serviços de proteção ao crédito e congêneres são considerados entidades de caráter público.

Mas ao mesmo tempo que a legislação protege os abusos contra o consumidor, ela também define suas responsabilidades, permitindo a inclusão do nome dos devedores inadimplentes em cadastros restritivos como SERASA e SPC, impedindo-o de tomar novos empréstimos, enquanto não saldar as dívidas existentes.

Enquanto seus débitos não forem quitados, ele permanece no cadastro de devedores, ficando com o "nome sujo".

O dinheiro perdido pelo banco (o valor que deixou de ser pago pelo consumidor inadimplente), na verdade não se torna um prejuízo definitivo: as perdas são repassadas para os novos tomadores de empréstimos, sendo então embutidas nas taxas de contratação futuras que estes irão pagar.

Na prática, o agente financeiro nada perde – quem paga a conta é o consumidor que futuramente contratar um empréstimo...

A punição que o consumidor inadimplente teria, por Lei, seria ficar 5 anos com o nome negativado nos serviços de proteção ao crédito oficiais, o que corresponderia à restrição à liberdade de um criminoso em uma cela – ele teria sua liberdade restringida, a título de punição social.

Mas nos últimos anos os bancos têm aparecido com um novo ardil para recuperarem esses ativos (que na verdade nunca foram perdidos, conforme explicado e que portanto não lhes pertencem): a restrição cadastral interna.

Mas o que é essa tal restrição interna?

Vejamos um exemplo:

Um consumidor ultrapassa o limite de seu cheque especial, de R$ 10.000,00, em R$ 1.000,00 e não consegue saldar os R$ 11.000,00 devidos.

Seu nome é inscrito nos órgão de proteção ao crédito e seu nome recebe restrições.

Após inúmeras tentativas, ele percebe que sua dívida tornou-se impagável, pois, dois anos depois, ela estava em R$ 44.880,00, devido à incidência de juros e taxa de comissão de permanência.

Com o intuito de usar-se da condição de restrição do cliente e sua vontade de "limpar seu nome", o banco oferece ao consumidor inadimplente um desconto enorme sobre o montante devido com juros (absolutamente ilegais e abusivos), para que quite a divida e saia do cadastro de devedores. Digamos que o banco lhe ofereça um desconto de 90%, cobrando apenas R$ 4.488,00 pela dívida original de R$ 11.000,00 (já paga pelos outros consumidores nas contratações de crédito posteriores).

O consumidor então, depois de quitar essa dívida pelo valor oferecido pelo banco, percebe que seu nome sai dos serviços de proteção ao crédito e pensa que o banco vai novamente conceder-lhe a conta corrente e os produtos que tinha antes da dívida, mas percebe que nada disso lhe será concedido, pois seu nome ficou com uma "restrição cadastral interna".

Desse modo, o banco "aparentemente" cumpriu a Lei, retirando o nome do consumidor do cadastro de maus pagadores. Mas verdade nada fez, perceba:

Com a fusão dos bancos e o aparecimento dos conglomerados bancários, um cliente que tinha conta, por exemplo, no ABN AMRO BANK, e caísse nesse ardil, ficaria com uma restrição interna nele (em sua base de dados), nada obtendo desse banco.

Mas ao mesmo tempo seu nome iria receber restrições em outras instituições controladas pelo banco que adquiriu o ABN AMRO BANK, o SANTANDER, que comprou esse banco, e também BANESPA - SUDAMERIS - AMERICA DO SUL e BANCO REAL, pois seu nome iria permanecer nas bases de dados de todos eles. Caso procurasse qualquer agência dos bancos mencionados, passaria o constrangimento de ser recusado, muito embora tivesse aceitado ao acordo proposto pelo banco de origem...

O mesmo se daria com um cliente do Bradesco, por exemplo, que não poderia movimentar uma conta no próprio Bradesco, e seria recusado igualmente nos bancos BILBAO VIZCAYA - BMC - BOAVISTA - MERCANTIL FINASA – BANCO IBI (C&A) – BCN – CREDIREAL - BANEB - BEA – BANCO BOAVISTA e BANCO CONTINENTAL, conforme a época em que esse acordo tivesse sido feito.

A restrição interna não leva em conta dados dos órgãos de proteção ao crédito oficiais e, na prática, pune o consumidor indefinidamente (e não mais por 5 anos), como determina a Lei. Seria como instituir-se prisão perpétua para todos os delitos cometidos pelos cidadãos, tanto para o assassino contumaz quanto para o faminto que furtasse, pela primeira vez em sua vida, uma fruta em um supermercado.

Instituições financeiras funcionam sujeitas a normas governamentais, por serem concessionárias de serviço público e deveriam vender seus produtos financeiros (conta corrente, seguros, empréstimos etc.) dentro de determinadas regras, previstas em Lei.

O Código de Defesa do Consumidor, nos artigo 39 diz:

É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços:

II - recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes;

IX - recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de interdição regulados em leis especiais;

E no artigo 51:

IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;

Neste caso, primeiro a dívida é ampliada até tornar-se impagável, para daí fazer-se uma proposta de quitação que na verdade não quita nada (pois a restrição permanecerá ativa). E o empréstimo original, por sua vez, é pago duas vezes (uma vez ao ser incorporado à taxa de contratações futuras e uma segunda vez pelo proclamado "acordo").

Dessa forma, ao consumidor restam apenas duas opções: ou quita a dívida com os juros abusivos embutidos nela ou permanece para sempre na lista de maus pagadores da instituição.

Além dessas prerrogativas legais, a Resolução BACEN 1.682/90, (é o BACEN o órgão que regulamenta as instituições financeiras de forma específica), determina que "a abertura, movimentação de conta e fornecimento de talonários de cheques ao correntista SÓ PODEM SER VEDADOS quando este figurar no cadastro de emitentes de cheques sem fundos"

Desse modo, a tal "restrição cadastral interna" fere a Lei, na medida em que recusa a abertura, movimentação da conta e demais serviços bancários a quem esteja nessa tal lista interna (e não no CCF, como determina a Lei). Os bancos criam uma regra própria, ignorando a Lei e escolhendo, a seu bel prazer, quem será ou não seu cliente, parecendo esquecerem de que são "concessões de serviços públicos" e nada mais... O cliente é adjetivado unilateralmente, então, e por critérios que fogem ao controle da sociedade, como "indigno de confiança". Quê poder imenso os bancos concederam a si mesmos!

De fato, a "restrição cadastral interna", ao mesmo tempo que desobedece a legislação em vigor, implementa discriminação e restringe o acesso aos serviços bancários mesmo daqueles que "cumpriram o acordo firmado" e proposto pelo próprio agente financeiro, configurando "prática abusiva e desproporcional", como é condenado pelo CDC.

Sem contar que o consumidor, após cair nesse ardil, nada pode fazer para reverter esse quadro, ficando totalmente à mercê da vontade do banco, que se nega a fornecer o serviço público do qual é concessionário, em flagrante quebra de obrigação contratual entre ele o seu órgão regulador, o BACEN. Desse modo, os bancos criam seus próprios órgãos internos de restrição ao crédito e ignoram os oficiais...

Vejamos o que diz a Lei:

 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

SEÇÃO II - DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS

Art. 51 - São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais  relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

(...)

IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;

Como colocamos no início do presente artigo, o artigo 5º da Constituição Federal, a Lei maior do país, em seu artigo X diz:

"são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação"

Assim, fica evidente que a "restrição cadastral interna" viola a moral e imagem pública da pessoa", mesmo tendo essa aceitado a acordo para adimplemento de seus débitos, sem contar, ao mesmo tempo, em "listagens internas" o aparecimento de clientes com dívidas que prescreveram e não são mais passíveis de cobrança por qualquer meio... Vejamos o que diz sobre esse particular o CDC em seu artigo 5º:

§ 5º - Consumada a prescrição relativa à cobrança de débitos do consumidor, não serão fornecidas, pelos  respectivos  Sistemas  de  Proteção  ao  Crédito,  quaisquer  informações  que possam impedir ou dificultar novo acesso ao crédito junto aos fornecedores.

E, como diz a Lei, todos se encontrem nas tais "listas cadastrais internas" fazem juz a indenização.

Que a sociedade brasileira como um todo tome conhecimento de seu direito e que essas Ações por Danos Morais se multipliquem por todo o país, porque apenas assim, feridos em seu bem moral maior, o dinheiro, os agentes financeiros inescrupulosos vejam ver erradicada essa prática, por inviável economicamente, e tomem por força da aplicação da Lei os caminhos da decência e legalidade...