Direitos Reais na Coisa Alheia - Servidão Predial


PorViviane Santos ...- Postado em 16 novembro 2011

Autores: 
Menezez, Rafael de

Rafael de Menezes

Reais na Coisa Alheia

 

SERVIDÃO PREDIAL

 

Servidão vem de “servitus”, que significa escravidão, submissão. E prédio em direito não significa edifício, mas sim imóvel, edificado ou não. De modo que em linguagem jurídica uma fazenda, uma casa, um terreno, etc. são exemplos de prédios. Servidão predial seria assim a submissão de um imóvel, tratando-se de assunto importante neste semestre, juntamente com superfície.

A SP é um direito muito antigo, tão antigo quanto a propriedade, sendo conhecida dos romanos. Na SP não se destaca qualquer das faculdades do domínio (uso, fruição ou disposição), pois se trata de um limite ao domínio, semelhante aos nossos conhecidos direitos de vizinhança. Só que os DV são impostos pela lei para manter o bom convívio social (vide aulas do semestre passado) enquanto as SP são voluntárias, nascem da vontade das partes.

Na SP teremos um prédio com uma vantagem, um benefício, sobre outro prédio, que sofrerá uma restrição, um ônus, de modo que os donos destes prédios vão poder explorar esta vantagem ou ser obrigados a suportar a restrição.

O prédio com a vantagem chama-se prédio dominante e o prédio com a restrição chama-se prédio serviente, e seus donos é que vão se beneficiar ou prejudicar, afinal não existe relação jurídica sem sujeito. Existe sempre este binômio vantagem x restrição. Um imóvel vai servir a outro, beneficiando seus proprietários.

Exemplos de SP: ilimitados, “numerus apertus”, a depender da necessidade e da criatividade das pessoas; as principais seriam servidão de vista, de ventilação, de passagem (ou de trânsito), de passar aqueduto, de retirar água, de retirar areia, de retirar pedra, de pastagem, de passar esgoto, etc.

Então se A mora num apartamento perto da praia e quer garantir seu direito de vista ou ventilação sobre o mar, deve reunir o condomínio, procurar o proprietário do terreno da frente B e perguntar quanto ele quer para jamais construir ali um edifício. Pago o preço a B, A registra a servidão de vista no cartório de imóveis e curte a brisa para sempre (1378). Sem o registro em cartório a SP não vale contra terceiros, e equivale a uma obrigação de não-fazer (= direito pessoal, relativo, vinculado a duas pessoas, que não se exerce contra todos). É óbvio que o edifício de A vai ter que pagar por essa servidão, mas vão valorizar os apartamento. Já B vai receber uma quantia, mas vai restringir o uso do seu terreno da frente. Tratando-se de direito real, os futuros proprietários dos imóveis envolvidos vão para sempre se beneficiar ou se prejudicar, até que um novo acerto, um novo contrato, cancele a servidão, permitindo construções livres no terreno da frente (1387).

Conceito: SP é o direito real limitado, imobiliário, impessoal, acessório, indivisível, permanente, impresumível, que impõe a um imóvel um ônus (= uma restrição) em proveito de outro prédio, contíguo (= vizinho) ou não, de donos diferentes.

Características e comentários ao conceito:

- É direito real limitado, pois o único direito real ilimitado é a propriedade.

- É imobiliário pois não incide sobre móveis, exigindo escritura pública e registro no Cartório de Imóveis.

- É impessoal pois se dá em favor do proprietário do prédio dominante, presente e futuro, prejudicando qualquer proprietário do prédio serviente. É assim direito absoluto ( = erga omnes = que se exerce contra todos).

- É acessório pois é um direito vinculado ao de propriedade, não podendo ser separado, de modo que quem adquire o prédio dominante adquire a vantagem, e quem adquire o prédio serviente tem que suportar a restrição. A servidão não se vende separadamente = inseparabilidade.

- É indivisível pois não se perde e nem se adquire por partes. Indivisível é o direito à servidão, mas as vantagens do seu uso podem ser divididas (ex: servidão de retirar água dividida por vários condôminos moradores do prédio dominante) 1386.

- É permanente pois dura anos, décadas, séculos, até ser cancelada, transmitindo-se inter vivos ou mortis causa aos novos proprietários dos terrenos.

- É impresumível pois não se presume, na dúvida não existe servidão, na dúvida o que existe é propriedade plena (1231). Então se seu vizinho está acostumado há anos a atravessar o seu terreno como um atalho isso não se transforma em servidão de passagem, pois é mera tolerância/cortesia de sua parte que não gera posse, tratando-se de simples detenção do vizinho (1208, 1ª parte). Veremos na próxima aula como pode ocorrer excepcionalmente servidão por usucapião.

- É proveitosa pois a servidão pressupõe vantagem/utilidade para o prédio dominante, então por exemplo deve ser extinta uma servidão de retirar pedra se a pedreira se acabar (1378, 1388, II). Esta característica inclusive é o fundamento da SP. O que justifica a SP? O fato de tornar mais útil, mais agradável, mais valiosa, mais vantajosa a condição do prédio dominante.

- os prédios devem ser próximos, devem ser vizinhos, mas não necessariamente contíguos/limítrofes.

- finalmente, os donos têm que ser diferentes, pois é direito real na coisa alheia, restringe a propriedade de outrém, não sendo possível servidão predial na coisa própria (1378, 1389, I).

Formas de servidão: a depender da necessidade das partes e da característica dos prédios, a servidão pode consistir em 1) tolerar alguma coisa, é a servidão “in patiendo”, tem que ter paciência para suportar o vizinho passando, retirando areia, água, etc. 2) a outra forma é a servidão de abster-se de fazer alguma coisa, chamada “in non faciendo”, como por exemplo a servidão de não construir mais alto para manter a vista/ventilação do prédio dominante (1383). Observem que nunca cabe ao proprietário do prédio serviente fazer alguma coisa, sempre é suportar ou se abster em benefício do prédio dominante (1380 a 1382).

Constituição: a SP se forma, via de regra, por contrato mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Imóveis. Também se admite por doação ou testamento (ex: A doa um terreno a B com servidão de passagem para o vizinho C). Admite-se também excepcionalmente SP pela usucapião, mas veremos isso na próxima aula.