A realidade brasileira e as políticas públicas do governo no combate ao laboro na infância


Porbarbara_montibeller- Postado em 07 março 2012

Autores: 
ARAGÃO, Maiara
ARAÚJO, Auricélia

sumário: Introdução; 1 Trabalho Infantil: contexto histórico; 2 Trabalho Infantil na Legislação Trabalhista Brasileira; 3 O Trabalho Infantil no Brasil: estatísticas, o mito do trabalho e as causas do trabalho infantil; 4 As formas de trabalho infantil e as políticas públicas de erradicação do trabalho infantil; Considerações Finais; Referências.

RESUMO

 

Pretende-se com esta pesquisa fazer um traçado histórico no que tange a utilização da mão de obra infantil no desenvolvimento de atividades econômicas, demonstrando, por conseguinte, como o assunto é abordado pela legislação trabalhista bem como a situação do trabalho infantil no Brasil e as políticas públicas desenvolvidas pelo governo para a sua erradicação.

PALAVRAS-CHAVE

Trabalho infantil. Previsão Legal. Políticas públicas

 

INTRODUÇÃO

 

O trabalho infantil é sem dúvida alguma uma mácula para as sociedades contemporâneas, pois segundo dados da OIT – Organização Internacional do Trabalho, existem mais de 218 milhões de crianças e adolescentes exercendo atividade laboral no mundo.

As populações mundiais continuam enfrentando sérios problemas como a fome, a miséria e o desemprego decorrentes do avanço tecnológico e da globalização que cada vez mais vem produzindo um significativo aumento da massa de excluídos sociais, propiciando assim, o trabalho informal, o trabalho escravo, ao qual se submetem os indivíduos como forma de sobrevivência, recebendo como pagamento pela mão-de-obra tão somente abrigo e alimento, sem quaisquer outras garantias estabelecidas pela legislação trabalhista.

É nesse contexto que se insere o trabalho infantil, contexto este de desigualdades e miséria social, que representa no Brasil mais de 2,5 milhões de crianças. Em pleno século 21, as crianças são tratadas como no século XIX, quando eram submetidas a trabalhar em minas de carvão, paridas com único intuito de ajudar à família no custeio de sua subsistência, sendo brutalizadas pela exploração ou submetidas ao trabalho perigoso. Estas crianças têm seus direito de acesso à educação, lazer e cultura usurpados, submetendo-se, assim, ao trabalho infantil como única forma de sobrevivência.

 

1 TRABALHO INFANTIL: contexto histórico

O labor infantil tem sua história confundida com a própria história do trabalho, estando presente nas mais diversas sociedades no decorrer dos tempos. Há referências à sua utilização desde períodos mais remotos, como aqueles em que o ser humano dependia exclusivamente da agricultura para sobreviver, até os dias atuais, nas mais diversas atividades, apesar de sua ilegalidade.

 

A mão-de-obra infantil participou ativamente no processo de desenvolvimento das antigas civilizações. No Egito, Mesopotâmia, Grécia, Roma, Império do Meio (hoje China) e Japão, as crianças semeavam e colhiam, eram incluídas no trabalho artesanal, carpintaria, mercenária e guarda de rebanhos. Existem relatos de menores trabalhadores desde os três anos, em minas, olarias e embarcações marítimas.

 

Há referências de exploração de crianças escravas nos tempos bíblicos. Os judeus, quando retornavam do exílio na Babilônia à Jerusalém, viam seus filhos reduzidos à condição de escravos como moeda de troca para obterem alimentos. Na Europa medieval, documentos comprovam que crianças eram submetidas à péssimas condições de trabalho, submetidas ao frio e à neve, à ferimentos provocados por quedas nas rochas escorregadias e ainda, há chicotes do encarregado caso caíssem, barbárie que era autorizada pelos pais.

Nos séculos XVI e XVII, período de expansionismo europeu, nas caravelas, urcas e galeões de guerra, mercantes ou de corsários ao menos 10% dos tripulantes eram meninos e meninas menores de quinze anos, que realizavam tarefas perigosas e penosas.

No contexto de industrialização do trabalho, consoante aborda a pesquisadora em trabalho infantil Eleanor Ferreira, nas metalúrgicas e minas de carvão crianças lidavam com o ferro e pesados vagões para o transporte do produto desde os cinco anos de idade e faleciam antes de chegar aos 25 anos. Meninos de seis anos deviam permanecer nos poços das minas por até doze horas e iluminavam a escuridão com apenas uma vela. E mais, “bem antes do término da jornada a vela terminava, mas eles deviam continuar seus trabalhos mesmo no escuro. Caso algum deles entrasse em pânico, adormecesse ou então distraidamente abrisse a porta do poço, era brutalmente espancado.”

Este quadro de exploração fora apresentado no filme e livro O Germinal, do escritor Émile Zola, publicado em 1885, onde relatou a condição dos trabalhadores do final do século XIX, nas minas de carvão da França. Frise-se que as péssimas condições de trabalho, a condição de miséria dos operários e a exploração do trabalho infantil, foram condições que se apresentaram desde a Revolução Industrial (século XVIII) nos mais diversos países.

Na conjuntura da Revolução Industrial, com a transição do trabalho manufatureiro para o fabril, a família deixou o ambiente familiar para trabalhar nas fábricas, levando inclusive as crianças e as submetendo a um rígido sistema de produção. Conforme se pode verificar em O Germinal, as crianças eram tratadas como meros trabalhadores e estavam sujeitas à toda desproteção e condições insalubres de trabalho oferecidas aos operários, a distinção de tratamento restringia-se apenas à remuneração, que era inferior à dos trabalhadores adultos. Ressalte-se que cada membro da família era tratado como mão-de-obra, necessário para complementar a renda familiar.

Nos momentos de crise da economia o emprego infantil passou a competir com o dos adultos, situação que fez surgir propostas concretas de redução da jornada infantil. Em 1802 fora editada na Inglaterra a primeira manifestação à idéia contemporânea de Direito do Trabalho, com a edição do Moral and Health Act, que determinou o prazo máximo de 12 horas diárias para o trabalho infantil. Entre 1802 e 1867, 17 leis inglesas foram editadas para a proteção do trabalho das crianças e dos jovens.

Importante ressaltar que o direito do trabalho nasce com a sociedade industrial, “pois durante a sociedade pré-industrial não havia sistema de normas jurídicas. Assim, predominava a escravidão, que tratava o trabalhador como um mero objeto, sem possuir uma equiparação a um sujeito de direito”.

No tocante à história do trabalho infantil no Brasil, tem-se que “acompanha a própria trajetória do país enquanto colônia, quando crianças descendentes de negros e índios eram obrigadas a incrementar a mão-de-obra das fazendas”.

 

Desde o início da colonização as crianças negras e indígenas eram incorporadas ao trabalho. Com o desenvolvimento socioeconômico do país a forma do trabalho infantil se modificou. Com a imigração crescente da Europa e Japão, pouco antes do final do século XIX, a revolução industrial chegou ao Brasil. As novas formas de divisão de trabalho facilitaram a próprio exercício do trabalho e possibilitaram a inclusão da mão-de-obra infantil a custos mais baixos, particularmente na indústria têxtil. No século XX, o forte processo de migração, e conseqüentemente a urbanização, ampliaram mais uma vez os ramos de atividade para as crianças. Nas cidades as crianças e adolescentes ganham no setor informal, principalmente na oferta de serviços e nas atividades ilícitas (tráfico de drogas, prostituição, etc.

 

Segundo Mary Del Priore, as crianças ingressavam precocemente no mundo do trabalho durante o período colonial. A partir dos sete anos de idade as crianças desenvolviam pequenas atividades ou estudavam, ou ainda, aprendiam algum ofício, transformando-se em aprendizes.

Com o início do processo de industrialização (final do século XIX) verificou-se a presença de crianças nas fábricas, as quais substituíam o trabalho dos escravos por um baixíssimo custo. Os pequenos imigrantes passavam onze horas frente às máquinas de tecelagem, com apenas vinte minutos de descanso. Durante a década de 1870 em São Paulo, o trabalho de crianças e adolescentes nas fábricas, sobretudo no setor têxtil, era solicitado por anúncios na imprensa.

Em 1917 fora realizado um movimento que combatia a exploração do trabalho infantil. Em São Paulo, criou-se o Comitê Popular de Agitação contra a Exploração dos Menores nas Fábricas, que utilizando-se de manifestações públicas obteve efeitos satisfatórios, pois exerceram pressão para o cumprimento de normas mais antigas e obtiveram a aprovação de algumas legislações protetoras à infância.

Todavia, a efetividade da proteção à infância ainda estava distante, tanto que, em 1919, foi realizado um levantamento em 194 indústrias de São Paulo e verificou-se que 25% da mão-de-obra empregada era constituída por operários com idade inferior a 18 anos. Em 1927 foi estabelecido o primeiro Código de Menores da República, elaborado por uma comissão de juristas. Estabeleceu-se à violação dos dispositivos de proteção e limites do trabalho do menor a imposição de multas e até a imposição de prisão, que poderia durar de oito dias a treze meses.

Na vigência do regime ditatorial, a Constituição Federal de 1967 representou um retrocesso na proteção ao menor em relação às legislações de outros países na mesma época, uma vez que estabeleceu como idade mínima laboral a de 12 anos de idade. Todavia, sob o governo do presidente Ernesto Geisel fora enviado pedido de autorização ao Congresso Nacional para ratificar a Convenção nº 138 da Organização Internacional do Trabalho que versava sobre a idade mínima ao trabalho, significando um avanço à legislação trabalhista.

Destarte, verifica-se que o trabalho infantil fora vislumbrado pela legislação sob diversas formas, a qual modificou por algumas vezes a idade mínima permitida para o labor, que variou conforme o período histórico, tendo em vista que sofreu reflexos da conjuntura econômica e política de cada período. Relevante observar que estas legislações não trataram apenas da idade mínima para o trabalho, mas também de outras “proteções”, como jornada de trabalho, locais inapropriados, atividades inapropriadas, entre outras.

Ademais, a regulamentação atual do trabalho infantil será tema do próximo capítulo.

 

2 TRABALHO INFANTIL NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

Importante estabelecer a princípio que no Brasil é proibido o trabalho infantil, assim entendido como o trabalho realizado por criança ou adolescente cuja idade seja inferior à mínima permitida por lei. Complementa o conceito Joel Marin:

 

[...] trabalho remunerado realizado por crianças e adolescentes em determinadas atividades produtivas, reconhecidamente prejudiciais, por impedirem o desenvolvimento físico, emocional, moral, social e intelectual do ser humano em formação

 

Conforme Cláudia Coutinho Stephan, ao delimitar a idade mínima para o trabalho, a Carta Constitucional considera que nessa delicada idade, compreendida pela infância e adolescência, faz-se obrigatória a preservação de certos fatores básicos, que fomentam o adulto de amanhã, como familiar e os valores fundamentais que aí se originam, o inter-relacionamento com outras crianças, que molda o desenvolvimento psíquico, físico e social do menor, a formatação da base educacional sobre a qual incidirão aprimoramentos posteriores.

A partir do que se depreende do texto constitucional, tem-se que ao menor de 14 anos o trabalho é absolutamente proibido, sendo permitido, sob certas condições, o trabalho àqueles com idade compreendida entre 18 e 14 anos, conforme dispõe a Carta Política: Art. 37, XXXIII, CF – “proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos”.

A CLT trata da proteção do trabalho do menor, em seu capítulo V,dos artigos 402 a 441 e o ECA vai cuidar da proteção ao trabalho infantil em seu Capítulo, V, - Do Direito à Profissionalização e à Proteção ao Trabalho, do artigo 60 ao artigo 69, grande parte desses artigos, reforçam o estabelecido pela CLT.

Assim, a proibição de trabalho insalubre por menores de 18 anos também é prevista no inciso I, Art. 405 da Consolidação das Leis Trabalhistas e no inciso II, Art. 67 do Estatuto da Criança e do Adolescente, com o objetivo de proteção à sua saúde, integridade física e segurança. A insalubridade é definida pelo Art. 189 da CLT da seguinte forma:

 

Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos.

 

O trabalho perigoso também encontra definição na CLT, que assim estabelece: “Art. 193 – São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem o contato permanente com inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado.”

Quanto ao trabalho noturno, observa-se que este é extremamente prejudicial ao menor, em face das inconveniências de ordem social e biológica que provoca. O descanso diurno é menor reparador que o noturno, e, assim, o trabalho noturno em horário que o menor deveria estar dormindo, recuperando-se das naturais agitações que a idade determina, poderá influenciar diretamente no acesso à escola do jovem.

No que se refere à jornada de trabalho, esta, em regra, é a mesma do trabalhador adulto (oito horas diárias e quarenta e quatro semanais - art.7º, XIII CF e art. 58, CLT), contudo a prorrogação da jornada é, em regra, proibida.

Como abordado anteriormente, é permitido o trabalho do menor a partir de 14 anos, estando na condição de aprendiz. Sobre o contrato de aprendizagem, a CLT dispõe da seguinte forma:

 

Art. 428, CLT: Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 (quatorze) e menor de 24 (vinte e quatro) anos inscrito em programa de aprendizagem formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar com zelo e diligência as tarefas necessárias a essa formação.

 

A CLT traz uma vasta previsão legal de direitos e proteções dedicadas ao menor de 18 anos, dispondo sobre definições de vários institutos, bem como prevendo regulamentações que estabelecem um regime diferenciado tratando sobre jornada de trabalho (art. 411; 413 ), locais de trabalho (art.403, § único; 405, §2º), serviços vedados (art.407 e § único; 408), obrigações do empregador (art.426; 427), entre outros.

Na seara do trabalho infantil, a Organização Internacional do Trabalho apresenta como importantes Convenções as de nº 138 e nº 182. A primeira, aprovada na 58ª reunião da Conferência Internacional do Trabalho, dispõe sobre a idade mínima para admissão em emprego, prescrevendo a adoção de idade mínima para admissão a emprego ou trabalho não inferior à idade de conclusão da escolaridade compulsória ou, em qualquer caso, não inferior à quinze anos. Ainda fixou a idade mínima de 18 anos para admissão em qualquer tipo de emprego ou trabalho que, por sua natureza, possa prejudicar a saúde, a segurança e a moralidade do jovem. O Brasil a aprovou pelo Decreto nº 179/1999.

Já a Convenção nº 182, trata da proibição das piores formas de trabalho infantil e ação imediata para a sua eliminação. O Decreto nº 6.481/2008 regulamenta os arts. 3º, alínea “d” e 4º da Convenção 182 d OIT que trata das piores formas de trabalho infantil e ação imediata para a sua eliminação.

Ainda, a OIT criou o Programa Internacional para Eliminação do Trabalho Infantil (IPEC), com o escopo de erradicar o trabalho infantil, dando suporte aos países para o enfrentamento dos problemas a ele relacionados.

Outros instrumentos protecionistas ao menor de 18 anos consiste na Declaração Mundial e na Convenção sobre os Direitos da Criança, criados pelo UNICEF (Fundação das Nações Unidas para Infância) em 1997. Estes definem a exploração do trabalho infantil como abuso dos direitos humanos, considerando como tal: o trabalho de tempo integral e iniciado muito cedo em idade; o trabalho que provoca excessivo estresse físico, social e psicológico; o pagamento inadequado; o trabalho que atrapalha o acesso à educação e o que abala a dignidade e auto-estima da criança, como a escravidão e a servidão, a responsabilidade em excesso, viver e laborar nas ruas, em condições inapropriadas, etc.

 

3 O TRABALHO INFANTIL NO BRASIL: estatísticas, o mito do trabalho e as principais causas do trabalho infantil

O Plano Nacional de Amostragem por Domicílio – PNAD elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, aponta segundo a pesquisa ocorrida em 2007 que mais de 2,5 milhões de crianças praticam algum tipo de trabalho. Essa pesquisa voltada basicamente para a quantificação do trabalho infantil no País, possibilita que se faça uma avaliação a partir de seus indicadores contribuindo de forma eficaz para a erradicação desse mal, sendo um dos principais instrumentos utilizados pelo Governo Federal quando da implantação de suas políticas públicas.

Segundo esta pesquisa, 2,3 milhões das crianças e adolescentes trabalhadores tem entre 10 e 15 anos, 157 mil crianças tem entre cinco e nove anos de idade o que compreende um universo de 16,6 milhões da população total dessa faixa etária. O maior número de crianças em efetivo trabalho encontra-se na Região Nordeste, o que representa cerca de 1,1 milhão, ou seja, 44,2% de menores realizando algum tipo de trabalho no Brasil.

Relacionando os dados desta pesquisa com os anos anteriores, percebe-se que houve uma redução em cerca de 500 mil crianças em relação ao ano de 2002 e de cerca de mais de 1,500 mil em 1997. Percebe-se, assim, que o quantitativo de crianças trabalhando no Brasil diminuiu nos últimos 10 anos, em decorrência, principalmente, das políticas públicas implantadas pelo governo no que tange ao Programa de Erradicação do Trabalho Infantil.

A pobreza figura como um dos principais motivos para a inserção do menor no trabalho infantil. Segundo a PNDA de 2007, 43,2% das crianças e adolescentes contribuíram com 10% a 30% da renda familiar, 41,5% contribuíram com até 10% e 15,4% conseguiram contribuir com mais de 30% com o rendimento mensal da família. É uma situação alarmante, pois os próprios pais colocam seus filhos nas lavouras ou mesmo em casa de famílias para trabalharem a fim de proverem seu próprio sustento ou o sustento da família.

Outro fator importante é a estrutura do mercado de trabalho que aliado à pobreza oferece condições para a incorporação da mão-de-obra infantil. Segundo Márcia Vieira,

 

O trabalho infantil, portanto, está inserido em uma questão maior, a exploração da força de trabalho de um modo geral, que caracteriza as relações de trabalho no Brasil, tanto no campo como na cidade. Historicamente, o processo de industrialização no Brasil, com uma formalização crescente da força de trabalho na indústria, teve seu ápice no final da década de 60, mas, a partir desse período, houve um crescimento do setor de serviços que passou a orientar a formalização e a informalização.

 

Corroborando com estas questões, um dos principais argumentos que se utiliza, pelo menos por parte dos empregadores de mão-de-obra infantil, é o do mito do trabalho, como justificativa para a contratação de crianças, onde especula-se ser melhor para os menores estarem trabalhando do que marginalizando-se. Esse pensamento vem de uma cultura capitalista, impregnada mesmo hoje, nas sociedades contemporâneas, que vêem o trabalho como uma forma de prevenção da marginalidade.

 

Esse mito permanece arraigado na sociedade capitalista, ou seja, o trabalho continua como um valor ético e moral. O caráter formativo do trabalho em que a criança que trabalha fica mais esperta, torna o homem do futuro mais digno, com melhores oportunidades de inserção no mercado de trabalho e como prevenção da marginalidade, associado à precarização das relações de trabalho são as principais causas da incorporação de crianças no mercado de trabalho.

 

Segundo Souza, a sociedade é entusiasmada por essa ideologia, legitimando, por conseguinte, esses motivos no momento em que reforça e associa o não-trabalho com a marginalidade e a delinqüência. Isso contribui para que se fortaleça o mito de que o trabalho é o formador do caráter das crianças e adolescentes das camadas populares, justificando e mascarando as questões obscuras trazidas pelo trabalho infantil.

Não obstante ainda se perceba na sociedade o chamado mito do trabalho, é do conhecimento de todas as entidades que lutam pela erradicação do trabalho infantil, que o interesse e a preferência pela mão-de-obra infantil se dá por essa ser mais dócil, de mais fácil exploração e menos custosa. Destarte, o trabalho infantil vem se expandido no mundo inteiro, uma vez que representa uma elevada produção a baixos custos. Consoante Ferreira , em nome de uma economia rentável sustentada por trabalho assalariado, precariamente pago e não qualificado, criam-se subempregos nos quais são explorados adultos e principalmente crianças.

Entre as principais causas da exploração do trabalho infantil, pode-se citar a precária situação econômica das famílias dos menores, assim como a estrutura de mercado, a falta de políticas sociais assim como outros benefícios socioculturais. A concentração da renda e da riqueza no Brasil, o desemprego, a miséria, a falta de políticas públicas eficazes no que tange à educação, lazer, esporte, cultura, podem ser citadas como as possíveis causas da incorporação da força do trabalho infantil.

As famílias de baixa renda são as que mais intimidam seus filhos a começarem a trabalhar, como forma de ajudar no sustento da casa, o que no mais das vezes, propicie um aumento significativo da evasão escolar, haja vista a dificuldade de aprendizagem por parte dessas crianças em virtude do cansaço e da alimentação precária. Além disso, há uma causa maior de ocorrência de trabalho infantil no Brasil, afigurando-se no trabalho infantil doméstico, onde crianças pobres são enviadas a casas de terceiros para trabalhar em serviços domésticos sob a perspectiva de obter uma vida melhor.

 

4 AS FORMAS DO TRABALHO INFANTIL E AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE ERRADICAÇÃO

 

As principais formas de trabalho infantil são as de trabalho rural, urbano e doméstico, sendo esta última, uma das piores configurações de trabalho infantil.

O trabalho infantil rural é desenvolvido de forma majoritária no âmbito familiar. A Organização Internacional do Trabalho estima que mais de 69% das crianças que figuram como mão-de-obra infantil se inserem nesta categoria, ingressando nessa atividade por volta de cinco anos de idade. As jornadas de trabalho são longas e exaustivas apresentando um grande índice de evasão escolar.

Segundo Irene Rizzini,

 

As crianças e adolescentes compõem a unidade de trabalho familiar, somando a sua produção a dos pais para que a família possa ter maiores ganhos. Quando remunerados, os salários são baixíssimos. Além disso, trabalhadores agrícolas infantis e adolescentes estão expostos a condição e substâncias danosas à sua saúde. No campo as crianças manipulam agrotóxicos sem manipulação: carregam pesos excessivos, utilizam equipamentos perigosos. Enfim, estão, a todo momento, colocando a saúde e a própria vida em risco.

 

Assim, o trabalho rural infantil é uma atividade complexa exercida por uma unidade familiar, que no mais das vezes trabalha por produção diária, o que justifica, em tese, a necessidade de todos os componentes da família, até mesmo das crianças, na atividade laboral.

No tocante ao trabalho infantil urbano a atividade laboral se dá principalmente em lixões e nas ruas, como catadores de lixo e vendedores ambulantes. As crianças são expostas a diversos perigos quando da prática da atividade laboral, entre esses perigos pode-se citar o uso de drogas, o recrutamento para o tráfico, além da prostituição. O trabalho infantil urbano é exercido em diversas áreas do setor formal e informal, sempre de forma clandestina. Como o trabalho infantil é proibido por lei, para os trabalhadores infantis não há regras ou direitos quanto ao desenvolvimento da sua atividade laboral, tendo seus direitos desrespeitados diuturnamente.

O trabalho doméstico exercido por crianças é uma das piores formas de trabalho infantil, segundo estatísticas do PNDA de 2006, o trabalho doméstico infantil subemprega mais de quinhentas mil crianças, o que significa dizer, 8% (oito por cento) dos 5,1 milhões de crianças submetidos ao trabalho exercido por menores no Brasil.

Consoante entendimento de Oris de Oliveira, “é doméstico o empregado que presta serviço de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no âmbito residencial destas, sendo indiferente que o trabalho seja prestado em casa de família residente no setor urbano ou rural”. A OIT descreve esse tipo de trabalho como uma forma de exploração disfarçada e protegida por uma cultura social dominada pela tolerância e aceitação.

 

O trabalho infantil doméstico continua a ser uma questão extremamente sensível, pois aparece frequentemente disfarçado de acordos em família dentro de um ambiente supostamente protetor, onde as crianças – mais frequentemente, as meninas – aprendem habilidades úteis. O trabalho infantil doméstico goza, por isso, de uma tolerância social semelhante a que se verifica no trabalho agrícola.

 

Ainda de acordo com a OIT, as conseqüências decorrentes do trabalho infantil domésticos são a evasão escolar, os abusos sexuais, os maus tratos, problemas de socialização entre outros. Dessa forma, por ser acolhido pela tolerância social e por ser de difícil fiscalização, tendo em vista a inviolabilidade do domicílio, o trabalho infantil doméstico se caracteriza por ser uma das piores maneiras da exploração do trabalho infantil.

As políticas públicas bem como os projetos dirigidos à erradicação do trabalho infantil, têm como objetivo primordial a permuta entre o trabalho e a escola. O Brasil, tentando erradicar o trabalho infantil, que atualmente conta com mais de cinco milhões de pequenos brasileiros, criou o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil - PETI, cujo escopo é a extirpação da mão-de-obra infantil e aqui será tratado como principal exemplo de política pública voltada para erradicação do laboro infantil.

O PETI é um programa do Governo Federal que tem como escopo retirar as crianças e adolescentes, de 07 a 14 anos, do trabalho considerado perigoso, penoso, insalubre ou degradante, ou seja, aquele trabalho que coloca em risco a saúde e segurança das crianças e adolescentes. Seu método inclui um auxílio financeiro aos beneficiários, vinculando esse auxílio a freqüência da criança na escola além de possibilitar as famílias a participação em projetos de emprego e renda.

Através do PETI, a família inserida recebe uma bolsa mensal por cada filho retirado do trabalho. Para tanto, as crianças e adolescentes devem estar freqüentado a escola com jornada ampliada, consistindo a jornada ampliada em reforço escolar além do desenvolvimento de atividades esportivas, culturais, artísticas e de lazer. O prazo máximo de permanência no Programa de Erradicação do Trabalho Infantil é de quatro anos. Atualmente o PETI integra o Programa de Bolsa Família do Governo Federal.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A mão de obra infantil fora amplamente utilizada no decorrer da história e nas mais diferentes civilizações, sem respeitar a condição peculiar desses indivíduos, que estão em desenvolvimento físico e intelectual.

A exploração do trabalho infantil demonstra a face mais cruel do ser humano, que aproveita-se da fragilidade infantil e da facilidade de submeter crianças e adolescentes a atividades que muitas vezes mostram-se perigosas e que prejudicam o saudável desenvolvimento desses indivíduos, os quais foram e, ainda são mesmo que proibido, submetidos a jornadas rigorosas de labor com remuneração inferior a de adultos, mesmo exercendo a mesma tarefa destes.

Diante da forte exploração do trabalho infantil e a partir de movimentos de combate às situações precárias de trabalho de adultos, crianças e adolescentes, surgiram normas que visavam regulamentar o trabalho, compreendendo entre elas as que objetivavam proteger o labor infantil. Desta forma, ao longo da história várias legislações estabeleceram normas direcionadas aos menores, apresentando avanços e retrocessos a depender do momento político e econômico de cada país.

Atualmente, há ampla proteção ao trabalho realizado por menores, observada em diplomas legais, como a Constituição Federal, Estatuto da Criança e do Adolescente, Consolidação das Leis Trabalhistas, Tratados Internacionais, etc. As normas protetivas devem ser respeitadas visando proteger o saudável desenvolvimento dos menores.

Verifica-se, também, um amplo combate à utilização do trabalho de menores absolutamente proibidos de exercerem quaisquer atividades, que compreende aqueles cuja faixa etária seja inferior à 14 anos.

INFANTILE WORK:

The Brazilian reality and the public politics of the government in the combat to it I work in infancy

 

ABSTRACT

It is intended with this research to make a historical tracing in what it refers to the use of the hand of infantile workmanship in the development of economic activities, demonstrating, therefore, as the subject is boarded for the labor law as well as the situation of the infantile work in Brazil and the public politics developed by the government for its eradication

KEY-WORDS

Infantile work. Legal forecast. Public politics

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