A Constituição de 1215


Porvinicius.pj- Postado em 06 dezembro 2011

Autores: 
CREADO, Bruno Prisinzano Pereira

 

RESUMO INFORMATIVO:

O referido texto nasce da análise da história do Direito Constitucional. Há tempos os doutrinadores definem como marco da primeira constituição a carta de 1215, entretanto quais fatores históricos são base de tal afirmação? A constituição de “João sem terras” é realmente o primeiro marco constitucional da história? Para tanto temos de estudar a formação do seu Estado e História da Inglaterra. 

Para responder ao questionamento usamos de vários mecanismos doutrinários constitucionais, históricos e filosóficos dentre eles o principal filósofo fora o Habermas, que debate a formação dos estados europeus e na área de direito constitucional Canotillo na definição de constituição. Após referida análise com tias pensadores defendemos que a cartas de 1215 não pode ser tida como a primeira constituição.

Outro de nossos questionamentos é referente à definição de outro marco histórico para a primeira constituição inglesa. Tal questão nasce em decorrência da nossa crença que a constituição de 1215 não é realmente a primeira constituição européia, exatamente por isso declinamos nossa tese de que o verdadeiro marco histórico ocorre no ano de 1485.

Por fim a última argumentação levantada e a relação entre a formação de Estado e formação constitucional, que a nosso ver ocorre no mesmo período no caso inglês, todavia tal levantamento não denota que exista ou não exista um mutualismo entre as duas, pois deixamos tal questão para análise futura.

PALAVRAS-CHAVE:

Constituição. Carta de 1215.formação do estado. Habermas.


 

SUMMARY INFORMATION:

 This text comes from the analysis of legal history Constitutional. Scholars have long defined as the march of the first letter of the constitution in 1215, but that historical factors are the basis of such statement? That is, the formation of "John without lands" is 
actually the first constitutional framework of the history?  For this we need to study the formation of their State and History of England. 
To answer the question we used several constitutional mechanisms doctrinal, historical and philosophical chief among them the philosopher out Habermas, which discusses the formation of European states and area of constitutional law in the definition of Canotillo constitution. After the analysis with aunts thinkers, argue that the letters of 1215 can not be taken as first constitution. 

Another of our challenges is related to the definition another milestone for the first constitution English. This question rises as a result of our belief that the constitution of 1215 is not really the first European constitution, just so disclaim our thesis that the real milestone occurs in year 1485.  

Finally the last argument raised and the relationship between the formation of state constitutional, that our view is in the same period in the English case, however such immunity does not denote whether or not there exists mutualism between the two, because leaving it to further analysis.

KEY WORDS:

Constitution. Letter 1215.Formation of the state. Habermas. 


 

   INTRODUÇÃO

A análise do conteúdo histórico é essencial ao direito, ainda mais quando em tela há direitos constitucionais. Por décadas os autores brasileiros apontam a constituição inglesa de 1215 como marco histórico da primeira constituição, como podemos notar em LENZA“Durante a idade média, a magna carta de 1215 representa o grande marco do constitucionalismo” (P.5), todavia, quais fatores históricos levam a tal afirmação?

A incógnita nos levou a analisar a história inglesa com escopo de sabermos se 1215 é realmente o momento da formação da primeira Carta Magna. Para tanto, temos três bases: Doutrina jurídica para definirmos o termo Constituição, fatos histórico para entendermos os fatores sociais em que foi redigida, e por fim, análise filosófica para entendemos a formação do Estado e conjunto de leis.

Após a pesquisa, notamos que dentre os autores o que mais se concentra na formação dos Estados ingleses é Habermas, já que usa de eventos históricos para fundamentar algumas de suas teorias, como em seu livro “A inclusão do outro”, mas especificamente no Capítulo intitulado “O estado nacional europeu- sobre o passado e o futuro da soberania e da nacionalidade”. Nesta parte, o autor discute a diferença entre Nação e Estado, usando de pano de fundo a formação européia, ou seja, com fundamento histórico.

Tal composição de idéias fica clara à luz do primeiro parágrafo do capítulo supra citado, que seja Habermas (2002):

como revela a designação “nações Unidas”, hoje a sociedade mundial é constituída por Estados nacionais. O tipo histórico decorrente da Revolução Francesa e da Revolução Norte americana impôs-se em todo mundo” (P.121)

Com tal composição inicial fica clara a fundamentação histórica, entretanto, para compreender suas idéias, o leitor deve ter ciência dos acontecimentos históricos citados, sendo que o filósofo pressupõe que seu estudioso já tenha em mente tais composições.

Na frase previamente citado, podemos notar que o autor demonstra que os Estados nacionais contemporâneos são provenientes dos ideais implantados na revolução Francesa e Norte Americana.

Quando o autor cita a da Revolução Francesa e Americana como molde dos Estados Nacionais modernos, deve o leitor lembrar que a base das revoluções foram os ideais: de igualdade, liberdade e fraternidade provenientes dos pensadores iluministas do século XVIIL.

 Esses pontos da história são cruciais para entendermos os Estados modernos e suas constituições, já que remetem a idéia essencial em qualquer Estado livre. Em caráter exemplificativo, podemos citar o “Princípio da igualdade” prevista em todas as Cartas Constitucionais do ocidente; Essa presunção é o mínimo que se espera de um Estado Nacional livre.

Toda a concepção delineada a cima não é citada pelo autor, já que esse presume que seu leitor já tenha ciência, sendo essa presunção plausível. Devemos nos atentar a uma análise histórica feita por Habermas entre os momentos de formação do Estado e da Nação intitulado: “from state to nation X from nation to state”. Neste ponto, o autor fundamenta que a Inglaterra é exemplo de “from state to nation” em que primeiro formou o Estado e depois a Nação.

Tal análise é essencial, pois temos outra questão a ser respondida: Há formação da Constituição e do Estado na Inglaterra ocorre no mesmo período? Todavia, não é nosso escopo responder se a formação do Estado está ligado diretamente a formação constitucional, pois esta questão passa por outra análise, que pretendemos fazer futuramente.

1 - FORMAÇÃO DA EUROPA

Toda a base teórica desta parte expositiva tem por tema a formação dos Estados europeus. Entretanto quando se fala em formação da Europa deve se levar em conta que esta sofrendo modificações territoriais desde os tempos antigos. Como apogeu grego apesar desse não ter se expandindo ao norte europeu, posteriormente ao império macedônio com as conquista de Alexandre e finalmente com o império Romano que trouxe grande modificação a todo o território europeu. Apesar de sua riqueza histórica, esse período não é tão importante para nossos estudos, já que a divisão territorial e étnica européia contemporânea quase não guarda relação com aquela de outrora.

A formação atual dos estados europeus começa a tomar forma com o fim do império Romano, entretanto diferente do que se pensa seu fim não se deu com uma invasão em massa feita pelos povos Bárbaros, mas essa se prolongou do século IV e V, os povos germânicos como visigodos, ostrogodos, anglo-saxões, francos, suevos e turíngios, acabam alem de invadir o império por dividir o mundo romano em cidades estados (Burns 1970).

Finalmente chega-se a idade media e o federalismo, marcado pelo fim do comercio e de governo centralizado, salvo o poder da Igreja Católica, as relações eram particulares entre camponeses que ofereciam sua força de trabalho, e senhores feudais que permitiam o cultivo de suas terras e davam proteção, como podemos notar em BURNS (1970) :

“Durante esse período não existiu realmente um mecanismo de governo unitário nas diversas entidades políticas, embora tenha ocorrido a formação dos reinos. O desenvolvimento político e econômico era fundamentalmente local, e o comércio regular desapareceu quase totalmente. Com o fim de um processo iniciado durante o Império Romano, os camponeses começaram seu processo de ligação com a terra e de dependência dos grandes proprietários para obter proteção (P. 298).”

 Foi nesse período que várias cidades européias surgiram, entretanto essa realidade se deu na primeira parte da idade média, já que a realidade fática da Europa sofreria grande mudança, pois apareceriam as primeiras monarquias nacionais, que geraram alguns dos Estados contemporâneos.

Com a morte de Carlos Magno, em 814, seu império foi dividido por seus descendentes, em três blocos: a França Oriental e França Ocidental, que correspondem as atuais França e Alemanha e no meio uma larga faixa de terra formando a denominada Faixa Intermediaria atuais Bélgica e Holanda, entretanto tal divisão não se manteve já que mais tarde se dividido em vários feudos.

Com isso surgem os reis da linhagem Capetos que são os formadores da monarquia feudal francesa. Enquanto na Inglaterra a linhagem de Guilherme, o conquistador,sobe ao poder; De sua linhagem temos o famoso João sem terras que assinaria a Magna Carta, fato que veremos na formação inglesa. A formação dessas duas monarquias nacionais gera os primeiros governos centralizados da Europa. 

Finalmente chega-se a baixa idade media a formação das monarquias absolutistas diminuindo o poder da Igreja Católicas, dentro mais uma nova ordem econômica surge o Mercantilismo e uma nova classe: a Burguesia.

Para ilustrar esses pensamentos podemos citar HUGON (1970):

“A Baixa Idade Média foi marcada pelos conflitos e pela dissolução da unidade institucional. Foi então que começou a surgir o Estado moderno, e a luta pela hegemonia entre a Igreja e o Estado se converteu em um traço permanente da história da Europa nos séculos posteriores.(P.412)”

 Nesta realidade que parte os pensamentos de Habermas, sob uma sociedade em evolução gerando mudanças estruturais nos moldes antigos, pois só a partir dessa monta que podemos entender a realidade fática européia daquele período, e assim fazer uma análise da verdadeira formação Constitucional inglesa.

2. DA FORMAÇÃO INGLESA: ESTADO E CONSTITUIÇÃO

2.1. FORMAÇÃO HISTÓRICA

      Em um estudo concentrado na formação das etnias Inglesas, poderíamos retornar a época da invasão Romana e posteriormente da invasão Saxônica sobre os Bretões, entretanto devemos nos atentar a fatos, mas recentes que tem maior relação com o debate levantado pelo filosofo, que seja da formação do território e nação inglesa.

Sendo assim, devemos iniciar nossos estudos pelo primeiro momento de formação territorial de Estado Inglês, que ocorre na formação da monarquia nacional na Inglaterra.

No ano de 1066, com a conquista de toda a ilha por Guilherme, impôs ao continente um regime feudal, entretanto impediu que houvesse uma descentralização por meios de atos como: controle dos vassalos, proibição de guerras privadas e manteve como prerrogativa real o poder de cunhar moedas. Todos esses atos centralizaram o governo (Burns 1970).

Os atos tomados por Guilherme tiveram grande importância para a formação territorial da Inglaterra. A unificação desses feudos perante uma única bandeira ocorreu no período da alta idade média, enquanto o continente só viria a ocorrer na baixa idade média com o início das monarquias absolutistas.

Outro ponto importante da formação inglesa ocorre no governo de Henrique II, que teve inicio no ano de 1154, com novas medidas que fortalecem o governo centralizado. A reforma do novo rei fez frente à nobreza feudal, entre seus atos: criação dos “scutage” obrigando os senhores feudais a comutar o serviço militar, impôs o primeiro imposto sobre renda e propriedade e manteve uma lei uniforme com juízes escolhidos pelo governo central (Burns 1970).

Tanto de Guilherme quanto de Henrique II reforçaram a formação de um governo central impedindo que a Inglaterra se dividisse em vários feudos, gerando assim um governo central poderoso. O que foi importantíssima para a formação do Estado inglês.

Entretanto, mesmo com tantos esforços para manter o Estado unido em um só reino, ainda não se via uma máquina estatal única. Sendo que, tal composição de Estado desenvolvido por Henrique, perderia força com seus descendentes.

Podemos notar que até este período a Inglaterra não tinha um corpo legislativo, nem tão pouco uma unidade nacional ou um governo centralizado. Todavia, tal situação mudaria no reinado de João sem terras, como veremos a seguir.

2.2 DA FORMAÇÃO CONSTITUCIONAL

No reinado de João, apelidado de João sem terras, ocorre à assinatura de um documento legal que é considerado marco da primeira carta magna. Com as constantes guerras gera o aumento de impostos sobre os barões que entraram em conflito com Rei e finalmente em 1215 é assinada a Magna Carta e ocorre a criação do Parlamento inglês.

Diferente do que se pensa esse documento não tem a função de criação de uma unidade nacional ou de direito individuais, em verdade é mais uma carta de garantias de uma minoria, que eram os senhores feudais com o escopo de limitar o poder do rei, ou seja, estas acabou por afastar a Inglaterra de uma unidade administrativa, nesses moldes pensa (Burns 1970):

“a interpretação popular dada à Magna Carta é, na realidade, errônea. Não pretendia ser uma declaração do Direitos ou uma carta de liberdades do homem comum; pelo contrario, era um documento feudal, um contrato feudal escrito, no qual o rei, como suserano, se comprometia a respeitar os direitos tradicionais dos vassalos.(P.445)”

A assinatura de tal documento teve por finalidade principal a garantia de não interferência do rei nos feudos. Com tal característica em vez de uma Carta de garantias temos apenas um contrato que reserva direitos em virtude da propriedade, em verdade esse é um fator que afasta a Inglaterra de um governo centralizado, pois privilegiou os feudos em detrimento do suserano.

Para compreender tal análise temos de conceituar constituição, sendo assim, nas palavras de Canotilho, temos três elementos para uma constituição ideal: escrita, divisão do Estado e garantias de liberdade aos cidadãos, senão vejamos Canottilho (1994):

“a constituição deve consagrar um sistema de garantias da liberdade (esta essencialmente concebida no sentido do reconhecimento de direitos individuais e da participação do cidadão nos atos do poder legislativo através do parlamento)”(P.151)

Sendo assim, observamos que falta um elemento ensejado de uma verdadeira constituição, pois a carta de 1215 não trazia em seu âmago garantias de liberdades, mas apenas garantias aos Senhores feudais de que suas propriedades seriam respeitadas pelo Rei e dentro mais não fora escrito por um Parlamento legitimado. Logo, podemos notar que as regras expressas estavam ligadas a propriedade dos feudos e não a garantias individuais dos cidadãos.

Podemos então concluir que o documento de 1215 não é marco da primeira constituição, mas apenas acordo de propriedade assinado entre Senhores feudais e o Rei, acordo esse que tem Extrema importância, pois as garantias expressas posteriormente foram ampliadas à toda população, assim como veremos a seguir.

No reinado de Henrique III, filho de João, a guerra civil toma a sociedade inglesa e um novo líder surge Simão de Montfort, que trás uma nova formação para o Parlamento. Por necessitar de apoio popular incluiu no Parlamento cavaleiros (militares) e cidadão, entretanto tal composição não tinha uma finalidade democrática, pois a principal função era criar um governo centre, assim como assevera(Burns 1970):

“esse expediente de um parlamento composto de membros das três grandes classes tornou-se um órgão regular do governo, quando Eduardo I, em 1295, convovou o chamado Model Parliament. O objetivo de Eduardo, ao convocar esse parlamento, não era introduzir uma reforma democrática, mas somente ampliar a estrutura política.” (P. 340)

Tendo tal composição podemos notar o retorno do governo central na afamada ilha, para assim estruturar um novo Estado. Entretanto, ainda não havia um sistema político de administração única para formar um Estado propriamente dito.

No fim do século XIV, começa as modificações estruturais na sociedade feudal inglesa, pois o sistema senhorial foi enfraquecido pelo desenvolvimento do comércio, indústria e das cidades. Com esse cenário dá-se o fim do sistema feudal inglês.

Esse sistema sucumbe por volta de 1485 com o fim da Guerra das Rosas. Essa guerra ocorreu pela disputa de poder entre duas facções; com a vitória dos Tudor e ascensão de um novo soberano: Henrique VII, que estabeleceu um governo central. O novo rei manteve o parlamento e ampliou os direitos da Magna Carta para além dos nobres, entretanto apesar de haver a formação de Estado ainda não havia uma nação delineada, como veremos a seguir (Burns 1970).

Tal momento histórico é ponto crucial, pois neste momento que as garantias legais se expandem para toda população, deixando de ser mero pacto entre Senhores feudais, passando a ser uma carta de garantias. Com o novo Rei, as garantias que antes estavam ligadas a propriedade dos feudos, por força de contrato, agora são garantias de todos os cidadãos ingleses.

Além desse fator, temos outro marco importante. No reinado de Henrique III tem início à ampliação da legitimidade do parlamento com a entrada de membros do exército e de cidadão. Tal amplitude Parlamentar trouxe uma estrutura com maior representatividade, logo as leis de 1215 eram sem legitimidade por não representarem a vontade das várias camadas da sociedade inglesa, mas com o novo Parlamento adquiriram a representatividade.

Logo, ousamos afirmar que no ano de 1485 nasce a primeira constituição, pois temos dois requisitos: representatividade de várias camadas na construção das leis e garantias individuais que se aplicam aos cidadãos. Sendo assim, o marco histórico da primeira constituição não é 1215 com João sem terras, mas 1485 com a aplicação dos direitos por Henrique VII.

2.2 DA FORMAÇÃO DO ESTADO  

Feito o levantamento histórico sobre a formação constitucional inglesa, temos de observar em que momento surge o Estado inglês para respondermos outra de nossas perguntas: a formação constitucional e do estado ocorrem no mesmo período?

A conceituação de Estado, explicitada por Habermas, é muito ampla, assim como, podemos notar em Habermas (2002):

“estado é um conceito definido juridicamente do ponto de vista objetivo, refere-se a um poder estatal soberano, tanto interna quanto externamente; quanto ao espaço refere-se a uma área claramente delimitada, o território do Estado; e socialmente refere-se ao conjunto de seus integrantes, o povo do estado. O domínio estatal constitui-se nas formas do direito positivo, e o povo de um Estado é portador da ordem jurídica limitada á região da validade do território desse mesmo estado.” (P.124)

Numa analise do conceito citado, podemos notar que Estado passa por uma soberania interna e externa, ou seja, se tiver soberania ela será um Estado, entretanto essa soberania se da de formas diferentes.

A soberania externa ocorre quando o Estado consegue manter o seu domínio territorial frente a outras nações. Com relação à sociedade inglesa, esse requisito já vinha sendo realizado desde 1066, com a conquista de toda a ilha por Guilherme o Conquistador, com isso cria-se a imagem de um governo central que pode responder e defender os limites territoriais do Estado.

A soberania interna está atrelada a produção legislativa, que seja a produção de direito positivo, essa positivação única foi construída com o passar dos tempos. No período de Guilherme atos como: a proibição de guerras privadas e a prerrogativa real de cunhar moedas demonstraram o poder de manutenção de um controle central, entretanto sem um corpo legislativo único.

Outro momento importante para a formação de um governo central ocorre no governo de Henrique II, que impôs o primeiro imposto sobre renda e propriedade e proporciona a aplicação uniforme da lei com juízes escolhidos pelo governo central. Esse foi o ponto inicial de um corpo de direito positivo que daria ensejo ao poder Central do Estado.

Apesar da existência de um governo central ainda não se verificava um ordenamento jurídico único. Por isso o Estado ainda não estava completo, dentro mais ainda persistia um sistema feudal na ilha que impossibilitava a formação de um Estado.

Com a constituição da Carta de 1215, cria-se um corpo legal unificado na Inglaterra, entretanto seu caráter restrito na época acaba por ser um limitador de aplicação normativa.

Dentro mais, o mesmo fator que impossibilita as regras de 1215 de ser o baluarte da formação do Estado inglês, impede que a mesma seja marco da primeira constituição européia. Já que aquele documento legal se restringe a mero acordo feudal, assim como alegado anteriormente.

Com a formação do Parlamento inglês e sua posterior modificação, feita nas idéias de Simão de Montfort e a ascensão da linhagem Turdor ao poder com Henrique VII tivemos um governo central que corporificou um conjunto de normas por meio de um Parlamento e com isso correspondeu à soberania interna delimitada por Habermas.

E finalmente com a primeira constituição inglês, pois com a formação do Parlamento nasce na Inglaterra corpo de lei unificado, criando um direito positivo que se aplicava a todo território e tão importante quanto isso tal momento histórico amplia as garantias da magna carta a todo o povo. O que antes era um contrato feudal vinculado a posse se transforma em direito constitucional proveniente da nacionalidade.

Podemos notar que o momento histórico inglês se adéqua ao conceito de Estado, todavia Habermas divide a formação do Estado em duas frentes, logo temos de verificar dentro da conceituação histórica se esses momentos ocorrem na sociedade modelo.

Habermas divide a formação do Estado antigo e moderno, sendo que há uma somatória para se ter o moderno será necessário além dos seus requisitos os do Estado antigo, sendo assim vejamos.

O estado antigo se forma para Habermas (2002):

 “o poder executivo do estado apartado do rei e burocraticamente configurado constituí-se de uma organização de postos especializados segundo áreas do conhecimento, ocupados por funcionários públicos juridicamente treinados e pode apoiar-se sobre o poder esquartelado do exército, polícia e poder carcerário existentes. Para monopolizar esses recursos do uso legítimo do poder, foi preciso impor a paz social nacional. Só é soberano o estado que pode manter a calma e a ordem no interior e defender efetivamente suas fronteiras externas” (P.124)

Neste rumo, nota-se que a questão do Estado está ligada a um binômio: soberania interna e externa, assim como no debate anterior nota-se que a Inglaterra tinha os dois requisitos.

Entretanto, o autor traz um novo elemento formador do Estado moderno Habermas (2002):

“ainda mais importante para o processo de modernização é a separação do estado da sociedade civil, ou seja, a especificação funcional do aparato estatal. O estado moderno é a um só tempo estado diretivo e fiscal, o que significa que ele se restringe essencialmente a tarefas administrativa.”(P.125)

O requisito para os moldes de um Estado moderno passa pela liberdade que este reserva a sociedade. Essa preceituação já existia no Estado inglês, como anteriormente demonstrado, pois durante o reinado de Henrique VII as garantias individuais foram ampliadas aos cidadãos ingleses.

Podemos notar uma similaridade entre o período que acreditamos ser da verdadeira formação constitucional como a formação do Estado inglês. Logo, a questão feita na parte introdutória do texto se revela verdadeira, pois a formação constitucional ocorre no mesmo período da formação do Estado. Todavia, não podemos afirmar que há uma ligação intrínseca entre a formação da constituição e do Estado, já que só com uma análise comparativa entre vários Estados que teríamos tal resposta, e dentro mais, este não é nosso escopo.

CONCLUSÃO

No artigo disposto, saímos de uma problemática: Analisar se o marco histórico da primeira constituição é realmente a Carta de João sem terras de 1215. Para tanto, tivemos de analisar a história inglesa e passamos pela formação constitucional, mas também pela formação do Estado inglês.

Após extensa argumentação sobre dados históricos e doutrinários, podemos afirmar que o documento assinado em 1215 por João sem terras e os Senhores Feudais é um contrato que garante certos direito aos Senhores Feudais frente ao poder do Rei. Logo é um contrato feudal, e não uma carta constitucional.

Afirmamos tal idéia em decorrência da falta de amplitude dos direitos dispostos; tais direitos estavam ligados à propriedade dos feudos, diferente de uma constituição onde estes estão ligados a cidadania. Outro fator basilar de nossa tese é a falta de legitimidade, apesar da Carta de 1215 ser escrita por um Parlamento, este não tinha representatividade das várias camadas populares, logo não tinha legitimidade para ser tida como uma constituição.

Outra de nossas conclusões é referente ao que acreditamos ser o marco de origem da primeira constituição, que seja 1485. Neste ano Henrique VII aumenta a representatividade do Parlamento, trazendo legitimidade às leis, e amplia os direitos que antes só se aplicava a nobreza feudal, trazendo a diferença pontual: As garantias eram a todos os cidadãos, logo não estavam ligadas a propriedade, mas a cidadania.

A última conclusão que chegamos é referente à formação do Estado inglês, que tem como marco o mesmo período da criação da primeira constituição, ou seja, a constituição e o estado inglês se formaram no mesmo período histórico.

 


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