A fragilidade do sistema prisional brasileiro


Porwilliammoura- Postado em 05 março 2012

Autores: 
ANDRADE, Eliezer Rodrigues de

A FRAGILIDADE DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

Eliezer Rodrigues de Andrade[1]

Orientador: Dr. Jorge Amâncio de Oliveira[2]

eliezer@tjto.jus.br

elroan@bol.com.br

RESUMO.

O presente artigo retrata o atual estado de miséria do sistema prisional brasileiro. O Estado não denota  seu esforço coercitivo banindo de vez as mazelas do crime, evitando que indivíduos aglomerem-se nas cadeias e penitenciárias já transformadas em uma verdadeira zona de guerra. As prisões brasileiras na realidade deformam a personalidade humana distanciando cada vez mais o delinqüente de uma possível reabilitação. Após obterem a liberdade muitos retornam ao mundo do crime pelo fato de não mais encontrarem apoio na sociedade. Diante deste quadro hostil, o Estado se sente incapaz de reverter esta situação crítica e cruel. A falta de humanidade para com estas pessoas é mais um modelo cultural de uma sociedade preconceituosa, em que prevalece a idéia de que o infrator deva sofrer os rigores da Lei de forma desleal. Naturalmente a ociosidade faz com que os detentos procurem formas de extravasar suas emoções e, como as alternativas são mínimas, muitos se enveredam por caminhos degradantes como a prostituição, homossexualismo, violência sexual, consumo de drogas bem como contraindo toda espécie de doenças. A nova lei de prisão constitui vários benefícios que pode dirimir a quantidade de presos nas penitenciárias, porém, ocasiona certo desconforto na sociedade no quesito segurança.

Palavras chaves: Dignidade Humana; Direitos Individuais e Coletivos; Nova Lei de Prisões (Lei nº 12.403/11); Lei de Execução Penal- LEP ( Lei nº7.210/84).

DESENVOLVIMENTO

              A superlotação carcerária é um dilema que afeta todos os presídios brasileiros, gerando um problema social de grande magnitude para as autoridades e especialmente para a sociedade. O modelo empregado nos albergues não traduz com fidelidade o tratamento adequado com os detentos, pois, o que se pode presenciar é uma constante afronta aos direitos humanos.

Segundo LENZA, Pedro[3] (2010, p.119).

Nos termos do preâmbulo da CF/88, foi instituído um Estado Democrático, destinado a assegurar os seguintes valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias: o exercício dos direitos individuais, a liberdade; a segurança; o bem-estar; o desenvolvimento; a igualdade e a justiça.

              O exercício dos direitos individuais traçados no preâmbulo da Constituição Federal/88, não são levados em consideração a dignidade humana de um presidiário. De forma subumana milhares de presos se empilham uns sobre os outros, revezando até na hora de dormir por falta de espaço suficiente nas celas e, como animais irracionais vivem um dia após outro, condicionados a toda sorte de tratamento.

              O sistema carcerário se propõe a recuperar, reeducar os presos e prepará-los para retornar à sociedade e se tornarem produtivos para que não reincidam em práticas delituosas, porém, isto não passa de uma utopia, pois, boa parte dos que retornam são reincidentes.

              A própria sociedade proclama com muita altivez que os indivíduos trancafiados estão bem distantes de uma recuperação moral. Parte da sociedade ainda considera a pena de morte uma solução para a redução da marginalidade e conseqüentemente a superlotação carcerária estaria resolvido.

Aparentemente o Estado apresenta condições adequadas para dirimir a deprimente forma de vida dos detentos, mais com apenas algumas ações bem apáticas. Legisladores procuram meios para amenizar a situação caótica e, diante deste problema, surge então um novo conceito de prisão preventiva. Criou-se a Lei 12.403/11 que provocou muita polêmica com respeito aos bandidos soltos nas ruas.

DA APLICAÇÃO DA LEI Nº 12.403/11- A NOVA LEI DE PRISÕES.

Segundo Melo[4] (2011, p.76)

 Não é de hoje que o Congresso Nacional, normalmente por meio de projetos de iniciativa do Poder Executivo, implanta alterações visando a esvaziar as nossas prisões. Exemplo foi a expansão das penas alternativas, a Lei 9.099/95; a extinção do exame criminológico na Lei de Execuções Penais, que antes era exigido para a progressão de regime de cumprimento de pena privativa de liberdade; e a possibilidade de progressão de regime para os crimes hediondos e assemelhados, na lei 8.072/1990, que antes previa que a pena nestes delitos devia ser cumprida em regime integralmente fechado.

              Essas mudanças no tocante á prisão, para o Governo são medidas para a redução de presos nas penitenciárias, pois não é de interesse construir novos presídios. Óbvio que, quanto mais se constrói locais como estes, nunca serão suficientes para abrigar tantos marginais.

              A nova Lei de prisões n.12.403/11, que entrou em vigor no dia 04 de julho/2011, alterando trinta e dois artigos do Código de Processo Penal, reformando critérios para a decretação de prisão preventiva, trouxe com toda força o direito a fiança como prioridade sobre a prisão, acrescidas de várias medidas cautelares.

Assim define GONÇALVES, Antonio[5] (2011, p.71).

Fiança; recolhimento domiciliar; monitoramento eletrônico; suspensão do exercício da profissão; atividade econômica ou função pública; suspensão das atividades de pessoa jurídica; proibição de freqüentar determinados lugares; suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor; embarcação ou aeronave; afastamento do lar ou outro local de convivência com a vítima; proibição de ausentar-se da comarca ou do País; comparecimento periódico ao juiz; proibição de se aproximar ou manter contato com pessoa determinada; suspensão do registro de arma de fogo e da autorização para porte; suspensão do poder familiar e bloqueio de internet.

              A impressa fez grande alarde com a reforma da nova Lei de prisões, divulgando uma possível soltura de milhares de presos e, com isso, deixando a sociedade preocupada com essas novas medidas. Para os legisladores, cabe ao cumprimento das medidas cautelares necessárias, resguardando e garantindo o andamento dos processos, bem como seu efetivo resultado, mas sem ferir as garantias individuais do indivíduo.

Segundo MELO (2011, p. 77);

Na prática, a manutenção da prisão do acusado ocorrerá apenas em casos mais graves, como homicídio qualificado, estupro, tráfico de drogas, latrocínio, o que, sem dúvida, aumentará a sensação de insegurança, sem contar que as medidas cautelares substitutivas da prisão dificilmente serão fiscalizadas (recolhimento domiciliar e afastamento de determinada pessoa etc), situação que traz ainda mais desânimo aos operadores do Direito especialmente os encarregados de atuar na defesa da sociedade.

              As garantias constitucionais são as melhores formas para aplicação da justiça, porém, não podem prevalecer sobre os direitos de outrem que só pretendem ter uma vida pacífica, sem grades, cercas elétricas, câmaras de vigilâncias, carros blindados e segurança vinte e quatro horas por dia.

              A construção de uma sociedade tem como um de seus fundamentos a dignidade humana e, para os juristas, estas novas medidas cautelares podem trazer novas experiências.

              Conforme HENRIQUE, Batista[6] (2011, p.79).

Vivemos em uma República Democrática com flashes de um Estado de Exceção. A Lei 12.403/2011 é uma oportunidade de vivermos novas experiências, já que está provado que o sistema até então vigente não atende aos anseios de construção de uma sociedade que tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana.

DA APLICAÇÃO DA LEI 7.210/84- LEI DE EXECUÇÃO PENAL- LEP

              A segurança e o bem estar, tanto dos encarcerados quanto para os que trabalham dentro ou fora dos presídios estão sempre vulneráveis. A precariedade em que se encontram os estabelecimentos prisionais é visível e as mazelas estão presentes em todas as cidades do país. È muito comum em pequenas cidades homens e mulheres estarem agrupados numa mesma ala, o que não assemelha com a lei de execuções penais (LEP).

              No artigo 10 da Lei 7.210/84, diz que é dever do Estado, oferecer assistência ao preso, ao internado, melhores condições de vida, com o objetivo de que o condenado não retorne ao mundo do crime. Este benefício traz grandes vantagens como assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa.

              A lei é realmente fantástica, tanto que os próprios detentos sabem quais os benefícios que ela proporciona, porém, na realidade, pouco dela se aplica, o que tornam os detentos cada vez mais indignados do modo como são tratados e, na medida em que isto acontece, só dilui cada vez os alicerces de uma sociedade que luta por justiça e paz.

              Devido ao tratamento desumano para com os detentos, as pessoas que estão do outro lado do muro, aguardam apreensivos por novas reações de ex-condenados ou foragidos da lei. Da maneira como se comporta o Estado diante deste cenário crítico, o caminho para uma restauração torna-se cada vez difícil e obscuro. A resssocialização está bem distante no que se encontra epigrafado na Constituição Federal. Senão vejamos:

Art.1ª da CF/88. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal tem com fundamentos: III- A dignidade humana.

Art. 5ª da CF/88, no seu inciso III- ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante.

              Neste batalhão de seres humanos, com certeza, milhares deles encontram-se presos por crimes insignificantes, enquanto outros com crimes de maior repercussão estão livres como se nada tivesse acontecido, retratando fielmente a impunidade no País. Este critério de justiça não deve ser considerado como um paradigma, um modelo, uma referência, uma estrutura ou mesmo um ideal. A justiça, esquece destas pessoas "insignificantes", sem quaisquer condições de constituir um advogado particular, aguardando que um Defensor Público suplique em seu favor. 

              Considerando a Lei de execução penal, boa parte dos encarcerados deveriam ter uma forma de vida mais decente é que o versa o artigo 41 da lei 7.210/84:

Art 41 da Lei 7.210/84: I-alimentação suficiente e vestuário; II: atribuição de trabalho e sua remuneração; III: previdência social; IV: constituição de pecúlio; V: proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação; VI: exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; VII- assistência material, á saúde, jurídica, educacional e religiosa (C.F/88).

              Embora façam valer algumas condições básicas, a forma de vida dos detentos não são as das melhores, uma vez que há pouca segurança, espaço insuficiente para a quantidade permitida, falta de higiene bem como outras inúmeras falhas que precisam urgentemente serem revistas pelas autoridades competentes.

              È dever de o Estado tratar com dignidade e respeito homens e mulheres que por motivos banais vivem atrás das grades pagando por seus erros. Talvez com a aplicação da Lei de forma mais justa, os detentos retornarão ao convívio social e só assim restituirão a confiança da sociedade.

O ESTADO E SUA INERCIA COM RELAÇAO AO SISTEMA DE SAÚDE DOS PRESOS.

              A quantidade excessiva de presos dentro em uma cela, contrai uma variedade de doenças infectocontagiosas. A incidência de doenças atinge um índice muito alto, sem que haja um controle médico, devido a precariedade e insalubridade, principais agentes de proliferação em massa.

              Os fatores que mais contribuem para que aumentem ainda mais o caos dentro das prisões brasileiras, são ocasionadas pela falta de simples atitudes, porém, básicas, como uma boa alimentação, condições de higiene, atividades educacional e modalidade esportiva, para que se evite o sedentarismo.

              Para ASSIS, Rafael[7], (2007):

A superlotação das celas, sua preca­riedade e insalubridade tornam as prisões um ambiente propício à proliferação de epidemias e ao contágio de doenças. To­dos esses fatores estruturais, como tam­bém a má-alimentação dos presos, seu sedentarismo, o uso de drogas, a falta de higiene e toda a insalubridade da prisão fazem com que o preso que ali adentrou numa condição sadia de lá não saia sem ser acometido de uma doença ou com sua resistência física e saúde fragilizada.     

              As doenças respiratórias são as mais comuns como a tuberculose e a pneumonia. A hepatite, doenças venéreas e principalmente a contaminação pelo o vírus HIV permeiam sem qualquer controle dentro das prisões.

              Segundo Assis, Rafael[8] (2007):

 Os presos adquirem as mais varia­das doenças no interior das prisões. As mais comuns são as doenças do apare­lho respiratório, como a tuberculose e a pneumonia. Também é alto o índice de hepatite e de doenças venéreas em geral, a AIDS por excelência. Conforme pesquisas realizadas nas prisões, esti­ma-se que aproximadamente 20% dos presos brasileiros sejam portadores do HIV, principalmente em decorrência do homossexualismo, da violência sexual praticada por parte dos outros presos e do uso de drogas injetáveis.

              Além dessas doenças, há um gran­de número de presos portadores de dis­túrbios mentais, de câncer, hanseníase e com deficiências físicas (paralíticos e semiparalíticos). A Lei de execução Penal não permite que um internado doente fique junto com os demais em uma mesma cela, mas sim em local apropriado até que se recupere.

              A manutenção do preso torna-se desnecessária, uma vez que, este pode cumprir a sua pena em regime domiciliar, conforme disposto no art. 17, inc.II da LCP, evitando um contágio e risco a saúde dos demais presos.

              Para Assis, Rafael (2007);

Outra violação ao disposto na Lei de Execução Penal, no que se refere à saúde do preso, é quanto ao cumprimento da pena em regime domiciliar pelo preso sentenciado e acometido de grave enfer­midade (art. 117, inc. II). Nessa hipótese, tornar-se-á desnecessária a manutenção do preso enfermo em estabelecimento prisional, não apenas pelo descumpri­mento do dispositivo legal, mas também pelo fato de que a pena teria perdido aí o seu caráter retributivo, haja vista que ela não poderia retribuir ao condenado a pena de morrer dentro da prisão.

              Se a Lei for cumprida sabiamente, com certeza haverá uma redução na quantidade de presos, considerando que muitos encontram-se detidos por crimes totalmente insignificantes como um furto simples, além de inúmeros que já cumpriram suas penas, porém aguardam apenas por uma decisão final da justiça.

              Vale dizer que, não é interessante manter um preso em celas deploráveis, contrariando o que tipifica o artigo 5º da LIC- Lei de Introdução ao Código Civil em que prima pelos os fins sociais do preso, aplicando o fator ressocializador.

              Segundo Assis, Rafael (2007);

Dessa forma, a manutenção do pre­so em estado deplorável de saúde estaria fazendo com que a pena não só per­desse o seu caráter ressocializador, mas também estaria sendo descumprido um princípio geral do Direito, consagrado no art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, também aplicável subsidiariamente na esfera criminal, e, por conseqüência, na execução penal, que em seu texto dis­põe: na aplicação da lei o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

 

CONCLUSÃO.

              O tratamento dos detentos nos presídios brasileiros não se coaduna com o que se encontram elencados nas leis, especialmente na Constituição Federal. Dificilmente os condenados por latrocínios, homicídios, estupros, sequestros e tantos outros mais, voltarão a ter uma vida social decente se não forem bem tratados.

              A maioria voltam e praticam os mesmos crimes, ou quem sabe, outros ainda mais graves, pois na prisão por onde viveu décadas não lhes foram concedidas novas oportunidades. As prisões brasileiras precisam urgentemente de reformas, pois só assim, será possível restituir o princípio da dignidade humana.

              Vale considerar também o trabalho de pessoas que estão diretamente na linha de frente ao mundo do crime, prendendo, soltando, conciliando, pondo em risco a sua própria vida e de seus familiares, para que a sociedade possa viver com mais segurança.

              Conclui-se que, o Estado é o principal responsável pela resssocialização dos detentos que fazem das penitenciárias o retrato fiel de uma verdadeira escória humana que só aumenta a cada dia. O Estado não deve em hipótese alguma vendar os olhos diante de tantas atrocidades que ocorrem no interior dos presídios, dilacerando pouco a pouco o que restou ainda de bom: a dignidade humana.

REFERENCIAS.

 ASSIS, Rafael Damaceno de. A realidade do Sistema penitenciário Brasileiro: artigo. 2007, retirado do site http://www.cjf.jus.br/revista/numero39/artigo09.pdf, acessado em 27.01.2012.

 ANTONIO, Gonçalves; novas regras de encarceramento: revista Visão Jurídica. São Paulo: Escala 2011.

 Constituição Federal Brasileira; Compacto de Direito Ride El. 2ª Ed. São Paulo: Ride El, 2011.

 HENRIQUE, Batista; esperança de mudanças: revista visão jurídica. São Paulo: Escala 2011.

 ____LEI 12.403/11. Palácio do Planalto; http://www.planalto.gov.br/ccivil_3/_ato2011-2014/lei/1203.htp. acessado em 27.01.2011.

 MELO, Ednilson Andrade Arraes Melo:  Em defesa da Sociedade Civil. Visão Jurídica. São Paulo: Escala, 2011.

 PEDRO, Lenza; Direito Constitucional Esquematizado. 14 ed. São Paulo: Saraiva 2010.

 VADE, Mecum; Compacto de Direito Ride El. 2ª ed. São Paulo: Ride El, 2011.