Princípios da Administração Pública


PorJeison- Postado em 22 outubro 2012

Autores: 
OLIVEIRA, Cassio Marcelo da Silva de.

 

Introdução

Este trabalho tem o objetivo de esclarecer quais os princípios constitucionais aplicáveis a Administração Pública, tanto os princípios explícitos na famosa palavra “LIMPE” (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência) encontrados no artigo 37, caput da Constituição Federal, e os implícitos que constam do artigo 2º da lei dos Processos Administrativo Federal, lei 9.784/99.

Dos princípios constitucionais explícitos e implícitos do Direito Administrativo

Cabe primeiramente indagar o que vem a serem princípios. Princípios são a mola mestra do direito, ou seja, são os pilares de sustentação desta ciência, as bases valorativas que condicionam o ordenamento jurídico. Conforme a melhor doutrina preleciona, Maria Sylvia Zanella Di Pietro citando o mestre José Cretela Júnior, vejamos:

“ Princípios de uma ciência são as proposições básicas, fundamentais, típicas que condicionam todas as estruturações subseqüentes. Princípios, neste sentido, são os alicerces da ciência.

Segundo mesmo autor, os princípios classificam-se em:

a) onivalentes ou universais, comuns a todos os ramos do saber, como o da identidade e o da razão suficiente;

b) plurivalentes ou regionais, comuns a um grupo de ciências, informando-as nos aspectos em que se interpenetram. Exemplos: o princípio da causalidade, aplicável 
às ciências naturais e o princípio do alterum non laedere(não prejudicar a outrem), aplicável às ciências naturais e às ciências jurídicas;

c) monovalentes, que se referem a um só campo do conhecimento; há tantos princípios monovalentes quantas sejam às ciências cogitadas pelo espírito humano. É o caso dos princípios gerais de direito, como o de que ninguém se escusa alegando ignorar a lei;

d) setoriais, que informam os diversos setores em que se divide determinada ciência. Por exemplo, na ciência jurídica, existem princípios que informam o Direito Civil, o Direito do Trabalho, o Direito Penal etc.”(DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2001, página 66)

Vê-se como é importante conceituar e saber a respeito das bases principiológicas de uma ciência, pois o sistema normativo decorre desta estrutura e deve estar em conformidade com a mesma, devendo por isto todo ordenamento respeito aos preceitos constitucionais. Toda e qualquer ação da Administração Pública deve pautar-se nestes mandamentos valorativos, tanto os explícitos no artigo 37, caput da Constituição Federal, como os ditos implícitos que constam do artigo 2º da lei federal 9.784 de 29 de janeiro de 1999, a lei do Processo Administrativo Federal.

Primeiramente falaremos dos princípios explícitos, no caput do artigo 37 da Magna Carta, quais sejam, legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

1.                  Legalidade: sabemos que a legalidade é um dos mais importantes princípios, posto que sua origem confunde-se com o nascimento dos chamados Estados Democráticos de Direito, tais Estados fundam-se na ordem legalmente estabelecida, daí a o mandamento de que a Administração Pública deve fazer o que a lei determina, diferentemente dos cidadãos (administrados) que podem fazer tudo o que a lei não proíbe. A lei oferece a Administração Pública uma linha a ser obedecida e estritamente seguida, assim o administrador público não pode se esquivar da lei, assim todas as atividades tem sua eficácia condicionada ao estabelecido no direito. Veja o que leciona Hely Lopes Meirelles “Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa “pode fazer assim”; para o administrador público “deve fazer assim”.(grifo nosso)” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2004, página 88).

2.                  Impessoalidade: alguns conceituam este princípio com o nome de finalidade, posto que o administrador deve praticar o ato somente em consonância com a finalidade esperada pela lei, que nada mais é do que o interesse público, todavia acreditamos que a finalidade é um princípio e impessoalidade outro. Observe este princípio com a ressalva que o mesmo possui dois aspectos, um quanto a própria Administração Pública e outro em relação aos administrados. Assim no que tange a primeira ressalva todos os atos praticados pela Administração tem seu nome ligado a está, ou seja é vedada ligação do nome do administrador que praticou este ou aquele ato ao mérito do mesmo, visto que o mérito é do órgão e não do funcionário público, vedada fica a promoção pessoal do agente público, portanto. Na segunda ressalva entramos do campo da chamada isonomia formal, visto que a Administração não pode privilegiar e/ou prejudicar os administrados uns em face dos outros, assim deve pautar seu atos em função do interesse público, nunca em função de interesses privados ou de terceiros. Com isto observamos que a validade dos atos fica condicionada a observação estrita destes dois aspectos da impessoalidade.

3.                  Moralidade: a atuação da Administração Pública deve ter por escopo os padrões éticos, a probidade, a lealdade, a boa-fé, honestidade, etc. Observamos que tal posicionamento deve ser efetivado entre Administração e administrados, ou seja o aspecto externo do princípio em análise e entre Administração e agentes públicos, aspecto interno de observância da moralidade administrativa. Assim o que vale não é a noção de moral para o senso comum diferenciando bem e mal, justo e injusto, etc. A noção aqui é maior e deve ser entendida como o trato da coisa pública em busca do melhor interesse coletivo.

4.                  Publicidade: os atos da Administração Pública via de regra devem ser publicados, para que todos deles tomem conhecimento, assim devem ser amplamente divulgados, salvo quanto as hipóteses de legais em que o sigilo de alguns atos faz-se necessário. A partir da publicação os atos tornam-se de conhecimento de todos e passam a produzir efeitos jurídicos que deles se espera, tal publicidade vigora tanto em relação aos atos como em relação a ciência por parte dos cidadãos da conduta dos agentes administrativos, garantindo que o povo fiscalize a Administração dando eficácia aos preceitos da democracia participativa. Estas publicações ocorrem no órgão oficial, notadamente o Diário Oficial, sem prejuízo da divulgação via televisão, rádio, internet, dentre outros. Temos assim quatro funções da publicidade dos atos, dar ciência aos administrados, fazer com que os atos gerem efeitos jurídicos externos, controle (fiscalização) da Administração pelos administrados e contagem de prazo de determinados atos.

5.                  Eficiência: este princípio estava implícito no artigo 74 da Magna Carta de 1988, porém foi introduzido no caput, do artigo 37 do mesmo diploma, pela emenda constitucional número 19 de 4 de junho de 1998. É a busca pelo chamado bom e barato, assim como a presteza na atuação e gerenciamento por parte da Administração. “O princípio da eficiência apresenta, na realidade, dois aspectos: pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público” (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2001, página 83). É um princípio extremamente contemporâneo, posto que o administrado deve ter suas demandas atendidas com presteza e o serviço público tem de ser prestado como todo e qualquer serviço da atualidade e dar ao público o atendimento qualitativo e satisfatório.

Cabe agora indagar quais o princípios implícitos, que como dito estão disciplinados no artigo 2ª da lei dos Processos Administrativos Federais, vejamos : “ A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.” Os princípios da legalidade, moralidade e da eficiência já foram acima explicados. Iremos explanar os demais princípios.

1.                  Finalidade: o princípio da finalidade é corolário simples de que a Administração deve sempre buscar alcançar o fim público colimado pela lei. “ E a finalidade terá sempre um objetivo certo e inafastável de qualquer ato administrativo: o interesse público. Todo ato que se apartar desse objetivo sujeitar-se-á a invalidação por desvio de finalidade, que a nossa lei da ação popular conceituou como “fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência do agente”(Lei 4717/68, art.2º, parágrafo único, “e”)”(MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2004, página 91)

2.                  Motivação: a Administração deverá sempre, portanto é obrigatória a motivação dos atos, entendendo motivação como a fundamentação fática e jurídica. Tanto para os atos ditos vinculados, quanto para os discricionários, onde vige o binômio da oportunidade e conveniência do administrador, que após escolher um dos caminhos apontados pela lei torna o ato daquele momento em diante vinculado. Tal princípio preocupa-se mais em resguardar os direitos individuais dos administrados, do que com a Administração em si, sendo uma forma de proteger os cidadãos dos arbítrios estatais, como ocorria na era absolutista e não mais deve prosperar na ótica do Estado Democrático de Direito, em que a legalidade deve sempre ser seguida.

3.                  Razoabilidade e Proporcionalidadea administração deve pautar-se sob o que é razoável, ou seja, agindo da melhor forma possível para atingir o fim público pretendido, sendo uma forma de limitar a discricionariedade administrativa, averiguada na velha forma dos valores atribuídos ao entendimento do homem médio, como informa Lúcia Valle Figueiredo. A doutrina explica a razoabilidade em consonância com a proporcionalidade que seria a adequação dos meios e fim de dado ato, devendo ato ser racionalizado buscando a medida mais compatível com a finalidade pública a ser perquirida.  Sem dúvida, pode ser chamado de princípio da proibição de excessos, que, em última análise, objetiva aferir a compatibilidade entre os meios e os fins, de modo a evitar restrições desnecessárias ou abusivas por parte da Administração Pública, com lesão aos direitos fundamentais. Como se percebe, parece-nos que a razoabilidade envolve a proporcionalidade, e vice-versa. Registre-se ainda que a razoabilidade não pode ser lançada como instrumento de substituição da vontade da lei pela vontade do julgador ou do intérprete, mesmo porque “cada norma tem uma razão de ser” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2004, página 92)

4.                  Ampla defesa e Contraditório: é a proteção constitucionalmente consagrada no artigo 5º, LV, da Constituição Federal “aos litigantes em processo judicial ou administrativo será assegurado o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. Assim nas situações de litigio administrativo aos litigantes será dado todos os meios e recursos de defesa, tanto pessoal quanto técnica (através defensor) bem como o direito ao contraditório que garante as partes a possibilidade do exercício do direito de resistir a uma dada pretensão, ou seja, alegado algo contra/desfavorável a minha pessoa posso contraditar e alegar o contrário e vice-versa.

5.                  Segurança jurídica: pode ser entendido como princípio da não retroatividade, ou seja dado assunto de Direito Administrativo cujo entendimento passe a ser divergente do atual, não volta no tempo para anular os atos já praticados sob o crivo da antiga lei. Isto ocorre em todos os ramos do direito, visto que entendimento diverso causaria insegurança jurídica, rompendo com os vínculos e preceitos da boa-fé, assim é possível a mutabilidade das leis, sem que tal mudança venha a afetar o ato jurídico perfeito, a coisa julgada, bem como o direito adquirido.

6.                  Interesse Públicomais conhecido entra nós como princípio da supremacia do interesse público, como o próprio nome nos fala o interesse público vigora sob o privado. A primazia do interesse público sobre o privado é inerente à atuação estatal e domina-a, na medida em que a existência do Estado justifica-se pela busca do interesse geral” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2004, página 101). A administração não pode renunciar a este direito, até porque tal direito pertence ao Estado, fato é que tal princípio se consubstancia na chamada isonomia material tratando os desiguais na medida de sua desigualdade, assim os administrados estão em situação jurídica inferior a da Administração pública.

Exitem ainda princípios implícitos não compreendidos no texto do artigo 2º, da lei 9784/99, como o da continuidade, presunção de legitimidade ou veracidade, hierarquia, autotutela, controle jurisdicional(explicado no item do princípio autotutela) dentre outros, conforme a doutrina adotada pelo acadêmico de direito.

1.                  Continuidade: a atuação estatal de prestação de serviços públicos deve ser continua, visto que o mesmo desempenha funções ditas essenciais e necessárias ao bem comum, como por exemplo, abastecimento de água, fornecimento de energia elétrica, segurança pública, atendimento saúde, dentre outros. Assim os fornecimentos destes serviços não podem parar, mesmo em caso de não cumprimento contratual em contratos de execução de serviços públicos.

2.                  Presunção legitimidade ou de veracidadeos atos administrativos tem presunção de legalidade, visto que todos os atos devem estrito cumprimento em conformidade com a lei e de veracidade, por serem dotados da chamada, fé pública. Trata-se de presunção relativa (juris tantum) que, como tal, admite prova em contrário. O efeito de tal presunção é o de inverter o ônus da prova” (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2001, página 72)

3.                  Hierarquia: a administração deve seguir com rigor a chamada repartição de competências, assim existe entre os diversos órgãos da Administração relações de subordinação, visto que cada qual possui uma função típica dada pela lei. Assim deve-se seguir a escala vertical e/ou horizontal de competência para a resolução de conflitos conforme a demanda do caso concreto.

4.                  AutotutelaA administração deve exercer o controle de mérito de seus próprios atos. ...pela autotutela o controle se exerce sobre os próprios atos, com a possibilidade de anular os ilegais e revogar os inconvenientes ou inoportunos, independentemente de recurso ao Poder Judiciário...”(DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2001, página 73) Assim não cabe ao Judiciário interferir no mérito dos atos discricionários, somente fiscalizar os aspectos concernentes a sua legalidade, bem como a legalidade dos atos vinculados. Segundo a nobre Di Pietro, “tal prerrogativa existe também quanto a tutela dos bens que integram o patrimônio público, através do poder de polícia administrativa, o que nada mais é do que o princípio do controle jurisdicional”.

Conclusão

Os princípios do Direito Administrativo são de primordial importância para o entendimento aprofundando da matéria, uma vez que constituem nos pilares desta ciência. Notamos que tal ramo do direito deverá sempre observar a estria legalidade, visto que a Administração só pode fazer o que a lei determina. Todos os seus atos estão sujeitos ao crivo do Poder Judiciário, todavia para respeitar o pacto federativo tal controle ocorrerá somente no âmbito da legalidade, jamais deverão ocorrer interferências quanto ao mérito administrativo, principalmente no âmbito dos atos discricionários. Urge dizer que sempre deverá ser observado o interesse público, visto que Administração tem de buscar atender da melhor forma possível os interesses do bem comum, sempre motivadamente, com a devida finalidade pública, com transparência, publicidade, ética, de modo contínuo, razoável, proporcional, assim atendendo ao mandamento de nossa Constituição Cidadã, que tem por escopo resguardar a ordem do Estado Democrático de Direito.

Bibliografia:

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2004.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2001.

 
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