Sociedade civil participativa: democracia através da boa governança ou negligência estatal?


Porbarbara_montibeller- Postado em 13 março 2012

Autores: 
BARALDI, Camila Bibiana de Freitas
DRI, Clarissa Franzoi

1.     Sociedade versus Estado

 

Grande parte das teorias a respeito do surgimento do Estado, notadamente as jusnaturalistas, apresentam-no como um avanço em relação ao estado de natureza. Segundo o filósofo político inglês Thomas Hobbes, este caracterizar-se-ia pela barbárie, pelas guerras permanentes de todos contra todos e, logo, pela insegurança[3]. Somente a instituição de um poder irresistível poderia trazer paz, fazendo com que os homens atuassem conforme os ditames da razão. Assim, através do contrato social, os homens consentem em transferir todos os seus poderes ao Estado em troca da segurança. Percebe-se nitidamente a noção de progresso no sentido sociedade – Estado, bem como ocorre em Locke, Rousseau e outros tantos autores modernos, apesar das diferentes concepções de Estado[4].

Contemporaneamente, porém, surge a idéia de que estado de natureza e Estado representam apenas dois estágios da sociedade civil. Esta não surge conjuntamente ou em decorrência do advento do Estado “organizado”, mas já existe também no estado de natureza. Vale dizer, a sociedade civil, anterior a ambos, constitui a célula mater de qualquer tipo de estruturação do poder político, ou mesmo da ausência dela. Assim, o Estado deixa de ser o “organizador todo-poderoso” da sociedade para tornar-se parte e reflexo dela, uma vez que criação sua. Prova disso é que um sobrevôo pela história mostra que as mudanças nas relações sociais e nos modos de produção e os interesses políticos foram sempre determinantes de uma maior ou menor ligação entre poder estatal e população. Ou seja, a forte separação hoje verificada entre os setores[5] não é uma característica intrínseca ao sistema, mas sim uma conseqüência da realidade econômico-social. Com efeito, a distinção entre público e privado começou a ser notada a partir do advento do Estado Moderno. Até então, no sistema feudal, não havia diferenciação entre os três setores – político, econômico e sociedade civil -, visto que todos estavam relacionados à mesma figura do senhor feudal. Aos poucos, essa distinção surgida no Estado Moderno e que, na verdade, nunca foi completa, começou a rarefazer-se. Foi assim quando da implementação do Estado de Bem-Estar Social. Neste momento, o Estado passou a atuar em muitos dos espaços que originariamente pertenciam à iniciativa privada, no intuito de promover ações em benefício da sociedade, principalmente nas áreas em que a iniciativa privada, isoladamente, não conseguia atender às necessidades da população. Hoje, percebe-se a ocorrência do fenômeno inverso relativamente ao Estado. Os espaços que eram considerados de ação estatal estão sendo “invadidos” pela sociedade civil e o motivo talvez seja o mesmo, pois podemos notar a atual incapacidade do Estado em atender a todas as demandas da sociedade contemporânea.

Diante do exposto, é possível afirmar que o poder estatal existe para atender as necessidades sociais, e não o contrário. Partindo-se da premissa de que parcela destas necessidades podem ser melhor satisfeitas pelos próprios cidadãos, através de movimentos organizados, talvez o real progresso ocorra do Estado para a sociedade civil[6].

 

2.     A Sociedade Civil organizada

Um dos reflexos da importância da maior participação da sociedade civil na solução de problemas coletivos no Brasil é a edição da Lei 9790/99, que dispõe sobre a qualificação de pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público. O caráter público atribuído a essas organizações deve-se à prestação de serviços ou promoção de valores de interesse comum, na esteira dos fundamentos e objetivos da República[7] e do fim da ordem econômica – assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social[8]. A lei dispõe também sobre o Termo de Parceria, forma de repasse de recursos do poder público a essas organizações. Essa é a grande novidade no tratamento dos organismos da sociedade civil, uma vez que, reconhecendo o valor dos serviços prestados por essas instituições, o Estado forneceria auxílio financeiro direto e menos burocrático, buscando facilitar sua atuação. Antes do advento do referido texto legal, os diferentes benefícios - qualificações/certificados, convênios etc. - à disposição das organizações eram excessivamente formalistas e discricionários, o que faz da Lei das OSCIPs um verdadeiro avanço na área.

A Lei 9790/99 tem suscitado opiniões divergentes. Entre as questões controvertidas estão as supostas inconstitucionalidade e não-recomendabilidade da lei. Ela seria uma lei inconstitucional pelo simples fato de a Constituição Federal de 1988 reproduzir um modelo de ordenamento jurídico que incumbe o Estado das mais diferentes ações necessárias à sociedade. No entanto, é importante esclarecer que a mesma Constituição institui um Estado Democrático de Direito, e isto não é contraditório com as referidas ações promocionais do Estado. A explicação reside no fato de que a principal característica do Estado Democrático de Direito é trazer consigo um conteúdo-objetivo que, ao final, é mais importante que a simples legalidade. Assim, a realização da igualdade e a busca da justiça social - alguns dos principais nortes do Estado Democrático de Direito[9] - seriam as bases para uma interpretação/aplicação não meramente formalista do texto constitucional. Inclusive porque o fetichismo da regra deve ser evitado, ou seja, com Chevallier pode-se dizer que não se deve dar um valor mítico para a ordem jurídica[10]. Na verdade, a norma jurídica é que tende a ser formatada pela realidade. Aplicando esses conceitos na questão da realização de serviços públicos pelo chamado Terceiro Setor, é possível afirmar que, realizando diretamente ou incentivando ações em favor da sociedade, o Estado brasileiro estaria efetivando os conteúdos-objetivos do Estado Democrático de Direito previsto em nossa Constituição.

Com relação à não-recomendabilidade, há quem diga que os programas desenvolvidos pelas OSCIPS são, na realidade, função do Estado. Neste ponto de vista, as atividades assistenciais, culturais, educacionais e ambientais desenvolvidas por grupos do “Terceiro Setor” são importantes e positivas, contudo estariam a desonerar o poder público de suas obrigações. Ampliando-se a interpretação do argumento, tem-se que, além das OSCIPs, grande parte das formas de engajamento da sociedade civil  na condução de políticas comunitárias significariam a intromissão dela em área cujas tarefas não lhe cabem. Mais, acabariam por gerar uma maior acomodação estatal, na medida em que o poder público teria cada vez menos estímulos para promover programas já desenvolvidos por seus próprios beneficiários. Isso tudo decorre do entendimento de que as iniciativas da sociedade civil são motivadas, em sua maioria, pelo fato de o Estado não estar cumprindo a contento com seus deveres. Assim, não se trataria de uma melhor gestão de projetos sociais pela própria população, ou de uma melhor noção desta acerca dos problemas a serem resolvidos, mas somente de uma necessidade face à displicência estatal. Entretanto, é improvável que se trate de esvaziamento das funções do Estado, na medida em que as referidas funções são da sociedade como um todo, que apenas busca ajuda no Estado. Ou seja, os deveres públicos cabem à população, constituindo-se o Estado somente em um meio para bem desempenhá-los. Já que a própria sociedade demonstra efetivamente condições de melhor realizar certas incumbências, não há razão para a intermediação estatal[11]. Essa prática, essencialmente democrática, talvez seja um dos poucos caminhos a oportunizar, contemporaneamente, a tão buscada justiça social. De fato, é possível que a radicalização da democracia dependa hoje em muito de um comportamento ativo do Terceiro Setor.

 

3. Participação social, princípio da boa governança

Confirmando o valor da participação da sociedade civil no aperfeiçoamento da democracia está a inserção desta nas práticas da boa governança, promissor elemento preventivo ou corretor de condutas antidemocráticas. Origina-se ela da noção de governança, a qual se encontra ligada à idéia de “gestão do desenvolvimento”[12]. Pode-se definir governança como o conjunto de mecanismos de administração de um sistema social e de ações organizadas no sentido de garantir a segurança, a prosperidade, a coerência a ordem e a continuidade do próprio sistema[13]. Logo, a boa governança corresponde às formas de administração desse sistema que melhor atendam aos anseios da maioria das pessoas que dele fazem parte, gerando uma gestão saudável do desenvolvimento. Nesse sentido, Matthieu Fau-Nougaret afirma que

...sans être exhaustif, on peut considérer que font partie de la ‘bonne gouvernance’: la transparence et la bonne gestion des affaires publiques, la participation de la societé civile, la mise en place d’un État de droit, le respect des droits de l’Homme, la liberté de la presse et d’expression, un processus démocratique dans la prise de décision, une politique économique et sociale sensée, le respect de l’environnement et le combat contre la corruption[14].

        

De forma mais sucinta, o Livro Branco sobre a Governança Européia elenca e define os princípios da boa governança: abertura, participação, responsabilização, eficácia e coerência das políticas públicas, além de proporcionalidade e subsidiariedade[15]. Pertinentes ao presente estudo são os princípios da participação e da subsidiariedade, que dizem respeito, respectivamente, a uma abordagem ampla e abrangente da concepção e execução das políticas públicas, compartilhadas com toda cadeia social, e à adoção de ações públicas somente quando estas se mostrarem estritamente necessárias para o reforço dos programas conduzidos pela própria população.

As idéias sobre governança partiram de uma análise da crise de governabilidade, nos planos local e internacional, relacionada às problemáticas da perda de credibilidade da instância estatal e da diminuição de eficiência e eficácia da ação pública[16], devidas, em grande parte, à corrupção, às violações dos direitos fundamentais e às conseqüências negativas da globalização econômica em certas nações. Se aceitos esses fatores como algumas das causas da debilidade das democracias atuais, as diretrizes da boa governança poderiam ser vistas como um caminho para a consolidação e fortalecimento das mesmas. Logo, a participação da sociedade e a utilização subsidiária da interferência governamental na condução de políticas constituir-se-iam, de fato, em uma alternativa para o aperfeiçoamento das práticas democráticas.

Com efeito, uma vez verdadeiro que a democracia real apresenta inúmeras mazelas e que a boa governança pode trazer soluções, é também verdade que o engajamento da população é sim positivo e fundamental. Desse modo, uma sociedade civil participativa parece ser essencial à revitalização das capacidades nacionais de concepção e execução de estratégias de desenvolvimento social, educativo, ecológico, econômico e científico.

Destaque-se que a “participação” também pode ser vista sob um enfoque ampliado. Não consiste ela somente na atuação da própria sociedade, mas também no incentivo e fiscalização, por parte dela, das ações desenvolvidas por Estado e mercado. A população não pode permitir que as atividades estatais indispensáveis deixem de ser cumpridas, ou que diminua a participação das empresas em projetos públicos. Em outras palavras, participação deve ser entendida por crescimento qualitativo e quantitativo dos programas geridos pela sociedade e fiscalização e incentivo, por parte desta, do aprimoramento das funções do Estado e aumento da colaboração do Segundo Setor. Na prática, caberia a ela demonstrar que a busca do bem comum leva ao benefício individual, e não vice-versa. Segundo Renato Janine Ribeiro, a chave para um governo efetivamente republicano é a canalização do interesse de um para o proveito de muitos[17]. A sociedade civil talvez seja a porta necessária para a propagação deste ideal.

 

4. Consolidação democrática

Conforme já referido, a sociedade civil tem se mostrado mais apta para tratar de seus próprios interesses do que o Estado. Uma das principais causas dessa incapacidade estatal é o déficit de representatividade que, no Brasil, pode apresentar-se tanto como predominância de representantes de determinado segmento social em prejuízo de outro nos parlamentos em geral quanto como distorção na representação dos eleitores de diferentes estados federados na Câmara de Deputados[18]. O principal efeito desse fato é que em vez de um poder ascendente, que parta dos interesses da base (povo), temos um poder descendente, que não reflete as idéias da sociedade e que, por conseguinte, não atende aos anseios desta.

O problema da representatividade está intimamente ligado à consolidação da democracia. A incapacidade do Estado em atender a, ao menos, grande parte das necessidades da população, diz respeito à ausência de um regime democrático pleno, no qual o Estado refletiria realmente a sociedade. O que há hoje no Brasil é o que O’Donnell chama de democracia delegativa[19], e nesta quem define o interesse maior da nação não é o povo, mas sim o governo democraticamente eleito[20]. O alcance da consolidação da democracia e conseqüente ultrapassagem deste estágio de democracia delegativa passa, para Macpherson, pela mudança de consciência da população e pela diminuição das desigualdades sociais e econômicas. Isso tudo só se configura possível com a presença da democracia, o que gera um círculo vicioso para o qual o autor oferece a solução da democracia participativa[21].

De fato, não é possível esperar que a consolidação democrática parta de instituições eivadas de práticas antidemocráticas, as quais necessitam, em verdade, ser objetos de medidas transformadoras. Aqui se insere a chamada Lei das OSCIPs como uma possibilidade de atendimento das necessidades sociais e de conseqüente redução da desigualdade, permitindo uma mudança de atitude que levaria à consolidação democrática partindo da sociedade civil, de acordo com as noções de boa governança. Num primeiro momento, assumindo as “funções estatais” (atendimento das necessidades) e, em longo prazo, possibilitando o saneamento democrático do Estado através da conscientização da população.

 

 

Referências Bibliográficas:

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VENTURA, Deisy F. L. Monografia Jurídica: uma visão prática. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000.

 


[3]BOBBIO, Norberto. Thomas Hobbes. 4 ed. Rio de Janeiro: Campus, 1991. p. 33-38.

[4]Para Locke, o contrato social foi instituído com o fim de preservar e consolidar os direitos já existentes no estado de natureza – vida e propriedade. Na visão de Rousseau, o contrato social pretende desenvolver a liberdade do homem e sua legitimidade baseia-se na vontade geral. Simplificadamente, poder-se-ia afirmar que as concepções de Estado de Hobbes, Locke e Rousseau são absolutista, liberal e democrática, respectivamente.

[5]O Primeiro Setor corresponde ao Estado, o Segundo ao mercado e o Terceiro à sociedade. Interessante notar que, nesta divisão, a sociedade é considerada como Terceiro Setor, quando, na verdade, constitui-se em setor-base ou setor-originário, dado que sem sua existência não se poderia falar em Estado (setor público), conforme já demonstrado, e muito menos em mercado (setor privado). Além disso, ela parece estar cada vez mais organizada e preparada para lidar com sua própria realidade, algumas vezes de forma mais adequada que o poder público.

[6]BOBBIO, Norberto. O Conceito de Sociedade Civil. Rio de Janeiro: Graal, 1982. p. 23.

[7]Artigos 1º e 3º da Constituição Federal de 1988, respectivamente.

[8]Artigo 170 da Constituição Federal de 1988.

[9]STRECK, Lenio Luiz e BOLZAN DE MORAIS, José Luis. Ciência Política e Teoria Geral do Estado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000. p. 89-96.

[10]Ibid., p. 85.

[11]Insta ressaltar que não se trata aqui da extinção do poder estatal, mas simplesmente de uma adequação teórica à realidade cada vez mais presente do Estado como coadjuvante à sociedade civil, esta sim ator principal. Sendo assim, não cabem as teorias marxiana da superação dos antagonismos de classe até a supressão do Estado (sociedade com classes x sociedade sem classes) e gramsciana da ampliação da sociedade civil até sua universalização (sociedade civil com sociedade política x sociedade civil sem sociedade política). Desta última, poder-se-ia fazer uso da noção de sociedade “ampliada”, “alargada”, ou mesmo “universalizada”, mas sem prescindir, ao menos a princípio, do poder político. Por óbvio, com a reabsorção de tarefas pela sociedade, torna-se menor a necessidade de auxílio estatal. Assim, a tendência é que, a longo prazo, o aparato estatal diminua; no entanto, se isso ocorrer, será mera conseqüência de um processo natural escolhido pelos cidadãos. Portanto, se de interesse coletivo a retomada de certos papéis pelos cidadãos, descartada a objeção do esvaziamento das funções “do Estado”.

[12] Para maiores informações, ver site <www.worldbank.org/publicsector/>. Acesso em 27 jun. 2002.

[13]MILANI, Carlos R. S. Governança Global e meio ambiente: como compatibilizar economia, política e ecologia. In: FUNDAÇÃO KONRAD-ADENAUER STIFTUNG. Pesquisas: Governança Global – Reorganização da política em todos os níveis de ação, São Paulo, n. 16, 1999, p. 106.

[14] FAU-NOUGARET, Matthieu. La “Bonne Gouvernance” dans les Relations Juridiques Internationales. Revue du Marché commun et de l’Union européene, n. 446, mars 2001, p. 172-173: “...em um rol não exaustivo, pode-se considerar que fazem parte da ‘boa governança’: a transparência e a boa gestão dos assuntos públicos, a participação da sociedade civil, a presença de um Estado de direito, o respeito aos direitos do Homem, a liberdade de imprensa e de expressão, um processo democrático na tomada de decisão, uma política econômica e social sensata, o respeito ao meio-ambiente e o combate à corrupção”.

[15] UNIÃO EUROPÉIA. Comissão das Comunidades Européias. Governança Européia: Um Livro Branco. Bruxelas, 25.07.2001, p. 11-12. Disponível em <http://europe.eu.int/comm/governance/white_paper/index_em.htm>. Acesso em 05 set. 2001.

[16]CAMARGO, Sonia de. Governança Global: utopia, desafio ou armadilha? In: FUNDAÇÃO KONRAD-ADENAUER, op. cit. (nota 13), p. 11.

[17]RIBEIRO, Renato Janine. A República. São Paulo: PubliFolha, 2001. p. 60-61.

[18]STRECK, Lenio Luiz e BOLZAN DE MORAIS, José Luis, op. cit. (nota 9), p. 102-103. A distorção representativa por estado federado decorre do texto da Lei Complementar n. 78, de 30-12-1993 em seus artigos 2º e 3º. Tal lei estabelece que nenhum estado membro da federação terá menos de 8 (oito) deputados federais e que o estado federado mais populoso será representado por 70 (setenta) deputados federais, o que permite que um eleitor do Acre possa ter a mesma representatividade de 16 (dezesseis) eleitores de São Paulo.

[19]Ibid., p. 98-105.

[20]Nesta definição de interesses da nação, o governante não precisa guardar nenhuma ligação com as idéias da sociedade e nem mesmo com o discurso que o elegeu.

[21]STRECK, Lenio Luiz e BOLZAN DE MORAIS, José Luis, op. cit., p. 106-107.

A democracia participativa consiste na real participação do povo no poder. Segundo Paulo BONAVIDES, não há democracia sem participação. Teoria Constitucional da Democracia Participativa – por um Direito Constitucional de luta e resistência, por uma Nova Hermêutica, por uma repolitização da legitimidade. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 51. Assim que, sem ensejar necessariamente decisões diretas, a democracia participativa significa exatamente democracia de fato, na qual a participação efetiva da sociedade é indispensável.