Uma nova concepção do arrependimento posterior


Porbarbara_montibeller- Postado em 03 abril 2012

Autores: 
TRINDADE, Alexsandro de Araujo

SUMÁRIO:

 

 

1 – Introdução; 2 – Clássica visão do Arrependimento Posterior; 3 – Nova Concepção do Arrependimento Posterior; 4 – Conclusão; 5 – Referências; 6 – Notas de Rodapé.

 

 

RESUMO:

 

 

O artigo visa demonstrar que o Arrependimento Posterior possui nova definição jurídica, em detrimento da clássica visão, por muitos ainda adotada.

 

PALAVRAS CHAVE: Arrependimento Posterior, Princípios, Extinção da Punibilidade.

 

 

1 - INTRODUÇÃO

 

 

O artigo irá comprovar que, com a edição da Lei 10.684/03, a velha estrutura do Arrependimento Posterior, capitaneada no Art. 16 do CPB, veio abaixo. A referida lei deu-lhe uma nova concepção, a qual rompe com a ordem elitista, seletiva e preconceituosa que permeia o Sistema Criminal, privilegiando, pois, o princípio da isonomia e uma política criminal humanitária.

 

 

2 – CLÁSSICA VISÃO DO ARREPENDIMENTO POSTERIOR

 

 

Alguém que furta duas caixas de gomas de mascar, no valor de R$ 98,80 (noventa e oito reais e oitenta centavos)[1], e as restitue ao seu dono, até o recebimento da denúncia, de forma voluntária, terá a sua pena reduzida de um a dois terços; caso seja depois do recebimento, só terá direito a atenuação da mesma. No entanto, se alguém sonegar, por exemplo, R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), e restituí-lo, antes da execução da pena, sua punibilidade será extinta.

Por que tamanha diferença? Se os delitos supracitados são patrimoniais e cometidos sem violência ou grave ameaça a pessoa, por qual razão ambos não tem o mesmo tratamento? O Princípio da Especialidade!

Quem sonega é especial, pois não vive em favela, pelo contrário, integra o mesmo meio social daqueles que legislam e julgam. Assim, aparentemente não representam perigo algum para a sociedade. A contrario sensu, aquele que furta, tem um histórico de criminalidade, em geral, de quem vive na periferia, sendo um perigo em potencial para a sociedade; é um não cidadão, que deve ser controlado através do Direito Penal, que merece toda a repressão do sistema criminal, para que não venha a perturbar a paz dos verdadeiros cidadãos de bem!

Só que, para o desespero daqueles que reforçam a ideia da seletividade do Direito Penal, os quais entendem que o criminoso nato deve ser punido a todo custo, a velha estrutura do instituto do Arrependimento Posterior ruiu. Não há dois Arrependimentos Posteriores, um para o Direito Penal Clássico e outro para Direito Penal Econômico, mas só há um. Com uma nova concepção, que privilegia o Princípio da Isonomia e atende aos anseios de uma Política Criminal liberal.

O Arrependimento Posterior, como ainda se concebe para o Direito Penal Clássico, está previsto no art. 16 do Código Penal da seguinte forma: Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente a pena será reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços)[2].

Segundo Guilherme de Souza Nucci, o arrependimento chama-se posterior para diferenciá-lo do eficaz. Quer dizer que ocorre posteriormente ao momento consumativo (2005, p. 167). Entretanto, linguisticamente a expressão não foi das mais felizes, tendo em vista que todo arrependimento é posterior a algo, pois ninguém pode se arrepender de um feito que não aconteceu!

Na verdade, o instituto deveria qualificar-se como Arrependimento Restaurador, vez que “o arrependimento, no caso, representa não um sentimento de pesar pelo crime cometido, mas sim a vontade de restaurar a ordem perturbada” (Juan Cordoba Roda apud PEDROSO, p. 323). Dessa maneira, dever-se-ia chamar Arrependimento Restaurador, e não posterior, não só por questão de respeito à língua portuguesa, como também porque privilegia seu fim último: restaurar a situação da vítima anterior à prática do delito.

Por se tratar de causa de diminuição de pena e por estar prevista na parte geral do Código Penal, sua natureza jurídica é de Causa Geral de Diminuição de Pena[3]. Portanto, “(…) sua inserção no contexto da teoria do crime foi indevida, merecendo situar-se no capítulo pertinente à aplicação da pena” (NUCCI, 2005, p. 167)[4].

O arrependimento restaurador aplica-se aos crimes de cunho eminentemente patrimonial, cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa. Claro que se praticada a infração com violência somente a coisa, não há impeditivo para a incidência do referido instituto.

No furto, por exemplo, é perfeitamente viável a aplicação do arrependimento posterior, mesmo que tenha sido ele qualificado pela destruição ou rompimento de obstácu-lo (art. 155, §4º, I), uma vez que a violência repelida pelo art. 16 é aquela dirigida contra a pessoa, e não contra a coisa (GRECO, 2008, p. 278).

 

Contra este requisito, no entanto, opõe-se Guilherme de Souza Nucci:

Trata-se de requisito indispensável para a aplicação do benefício, embora se devesse, em futura modificação da lei penal, ampliá-lo para qualquer delito que produza efeito patrimonial, independentemente de ter sido praticado com violência ou grave ameaça. Ao roubo, cometido com grave ameaça ou lesão leve, por exemplo, cujo agente, arrependido do que fez, procure a vítima ou a polícia, devolvendo, integralmente, a coisa subtraída, bem como pagando qualquer dano remanescente, deveria ser efetivada a causa de diminuição da pena. Não se privilegiam, no direito penal pátrio, as formas de arrependimento do autor. Se, por um lado, quer-se que a pena sirva – e é a concepção mais difundida atualmente – de instrumento para a reeducação, quando se vislumbra uma forma real de arrependimento, significando uma natural reeducação, não se dá valor (2005, p. 167). 

 

 Acertada, no entanto, a decisão do legislador ao impor tal requisito, vez que não se pode esquecer que a gravidade da violência, por menor que seja, não se tem como reparar. Além do que, dois pontos devem ser considerados, que o benefício privilegia mediatamente o infrator, mas tem como alvo principal a vítima. Assim como, quem pratica um roubo e repara o dano tem direito a atenuante genérica, prevista no art. 65, III, b, do CP, não ficando, pois, sem nenhuma proteção.

Ainda com relação à violência, aduz Luiz Flávio Gomes que a violência exposta no art. 16 do CP é dolosa e não culposa, ou seja, refere-se a delitos dolosos e não culposos (Ex: Homicídio culposo no trânsito) (2007, p. 488). Portanto, preleciona que:

 

Excluídos os crimes violentos e dolosos contra a pessoa, não há outro impedimento para se dar efetividade ao dispositivo legal. Crimes patrimoniais, crimes funcionais (cometidos por funcionário público) etc… Todos admitem (plenamente) a diminuição da pena nele contemplada (2007, p. 488).

 

Pensa de forma contrária Júlio Fabbrini Mirabete:

 Entretanto, não se aplica nos crimes em que não haja lesão patrimonial direta. Não cabe, por exemplo, no crime de lesões corporais culposas quando o agente repara o dano patrimonial do ilícito. Não se pode concordar, portanto, com decisões que concedem a redução nessa hipótese (2008, p. 158).

 

Salutar frisar que o pano de fundo da questão não é o dolo ou a culpa da violência ou do delito, mas sim o efeito patrimonial decorrente da infração. Então a indagação que há de ser feita é: o Arrependimento Posterior incide sobre toda e qualquer infração que tenha efeito patrimonial?

Límpido que não! O instituto só derrama suas águas sobre as infrações que possuam como lesão principal, e não acessória, o patrimônio. Numa Lesão Corporal Culposa, o prejuízo advindo com tal ilícito é secundário e não principal, pois este é a integridade física do agente que não há como ser reparada, ou será que num Homicídio Culposo, no qual a violência é culposa, tem como se reparar a vida ceifada?

Claro que ao adotar tal postura, almeja-se privilegiar a vítima, entretanto tem que se ter bom senso nessa situação, pois na verdade, pode-se estar agindo contra o seu anseio, como fora bem frisado. Além do que o fim do instituto não foi este, mas de agir sobre os delitos de cunho eminentemente patrimonial. No mais, saliente-se que, para as hipóteses acima fustigadas, existe a atenuante genérica do art. 65, III, b, do CP, que na realidade é a que deve ser aplicada a estes casos.

Em relação ao quanto há de se reparar, para gozar do benefício labutado, existem três posicionamentos: O primeiro defende que a reparação deve ser integral, e não parcial, só que isto será verificado pelo juiz, através do conformismo da vítima, admitindo até uma reparação quase integral, mas não parcial; Já o segundo preleciona que a reparação parcial pode dar ensejo ao Arrependimento Restaurador, desde que a vítima consinta com tal satisfação patrimonial; Por fim, o terceiro aduz que a restituição deve ser total, não se indagando da aceitação da vítima, entretanto se impossível esta, e a vítima se conforma com a reparação parcial, pode ser o agente beneficiado com o instituto ventilado.

Ao lado do primeiro:

Guilherme de Souza Nucci: Deve ser feita de modo integral. Sendo parcial, não se pode aplicar o benefício ao agente. Entretanto, é preciso ressaltar que a verificação da completude do reparo ou da restituição deve ficar a cargo da vítima, salvo em casos excepcionais. Exemplificando: se o agente furta veículo do ofendido, devolvendo-o sem calotas, é possível que a vítima se dê por satisfeita, podendo-se considerar concretizado o arrependimento posterior. Entretanto, se o agente devolvesse somente os pneus do veículo, ainda que a vítima concordasse, seria uma forma de burlar o texto legal, não o aceitando o juiz (2005, p. 168).

 

Perfilhando o segundo, prelecionam: I – Paulo José da Costa Junior: É possível que a reparação do dano não seja integral, correspondendo, então, a uma menor diminuição da pena do que ocorreria se fosse completa (apud NUCCI, 2005, p. 168); II – Alberto Silva Franco: Em princípio, ser total, mas se a vítima se satisfez com a reparação parcial é de se admitir o arrependimento posterior (apud GRECO, 2008, p. 281).

Nos trilhos do último:

Rogério Greco: Há duas situações distintas que merecem ser objeto de análise. Na primeira delas, que diz respeito à restituição da coisa, esta deve ser total, para que se possa aplicar a redução, não se cogitando, aqui, do conformismo ou da satisfação da vítima quanto à recuperação parcial dos bens que lhe foram subtraídos. Na segunda, ou seja, não havendo mais a possibilidade de restituição da coisa, como quando o agente a destruiu ou dela se desfez, para que se possa falar em arrependimento posterior é preciso que exista reparação do dano. Nessa situação específica é que devemos aplicar o raciocínio de Alberto Silva Franco, conjugando-se o conformismo da vítima com a reparação parcial do dano levada a efeito pelo agente, para que possa ser ele beneficiado com a redução (2008, p. 281).

 

Na esteira do explicitado, o Superior Tribunal de Justiça comunga com a tese de que, para gozar do benefício, a reparação deve ser integral, como se pode inferir:

 
CRIMINAL. RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. OFENSA A DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. MATÉRIA PRÓPRIA DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. NÃO-CONHECIMENTO. SUBSTITUIÇÃO DE PENA IGUAL OU INFERIOR A UM ANO DE RECLUSÃO. APLICAÇÃO DA REGRA DO § 2.º, DO ART. 44, DO CP. MATÉRIA DECIDIDA EM SEDE DE HC. PROVA ILÍCITA. CONDENAÇÃO QUE SE BASEOU EMOUTRAS EVIDÊNCIAS. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. ARREPENDIMENTO POSTERIOR.REPARAÇÃO DO DANO ANTES DA DENÚNCIA NÃO CONFIGURADA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO.
I. (...).
II. (...). 
III. (...).
IV. Se não restou comprovada, de plano, a efetiva reparação do dano, antes do oferecimento da denúncia, não se aplica a causa de diminuição de pena relativa ao arrependimento posterior.
IV. Recurso parcialmente conhecido e desprovido.

(Resp. 505284 / SC; RECURSO ESPECIAL 2003/0021082-4 / Relator Ministro GILSON DIPP / DJ 03.11.2003).

 

O direito não pode ser interpretado de modo que leve a graves distorções. A reparação do dano, independente de ser através do pagamento ou da restituição da coisa, deve ser integral. No entanto, por acaso se não reparado integralmente, mas reparada uma quantia que a vítima e o magistrado julgam satisfatória, o acusado faz jus ao Arrependimento Restaurador.

Então, inicialmente a reparação deve ser integral. Contudo, se não for, analisa-se se a vítima concorda com o que foi reparado, assim como se o juiz também a aceita. Importante, o policiamento do magistrado nesta questão, para evitar, por ventura, fugas ao pretendido pelo instituto ventilado. Portanto, exige-se não só o conformismo da vítima, como também, o do juiz, por motivo de segurança não só jurídica, como daquela.

Para que o instituto em tela espraie seus efeitos, não necessita que a ideia da reparação nasça em sua mente, ou seja, que a mesma ocorra de forma espontânea, somente reclama que o acusado a pratique. Não sendo possível a sua observância, caso a reparação venha a ser efetivada, por meio de uma apreensão policial.

Dessa forma,

”Contentou-se o art. 16 do Código Penal em permitir a aplicação da causa de diminuição de pena por ele prevista quando o arrependimento posterior for voluntário, não se exigindo, aqui, o requisito da espontaneidade.

(…)

Contudo, se, v.g., a coisa subtraída pelo agente não é por ele voluntariamente entregue a autoridade policial, mas, sim, é descoberta e apreendida no curso das investigações, não se falará na aplicação da redução pena, porque não se vislumbra, in casu, a voluntariedade do agente” (GRECO, 2008, p. 279-280).

 

Agora, indaga-se se a voluntariedade é sinônimo de pessoalidade do ato, ou se pode conferir o Arrependimento Posterior através de uma reparação empreendida por terceiro, em seu nome.

“Nessa hipótese, temos pelo menos, duas correntes. A primeira, cuja interpretação atrela-se à letra da lei, exige a pessoalidade do ato, não permitindo a redução da pena se a reparação do dano ou restituição da coisa forem levadas a efeito por terceira pessoa; a segunda corrente, numa interpretação mais liberal, que atende tanto aos interesses da vítima como aos do agente, permite a aplicação da redução mesmo que reparação do dano ou restituição da coisa tenham sido feitas por terceiro” (GRECO, 2008, p. 280).

 

Atrelado a primeira corrente, traz Júlio Fabbrini Mirabete que: Para a existência da causa de diminuição da pena, a reparação deve ser pessoal, completa e voluntária (2008, p. 157). Ao contrário, perfilhando o outro pensamento, expõe Paulo Queiroz:

No entanto, se, como diz a Exposição de Motivos do Código, tal providência de Política Criminal é instituída menos em favor do agente do que da vítima, não faz muito sentido recusar idêntico efeito quando um terceiro, intervindo em favor do agente, restitua a coisa ou repare integralmente o dano, como pode ocorrer em se tratando de indiciado pobre (2006, p. 269).

 

Exigir pessoalidade do ato é por demais exarcebado, pois se um terceiro faz a reparação do dano em nome de outrem, se não há certeza de que este se arrependeu, porque não aplicar o in dubeo pro reo? Ou seja, porque não presumir que com a reparação do dano, efetuada por terceiro, o agente arrependeu-se do ato praticado?

Assim, tendo em vista uma política criminal mais liberal, que privilegia não só a vítima, como também o acusado, deve-se presumir voluntária a reparação do dano, procedida por terceiro, desde que não haja prova em contrário. 

Nesse diapasão, outra questão tormentosa é a trazida pelo art. 16 do CP, qual seja, se a circunstância apresentada pelo mesmo é objetiva ou subjetiva, ou seja, se no concurso de pessoas, reparado o dano por um dos agentes, ao (s) outro (s) aproveita o benefício.

Conforme preleciona Luiz Flávio Gomes:

O tema é polêmico, havendo duas posições (uma afirmativa e outra negativa). Prepondera o entendimento negativo, apesar de se tratar de uma causa objetiva de diminuição da pena. Sendo causa objetiva, diz a doutrina, o normal seria favorecer todos os agentes. Ocorre que o art. 16 do CP exige ato voluntário do agente (que é algo eminentemente pessoal). De outro lado, o fundamento da diminuição da pena é a suavização do desvalor do resultado (que fica atenuado com a reparação dos danos ou restituição da coisa). Se um só agente cumpriu as exigências do art. 16 do CP, apenas em relação a ele o desvalor do delito foi minorado. Por isso que o entendimento preponderante sustenta que apenas ele deve ser beneficiado.

(…)

Depois que um dos co-autores já pagou todo o prejuízo, pode ser que outro co-autor pague (ao primeiro) a parte dele. Nesse caso este último também pode se valer do art. 16 do CP (2007, p. 488-489).

 

Na contramão do exposto, denota a posição do Superior Tribunal de Justiça, como se percebe:

PENAL. RECURSO ESPECIAL. ESTELIONATO. ARREPENDIMENTO POSTERIOR. POSSIBILIDADE DE EXTENSÃO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO A CO-RÉUS.
Apesar de a lei se referir a ato voluntário do agente, a reparação do dano, prevista no art. 16 do Código Penal, é circunstância objetiva, devendo comunicar-se aos demais réus.

Recurso conhecido e provido. 

(REsp 264283 / SP ; RECURSO ESPECIAL 2000/0062057-2 / Relator Ministro FELIX FISCHER /DJ 19.03.2001).

 

Aquele que compreende que a voluntariedade, significa pessoalidade do ato, ou seja, que o agente tem que de corpo presente efetuar a restituição ou reparação, defende, sem sombra de dúvida, que tal circunstância é pessoal, subjetiva, intrínseca ao sujeito que a pratica. Pois, dessa maneira, não havendo pessoalidade também dos demais concorrentes, não há que se falar na extensão da redução para estes.

Contudo, há de se recordar que voluntariedade, quer dizer desejo de reparar o dano, e não a presença do acusado, no momento de sua prática. Vontade esta que pode ser manifestada pela própria pessoa ou por outrem em seu nome. Claro, destarte, consubstanciar uma circunstância objetiva, pois, não está dentro da esfera subjetiva do agente.

Isso porque a condição da reparação, não pertence somente ao acusado que a realiza, visto que se faz em nome de todos, até que se prove o contrário, a estes deve ser estendida a redução da pena.

No mais, se assim não se compreender, nenhum co-autor ou partícipe terá direito ao benefício. Senão, veja-se: Reparado integralmente o dano por um dos concorrentes, os demais para ter direito a redução ou efetuam a reparação juntamente com este ou lhe restituem aquilo que foi reparado em seu nome; como se conceber alguém beneficiar-se da própria torpeza! Será que se não percebeu que o concorrente devolvendo sua parte ao que reparou, este estará lucrando com seu evento criminoso! Absurdo imaginar tal hipótese!

Portanto, com esteio em tudo que foi exposto, o art. 16 do CP configura circunstância objetiva, extrínseca ao sujeito, estendendo, pois, a redução da pena a todos os sujeitos integrantes da relação criminosa, quando algum deles restitua a coisa ou repare o dano, ou quando um terceiro estranho o faça por estes.

Nessa toada, o Arrependimento Restaurador reclama um limite temporal. O art. 16 do CP é claro ao prelecionar que, só poderá gozar do seu benefício, quem atender aos requisitos até o recebimento da denúncia ou da queixa. Note-se que não é do oferecimento da denúncia, mas sim do seu recebimento.

Mister observar que o oferecimento ocorre com a proposição da denúncia pelo Ministério Público ou da queixa pelo Querelante, enquanto o recebimento dá-se no momento em que o magistrado aposta na peça acusatória o despacho de recebido. Assim, a partir desta fase, mesmo que preenchidos os demais pressupostos, não terá direito ao Arrependimento Posterior.

“Deve ser ressaltado, por oportuno, que o artigo fala em possibilidade de arrependimento posterior até o recebimento da denúncia. Assim, embora oferecida a denúncia, se o juiz não a tiver recebido, o agente poderá beneficiar-se com esta causa geral de diminuição de pena” (GRECO, 2008, p. 278).

 

Portanto, para fazer jus ao art. 16 do CP, o acusado há de justificar os seus preceitos, antes de recebida a denúncia pelo magistrado. Entretanto, se proceder à reparação do dano depois de recebida a denúncia, não terá direito, como bem afirmado, ao Arrependimento Posterior, mas gozará da atenuante genérica, preceituada no art. 65, III, b do CP.

Sacramentados os pressupostos exigidos, o réu terá direito, por enquanto, a ver sua pena reduzida de um a dois terços. Para Guilherme de Souza Nucci, “deve-se levar em consideração dois fatores: a) espontaneidade do agente; b) celeridade na devolução. Quanto mais sincera e rápida for a restituição ou reparação, maior será a diminuição operada” (2005, p. 170).

Para verificar o quanto será reduzido, o magistrado deve levar em consideração o tempo em que se procedeu a reparação, assim como se foi o mesmo quem a efetuou ou se outra pessoa a fez em seu lugar. Verificadas tais hipóteses, reduz-se substancialmente a pena.

Assim, ante tudo o que fora adunado, vislumbra-se que o Arrependimento Posterior é, para os conservadores, uma causa geral de diminuição de pena, que reduz a pena de um a dois terços, nos crimes de cunho patrimonial, praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa, ao agente que, por si mesmo ou mediante terceiro, restitui a coisa ou repara o dano causado à vítima, antes de recebida a denúncia ou a queixa.

 

 

3 – NOVA CONCEPÇÃO DO ARREPENDIMENTO POSTERIOR

 

 

Entretanto, com a edição da Lei 10.684/03[5], esta velha estrutura veio abaixo. O instituto do Arrependimento Posterior, além de estar situado noutro local, possui novos contornos, sendo a principal mudança a alteração de sua natureza jurídica, que de simples causa geral de diminuição de pena, passa a ser de extinção da punibilidade. 

Nessa norma, o assunto foi disciplinado no art. 9º, caput e §§ 1º e 2º da respectiva lei, conforme se pode inferir:

Art. 9o É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1oe 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.

        § 1o A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.

        § 2o Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios.

Inicialmente, salutar notar os crimes que são açambarcados pelo art. 9º, da lei 10.684/03. Constam da lei os delitos previstos nos arts. 1º e 2º da lei 8.137/90 e 168-A e 337-A do Código Penal. Os dois primeiros tratam-se dos crimes praticados por particulares contra a ordem tributária, enquanto os posteriores são Apropriação Indébita Previdenciária e Sonegação de Contribuição Previdenciária, respectivamente.

Cristalino o fato de que o bem jurídico tutelado pelos arts 1º e 2º, da lei 8.137/90, é o erário público, o patrimônio do Estado, ou seja, o dinheiro de todos. Com relação aos dois delitos previdenciários, apesar de um constar no título II, dos crimes contra o patrimônio, e no título X, dos crimes contra a administração pública, o bem jurídico protegido por ambos é o patrimônio da Previdência Social, que na bem da verdade, é o dinheiro do Estado.

Portanto, claro está que os delitos agraciados no art. 9º, do PAES, o bem jurídico em questão é o erário público, o patrimônio de todos. Além do bem jurídico protegido por esses delitos, outro aspecto que desponta é que são delitos que não possuem como característica a violência ou grave ameaça à pessoa. Dessa maneira, os seus preceitos são aplicados a infrações penais cometidas sem violência ou grave ameaça à pessoa.

Observa-se que o caput do art. 9º (do REFIS II)  prevê a suspensão da pretensão punitiva do Estado, e a interrupção do prazo prescricional no §1º, os quais constituem efeitos do parcelamento do débito existente com o ilícito penal.

No caso, suspender-se-á a pretensão punitiva do Estado, quando parcelado o dano causado pelo delito praticado. Significa dizer que se parcelado o crédito decorrente da infração penal, se estiver na fase do inquérito policial, este será trancado e se já tiver sido instaurado o processo, o mesmo será suspenso. Tentando minimizar, estipula que se suspende também o curso normal da prescrição.

Além dessas suspensões, previu no §2º a extinção da punibilidade, decorrente do pagamento do débito. Apesar de constar, tão somente, a pessoa jurídica, desarrazoado é imaginar que só esta tem direito a extinção da punibilidade, não alcançando também os seres humanos. Reforçando, frise-se que o parágrafo fala na “pessoa jurídica relacionada com o agente”, ou seja, não necessita que seja este quem efetue o pagamento, podendo ser uma terceira pessoa, no caso a própria empresa[6] utilizada na prática do delito.

Aqui impende esclarecer mais uma característica, que é o fato de que a reparação é voluntária, mas não precisa ser pessoal, podendo ser realizada por uma terceira pessoa, no caso a empresa pode efetuar o pagamento devido pelo agente, que terá direito a extinção da punibilidade. Portanto, não exige que o agente pessoalmente repare o dano, podendo ser feito por outra pessoa.

Para que venha gozar da extinção da punibilidade, o acusado deve reparar integralmente o dano realizado, ou seja, se pago parcialmente não fará jus ao benefício. Entretanto, ao contrário das leis anteriores[7],cai, por terra, o limite temporal, qual seja o recebimento da denúncia. Dessa maneira, enquanto não executada a pena, o agente terá direito a extinção da punibilidade, se reparado integralmente o dano.

Portanto, percebe-se que, consoante dispõe o art. 9º, da lei 10.684/03, para os delitos sem violência ou grave ameaça à pessoa, de cunho eminentemente patrimonial (arts. 1º e 2º, da lei 8137/90 e 168-A e 337-A do CP), reparado integralmente o dano, pelo próprio agente ou por terceira pessoa, antes de executada a pena, terá direito a extinção da punibilidade.

Cediço, como se pode inferir, que o art. 9º, da citada lei, criou outro Arrependimento Posterior, tão somente para delitos ali previstos, em detrimento dos demais. Ocasionando a coexistência do Arrependimento do art. 16 do Código Penal, que prevê uma redução de pena e o daquele artigo que estabelece a extinção da punibilidade, para a mesma situação de reparação do dano.

Essa coexistência deveu-se inicialmente pela figura do legislador, que restringiu a atuação do Arrependimento Posterior criado no art. 9º, do PAES. Depois mantida pelos tribunais, tendo em vista que entendem que por ser lei especial, em relação aos delitos previstos no Código Penal, não pode ser ampliada para ser aplicada a estas infrações.

Nesse aspecto, é a jurisprudência do Superior Tribunal Justiça, como se pode inferir:
PENAL. HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. RESSARCIMENTO DA VÍTIMA APÓS CONSUMAÇÃO DO DELITO.
Na linha de precedentes desta Corte, no delito de apropriação indébita o ressarcimento do prejuízo antes do recebimento da exordial acusatória não enseja a extinção da punibilidade, podendo incidir apenas como causa de diminuição da pena (v. g. arrependimento posterior) ou como circunstância atenuante. Habeas corpus denegado.
(HC 38770 / SP; HABEAS CORPUS 2004/0141791-2 / Relator Ministro FELIX FISCHER / DJ 01.08.2005).
 
Cristalino que a diferença substancial, entre as infrações penais agraciadas pelo art. 9º, da lei 10.684/03 e as do Código Penal é no tocante ao bem jurídico tutelado, pois ambos abarcam delitos sem violência ou grave ameaça à pessoa e de cunho eminentemente patrimonial. Portanto, a diferença reside no fato de que os primeiros têm como bem jurídico o erário público, enquanto os demais o patrimônio do indivíduo.
Assim, como justificar um tratamento melhor para quem possui um bem jurídico muito mais importante que outro? Ou seja, como não permitir a extensão do benefício para aquele, que nas mesmas condições, infringe um bem jurídico de menor valor, em relação aquele que goza o privilégio?

Dessa maneira, a partir do momento em que se restringiram os benefícios da 10.684/03, para as infrações penais ali aclamadas, gerou-se uma desigualdade latente na lei. Pois, somente é isonômico dispensar tratamento diferenciado para sujeitos, desde que entre os mesmos haja uma desigualdade que o justifique[8].

Fato que certamente não ocorre no presente caso, já que em vez de igualar a balança, desnivelou ainda mais. Óbvio que é injustificável a desigualdade proporcionada pela lei do PAES. Como pode alguém que sonega dinheiro público, que poderia ser utilizado para merenda das crianças, para custear as aposentadorias dos idosos, merecer um tratamento absurdamente privilegiado, em relação àquele que furta duas caixas de goma de mascar, ou daquele que furta um protetor solar.

Não há como se conceber, flagrante o desrespeito ao princípio da isonomia, tendo em vista a injustificada desigualdade vivenciada na lei. Contudo, tal desigualdade, tristemente, é mantida pelos tribunais, quando não permitem que os delitos açambarcados pelo Arrependimento Restaurador do art. 16, do CP, tenham direito a extinção da punibilidade. Mantêm-se, dessa maneira, perante a lei, a desigualdade gerada na lei.

Para tanto, justifica tal desigualdade sob o manto da especialidade, visto que por ser a lei 10.684/03 especial, e também por falta de previsão, não poderia ser aplicada aos demais delitos que ali não se encontram. Constitui um posicionamento exarcebadamente elitista e preconceituoso. Porque em razão da dignidade do bem jurídico tutelado, não há como se justificar tamanha falta de isonomia.

Não há outro argumento que não atrelar a voracidade da arrecadação tributária, de buscar, de reaver, a todo custo, aquilo que foi retirado do Estado, através do Direito Penal, com a proposição de que não se vê os delinquentes econômicos, como criminosos, mas sim pessoas que tiveram a infelicidade de sofrer as amarguras do sistema criminal.

Dessa forma, utiliza-se o Sistema Penal, escancaradamente, como meio eficiente de execução fiscal. Além do reforço da ideia de que a Repressão Penal é para quem está à margem da sociedade, para aquele que reside nas vielas escuras e sombrias da sociedade, que somente é mais um nas estatísticas de noticiários policiais.

 Clarividente que, para novamente restabelecer o desequilíbrio gerado na lei, e mantido perante a lei, deve-se romper a restrição imposta na lei 10.684/03, permitindo que todos os crimes que se encontrem na mesma situação, qual seja, sem violência ou grave ameaça à pessoa, de cunho eminentemente patrimonial, gozem dos mesmos direitos do grupo seleto estabelecido na respectiva norma.

Com a quebra da seletividade, abrindo o leque para todo e qualquer crime que se encontre nessas condições, retorna-se a sintonia do princípio da igualdade, o respeito aos seus postulados. Isto é possível, vez que o caso não é do princípio da especialidade, mas sim do princípio da posterioridade.

Uma lei posterior que, de qualquer forma beneficie o agente, deve retroagir para que a ele se aplique. Assim como se desrespeita ao princípio da igualdade, de índole constitucional, deve ser estendida a todos que se encontrem na mesma situação. O que está sendo feito aqui, com o devido respeito a um dos valores supremos do país, que é o princípio da isonomia.

Portanto, uma lei posterior, lei 10.684 de 2003, em relação ao Código Penal, de 1940, que flagrantemente viola o princípio da isonomia, deve ser harmonizada, alargando os seus preceitos a todos que se amoldem a situação por ela proposta. Então, todo agente que, cometa crime sem violência ou grave ameaça à pessoa, de cunho eminentemente patrimonial, repare integralmente o dano ou restitua a coisa, antes de executada a pena, deverá ter a sua punibilidade extinta.

Mas o que é isso, senão Arrependimento Posterior. Na verdade, então, não há dois Arrependimentos Posteriores, um para o Direito Penal Clássico e outro para o Direito Penal Econômico. Após a edição da lei 10.684/03, só há um. Um novo Arrependimento Restaurador, com uma nova natureza jurídica, um novo limite temporal, e, principalmente, com outro efeito, em relação ao antigo, previsto no art. 16 do CP.

Na realidade, a lei do REFIS II não criou um outro Arrependimento Restaurador, mas sim modificou o antigo, previsto no art. 16 do CP, revogando-o. Isto perfeitamente possível, tendo em vista que a Lei do PAES é da mesma índole hierárquica do Código Penal, leis ordinárias[9], posterior, vez que aquele é de 2003 e este de 1940, e, no seu art. 9º, tratou, de forma diferente do tema estabelecido no art. 16 do CP. Dessa forma, o instituto do Arrependimento Posterior não é mais o previsto no art. 16 do CP, mas sim o do art. 9º, da lei do 10.684/03.

O antigo Arrependimento Posterior, previsto no art. 16 do CP, era uma causa geral de diminuição de pena, que, para o agente que cometesse crime sem violência ou grave ameaça à pessoa, de efeito patrimonial direto, reparado o dano ou restituída à coisa, pelo próprio agente ou por terceira pessoa em seu nome, antes de recebida a denúncia, tinha direito a uma redução de um a dois terços da pena.

Agora o instituto do Arrependimento Restaurador, veiculado não mais no art. 16 do CP, e sim no art. 9º da lei 10.684/03, preceitua que, para o agente que cometa delito sem violência ou grave ameaça à pessoa, de cunho eminentemente patrimonial, reparado integralmente o dano, pelo próprio sujeito ou por terceira pessoa, inclusive pessoa jurídica, em seu nome, até antes de ser executada a pena, verá extinta a sua punibilidade. 

Percebe-se que além da natureza jurídica, que antes era causa geral de diminuição de pena e agora extintiva da punibilidade, substancialmente modificou do velho, para o repaginado Instituto, o limite temporal, que dantes era o recebimento da denúncia, atualmente é possível até o momento anterior ao de ser aplicada a pena, ou seja, até mesmo depois de transitada em julgado a decisão. Por fim, a primordial mudança, passou de uma simples redução de pena, ao de quem furta duas caixas de goma de mascar, reparando integralmente o dano, terá a extintação da sua punibilidade.

Impende ainda observar a disciplina do art. 65, III, b, do CP. Sob a égide da antiga disciplina do Arrependimento Posterior, quando reparava o dano, depois de recebida a denúncia, não incidia o art. 16, do CP, e sim aquela atenuante genérica. Como agora, com a nova concepção do Arrependimento Restaurador, se fizer isso terá direito a extinção da punibilidade, como fica a atenuante do art. 65, III, b, do CP? Também caiu por tabela?

Nota-se que o instituto do Arrependimento Posterior, assim como era antes, não é para todo e qualquer delito, contudo, para aqueles que são praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa e de efeito patrimonial direto. Portanto, para todo e qualquer delito que não se enquadre nessa situação, reparado o dano da vítima, continua sendo aplicável a atenuante genérica do art. 65, III, b, do CP. Além do que, mesmo para aquelas infrações, caso não se repare integralmente o dano, mas se minore de alguma forma a situação vivenciada pela vítima, não fará jus ao Arrependimento Posterior, mas a atenuante genérica do art. 65, III, b, do CP. 

Ademais, extremamente importante mencionar que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, lentamernte, está caminhando neste sentido, de extinguir a punibilidade daquele que, voluntariamente, nos crimes de cunho patrimonial, independente de sua origem (Direito Penal Econômico ou Clássico), cometidos sem violência ou grave ameaça a pessoa, restitui a coisa ou repara o dano, como se pode perceber:

 

Apropriação indébita (em razão da profissão). Advogado (verba trabalhista). Restituição do bem antes da denúncia (caso). Punibilidade do fato (extinção). 1. A ação penal proposta contra advogado que deixou de repassar a clientes quantia recebida em razão de ação trabalhista não há de ir adiante quando, antes mesmo do oferecimento da denúncia, ocorreu o ressarcimento dos valores. 2. Ora, se se pode considerar desnecessário o Direito Penal quando possível garantir a segurança e a paz jurídica por meio do Direito Civil, Administrativo ou por meio de medidas preventivas extrajurídicas, mais desnecessário será em caso de restituição do bem apropriado indevidamente. 3.Há, pois, de se responder, com a extinção da punibilidade do fato, à pergunta formulada em caso análogo: se o indivíduo que sonegou milhões de reais não responde pelo crime de sonegação caso pague o valor sonegado antes do recebimento da denúncia, por que não dispensar o mesmo tratamento a alguém que comete um delito contra o patrimônio, sem violência, na hipótese da vítima não sofrer prejuízo (por devolução ou restituição dos bens/valores)? 4. Recurso ordinário provido – extinção da ação penal. (RHC - RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS – 25091 / HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE) / SEXTA TURMA / DJE DATA:17/05/2010 / Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo no julgamento após o voto-vista do Sr. Ministro Nilson Naves, que deu provimento ao recurso, e os votos da Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura e do Sr. Ministro Celso Limongi, no mesmo sentido, por maioria, dar provimento ao recurso em habeas corpus nos termos do voto do Sr. Ministro Nilson Naves, que lavrará o acórdão. Vencido o Sr. Ministro Relator, que lhe negava provimento. Votaram com o Sr. Ministro Nilson Naves a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura e o Sr. Ministro Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP). Não participou do julgamento o Sr. Ministro Og Fernandes. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

 

 

4 – CONCLUSÃO

 

 

Então, a partir do art. 9º, da lei 10.684/03, o Instituto do Arrependimento Posterior deve ser interpretado da seguinte forma: O agente que, cometido um crime, sem violência ou grave ameaça à pessoa, de cunho eminentemente patrimonial, reparado integralmente o dano, pessoalmente ou mediante terceira pessoa, em seu nome, antes de ser executada a pena, verá extinta a sua punibilidade.

Tal posicionamento privilegia uma política criminal humanitária, na qual põe a vítima acima da voracidade punitiva do Estado. Pois, este diz ao agente que abre mão de puní-lo, para que a vítima possa ter seu problema solucionado. Coloca a vítima em seu devido lugar, como eixo central do Sistema Criminal.

Assim como, beneficia a todos os agentes que estavam à margem da lei 10.684/03, que em vez de uma mera redução de pena, tem direito a extinção da punibilidade. Pois o erro não está em permitir que quem sonegue R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) tenha sua pena extinta, caso devolva todo o dinheiro, entretanto, em não permitir que quem furte uma Bicicleta tenha o mesmo direito.

  Por fim, aqui não se está a pregar a impunidade, mas sim defender que as normas sejam aplicadas de forma justa a todos os sujeitos, sem eleger possíveis inimigos. Vislumbra-se um jogo justo, em que todas as regras sejam aplicadas, a todos agentes, da mesma forma, sem que se tenha em mente sua condição social. Um Direito Penal justo, que tenha suas normas aplicadas indistintamente, sem visualizar uma clientela habitual. Em assim sendo, quem furtar duas caixas de goma de mascar, deverá ter as mesmas regras de quem sonegar um milhão de reais. Portanto, pugnar por oportunidades iguais, para aqueles que se encontram em situação de igualdade; isto sim é sinônimo de justiça!

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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